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Cantada Barata

Emily.

Estou colocando meu avental para mais um dia de trabalho, não é
cansativo, tem um banquinho sem encosto giratório aqui atrás do balcão,
então posso ficar sentada enquanto trabalho.

O sino da porta anuncia a chegada de alguém.

A porta de entrada se abre e continuo anotando as minhas dividas em papel
que achei perto da caixa registradora com minha caneta decorada, sem me
importar com quem chegou. Fará o mesmo de sempre, procurar o que quer e depois vir até o caixa pagar, raramente me pedem ajuda para achar algo.

— Que sorte a minha — Reconheço essa voz de algum lugar...

Ah não! É aquele mesmo loiro de ontem, disposto a me infernizar de novo!

— O que vai querer? — Pergunto sem paciência, porém com educação. Ele
se inclina sobre o balcão e esbanja um sorrisinho.

— Um beijo. — Seu olhar descarado me atinge. Esse jeito galanteador não
me convence, imagino quantas vezes já fez isso com outras.

Com uma pitada de cinismo, pego o pacotinho de bala no formato de boca
e lhe entrego com má vontade, quase jogando em seu rosto esculpido
simetricamente.

— Você parece ser um tanto ácida — Ele diz, com um sorriso provocante
no rosto, não desiste fácil. Me curvo no balcão, apoiada pelos cotovelos e
ficando mais próxima dele, posso entrar nessa para me divertir.

— Cinco dólares. — O loiro continua me encarando com seu sorriso
cafajeste.

— Não quer saber meu nome? — Ergue a sobrancelha loira, igual aos
cabelos cacheados.
É, ele com certeza tem algum problema.

— Eu pedi para você dizer? — Me desfaço da posição que estou e cruzo os braços, aguardando o senhor gracinha que está agora com cara de cachorro
sem rumo, me entregar o dinheiro e pagar.

— Vou dizer assim mesmo, é Nikolai — Ele diz, todo cheio de si, tira o
dinheiro do bolso e me entrega. Uma nota de valor maior, preciso dar o
troco, todavia não tenho moedas para variar né.

— Aceita o troco em balas? — Pergunto, no tom mais simpático e ele
levanta a sobrancelha em reprovação a pergunta.

— Eu te paguei com balas? — Questiona com calma. Audacioso.

Essa criatura está começando a me irritar.

— Então criatura, você vai ter que esperar eu ir à loja do lado para pegar a droga do seu troco em moedas, ok? — Minha paciência já está no limite,
minhas mãos estão em posição típica de quando faço isso involuntariamente.

Ele suspira com um sorriso forçado de provocação, minha vontade é de dar um soco nele. Saio de trás do balcão e passo por ele, sentindo seu perfume tão doce que chega a ser enjoativo, é como se abrisse uma barra de caramelo.

Minutos depois.

Entro na loja devagar e relaxada, sem me importar o tempo que ele
esperou, os olhos azuis intensos me encontram.

— Demorou tanto que eu pensei que tinha morrido — reclama, escorado
preguiçosamente no balcão, impaciente

Toma seu troco — Estendo a mão após retirar as moedas do bolso do
avental, ele pega e logo abre aquele sorriso perfeito e irritante.

— O que você vai estar fazendo daqui a um ano? — Que tipo de pergunta
foi essa? Ele não parece curioso, mas sim pretensioso.

— Vou trabalhar e viajar para bem longe, por quê? — Respondo, sendo
ríspida e mostrando desinteresse.

— Não quer estar fazendo um ano de namoro comigo? — Nikolai dá risada
e eu não consigo evitar rir também, que cantada tosca!

— Te vejo amanhã, Emily — O homem alto de jaqueta se despede, saindo
e piscando de maneira malicioso para mim. Não vai rolar loirinho.

— Você vem aqui só para comprar bala?
— Pergunto parando de rir e
voltando a me lembrar como ele é irritante. Nikolai para perto da porta e
aponta o dedo para mim.

— Quem sabe não consigo arrancar mais um sorriso seu — Ele sai
sorrindo, agora foi mais fofo e gentil, não com segundas intenções.
Ainda bem que amanhã não estarei aqui.

Viro-me e volto para trás do balcão, preciso ajeitar os objetos, pois está
tudo uma bagunça.

Abro a porta e ouço uma música em volume alto suficiente para eu escutar
e saber de qual cômodo vem. Deixo a chave e a carteira no sofá azul-escuro
após fechar a porta e caminho seguindo a música.

Adentro a cozinha e vejo Rô dançando animada, um cheiro bom invade
meu nariz e dirijo meu olhar para a pia, onde tem uma travessa de vidro
contendo um bolo, do qual não sei o sabor.

— Ah! — Ela grita ao se assustar comigo.

— Não quis atrapalhar — Me refiro à música e toda sua coreografia
apontando a pequena caixinha de som em cima da mesa branca de madeira
que temos.

Rosalie desliga a música, neste momento percebo algo em seu
braço direito.temos.

— O que é isso? — Aponto a travessa e caminho seguindo o cheiro que emana, passando pela banca de mármore falso e escuro que temos.

— Bolo de morango — responde, orgulhosa do feitio, faço careta em
reação e ela também, me taxando de fresca.

— E como fez isso? — Pergunto, porque ela não tem costume de fazer
sobremesas tão variadas, apesar do talento.

— Com as mãos, ué — retruca, desligando a música. Engraçadinha.

— Vou trocar de roupa, o pai está bem? — Rô afirma num gesto, sigo em
passos silenciosos até o quarto, onde meu pai está dormindo e só a luz do
abajur ilumina. Retiro as botas e vou para o banheiro, trocar o absorvente.

— O que foi isso no seu braço? Aquele babaca do Billy de novo? Fala a
verdade Rosalie, porque se eu fizer ele falar vai ser pior — exijo, assim que
retorno à sala. Ela fica tensa, querendo fugir da conversa.

— Não foi nada, bati na porta, ele e eu estamos conversando, ele prometeu
que vai mudar e foi muito sincero Emily — Rosalie pega a gata nos braços
e desvia de mim quando me aproximo para ver de perto.

Está nervosa.

— “As portas”, elas costumam te machucar até você se calar para sempre, isso foge do controle e sabe como acaba? Se você não frear isso, eu vou dar um ponto final, cansei de ver isso e fazer vista grossa Rosalie. — Se
preciso ameaçar e ser tão hostil com ela para impedir algo pior, eu farei.

Não admito que aquele rato continue fazendo mal a ela, com pedidos de
desculpa, promessas que nunca cumpre, pressão, abusividade...

— Eu resolvo isso! Já sei tomar minhas próprias decisões Emily, Billy é
incapaz de me fazer esse mal todo que você imagina, nós tivemos um
desentendimento, só isso, eu provoquei sem querer também... — Está
desnorteada, cega, mal sabe se o que diz faz sentido.

— Rosalie! Você não provocou nada, cai na realidade! Esse cara é podre,
ele te sufoca, te humilha, te machuca, o que mais falta para largar esse
traste hein? Eu juro que não consigo entender o por quê continua com ele,
por mim eu ia agora mesmo na delegacia e faria um boletim de ocorrência, mas do que adianta? Se no outro dia você dá corda e começa tudo de novo? — Perco a voz de tão exaltada, isso me dá náusea de tanto ódio.


Minha irmã não responde, somente se afasta, chorando, talvez

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