Capítulo 2
Ashley encarou a sua mulher, o estômago contorcido de receio e angústia.
Meredith, em contrapartida, batia o pé, o salto do seu sapato ensurdecendo os ouvidos dos mais próximos. Os membros do tribunal lançavam-lhe olhares irritados, interrompendo o falatório entre si o suficiente para a fuzilar em vez de chegarem a alguma conclusão. Nos bancos atrás de si, onde as suas testemunhas beneficiárias se encontrava, Laurel semicerrara os olhos, tentada a entrar na mente de cada um daqueles júris e saber onde é que eles estavam com a cabeça para se demorarem tanto. Com a mão de Draco pousada firmemente na sua perna, a Ravenclaw permaneceu quieta, a morder o lábio inferior.
- Não é suposto eles nos mandarem embora e só nos chamarem quando chegarem a alguma conclusão? - questionou Ashley à ruiva ao seu lado.
Hermione Granger, sentada do lado esquerdo da Hufflepuff, assentiu de imediato, os olhos castanhos fixos nos feiticeiros com estranheza.
- Isto não é normal. - respondeu a Grynffindor, baixinho - As decisões estão a ser todas feitas à pressa e sem qualquer deliberação adequada. Eles parecem... desesperados.
- É normal. - retorquiu Ron Weasley, sentado por sua vez no lado esquerdo de Hermione - Todo o sistema deles foi por água abaixo. O Ministério ainda está a recuperar e as pessoas não confiam neles.
- Hey. - Harry chamou, esticando-se para a frente para encarar a Hufflepuff, que o observou com os olhos âmbar inquietos - Vai ficar tudo bem. Todos nós testemunhamos a favor da Meredith, é impossível que ela seja considerada culpada.
- Há muita coisa que deveria ser impossível e que, no que toca ao Ministério, nunca foi. - Ashley prensou os lábios, encarando o Herdeiro de Grynffindor com um sorriso de canto - Como a Umbridge torturar alunos.
O rosto de Harry contorceu-se, como se concordasse. Sentada no seu lugar, a perna de Laurel abanava, impaciente. A Ravenclaw não era pessoa para apenas ficar ali à espera, vendo o futuro de uma das suas melhores amigas nas mãos de feiticeiros e feiticeiras que mal sabiam o que estavam a fazer. Como Ron referira, o Ministério fora abaixo e o Wizengamot era agora formado por novos membros, alguns dos quais nem sequer tinham feito parte da Batalha de Hogwarts, preferindo esconder-se ou fugir do país quando Voldemort atingira o auge do seu poder. Apesar do esforço de Kingsley para ter consigo apenas os melhores e os mais confiáveis, ainda havia alguns que de bom ou confiável tinham, não passando de velhos cobardes ou funcionários ambiciosos.
Laurel apertou a mão de Draco, inconscientemente. Na sua mente, revisou toda a defesa que apresentara em nome de Meredith. O seu marido sorriu-lhe tranquilamente, afastando a sua madeixa loira que caía teimosamente para os seus olhos safira.
- Vai correr tudo bem, fizeste um excelente trabalho. O feitiço para projetar as memórias na parede, como se fosse um Pensatório mas em três dimensões? Brilhante. Eu não teria essa ideia nem em mil anos.
- A inteligência de Rowena Ravenclaw tem de servir para alguma coisa. - brincou a ruiva, abanando a cabeça - Ron tem razão, o Ministério está o caos...
- Peço desculpa mas já chegaram a alguma decisão?
A impaciente Meredith Lovelace pusera-se de pé, os olhos negros faiscando na direção do Ministro. A sua figura alta e esguia, em conjunto com as olheiras escuras e os lábios vermelhos, tornavam-na intimidante. Quem conhecera Amanda Lovelace reconheceria de imediato a sua filha, tão parecida que era.
- Meredith, por favor, espera um pouco... - pediu Ashley, exasperada.
- Lamento Ley, mas isto é incompreensível. - a morena virou-se, irritada - Já todo o mundo bruxo sabe o que fiz na Guerra. Lutei ao vosso lado, servi como espiã para a Ordem de Fénix e as provas foram esfregadas na vossa cara de uma maneira demasiado gentil, na minha opinião. - Meredith piscou o olho a Laurel, que revirou os olhos, surpreendendo-se sempre com a ousadia da amiga - Estive duas semanas em Azkaban, longe da minha família, tal como me foi instruído. A única razão porque aceitei ser feita prisioneira porque merecia. - Ley abriu a boca, pronta para protestar mas Meredith ergueu a mão, impedindo-a - Fiz o que tinha de fazer para manter a minha posição ao lado de Voldemort mas isso não justifica os danos que causei em inocentes; os pais de Dean Thomas que o digam. - engoliu em seco, endireitando os ombros - Mereço ser perdoada e todos sabemos disso, então porque continuar com esta palhaçada?
- Porque, Miss Lovelace, esqueceu-se de um pormenor. - Kingsley pusera-se de pé, os olhos escuros fixos na mais nova com seriedade - A senhora foi para Azkaban, tal como os restantes Devoradores da Morte, para esperar o seu julgamento... Não para mandar os Dementors embora, muito menos para os forçar a ir para bem longe daqui.
Um sorriso irónico brotou nos lábios de Meredith, ao mesmo tempo em que Laurel escondia a cara, tão culpada quanto ela. Quando a decisão de manter todos os Devoradores da Morte, sem exceção, em Azkaban até serem julgados chegara aos ouvidos da Ravenclaw, esta percebera de imediato o que isso implicaria: membros da sua família seriam mantidos junto aos Dementors. Ela conhecia as criaturas, vira o que eram capazes de fazer a um ser humano, o medo de Sirius ao senti-los ainda presente na sua memória. Protetora até ao fim, não iria permitir que Draco ou Meredith estivessem expostos a tal tortura. Por isso, fizera o que fazia melhor: lutara.
Ashley também não gostara. A sua mulher era inocente, não tinha nada que ser presa como qualquer um dos assassinos e criminosos que estavam presos em Azkaban. Por isso, mantivera-se calada quando Laurel entrara pela sua casa adentro à procura de Meredith, os olhos safira faiscando de raiva e desafio. Apoiara as duas no seu plano para pôr um fim à Escuridão provocada pelos Dementors, a qual ninguém deveria ser exposto, nem a pior pessoa do mundo.
Na mão de Meredith, um anel negro brilhava. Era feito de ónix, esculpido pelo mesmo joalheiro que fizera o lindo anel de safira na mão de Laurel. Os olhos da Lovelace, tao escuros como a jóia, brilhavam, fixos no Ministro com claro desafio.
- Que provas têm disso? - questionou a jovem, as sobrancelhas erguidas.
- A sua ligação aos Dementors é conhecida por todos nós...
- A minha ligação aos Dementors não passou de um Encantamento usado para os controlar quando precisei. - ripostou Meredith, encarando as unhas com desinteresse - Não tem qualquer prova de que sou responsável pelo desaparecimento dos Dementors. A meu ver, eles foram passar férias no Triângulo das Bermudas e não voltaram. Nada tenho a ver com isso.
Girou o anel no seu próprio dedo, discretamente. Fora ideia de Laurel e sua criação, claro. A mente brilhante da jovem levara-a a criar um Encantamento que pudesse aprisionar os Dementors naquela jóia, num feitiço semelhante ao que Voldemort usara para aprisionar a sua memória num diário velho. Com o controlo de Meredith sob os Dementors, bastara pedir-lhes que entrassem no anel e eles la tinham ficado, obedientes à menina que reconheciam como uma deles.
Assim fora. Entrara em Azkaban e, duas horas depois, os Dementors desapareceram. Era curioso e suspeito, claro, mas o Encantamento fora usado sem varinha e, portanto, não havia provas. As celas estavam isoladas umas das outras, por isso ninguém a vira murmurar as palavras mágicas necessárias. O anel viera escondido, oculto pela magia de Laurel, a qual a acompanhara em todo o percurso até à cela, antes de ir para a sua.
A Ravenclaw também fora presa, por escolha própria. Acompanhara o marido, a melhor amiga e encaminhara-se ela própria para uma cela sua, justa até ao fim. Apenas Ashley ficara em casa, a pedido de Meredith. A mente frágil da Hufflepuff não aguentaria ver a sua família encarcerada na prisão mais perigosa do mundo, por isso a sua mulher poupara-a, a custo.
- Senhor Ministro... - Laurel colocara-se de pé, a sua figura pequena e pálida mais ameaçadora do que qualquer uma das pessoas ali presentes - O meu julgamento foi curtíssimo, fui declarada inocente mal cheguei aqui. O meu marido e a sua família foi ligeiramente mais prolongado, mas nada como isto. Lucious Malfoy, o meu sogro, teve uma pena levíssima, apenas dois meses preso e ele sim é culpado. Estamos aqui há duas horas mostrando claramente que Meredith é inocente, o que foi mais do que levou para declarar Lucious culpado. A sua acusação de que Meredith teve alguma coisa a ver com o desaparecimento dos Dementors é absurda, como se... Como se desejasse ter motivos para a declarar culpada. - humedeceu os lábios, os punhos cerrados ao lado do corpo - Existe algum motivo para isso?
- Essa é uma acusação muito grave, Miss Ravenclaw...
- Também a sua. O que pretendem? Acusá-la só porque ela é filha de Amanda Lovelace? - os membros do Wizengamot sussurraram, inquietos - Porque ela é mulher? Diga-me, Senhor Ministro: é mesmo assim que quer começar o seu mandato?
Kingsley abanou a cabeça, aturdido. Os feiticeiros à sua volta murmuravam entre si, confusos e sem saber o que fazer. O barulho de um arrastar de cadeira atraiu a atenção de todos, o pigarrear nervoso de Harry Potter ecoando pelo silêncio em que o salão estava mergulhado.
- Membros do Wizengamot... Tal como referi antes, esta mulher lutou ao meu lado, salvou-me a vida e, sem ela, Voldemort ainda estaria entre nós. Não entendo o que pretendem com esta demora e esta indecisão. O mundo bruxo precisa de união, de justiça, de pessoas corajosas e lutadoras como Meredith Lovelace para corrigir todo o mal que foi feito, não de juízes confusos e perdidos. Esta mulher é inocente e aprisioná-la não passará a a mensagem que vocês pretendem. Não é por culpabilizar Meredith que irão impedir que o mal surja novamente. Não é assim que mostram o vosso poder e mostram segurança naquilo que fazem.
A voz de Harry Potter soava na mente de todos. Era a voz mais poderosa do momento, já que era o herói da sociedade, o menino que salvara o mundo. A outra heroína sorriu-lhe, a gratidão presente no seu olhar safira, a mão pousada sobre a mão inquieta de Ashley, cujos olhos âmbar se tinham banhado em lágrimas com as palavras de Harry.
Meredith, por sua vez, fitava o Menino-Que-Sobreviveu com assombro. Nunca na vida acreditaria que Harry estava ali a defendê-la, já que nunca se tinham dado bem. O Herdeiro de Grynffindor sorriu, envergonhado, enquanto a Lovelace assentia, num gesto de agradecimento mudo.
As palavras de Harry surtiram o seu efeito. Minutos depois, Meredith Lovelace foi declarada inocente, apesar das dúvidas que existiam sob o seu envolvimento no desaparecimento dos Dementors. No seu dedo, o anel de ónix brilhava, tanto quanto os olhos escuros da jovem que corria para abraçar a sua mulher, contente por aquele pesadelo ter finalmente acabado, tantos meses depois.
**
A Mansão Lovelace estava mergulhada num silêncio doce e confortável.
As duas mulheres encontravam-se deitadas, a cabeça de Ashley pousada no peito nu de Meredith, que acariciava-lhe os cabelos. Duas semanas separadas e as saudades eram mais que muitas, já que não se tinham separado desde o casamento. Após uma pequena festa na Mansão Ravenclaw para celebrar o fim dos julgamentos, tinham regressado à sua casa e feito amor até os seus corações se acalmarem, as saudades dissipando-se a cada beijo trocado. Agora, apreciavam a companhia uma da outra, os corpos tapados com um lençol fino, a noite iluminada pelas velas que Ashley acendera para receber a sua mulher na cama que partilhavam.
- E agora? - perguntou a Hufflepuff, erguendo os olhos âmbar na direção do rosto de Meredith, cujo rosto se iluminou num sorriso cansado.
- Agora o que, querida?
- Temos a vida toda pela frente. - Ashley sorriu, feliz - O que pretendes fazer? Eu... Eu vou voltar a Hogwarts. - encolheu os ombros, envergonhada - Vou fazer o sétimo ano para depois tentar entrar no St. Mungus como medibruxo. Não sei se consigo....
- Claro que consegues! - exclamou Meredith, beijando-a suavemente - Consegues o que quiseres e sei que é a tua profissão de sonho por isso apoio-te a cem por cento, está bem?
Ashley assentiu, grata pela confiança que a Lovelace depositava nela.
- E tu? - perguntou, curiosa - Vais voltar?
Meredith abanou a cabeça, sorridente.
- Não pretendo voltar. Tenho a oportunidade de me tornar estilista e vou aproveitá-la. É tudo o que sempre quis. E.... - ergueu o queixo da mulher, com um sorriso malicioso no seu rosto bonito - Vou levar a minha esposa na lua-de-mel perfeita. Estamos livres, podemos sair do país e fazer o que quisermos. Mal posso esperar para estarmos longe de tudo e todos, poder passar o dia inteiro contigo no quarto e...
Sussurrou-lhe ao ouvido, fazendo Ashley gargalhar, envergonhada com as palavras perversas que ela proferia. Meredith sorriu, feliz, sentindo o coração explodir com o amor que sentia por aquela mulher. Faria tudo por ela e sabia que era recíproco. A Hufflepuff beijou-a, a paixão fervendo entre elas como fogo sem controlo. Quando se soltaram, os olhos de Ashley brilhavam, os lábios murmurando:
- E depois?
Meredith franziu o sobrolho.
- Depois o quê?
Ley sorriu, acariciando a pele nua dela.
- Quero uma família contigo, Mer. Um dia, não agora, mas é o que mais desejo no mundo. Podemos adotar, claro, como órfã foi o que sempre quis fazer...
A mulata calou-se, surpreendida com os olhos marejados de lágrimas da esposa. Meredith soluçou, ao mesmo tempo que revirava os olhos perante a sua própria emoção, achando lamechas estar a chorar... De amor. De muito amor pela menina de olhos âmbar e sorriso fácil que a observava, preocupada:
- Estás bem?
Meredith sorriu.
- Estou muito bem, flor. Nunca estive melhor.
E beijou-a, perdendo-se no seu corpo, nos seus caracóis livres e leves como Ashley Hufflepuff, no amor que sentia por ela, na luz que invadira a sua vida escura.
Seriam felizes desde que estivessem juntas.
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