Nona parada - São Francisco
- Aquele baile de primavera foi ótimo! - Brie sai do carro e joga o nosso lixo fora. - Ver Claire caindo naquela mesa de bebidas com a coroa foi melhor que qualquer vingança.
- O que eu tinha na cabeça quando a namorei? - encho o tanque do carro pelo que eu espero ser a última vez.
- Nós nunca ficamos durante a adolescência - a garota de cabelo desbotado me abraça. - Acho que ninguém imaginava isso.
- Nós não somos oposto, deve ser por isso que nunca nos atraímos.
- Nós somos opostos agora?
- Acho que não, mas isso é o de menos.
Paramos nas redondezas de Los Angeles ontem e pegamos o final da estrada hoje. São Francisco está tão perto.
Brie não para de cantar músicas que eu conheço de cor. A companhia dela no banco do passageiro era melhor que qualquer locutor de rádio e lata de energético.
- Bem vindo a São Francisco! - Brie canta a frase na melodia da música. - Onde sua mãe mora?
- Está marcado no mapa - aponto-o. - Você vai ter que me ajudar.
- Tudo bem, eu consigo dizer direções sem me perder.
Gargalho e ela soca o meu braço.
...
Encontramos a casa da minha mãe em uma daquelas colinas clássicas. A pintura azulada da construção de dois andares é muito convidativa e charmosa. O jardim abriga algumas roseiras bem cuidadas e a pequena varanda serve de abrigo para duas poltronas com estofados de flores.
Estaciono em frente e ligo para minha mãe.
- Você está em casa? - pulo o cumprimento inicial.
- Sim! - ela diz com tamanha empolgação. - Vocês já chegaram?
- Estamos aqui em frente.
- Ah, estou vendo. Já desço. - E desliga.
Nem preciso dizer para Brie que chegamos ao lugar certo. Ela desce, desligo o carro e respiro fundo. Ah mãe, se você soubesse metade da minha vida depois que você se mudou.
Vamos até a porta e Brie fica um pouco atrás de mim. Me pergunto se minha mãe se lembra dela, de festas que eu ia e dos bailes da escola.
- Filho! - minha mãe me abraça sem pensar duas vezes, demonstrando ser a mesma mulher que deixou a vida em Miami.
- Ei, mãe! - fico meio sem jeito. Eu parei de me encontrar com meu pai quando me demiti e nunca mais nos falamos.
- Como você está? A viagem ocorreu bem? Por que não veio de avião? - ela se afasta e coloca suas mãos no meu rosto. Por favor, não me chame de Pequeno Owen agora.
- Eu estou bem. - Sorrio e puxo Brie pela mão. - Mãe, essa é a Brie, uma antiga colega da escola.
- Olá querida. Pode me chamar de Andrea - elas trocam um cumprimento de mãos.
- Olá. - Brie sorri e me olha.
- Entrem, por favor. - Minha mãe sai do caminho e nós entramos. - O quarto de vocês tem uma cama de casal e muito espaço para suas coisas, mas eu posso emprestar meu quarto para vocês.
Não é a casa que eu cresci e definitivamente não se parece com ela. A luz entra pelas janelas e a mulher ao meu lado apenas me lembra da minha mãe, mas não é ela. Nossa, o tempo não lhe foi muito gentil.
- Vocês chegaram muito tarde para eu fazer almoço, mas se não estiverem exaustos, podemos sair para jantar.
Olho para Brie, que já está subindo as escadas, e penso no que direi.
- Vamos nos instalar, tomar um banho e descansar. Talvez mais tarde podemos sair um pouco com você. - Sorrio no final.
-Tudo bem, sintam-se em casa. Estarei no jardim cuidando das minhas flores.
Beijo minha mãe no rosto e sigo Brie. Ela me espera para encontrar o quarto certo e eu guio-a até a única porta do corredor aberta. Encontramos uma cama de casal, um armário vazio, uma poltrona e uma porta para o banheiro.
- Você quer sair com a minha mãe mais tarde? - deixo minha mochila no chão e encosto a porta.
- Se não for atrapalhar o reencontro de vocês - Brie dá de ombros, abre sua mochila em cima da cama e tira uma muda de roupa.
- Claro que não, Brie. - Vou até o armário e pego uma toalha limpa para cada um de nós.
- Eu só preciso de um bom banho e dormir um pouco.
- A estrada é muito cansativa, mesmo revezando com você. - Jogo-me na cama e a encaro. - Vou colocar um despertador para umas sete horas, dá tempo de dormirmos bem.
- Tudo bem então. - Ela tira a camiseta e meus olhos param na cicatriz que ela tem na altura das costelas. Eu deveria perguntá-la sobre suas história, mas meus pensamentos se vão e eu mergulho no melhor cochilo que eu poderia tirar.
...
- Chegamos. - Estaciono o carro perto ao lado de um galpão iluminado na beira do oceano e quase embaixo da ponte mais famosa de São Francisco.
Chego a duvidar da minha mãe sobre esse restaurante. Eu apenas segui seu carro até aqui. É um galpão velho por fora, mas há tantas pessoas ao redor que eu resolvo ficar quieto. Minha mãe fala com alguém na entrada e nós somos colocados para dentro rapidamente.
O espaço interno é o oposto do externo. Sem desgaste nenhum, o lugar parece recém tirado de um catálogo de interiores. É moderno com toques clássicos - meu Deus, eu aprendi isso tudo ouvindo Clarissa falar sobre nossa casa!
Deixamos o espaço fechado e nos sentamos em uma mesa no fundo da sacada. Puxo a cadeira para minha mãe, depois para Brie e me sento entre elas. O garçom traz uma garrafa de vinho e parece íntimo da minha mãe.
- É o meu restaurante preferido aqui - ela se explica. - Os garçons me conhecem muito bem e eu contei que meu filho estava chegando.
- Ah sim - sorrio e Brie ergue sua taça.
- Um brinde ao Owen - Brie diz.
Minha mãe gosta do gesto e a acompanha. Faço o mesmo e nós provamos do vinho ao mesmo tempo. Olho para Brie mais uma vez porque esse vestido roxo de veludo que ela usa realça suas curvas e seu cabelo desbotado. Ela sorri com seus lábios descoloridos e eu seguro sua mão sob a mesa.
- São Francisco é um bom lugar para um novo começo, filho - minha mãe observa o horizonte enquanto fala. - Tenho alguns amigos que adorariam um novo advogado para tratar dos casos deles, você ganharia bem e poderia morar onde quiser.
- Eu não quero voltar a trabalhar por agora, mãe. Tudo o que eu fiz desde o final da faculdade foi trabalhar e tentar arrumar minha vida. Talvez seja hora de deixar as coisas bagunçadas.
- Bom, se quiser, é só me falar. - Ela repousa seus olhos em Brie. - O que você faz, querida?
- Estou indo atrás de uma nova vida em Los Angeles como artista.
- Você pinta ou desenha?
- Um pouco dos dois.
- Como estão seus pais?
Brie parece um pouco desconfortável com a pergunta, mas respira fundo e responde.
- Eles estão bem. Até perguntaram sobre a senhora alguns dias atrás quando estávamos no telefone.
- Eles eram as pessoas mais gentis da vizinhança toda. - Ela sorri e bebe mais vinho. - Eu vou lá dentro conversar com um amigo e volto logo.
Ela se retira da mesa e desaparece restaurante adentro. Brie solta um longo suspiro e bebe todo o seu vinho em um gole.
- Você está nervosa? - coloco minha cadeira mais perto dela.
- Sua mãe não parece muito feliz comigo aqui.
- Não se preocupe com isso, ela não aceitou muito bem o fato da separação e é bem conservadora quanto à aparência. - Enrolo uma mecha do cabelo de Brie no meu dedo indicador.
- Amanhã nós podemos visitar outros lugares sozinhos? - seu rosto está bem próximo ao meu.
- Me dê os nomes e as direções e nós iremos onde você quiser. Posso nunca ter vindo aqui, mas sei usar o GPS.
Beijo-a lentamente, provando o sabor do vinho em seus lábios junto com o aroma de seu perfume. Suas mãos seguram nas aberturas do meu blazer e ela não parece se lembrar de que estamos em um restaurante, não num quarto de hotel ou num carro.
Brie se afasta e eu ajeito o ombro do seu vestido.
- Obrigada pela carona, Owen.
- Nós não terminamos ainda.
Minha mãe retorna a mesa seguida por um garçom empurrando um carrinho cheio de comida. Ela deve ter preparado tudo enquanto estávamos dormindo. Ajeito-me e ela deixa que o jovem rapaz apresente nosso jantar.
Ele nos serve legumes cozidos no vapor, filé de carne assado e um molho para jogar sobre a comida. Provo da comida e me sinto melhor depois de dias comendo em qualquer restaurante na beira da estrada. Minha mãe conta como descobriu esse lugar e pergunta se gostamos.
- Muito bom mesmo, mãe. - Digo quando termino de comer.
- Parece a comida que a minha mãe fazia. - Brie parece nostálgica, mas quase não tocou no que está em seu prato.
- Então eu acertei em cheio com o pedido. - Minha mãe sorri e pergunta se vamos beber mais.
- Não, eu pretendo sair daqui dirigindo - rio como se fosse uma piada, mas ela não gosta do meu tom. - Se você não se importar, eu e Brie vamos passear pela cidade após o jantar.
Os olhos de Brie demonstram a surpresa da ideia. Ela esperava por isso amanhã.
- Claro que não me importo. - Ela sorri e tira uma chave da bolsa de mão. - Eu ia te entregar antes de sairmos, mas agora parece uma oportunidade melhor.
- Obrigado, mãe. - Não acho que seja a chave da porta de casa, mas não digo nada.
Pego-a e guardo no bolso do blazer.
Não vejo a hora passar enquanto conversamos. Minha mãe continua perguntando sobre a família de Brie e sobre meu trabalho. A conversa passa a se tornar cansativa e um amigo da minha mãe surge e a convida a se sentar com ele.
- Vocês já querem conhecer a cidade? - ela coloca sua mão no meu ombro.
- Se não for uma má hora - respondo.
- Eu pago a conta, vocês podem ir.
- Obrigado, mãe. - Abraço-a e ela sussurra algo em meu ouvido.
Levo Brie até meu carro, abro a porta para ela, fecho-a e entro do lado do motorista. Tiro o carro da vaga e dirijo em direção ao centro da cidade. As luzes das vitrines são o que mais chamam a atenção nossa e dos pedestres. É tudo como num sonho.
- Acho que estamos perdidos - Brie diz.
- Não, não estamos.
- Como você sabe, Owen? Você mesmo disse que nunca tinha vindo aqui.
- GPS - mostro meu celular para ela.
- E para onde estamos indo?
- Você verá.
Deixo-a na ansiedade. Estamos nos afastando do centro da cidade e indo em direção ao lugar que minha mãe me sussurrou antes. Twin Peaks, o ponto mais alto da cidade com uma ótima vista em qualquer horário.
Nós estamos cada vez mais altos e Brie se encanta com as luzes da cidade. Estaciono o carro no canteiro da estrada e desço. Brie faz o mesmo e se senta no capô do carro.
- Aqui é lindo - ela sussurra.
- Nem se compara com uma pessoa que eu conheço. - E sorrio quando vejo o sorriso em seus lábios.
- Você é muito bobo! - ela empurra meu ombro e eu finjo a falta de equilíbrio. - Owen!
Eu estou tão próximo a ela que não me lembro do mundo ao redor. Brie combina mais com São Francisco do que com qualquer outra cidade que tenhamos passado. Ela é viva e uma brisa de novidades. Não há como ficar entediado com ela por perto.
- O que foi, Owen? Parece que você quer me dizer alguma coisa. - Seus dedos correm pelas minhas bochechas.
- Obrigado por ter aceitado ser a minha parceira nessa viagem.
- Não vou te agradecer pela carona porque já o fiz vezes demais.
Beijo sua bochecha e apenas encosto seus lábios contra os meus.
- Nunca aprendemos a reconhecer um sentimento, nem mesmo na segunda vez que ele surge dentro de nós. Eu já senti isso milhares de vezes durante a minha vida, de formas, motivos e intensidades diferentes. - Tomo pouco espaço para que o que eu preciso dizer seja claro. - Eu te amo, Brie, e não sei como lidar com isso.
Vejo um pouco de surpresa em seus olhos. Então ela parece mais calma e me beija com suas mãos nas minhas bochechas, suas pernas passando pelo meu quadril e mente em outro lugar.
Seguro-a com minhas mãos em suas costas e a deito gentilmente sobre o carro.
Brie me afasta por um minuto e foge dos meus braços. Ela caminha até a beira do morro e olha para mim por sobre o ombro.
- Tente não partir o meu coração no meio dessa confusão. - E ela volta até meus braços. - Eu te amo, Owen, seu idiota.
Rio e percebo como ela está tremendo com o vento frio.
- Podemos voltar aqui amanhã - deslizo minhas mãos pelos braços nus dela.
- É uma boa ideia.
Voltamos para o carro, para a cidade e para o bairro da minha mãe. Ouço um estrondo vindo da parte traseira do veículo quando estaciono em frente a casa. Brie desce do carro e verifica o que aconteceu primeiro do que eu.
- Um pneu estourou - ela diz e eu confiro.
- Muito tempo na estrada. Resolvo isso amanhã, vamos entrar logo.
Assim como a minha mãe me contou da vista do Twin Peaks, ela me falou que a chave reserva está ao lado de um vaso de flor. Pego-a e abro a porta. Brie sobe e quando eu chego ao quarto, ela já está dormindo. Tiro minha roupa e deito ao seu lado.
Espero ter feito a coisa certa contando o que sentia para ela. Ou as coisas podem ir de mal a pior quando acordarmos.
...
One For The Road está de volta! Desculpem-me pelo breve hiatus, eu queria entregar um bom capítulo para vocês. Perdoem alguns errinhos que podem ter passados despercebidos, eu só pensei em postar logo para vocês matarem saudade do Owen e da Brie!
Infelizmente tenho que anunciar que a história está em sua reta final, então aproveitem enquanto podem.
Não se esqueçam de comentar o que acharam e votar!
Gorro Vermelho
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro