26 - Quebradiço
Sonhei que eu estava no século XVI e era a Ana Bolena.
Foi um pesadelo. Um tremendo pesadelo. Um pesadelo de remorso, talvez.
Nele eu ouvia o tio Albert, o rei, dizer na frente de todo o reino e em uma praça pública: "Está sendo executada por adultério à sua vossa alteza real".
Segundos depois, sendo segurada pelos guardas, fui posta de joelhos diante do executor que pegou o machado e caminhou lentamente na minha direção.
Então, Rosana aparecia vestida de rainha vermelha gritando "Corte-lhe a cabeça".
Para meu contentamento, eu acordei depois de provavelmente ter sido decapitada.
Agora, deitada na minha cama, sinto que algo está ferradamente estragado dentro de mim. Apodrecendo. E, ecoa, o tempo todo.
Descobri a maneira perfeita de me livrar do noivado e aparentemente não posso fazê-lo sem comprometer o Jack, a imprensa e o tio Albert soltariam os cachorros em cima dele. A intenção não é essa.
Ao mesmo tempo, descobri que a minha melhor amiga não confia em mim tanto quanto eu confio nela. Parando para pensar agora, muita coisa na nossa amizade pode não ser reciproco. Até o idiota do Dylan sabia e eu não.
— Mas vocês são melhores amigas! — Emma diz, deitada do lado direito da minha cama.
Emma me viu descer enfurecida as escadas da casa da Harp, me acompanhou na volta e veio dormir aqui.
— É, e amigas não mentem umas pras outras. — Viro o meu corpo para encará-la, arrumando a minha cabeça no travesseiro.
— Não dá pra aplicar isso a tudo. — Emma faz o mesmo. — Oito ou o oitenta. A situação é complicada.
— Não, não é. Eu não me importo se ela se relaciona com meninas, nem se é com a Megan... A questão não é a Megan ser a minha irmã postiça, é que ela mentiu pra mim! — Digo me levantando da cama. — Fiquei que nem uma idiota tentando entender o que estava acontecendo. — Ando para a esquerda. — Até perguntei para a Sra. Piper ela sabia de alguma coisa! — Ando para a direita. — Ontem, eu beijei o Jack e tudo o que eu queria fazer primeiro era contar pra ela! E, ela não confiou o suficiente em mim para me contar que anda beijando a Megan por aí!
Emma ergue a cabeça e se senta na cama, arregalando os olhos.
— Vo-você e o Jack.... — Ela pergunta com a boca entreaberta. — Quando?
Lembrar disso é me sentir ainda mais esquisita.
Às vezes é muito mais fácil não sentir nada na maioria do tempo, ou sentir raiva, estou mais familiarizada com esse sentimento.
— No gazebo da casa dela. — Conto com a respiração pesada, descansando as minhas mãos na cintura.
— Meu Deus. — Emma sorri subitamente, encarando o lençol da minha cama. — Isso é... Quem diria? — Leva os olhos até o meu rosto.
Dou de ombros. Também não sei explicar e é difícil de explicar nesse momento.
— Acho que nem vou para o colégio hoje. — Aviso andando até o meu banheiro.
— Eu dormi aqui para certificar que você vai sim! — Escuto Emma se levantar da cama também e me seguir. — A Lenna até já chamou a gente para tomar café. — Ela para na porta do banheiro.
Pego o creme dental, coloco um pouco na escova e começo a escovar os meus dentes.
— E, se você faltar comigo? — Pergunto, com os olhos fixos no meu reflexo no espelho.
Estou descabelada, com o lápis de olho borrado e pareço não dormir direito há um ano.
— Temos um teste de biologia! — Emma insiste me recordando. — E, a Felicity, minha madrasta, diz que quanto mais você foge dos problemas, mais deles irão até você.
— Então eu devo estar fugindo dos meus a vida inteira. — Resmoneio cuspindo na pia, e lavando a minha boca. — Sua madrasta pelo menos parece legal.
— Ela está bem deprimida desde a morte do meu pai. — Emma diz e eu levo o meu olhar até a entrada do banheiro, onde ela ainda está. — Não arrumou emprego desde que nos mudamos pra cá e passa o dia inteiro deitada e comendo besteira.
— Se ela não está trabalhando, como vocês...
— O seguro de vida. — Ela esclarece. — Tem dado conta das despesas.
Assinto devagar, enquanto ela sorri de maneira leve, tomando o caminho de volta para o meu quarto.
— Emma? — A chamo e ela retorna, me olhando confusa e esperando eu dizer alguma coisa.
— Lembra quando a gente se conheceu? — Pergunto e ela faz que sim. — E, eu caí no chão e depois... Bom... Você sabe... — Reviro os meus olhos e ela continua assentindo. — Eu não quis... Quero dizer eu quis e fiz, mas... Eu não quis... — Respiro fundo. Merda, isso está ficando ridículo. Eu estou sendo ridícula. — Acho que a verdade é que eu hoje, não iria querer fazer aquilo. — Ajeito minhas palavras da melhor maneira que consigo, mesmo que não tenha saído, sequer soado tão bem quanto eu queria.
— Tá tudo bem, Isla. — Emma curva seus lábios. — Eu fico feliz em ouvir isso. — Seu olhar se ilumina, enquanto o sorriso cresce no seu rosto.
Emma insistiu um pouco mais e eu criei coragem para me arrumar para ir ao colégio.
Só não pensei muito na hora de descer para tomar o café da manhã na mesa, pois eu costumo me sentar de frente para a Megan e não estou querendo muito papo. Não mesmo.
Desvio o olhar sempre que posso para o bule de chá ou para o refletir da prataria bem polida.
Rosana nem está aqui, não há nada que me force tomar o café da manhã na mesa como se fossemos a família do comercial de margarina.
Contudo, antes de eu pensar em me levantar, a raposa que ontem beijava a minha melhor amiga resolve abrir a boca para falar.
— Eu sei que não quer falar comigo. — Megan diz, com uma certa indiferença, passando geleia no seu pão. — Mas a Clarice ligou.
Meus olhos vão até a Emma, quem está num lugar posto pela Lenna, onde a vovó costuma sentar.
Não me movo nos primeiros segundos. Apenas pisco incontáveis vezes antes de encarar a ruiva.
— Ligou? — Questiono, com a garganta um pouco seca.
Eu devia saber que beber tanto vinho de amora não ia ser uma boa ideia. Só que eu nunca opto por boas ideias de qualquer forma, então...
— A Lenna atendeu e passou o telefone pra mim — Explica, falando baixo. — Ela acha que é a mamãe que quer falar com ela. — Ainda bem que a Rosana não está em casa. — E deixou o endereço de onde está hospedada, fica no leste da cidade. — Morde um pedaço da sua torrada.
— E, onde tá o endereço? — Arqueio o olhar.
— Eu vou. — Afirma e de imediato eu já nego com a cabeça, mas ela prossegue: — Se não fosse por mim, você não teria encontrado, então sim, eu vou. E, precisa ser hoje, a mamãe vai chegar de viagem pela noite.
— Só pode estar de brincadeira comigo! — Resmungo, desviando a atenção para os detalhes pintados nas porcelanas.
— No mais, Clarice acha que vai falar com a filha da Rosana. — Megan continua. — E é com quem ela vai falar.
Não acho que isso vá funcionar, nada tem funcionado de fato.
— E, você? — Pergunto a Maya, quem não disse nada até agora.
— Eu vou ficar fora disso. — Ela ergue as mãos em redenção. — Quero sobreviver até a formatura.
— Vocês estão atrasadas! — Fred diz se aproximando da mesa e pegando uma maçã da bandeja.
— Você também. — Megan replica. — Perdeu hora?
— Perdi. — Ele responde dando de ombros. — Mas não porque fiquei bebendo.
Megan joga um pedaço de torrada no garoto que desvia e sai do cômodo deixando escapar outro palavrão.
Eu estou sendo uma imbecil. Uma covarde.
Estou evitando encontrar com Jack Ahren pelo colégio o dia inteiro.
Mais especificamente com ele e com a Harper, enquanto me escondo na biblioteca, adiando o inevitável.
Não quero falar com a Harp agora. Capaz de eu ser uma estúpida incontrolável para variar.
Ainda não sei como conseguiu esconder algo tão importante de mim. No lugar dela eu não daria conta, e sem ela eu não dou conta.
Sinto isso na pele, afinal, não consegui conversar com ela sobre o Jack e geralmente, é a Harper quem me ajuda a entender como eu estou me sentindo.
Agora, tudo está uma bagunça sem volta. Parece que eu entrei no mar e estou longe demais da costa para voltar. É nadar ou morrer.
Prometi ao Dylan que o ajudaria com literatura alguns minutos antes da prova.
É outro motivo para eu ainda estar enfiada na biblioteca, fuçando nas prateleiras e esperando eles aparecerem.
— Está me evitando? — A voz do Jack me faz derrubar um livro sem querer.
Giro o meu corpo para olhar o rapaz, que surgiu entre as estantes.
Ele me cumprimenta com um sorriso gentil, agachando para pegar o livro que eu derrubei e o colocando na minha mão em seguida.
— Precisamos conversar sobre o que aconteceu. — Murmura, e por muito pouco eu não derrubo o livro outra vez.
Olhar para ele é lembrar o quão perto estávamos um do outro na noite anterior.
Da boca macia colada na minha. De como as suas mãos me seguravam.
Desperta a porcaria das borboletas na barriga, e eu não sei lidar com isso, não posso.
Se não pode encarar a conversa, se faça de desentendida.
— Precisamos? — Meu tom sai em puro cinismo e ele nota, é claro que sim. Por isso ele suspira bem fundo.
— Isla, por que me beijou? — Dispara certeiro. De uma vez.
Merda. O puxo pela gravata do uniforme e o empurro para detrás da estante, longe do campo de visão dos alunos, mas sendo seguida pelos guardas.
— Fala baixo! Eu tenho um noivo!
— Você nem conhece ele. — Jack argumenta abaixando seu tom de voz.
Ele está certo. Não conheço mesmo.
Engulo em seco e afasto a minha mão da gravata dele.
— Isso não vem ao caso. — Retruco, relaxando os meus ombros. — Se as pessoas souberem disso eu vou ser massacrada pela mídia!
Aponto para eu e ele várias vezes ao falar "disso".
— "Disso"? — Questiona, erguendo as sobrancelhas.
Por que ele começou a bancar desentendido?
— Para todo mundo no reino, Isla Grant está noiva da sua vossa alteza real desaparecida! — Ainda estou sussurrando. — Os jornalistas iriam adorar uma matéria sobre a minha infidelidade suposta. Isso iria acabar comigo, e tudo bem, tenho guardas que vão evitar socos na minha fuça futuramente, mas e você? É o que você quer?
Jack enche os pulmões de ar quando fecha os olhos. Deve estar pensando no que eu acabei de falar, e que receber socos pode não ser a melhor coisa do mundo.
— Não. — Responde, abrindo os olhos e umedecendo os lábios. — Claro que não. Então, essa é a questão, a mídia?
Rosana, tio Albert, o meu futuro, no geral.
— É... — Sacudo a cabeça tentando pôr os pensamentos em ordem. — Quero dizer, também. Eu tenho um noivo, isso é um fato.
E se souberem que eu andei me atracando com você iremos ser decapitados. Pelo século, não no sentido literal.
Jack assente devagar sem quebrar o contar o visual. Ele ainda espera saber de alguma coisa. Eu sei.
— O que eu quero saber é porquê você me beijou e eu peço sinceridade. — Insiste na pergunta de alguns minutos atrás.
— Você me beijou de volta!
Ele junta as sobrancelhas.
— Sim, beijei, mas eu perguntei primeiro. — Rebate sem demorar. — Vamos lá, Isla... Eu quero sinceridade.
— Está pedindo sinceridade para a pessoa errada.
— Por quê? Sempre foi muito franca comigo. Até demais. — Seus olhos rolam.
Repito, sem a Harper, é difícil organizar os meus sentimentos em pensamentos, e está tudo tão caótico. Eu não sei o que devo dizer e se devo dizer alguma coisa. Não sou boa nessas coisas, nem um pouco.
— Talvez... — Dou uma ênfase pungente nessa palavra. — Eu goste de você. — Murmuro com os olhos fixos no rapaz, observando cuidadosamente a sua reação. — É tipo uma queda, Jack. — Isso é tão difícil de dizer. Complicado.
É tão mais fácil ofendê-lo e detestá-lo.
Jack permanece intacto nos primeiros segundos.
— Uau. — Diz em um riso tímido. — Isso foi direto. Pensei que iria enrolar por mais algum tempo.
— Eu não tenho paciência pra isso. — Replico observando o sorriso dele aumentar e diminuir algumas vezes.
— Eu notei.
— Posso até estar afim de você, mas é só isso.
— Só? — Torna a arquear o olhar.
— É. Só isso. Não espere que eu vá suspirar aos quatro ventos por você. Ou, ficar grudada no seu pescoço, escrevendo o seu nome da capa do meu caderno. Você beijou "Isla Grant" e deve ser por isso que esse sorrisinho irritante não sai do seu rosto. — Eu aponto para o sorriso no rosto dele. — Mas, é só.
— Só?
— Não sabe dizer outra coisa? — Inquiro impaciente, quase pegando o livro na minha mão e batendo na cabeça dele, como bater num rádio velho com o disco aranhado para ver se ele destrava.
— Eu também gosto de você, Isla.
Pareço petrificar.
Eu não sei o que dizer. Sou pega indiscutivelmente despreparada para isso.
— Eu gosto muito de você e essa é a única razão pelo qual esse sorrisinho irritante não sai do meu rosto. — Continua falando, apontando para o próprio sorriso.
Acho que posso beijá-lo outra vez. Aqui e agora.
— Gosta? — A palavra sai junto com o ar que eu prendo e solto sem saber fazer ao certo.
— É, eu gosto. — Seu sorrisinho fica mais largo. — Mesmo depois de você ter estragado algo que deveria ter sido romântico.
Ah. Eu não combino com esse troço de romantismo.
— Eu não esperava que você fosse me dizer isso de volta! — Sussurro exaltada em minha defesa.
— Você é uma das pessoas mais inteligentes que eu conheço, como não reparou?
Jack eleva a sua mão até o meu rosto.
Nessa altura do campeonato eu já nem sei mais o que falar. Apenas vou percebendo meus sentidos entrarem em colisão com apenas um toque dele.
— Eu preciso de algumas horas com você. — Murmura, fazendo os ossos e músculos das minhas pernas parecerem geleia. — Talvez, muitas horas com você. — Sorri em meio a fala. — Mas, entendo que aqui é um lugar complicado para conversar. — Afasta a sua mão do meu rosto e eu acho que posso pegá-la e pôr de volta.
— O que tem em mente? — Cochicho.
Ele encarou os guardas distantes de nós e depois devolve o olhar para mim.
— Pensaremos em algo. — Fala com as pupilas tão dilatadas que os olhos azuis estão quase totalmente pretos.
Antes de se afastar, Jack deposita um beijo demorado sobre a minha mão, sorrindo assim que a soltou.
— Você demorou. — Megan afasta as costas do pilar da entrada, caminhando na direção da porta do carro, estacionado em frente a nossa casa.
Ela pegou um dos carros da garagem. Um dos conversíveis, deve ter algum apego a eles como a vovó.
— A Rosana vai matar você. — Eu falo, mas não que eu ligue. Ela sabe que não.
Estou dizendo isso porque os guardas vão nos seguir. De certo, já devem ter comunicado a Rosana sobre isso, talvez até ao tio Albert.
Não é como se nos importássemos muito.
Afinal, não temos como driblar algo assim, então resolvemos fazer da maneira mais escrachada de todas.
Sob os narizes deles.
Rosana vai nos matar, mas agora duplamente só pelo carro que a filha dela escolheu.
— Vamos, Islazinha. — Megan sorri de maneira forçada.
E, de uma vez por todas decido entrar no carro.
Uma vez eu li que se você quer fazer uma torta de maçã do nada, deve primeiro inventar o universo.
Isso significa que para preparar uma simples torta de maçã desde seu início, seria necessário retroceder anos e anos na criação do mundo, dos céus e da terra, de tudo o que já conhecemos, inclusive a própria existência humana.
Rosana evita falar do passado e disse que eu não devia mexer nele, mas ela também deixou claro que não vai me contar nada. Se eu preciso entender um problema, preciso entender como ele começou e talvez poder ver as coisas como um todo.
Exatamente como montar um quebra-cabeças: tudo pode ser extremamente sugestivo olhando para algumas peças e somente.
E, preciso desacelerar com o tempo e saber usar da minha capacidade neuronal e parar de dar volta em círculos. Porque nem o fantasma e suas pistas soltas tem aparecido ultimamente.
Acho que é o que a Harper me diria.
Não falei com ela o dia todo e isso é tenebroso. Nunca ficamos tanto tempo sem falar uma com a outra. Nós nunca discutimos desse jeito. Brigávamos, mas as discussões eram tão frívolas e bestas, não passávamos mais de duas horas sem conversar.
Não é bom. Não mesmo e nem confortável. Harper está há tanto tempo na minha vida que já se tornou parte de quem eu sou. Parece que está faltando alguma coisa, que eu perdi algum membro do meu corpo.
Só que, eu também estou com raiva dela. Eu realmente não consigo tirar da cabeça que ela não conseguiu confiar em mim.
Será que eu sou uma pessoa tão difícil assim? Ela me conhece, eu nunca, jamais a julgaria. Não há razões para isso.
Boa parte do trajeto eu nem abri a boca para falar com a Megan. Mandei uma mensagem para o Jack, avisando que estava indo falar com a Clarice, acompanhada da ruiva e dos guardas num outro carro nos seguindo.
Também preciso resolver essa situação com o Jack. Só que eu não sei como, o baile é daqui há alguns dias!
— Por que a Harper? — Inquiro de uma vez, olhado para a Megan com as mãos no volante. — Justo a Harper!
Megan junta as sobrancelhas e ri com desdém.
— Não fiquei com ela pra atingir você. — Diz com os olhos na estrada. — O mundo não gira ao seu redor, maninha!
— Eu não estou dizendo que gira.
— Mas está agindo como se fosse!
— Não estou não.
— Não? — Outra risada. — Você nem deixou ela se explicar direito! Aposto que ficou esfregando na cara dela o quanto está se sentindo traída.
Abro a minha boca para rebater, mas não sei o que dizer. Realmente fiz isso, porque eu me senti traída. De fora e nem um pouco confiável.
— Eu fiquei com raiva! — Consigo rebater após um tempo. — Eu jamais esconderia algo assim da minha melhor amiga. Se ela não confiou em mim, pra algo tão importante por que continuar sendo minha amiga?
— Porra, Isla! Você é realmente uma insensível. — Megan soa desacreditada. — Acha que isso é fácil? Uma garota não descobre sentir atração por outra do dia pra noite e se sente tranquila com isso. Não sabendo o quanto isso é um tabu por aí! Ainda mais a família da Harper. A mãe dela é católica devota, esqueceu?
Eu nem pensei nisso.
— Sem mencionar os problemas com o divórcio dos pais. A corte e a elite já inventam muita fofoca por aí. Falam mal da Sra. Piper e até mesmo da mamãe porque elas se divorciaram. O que você acha que vão falar quando souberem que a filha dela também gosta de meninas? — Megan olha para mim de relance. — "É culpa dos pais que se divorciaram e deixaram a menina desamparada" Vão ficar procurando algo para culpar como se fosse algum crime, algo terrível!
Puta merda eu realmente não parei para pensar nisso. Nem passou pela minha cabeça.
A sra. Piper é tudo para a Harper, ela deve estar sentindo que pode decepcionar a mãe de alguma forma.
Não tenho tempo para formular algo e dizer alguma coisa. Megan entra no estacionamento de um prédio bonito e espelhado, com muitos andares.
A ruiva fecha o teto solar e desliga o veículo em seguida.
— Você vai ficar aqui. — Diz tirando o cinto de segurança. — Vou entrar sozinha.
— Como é que é? — Franzo a testa em incompreensão.
— Você me ouviu. — Ela parece tranquila demais. Eu deveria ter medo? — Quero falar com ela sozinha. Você tem um péssimo hábito de ir com muita sede ao pote.
— Eu vim com você pra isso! E se for perigoso?
— Prometi a Clarice que iria ser comigo que ela ia falar, por isso concordou em me dar o endereço. — Ela contrapõe abrindo a porta do carro. — Eu vou entrar com um dos guardas, sem riscos. Se quiser ir depois, por mim tudo bem. Mas, eu vou sozinha. — E, sai do carro. — Fica aqui e não arruma problema! — É tudo o que ela grita antes de se afastar.
Daqui posso ver o Declan saindo do carro da guarda, a seguindo.
Fungo frustrada e solto a porcaria do cinto, batendo as costas no banco do carro.
Por que a Megan concordaria em falar com a Clarice sozinha? E, por que prometeria isso?
Eu deveria ter atendido o telefone. E, assustado a Clarice. Sutileza não é o seu forte, Isla.
Minhas penas mexem frenéticas, meus dedos tamborilam os meus joelhos. Será que vai demorar muito? É uma conversa rápida, não é?
O que a Clarice sabe sobre a Rosana? Será que sabe algo sobre o pai das gêmeas e por isso quis conversar com uma delas? Por que o fantasma me faria ir até a biblioteca e da biblioteca para o lugar onde a minha mãe estudou, assim como aparentemente o defunto do Devon? Por que me faria ir até uma funerária e nos trazendo até aqui?
O que ele quer que eu saiba?
Talvez, Megan tenha razão, talvez seja o pai dela por trás disso tudo.
Será que eu deveria ligar para a Harper? O celular está no bolso da saia do meu vestido. Só preciso de dois movimentos rápidos na tela. Nem vou fazer muito esforço.
Melhor não.
A Megan pontuou tanta coisa, está sendo difícil de digerir. Eu preciso pensar melhor para não estragar tudo.
Eu sou perita nisso. E provavelmente autodestrutiva.
No porta luvas do carro, encontrei um maço de cigarro e um isqueiro de metal rosa. Não sei se é da Megan ou da Rosana. Eu não ligo. Acendo um.
Esse não tem essência nenhuma, mas acho que já nem faço questão do sabor. Se a Rosana me visse agora, ela iria surtar.
Catorze minutos. É o tempo que eu levo até fumá-lo por inteiro e nada da Megan. Será que aconteceu alguma coisa?
Não, se tivesse acontecido iria ocorrer um alvoroço, Declan apareceria. Mas, e se aconteceu algo com ele também?
Ele tem contato de rádio com outros, Arthur e o Harry saberiam. Mas, e se ele não conseguiu entrar em contato?
Será que eu deveria ir até lá? E, se eu piorar tudo mostrando o rostinho que todos conhecem?
Merda, Megan.
Para o meu alivio, eu consigo vê-la sair do prédio inteira, acompanhada do Declan inteiro.
Megan se aproxima, parece ter visto alguma assombração.
A ruiva abre a porta do carro, entra e a fecha com força, apoiando as mãos no volante, com os olhos fixos nele.
Ela respira fundo várias e várias vezes.
— E aí? — Pergunto a garota que não se move.
Seus orbes enchem d'água, o rosto ganha uma tonalidade avermelhada e então ela começa a socar o volante com força.
— Merda! — Ela grita sem parar de esmurrar. — Merda! Merda!
— Para! — Tento segurar as suas mãos, me inclino para frente e passo os meus braços ao redor do corpo da garota, para que ela pare de se debater. — Vai se machucar! Megan! Para!
Leva alguns segundos até ela parar e se render.
A garota parece quebrar, caindo num choro desesperado, apertando os meus braços como se temesse despencar.
— Eu sou filha de um... — Soluça e tenta secar o rosto. — De um abusador. Ele... Ele machucou a minha mãe, Isla.
Eu tô postando todo dia e nunca sei o que comentar no fim.
Aguardo vocês amanhã. Beijocas com pipocas.
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