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Minha paciência

— Não posso crer em meus olhos. — Marcel disse mais indignado do que amedrontado.

— Pensa que sou dessas que desistem fácil? — Honória sorriu largo. Não faria um longo discurso, atiraria logo para não dar chances de fuga. Iniciou uma contagem de trinta segundos em sua mente. — Dou a ti uma última chance, Marcel Desfleurs.

— Preserve um pouco de dignidade, Honória. Quando era solteiro você não conseguiu nada, agora que sou casado, muito menos terá. — O francês bufou impaciente.

— Terei o prazer de ver a infelicidade de sua querida esposa. — A mulher debochou. — Em plena noite de núpcias ficará viuvinha.

— Se vai atirar, faça logo. — Marcel desafiou.

— Como queira...

Honória estava prestes a apertar o gatilho quando um tapa acertou-lhe a lateral da cabeça, em cheio. O golpe foi tão forte que a mulher, tonta, perdeu a coordenação das mãos e deixou a arma cair no chão.

Enquanto Marcel catava a arma, Clementine segurou Honória pelos cabelos, posicionada atrás da mulher.

Mon Dieu, o que temos aqui... Alguém que resolveu me esgotar a pouca paciência que me resta. — Clementine disse com a boca quase colada ao ouvido da mulher. A francesa puxou uma pequena, muito afiada, faca que estava oculta no vestido e a posicionou sobre a artéria do pescoço de Honória.

Clementine procurava por Marcel quando ouviu a voz de Honória vindo do lugar mais óbvio. Sorrateira como um gato, a francesa fez sinal para que Marcel não denunciasse sua presença enquanto pulava a janela e entrava no cômodo. Como sempre, o irmão era muito bom de flerte. Ocultar suas reais emoções era uma arte que tinha desenvolvido por anos e anos. Dessa forma acabaram naquela situação.

— Solte-me vagabunda francesa! — Honória esbravejou.

— Sabe Honorinha... Acho que minha cunhada tem um coração invejável por deixar você viva e livre. — A voz de Clementine anunciava suas intenções funestas. — E meu irmão... Ah! Marcel é piedoso demais, um defeito irremediável desse grande tolo. Já eu, gosto de sangue.

A francesa, com brusquidão, virou Honória e frente para si e acertou nela uma facada no estômago. Com uma técnica invejável, Clementine fez com que a lâmina passasse entre os vãos do espartilho da inimiga. A que antes ameaçava, se contraiu de dor. Clementine puxou a faca e acertou um soco forte na barriga da outra, que caiu ajoelhada.

— Acho que estou um pouco enferrujada, pois não ouvi manifestação vocal de dor. — Clementine limpou a faca nos cabelos de Honória, que ainda se recuperava. — O que devo fazer para ficar ainda mais feliz nessa noite especial?

Clementine olhou para o irmão, que somente ergueu o queixo.

— Marcel, como sempre quase não suja as mãos. — Ela falou e ele sorriu.

— Sabe que sou um anjo, meus inimigos raramente morrem por minha ação. — O francês replicou com tranquilidade.

— Segure-a em pé. — Clementine ordenou.

Marcel obedeceu e, com algum esforço, colocou a outra em pé, a segurando pelos braços, obrigando a mulher a parar de estancar o ferimento em sua barriga. Honória soltou um grunhido de raiva e dor enquanto era forçada a olhar para o rosto de Clementine. A mulher cuspiu no rosto da francesa.

— Que hábito adorável... — Clementine falou enquanto limpava o cuspe de si. — Ajudou-me a decidir por onde começar. Segure aberta a boca dela.

Marcel passou um braço pelo pescoço de Honória, a sufocando até que as pernas fraquejassem e com a mão livre apertou as laterais do rosto da mulher, fazendo com que a boca dela permanecesse aberta.

— Também já me cansei de você, Honória. — O homem falou.

Mesmo que tentasse relutar, a prisioneira não foi capaz de sair do aperto técnico, forte e experiente de Marcel. Clementine, com rapidez, puxou a língua de Honória e cortou. A mulher arregalou os olhos, desesperada ao sentir a dor de perder a língua.

— Estou retirando de você a dádiva da fala porque tu nunca soube fazer bom uso de sua boca. — Clementine disse enquanto guardava o pedaço do língua em um bolso oculto na saia do vestido de Honória. — Leve-a consigo, a mim de nada serve. Guarde como recordação por ter me esgotado a paciência.

O sangue saía da boca de Honória e escorria.

— Acho que estou lisonjeada de algumas de suas últimas palavras terem sido para mim. Por isso estou disposta a deixar você ir, mas antes...

Clementine cortou os tendões de ambos os braços de Honória, fazendo com que a mulher perdesse o movimento das mãos. Dessa maneira ela teria mais dificuldade em se salvar, apesar dessa chance existir.

Marcel soltou Honória, que finalmente chorava.

— Vá, ma chérie. — Clementine falou para Honória. — Seja discreta e cuide para não cair, pois será difícil se levantar.

Como é instinto do ser humano se agarrar à vida, Honória partiu, deixando um rastro de sangue e de amargo fracasso. Desapareceu, arrependida por tentar matar Marcel.

— Clementine... Pensei que a maternidade tivesse amolecido seu coração. — Marcel disse enquanto se alinhava.

— E está certo afinal, ela saiu com vida. — Clementine sorriu. — Agora vá e procure Ofélia. Essa maldita Honória me fez perder Sorte apostando uma disputa de quem bebia mais cachaça.

— Ela está amamentando ainda... Não será perigoso? — Marcel falou surpreso.

— Aquela doidivanas disse que guardou leite ou algo do gênero, parece que veio preparada para festejar... Vamos! Os próximos da fila eram Ofélia e Julião. — Clementine apressou ao irmão que sorria.

As horas seguintes prometiam ser animadas.

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