capítulo 6 - Medo do desconhecido
Cada suspiro que você der
Cada movimento que você fizer
Cada laço que você quebrar
Cada passo que você pisar
Eu estarei te observando
Todo santo dia
Cada palavra que você disser
Cada jogo que você jogar
Cada noite que você ficar
Eu estarei te observando
(Every Breath You Take - The Police)
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You é um livro de autoria da escritora americana Caroline Kepnes, que narra, sob o ponto de vista do protagonista Joe Goldberg, a história de uma paixão obsessiva, somada a uma grande dose de psicopatia.
Tudo se inicia no exato momento em que Joe vê Guinevere Beck pela primeira vez, entrando na livraria em que ele trabalha. Ele acredita que todos os seus movimentos, gestos e conversas, trocados com ele, foram uma maneira de Beck o paquerar e que ela o queria tanto quanto ele. O livro gira em torno dessa obsessão e do que Joe é capaz de fazer para manter Beck ao seu lado.
A história não tem nada haver com amor a primeira vista e só denota uma falta de visão aos fatos narrados pela escritora, no ponto de vista de quem me enviou essa caixa.
É horrendo pensar no fato de que alguém por aí pode estar tendo esse tipo de sentimento comigo, mas isso claramente é uma brincadeira de mau gosto de Scott ou até mesmo de Emma. Eles eram os únicos que sabiam sobre a jóia.
"Obrigada, Netflix!"
Quando um livro é apenas um livro, as pessoas não ligam muito para ele, por mais que seja um Best Seller, mas quando essa história vira uma série cheia de atores famosos e bonitos, a coisa muda de figura. Essa geração Y, como o próprio Joe adora mencionar, precisa muito de ajuda.
A nossa amada rede de streaming podia muito bem ter despertado a loucura de algum maníaco próximo a mim, quando resolveu transformar You nesse sucesso. Como se a América já não estivesse abarrotada de serial killers, sendo até difícil mensurar. Mas não, isso só pode ser uma brincadeira de mau gosto.
Peguei a caixa, levei até a cozinha e esperei Lizzie para que pudéssemos dar início a nossa sessão de cinema. Enquanto assistia Emma Watson se destacando brilhantemente como Bela e ouvia minha filha cantarolando em uníssono todas as canções do filme, minha mente estava estagnada em decorrência daquele inesperado "presente".
🍂🍂🍂
No dia seguinte, não tive a oportunidade de falar com Scott e tirar a dúvida que me consumia desde a noite passada, já que o mesmo não deu as caras no escritório durante todo o expediente. Seria ele capaz de uma brincadeira tão insensível como aquela?
Contei à Emma sobre o convite de Anthony, mas não mencionei nada sobre a caixa misteriosa. Minha irmã gostava de pregar peças, mas era uma péssima mentirosa quando se tratava de estar cara à cara com seu alvo. Ela poderia mentir pelo telefone, mas não conseguiria esconder o riso diante de mim. Aliás, Emma também tem algo para contar, espero que não sejam notícias ruins.
Lizzie não estava no melhor de seus dias, muito por conta da falta que sentia do pai. Não posso negar, entre muitos defeitos que Tyler possui, negligenciar a filha não é um deles. Ele sempre foi um ótimo pai e mesmo com as viagens que sua profissão lhe exige, ele não abdica de estar próximo a ela sempre que possível.
A falta que ela sente dele, nesses períodos distantes, acaba influenciando na forma dela agir com os colegas e professores. Ela se retrai e constrói um muro ao redor de si mesma, que somente Tyler sabe como destruir. Sempre me disseram que meninas são mais apegadas ao pai e sei disso por experiência própria, já que sou muito próxima ao meu, mas Lizzie vê Tyler como um herói, o que sabemos bem que ele não é.
Pensei em cancelar o jantar e cuidar de minha pequena, afinal de contas, ela estava precisando de mim e Anthony, uma hora ou outra, saberia que nada me é mais importante, do que Lizzie. Devo confessar que também tinha um certo receio de que Lizzie acabasse por não gostar de ter outro homem em nossas vidas, por esse mesmo motivo, sempre me privei de relacionamentos afetivos.
Sei que é apenas um jantar entre duas pessoas adultas, na intenção de se conhecerem melhor. Nada além disso. Mas se isso vier a dar em algo mais sério, Lizzie será o parâmetro para que eu decida prosseguir, ou por um ponto final em tudo.
Disse a ela que sairia com um amigo, mas que se ela preferisse, cancelaria e passaríamos o restante da noite juntas, como sempre fazíamos, mas mais uma vez, a maturidade dela me surpreendeu.
- Pode ir, mamãe - tocou meu rosto com carinho - Tia Emma e eu vamos brincar com o Polar.
- E eu posso saber quem é Polar? - isso era novidade para mim.
- O gatinho que a titia adotou - sorriu entusiasmada - Ela prometeu trazer pra que eu veja.
- Que bom, querida!
Lizzie sempre gostou de animais. Tyler mentia para ela, dizendo ser alérgico, mas na verdade, como eu já disse anteriormente, ele os abomina. Será difícil escolher qual bichinho dar à ela, mas confesso que gosto muito de gatos.
Apesar do que as pessoas pensam sobre eles, os felinos não são animais egoístas e sem sentimentos, pelo contrário, têm sua própria e peculiar maneira de demonstrar afeto. Ao invés de pularem, balançando o rabo e nos seguindo para todo o lado, como um cachorro, por exemplo, os gatos corroboram seu carinho por nós em pequenos detalhes que podem passar despercebidos, como um ronronar quando próximo da gente, pequenas lambidas e mordidinhas são a forma dele dizer que nos ama. São parecidos com os humanos, independentes e silenciosos.
A campainha tocou e Lizzie correu atender, ansiosa para ver seu mais novo amiguinho. Emma adentrou, segurando uma bolinha de pelos brancos e olhos azuis, que se prendia a roupa dela feito um daqueles bonecos agarradinhos que tínhamos quando criança. Polar era realmente uma fofura.
Minha filha pediu para segurá-lo e logo a perdemos de vista, indo para seu quarto de posse do gato. Acho que, por fim, fiz minha escolha quanto ao presente de Natal perfeito. Agora só preciso achar um bichano tão fofo quanto.
- Obrigada pelo presentinho, irmã. Não achei a menor graça - disse, assim que ficamos à sós.
- Do que você está falando? - Emma franziu o cenho - Polar é meu, só trouxe por que Lizzie insistiu.
- Não é do gato que estou falando. Me refiro ao presente que me enviou ontem. A caixa, Emma!
- Mas do que é que você está falando, sua maluca? - ela não parecia ciente do fato que eu lhe expunha.
"Não foi ela!" Pensei.
Fui até a cozinha e trouxe o embrulho para que ela visse com os próprios olhos à quê eu me referia. A caixa estava como eu havia deixado na noite anterior e me arrepiei ao tocá-la novamente.
- Isso é bizarro, Sarah! - ela empalideceu - Você deveria tomar cuidado. Deus sabe o tanto de malucos que existem por aí à fora.
Engoli nervoso, mas não quis demonstrar medo - Se não foi você, isso só pode ser coisa do Scott. Ele estava muito bonzinho pro meu gosto, me dando jóias, folga em plena segunda-feira...
- Sarah, o Scott me ligou ontem à noite - me encarou seriamente - Era sobre isso que eu queria conversar com você. Ele quer te chamar para sair, jantar, sei lá. Está tentando te reconquistar, duvido muito que faria esse tipo de brincadeira.
Fiquei ainda mais exasperada com o que Emma me relatava. Se aquilo não havia partido de Scott, então quem estaria se dispondo a me aterrorizar daquela maneira?
- Preciso me arrumar. Logo Anthony deve chegar e eu estou aqui, de hobby e chinelos - mudei de assunto para não alarmá-la, mas sentia como se um soco ouvesse atingido meu estômago. Aquela situação era mesmo real, eu tinha um stalker.
- Aposto que ele não iria se importar nenhum pouco de te ver vestida assim - zombou ela - E baseada no que você me contou sobre a noite que passaram juntos, acho que ele até preferiria.
Ri. Dei de ombros e subi as escadas à passos largos. Emma veio logo atrás de mim, mas dispersou-se, indo até o quarto de Lizzie.
Tomei um banho, vesti uma bela lingerie rosada, um tanto quanto delicada, mas que caía muito bem em meu corpo, por cima um vestido branco decotado e que deixavam minhas pernas à mostra. Calcei sandália altas de mesma cor e completei o look com jóias douradas, incluindo o bracelete que fora presente de Scott. O conhecendo como conheço, diria que ele ficaria uma fera se soubesse que o estou usando para sair com outro que não ele.
Deixei meus cabelos soltos e fiz uma leve maquiagem com tons claros e harmônicos.
Fui até o quarto de Lizzie me despedir, para esperar por Anthony no andar de baixo.
Precisamente às oito horas da noite ouvi o tilintar da porta e mal pude crer em sua pontualidade. Desci as escadas o mais depressa que pude, para não dar tempo de Emma convidá-lo a entrar. Não queria que ela o assustasse com sua impolidez exacerbada.
Ao abrir a porta, me deparei com aquele sorriso genuíno, emoldurado por barba e cabelo impecáveis. Estava plenamente lindo, vestindo um terno preto, camisa branca e gravata azul marinho. Céus, quem usa terno em um primeiro encontro? Só posso dizer que ele estava maravilhoso e que as rosas que trazia consigo me deixaram ainda mais deslumbrada.
- Lhe trouxe isso pra agradecer que tenha aceito meu convite - aquela voz rouca e sedutora neutralizava qualquer de minhas ações.
- Obrigada! - balbuciei com dificuldade - Vou pôr na água. Espere aqui!
Voltei para dentro, com o coração acelerado e as mãos suadas por conta da ansiedade.
Emma olhou-me interrogativa - Pensei que já tivesse ido. Que flores lindas, são do tal Anthony?
- E de quem mais seriam, Emma? - arqueei a sobrancelha - Só voltei para colocá-las na água.
- Deixa que eu faço isso.
Entreguei as flores à ela e segui de volta até a porta, mas não sem antes ouvir a voz de minha irmã proferindo um "Pega ele, mana!" Antes que eu saísse novamente.
Fiquei aliviada por ela não ter dado às caras e tentado falar com Anthony.
- Vamos? - indaguei, assim que saí - Não quero que tenha o desprazer de conhecer minha irmã mais nova.
- Mas por quê? - quis saber - Acha que não nos daríamos bem?
Fechei a porta atrás de nós e a tranquei com chave, pensando em meu possível stalker - Não é isso. Emma sabe ser bem inoportuna e na melhor das hipóteses, ela te contaria coisas sobre minha vida pessoal, que eu mesma não seria capaz de revelar assim tão depressa.
Ele abriu a porta do veículo para que eu adentrasse - Você disse na melhor das hipóteses. O que seria a pior?
- Você se apaixonar por ela! - falei sem nem pensar.
Anthony deu a volta e também entrou, puxando o cinto e ajeitando-se na direção - Isso não seria possível, Sarah!
Pus o cinto e o encarei curiosa - Ora, porquê?
- Porque gosto de você - ele girou a chave na ignição e deixamos minha casa para trás - Sabe, você pode achar que sou louco, mas desde a noite que passamos juntos, não consigo parar de pensar em você.
Suas palavras soavam sinceras e me deixavam completamente aturdida. Era bem verdade que meus pensamentos também eram todos dele, desde quando nos conhecemos, mas não poderia imaginar que a mesma coisa acontecia com ele.
- Por favor, diga alguma coisa. Está me deixando acanhado - ele passou os dedos entre os cabelos louros e eu quase pude notar uma nota de desapontamento em seu semblante.
Toquei sua perna com a palma de minha mão, tentando confortá-lo - Desculpa! É que você me pegou de surpresa, mas o mesmo acontece comigo. Fiquei abalada por pensar que não veria você novamente.
Anthony mantinha as mãos firmes no volante e eu não conseguia tirar os olhos dele.
- Porque pensou isso? Eu disse que ligaria.
Baixei o olhar, envergonhada por ter que confessar que não lembrava de nada que ocorrera após a nossa bebedeira desenfreada.
- Você não lembra. Não é, Sarah? - olhou-me afetuosamente - Não precisa ficar constrangida. Você bebeu demais, é normal ter lapsos de memória.
Mexi no cabelo e examinei a paisagem pela janela do carro, tentando não mirá-lo nos olhos. Era inútil, pois podia sentir a destreza daquele olhar azulado me fitando por cima dos ombros.
Suspirei - Não lembro de nada, Anthony. Só me recordo de beber aquele vinho na sacada, ao seu lado, o resto parece ter se dissipado de minha mente.
- Não aconteceu muito mais do que isso - confidenciou-me - Nós bebemos, eu pedi que passasse a noite comigo, você disse que precisava ir, me deu seu telefone e o endereço de sua casa e eu a levei de volta.
- Só isso? - eu imaginava ter perdido muito mais.
Ele maneou a cabeça positivamente, mas sem me olhar nos olhos e estacionou o carro em frente a um dos restaurantes mais caros e chiques de Salt Lake Tahoe - Chegamos! - anunciou - Espero que goste de comida tailandesa.
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