Capítulo 13 - A morte é uma piada
Lá vai meu herói
Observe-o enquanto ele se vai
Lá vai meu herói
Ele é comum
...
O melhor deles não sangra?
Enquanto o resto desaparece
Verdade ou consequência, fale em voz alta
Use aquela evidência, saia correndo
(My Hero - Foo Fighters)
🍂
Fiquei alguns segundos parada em frente a porta, analisando e tentando compreender o que "mato e morro por você" realmente significava. Se interpretá-la figurativamente já fez com que os pelos de meu braço eriçassem, imaginem o que sinto ao pensar que isso pode ter um sentido bem mais literal.
Voltei para meu refúgio, já não tão seguro quanto eu imaginava, carregando comigo a flor negra e o bilhete rabiscado por meu perseguidor. Meu coração acelerado e as pernas fracas quase me fizeram desabar alí mesmo. Usando as últimas forças que me sobravam, passei a chave na porta e sacando o celular, consegui enviar um pedido de socorro à Anthony:
"Preciso de você. Por favor, venha o mais rápido que puder!"
Sua resposta veio rápida e doce para o alívio de meu coração assustado - "Já estou chegando!"
Poucos minutos mais tarde, a campainha tocou novamente. Dei uma espiada pelo olho mágico e vislumbrei o rosto que tanto queria ver. Anthony adentrou minha casa, abraçando-me calorosamente e afagando meus cabelos, tentando conter o choro que se manifestava em mim.
Ele estava suado, um pouco ofegante, com as roupas amassadas e sujas de terra. A gravata que costumava usar no trabalho parecia manchada com alguma coisa de coloração avermelhada e no canto inferior direito de seus lábios havia um corte, indicando uma pequena lesão.
- Shi, shii... - ele segurou meu rosto entre as mãos e com os polegares, enxugou as lágrimas que escorria para fora de meus olhos - Acalme-se, Sarah. Estou aqui com você!
Fechamos a porta e nos acomodamos lado à lado no sofá - O que houve com você? Porque está sujo e desgrenhado desse jeito?
- Fomos chamados para efetivar a prisão de um homem suspeito de matar a esposa - explicou ele - O sujeito reagiu e entramos em luta corporal. Estava em meio a ação, quando recebi sua mensagem. Agora quer me contar o que te deixou tão assustada?
Indiquei a flor e o bilhete sobre o móvel a nossa frente e Anthony imediatamente o tomou, lendo o mesmo apenas para si - Sarah, isso é muito grave - disse, abraçando-me novamente - Seja lá quem for esse homem, está claro que não é apenas uma paixão platônica e inocente, ele pode ser perigoso.
- E o que eu devo fazer? - o desespero me tomava cada vez mais - Eu estou apavorada, Anthony!
- Calma! - seus dedos tocaram meu rosto, impacientes por não serem capazes de frear meu pranto - Ficarei aqui com você e Lizzie, pelo tempo que precisar. Assim vocês ficarão seguras, até que o departamento responsável por esse tipo de crime solucione o problema. Ok?
- Lizzie! Oh, meu Deus... - lembrei de que havíamos combinado de assistir algo após o banho, mas minha filha não havia descido desde então - Como pude esquecer dela. Será que...
- Mamãe, podemos pedir uma pizza? - fui interrompida pela voz pueril de Lizzie - Tio Anthony!!! - exclamou ela, descendo as escadas e disparando em nossa direção.
- Oi, princesa! - cumprimentou ele, pegando-a em seus braços.
- Podemos comer uma pizza? - indagou Lizzie novamente.
Sorri ao ver seu rosto iluminado pelo presença dele - Claro! Mas o tio Anthony precisa tomar um banho primeiro - zombei.
Ele lançou-me um olhar brincalhão, soltando Lizzie ao chão - Está me chamando de sujismundo?
- Sua imagem fala por si só, meu querido!
Rimos juntos e Anthony foi até seu carro, em busca de algo que pudesse vestir após o banho, voltando com uma calça de moletom e uma camiseta branca lisa. Segundo ele são roupas que gosta de carregar consigo, caso queira se exercitar antes do trabalho.
Com Anthony já de banho tomado e com o pedido de Lizzie atendido, nos sentamos todos juntos diante da televisão. Assistimos todos os filmes favoritos de minha filha e pude notar que Anthony se divertia na mesma proporção que ela.
Quem imaginaria encontrar um homem assim? Sei que é cedo pra eu ter me entregado à ele dessa forma tão intensa, mas o amor é assim, acontece quando menos se espera, seja ele movido por uma forte atração, um arrebatamento instantâneo ou por coisas intangíveis que você nem ao menos tem o poder de controlar.
Pus Lizzie na cama e voltei para sala. Bebemos algumas taças de vinho e rimos de coisas casuais. Minha apreensão do início da noite, pelo bilhete e tudo que o envolvia quase deixaram meus pensamentos por completo, exceto pelo teor da frase cheia de interpretações distintas.
- Como se sente, Sarah? - indagou ele, apoiando o cotovelo sobre o encosto do sofá e analisando cuidadosamente meu semblante que voltava a ser de angústia e apreensão.
Sorri sem humor - Com sua presença fico mais tranquila, mas essa sensação de impotência me desestabiliza emocionante. Entende?
Sarah, eu prometo que farei tudo que estiver ao meu alcance pra protegê-la - inclinou seu corpo à frente e depositou um beijo sobre minha testa - Agora você precisa descansar. Suba e tente dormir um pouco, eu me ajeito aqui mesmo.
- Dorme comigo? - aquilo não era apenas um pedido, era quase uma súplica.
- Pensei que não quisesse que Lizzie me visse por aqui, com tanta intimidade.
Me aproximei ainda mais, tocando sua perna sutilmente - Por favor, preciso sentir que está perto.
Ele assentiu e um sorriso terno brotou em seus lábios - Tudo bem. Vamos subir!
Aquilo podia ser um erro, mas Anthony não era um suspeito. Não consigo explicar, mas a forma com que ele age, seu jeito prestativo e todo o cuidado que tens comigo, por mais questionável que seja para alguns, para mim é real, para mim é genuíno e não desperdiçarei a chance de ser feliz de novo.
Deitamos juntos em minha cama e Anthony me puxou para seu peito. Me aninhei como um filhote indefeso procurando por proteção e ele, sentindo o quanto eu precisava daquilo, me trouxe para mais perto - Tudo ficará bem, linda. Você e Lizzie transformaram minha vida nebulosa em algo multicolorido. Não vou deixar ninguém machucá-las.
Dormimos abraçados, entrelaçados um ao outro. Não transamos, não tivemos nenhum tipo de atitude erótica um para com o outro, foi apenas carinho, afago e proteção.
Na manhã seguinte tomamos café juntos e Anthony fez questão de prepará-lo. Fez panquecas com chocolate para Lizzie e ovos com bacon para nós dois, tudo acompanhado pelo seu tradicional café com creme. Digo isso apenas repetindo suas próprias palavras.
Como meu carro havia ficado no estacionamento do prédio de Anthony, Lizzie e eu o acompanhamos até lá. Peguei meu veículo e nos despedimos rapidamente com um afetuoso beijo. Ao se afastar da janela de meu carro, Anthony debruçou-se ao lado da de Lizzie, beijou-lhe o rosto e prometeu que iria nos ver à noite.
Deixei minha pequena na escola e me dirigi ao escritório. Precisava conversar com Scott e enteder o que de fato estava acontecendo com Tyler e qual era o real direito dele sobre Lizzie. Por mais que o stalker me assustasse, meu ex marido era o obstáculo à ser vencido primeiro.
Assim que adentrei meu local de trabalho, meus amigos vieram até mim. Contei à eles apenas o essencial, não queria ter de ouvir sobre as desconfianças de Henry sobre Anthony , então não mencionei a rosa com o bilhete sinistro e nem a briga que teve com Tyler, apenas lhes disse que havia aceito o pedido de namoro. Hannah fez milhares de perguntas sobre sobre nosso passeio e como Lizzie havia reagido quando soube de nosso namoro.
Sorri e respondi a todas, mesmo visivelmente incomodada com a situação. Não me levem a mal, Hannah é uma ótima amiga, assim como Henry, mas quando se trata de meus sentimentos, prefiro mantê-los guardados apenas para mim mesma.
Scott não deu as caras durante a manhã e eu ficava cada vez mais impaciente com aquela situação. Por volta das 11h, percebi que meu celular vibrava com insistência e não pude mais ignorá-lo, podia ser da escola de Lizzie, ou até mesmo meus pais com algum problema.
No mesmo instante em que eu avaliava se atenderia ou não, meu chefe adentrou o escritório, cumprimentando brevemente a todos que por ali estavam e trancando-se em sua sala.
Olhei o visor e o nome de Emma piscava junto à sua foto na tela do aparelho. Não era comum receber ligações de minha irmã durante o expediente de trabalho, ela sempre optava pelas mensagens, sabendo o quanto Scott odiava ver seus funcionários pendurados ao telefone particular.
- Emma? - atendi.
- Pela sua calma, acho que ainda não sabe o que aconteceu. Não é?
Meu corpo estremeceu, o coração palpitava prevendo uma notícia a qual não estava preparada para receber - Do que você está falando?
Ela suspirou pesadamente - É o Tyler. Ele foi assassinado.
Deixei o celular escorregar pelos meus dedos e tentei me erguer da cadeira, mas depois de alguns poucos passos, senti meu corpo pesar, minhas pernas fraquejaram e a visão ficou turva. Caí ao chão sem que ninguém pudesse ter o reflexo de me amparar.
Despertei no sofá que ficava na sala de Scott, todos me avaliavam com cuidado, provavelmente curiosos em saber o motivo de meu desmaio. Levantei-me tendo os braços de King envolvendo minha cintura, afim de me segurar, caso minhas pernas viessem a falhar novamente.
Ele pediu que todos se retirasse e eu ainda em choque com a notícia dada por Emma, não esbocei nenhuma reação.
O que eu diria à minha filha? Como explicar para um criança de apenas cinco anos de idade que seu pai não vai mais voltar e pior, que alguém tirou a vida do mesmo? Naquele instante minha mente viajou até minha casa, até o bilhete do stalker que agora repousava sobre a mesinha de centro na sala.
- Eu sinto muito, Sarah - Scott quebrou o silêncio desconfortável que prevalecia entre nós - Não por ele, nem por você que tenho certeza que ficará melhor sem aquele desgraçado te pressionando, mas por Lizzie. Nenhuma criança merece passar por uma perda como essa.
- Foi você, Scott? - minha mente permutava entre a imagem do bilhete e a cena de Scott me dizendo que faria de tudo para manter Tyler afastado, inclusive destruí-lo com suas próprias mãos.
- O quê?
Seu olhar incrédulo fez-me sentir mal, mas mesmo assim eu prossegui - Eu lembro de você dizer que faria qualquer coisa para me ajudar com Tyler, inclusive acabar com ele você mesmo.
- Pelo amor de Deus, Sarah - ele deu de ombros e sentou-se em sua cadeira atrás da mesa - Você só pode estar louca, eu disse aquilo metaforicamente. Me referia a destruí-lo no tribunal, diante do promotor, como qualquer grande advogado faria. Sarah, eu não sou assassinado.
Percebi o quão tola estava sendo, julgando as pessoas que mais me ajudaram e tudo por conta de um maluco que decidiu atormentar minha vida sem droga de razão alguma - Me desculpe, Scott. Não sei onde eu estava com a cabeça pra te acusar dessa maneira.
Ele veio até mim novamente, mas parou em frente à mesa, recostando-se nela para me olhar nos olhos - Sarah, nós sempre desconfiamos que o leiteiro não enriqueceu da noite pro dia apenas distribuindo laticínios para supermercados, não é?
Minhas sobrancelhas se uniram em sinal de dúvida - Onde você quer chegar com isso?
Vou direto ao ponto - cruzou os braços em frente ao corpo - Tyler Armstrong está envolvido com um dos maiores cartéis de drogas do México e a narcóticos desconfia que a empresa seja apenas fachada para trazer toda a metanfetamina produzida lá, para os Estados unidos.
Como sabe disso?
- O coronel Donald's, que está encarregado dessa investigação, é amigo pessoal do meu pai - suas pupilas dilatadas insistiam em me perfurar com suas verdades.
Acha que a morte de Tyler pode ter sido queima de arquivo? - indaguei.
- Tenho quase certeza disso - coçou a barba levemente - O corpo foi encontrado no parque estadual, completamente desfigurado e só puderam reconhecê-lo por conta das tatuagens.
Eram muitas informações para digerir. Eu ainda estava atônita por saber de sua morte e ouvir o modo como as coisas aconteceram era demais para mim. Tyler era um monstro, me machucou física e psicologicamente durante anos, mas era o pai da minha filha e minha índole me impedia de esboçar qualquer reação exultante.
- Vá pra casa, Sarah! - King ordenou - Tire uns dias de folga, fique com sua filha e se precisar de qualquer coisa, não exite em me chamar.
Apenas assenti. Saí da sala de Scott e passei por meus amigos sem dar-lhes uma palavra. Uma hora ou outra eles descobririam o que havia acontecido, sem ser necessário que eu fosse a portadora da fofoca.
Deixei tudo como estava em minha mesa, apenas peguei as coisas de que precisava e deixei o escritório. Desci até o estacionamento, mas quando adentrei meu carro, não pude mais me conter, desabei em um choro descontrolado. Um misto de medo e raiva tomou-me por inteiro.
Fiquei alí por um longo tempo. Não estava em condições de dirigir e mesmo que estivesse, a última coisa que eu queria era dar aquela notícia trágica à minha pequena Lizzie. Qual seria a peça da vez? O que o destino ainda teria em mente para foder com o resto de minha sanidade mental?
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