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Enquanto a ajuda não chegava, deitei minha cabeça no colo de Diego e ele aproveitou para passar as mãos nos meus cabelos. Seu toque era sútil e acabou amenizando um pouco da dor que eu estava sentindo.
—– Eu nem sempre fui assim — Ele soltou de repente.
—– Agressivo? — Levantei a cabeça pra olhar para ele.
—– Impulsivo.
Voltei à posição que eu estava, e seus dedos seguiram se entrelaçando em meus cabelos.
—– Antes de virmos pra cá, a gente morava no interior, eu tinha comprado uma casinha lá pra fugir do caos da cidade grande com a minha família, queria um lugar mais tranquilo pra morar, próximo da natureza para poder extrair dela o melhor que ela podia me oferecer...era um lugar lindo, rodeado por flores e o vermelho das maçãs que preenchia aquelas grandes árvores ao redor, era o passatempo da Ana, colher maçãs, ela adorava...
Ele contava, e um filme passava na minha cabeça.
—– Nessa época a Ana tinha três anos, e Christine estava esperando o nosso segundo filho, que iria se chamar Benjamin. Era uma sexta feira a noite quando decidimos ir todo mundo para o cinema, tínhamos o hábito de fazer isso, só que dessa vez Christi não queria ir, porque estava muito cansada e preferiu ficar em casa dormindo...eu até pensei em desistir do passeio, mas ela me assegurou de que ficariam bem, e eu acreditei, afinal de contas aquela não era a primeira vez que ela ficava sozinha em casa, e eu nunca pensei que a maldade pudesse nos encontrar lá, então dei um beijo em seus lábios e sai com a Ana pela porta, ela saltitava inocentemente, porém fiquei um pouco apreensivo, olhei pra trás e vi minha esposa na porta sorrindo e acenando, e aquilo soou como uma amarga despedida...
Suas mãos pararam de me acariciar, então olhei pra ele e vi que estava petrificado.
—– Diego? — Chamei por ele, preocupada, mas ele não respondeu. Os seus olhos estavam parados em algum ponto que só ele conseguia ver.
Me levantei do seu colo e toquei seu rosto frio e pálido, seus olhos azuis então se direcionaram para os meus e depois se encheram de lágrimas.
—– Se eu soubesse que era mesmo uma despedida, eu jamais teria saído de casa.
Meus olhos se encheram de compaixão por ele, enquanto os seus se perdiam novamente.
Ele continuou, e eu me deixei levar pelo tom calmo de sua voz e viajei em suas palavras.
.....
Aquele dia eu mal consegui prestar atenção no filme, eu nem sabia que filme era mais, olhei pra Anabelle abocanhando a pipoca junto com a sua mão pequena e senti uma imensa vontade de chorar, olhei em volta e inesperadamente me senti vazio, mesmo o lugar estando repleto de pessoas, meu peito foi acometido por aquele mesmo aperto que senti ao sair de casa.
Eu tinha esquecido de dizer " Eu te amo" como das outras vezes, e isso por um momento me deixou frustrado.
—– Vamos filha.
Deixei o pote de pipoca de um lado, o refri do outro, e apanhei a Ana em meus braços, eu sentia que ela iria cair então a segurei firme. O filme ainda não havia acabado, e o seu choro ecoou por toda a sala do cinema, incomodando aqueles que ali estavam assistindo.
A velocidade na qual eu estava era preocupante, mas por se tratar de uma estrada de terra, não havia atividade da polícia por lá. Ana estava segura, enrolada por um cinto firme e cantarolando uma canção. A luz do farol abria caminho pela escuridão, eu mal conseguia respirar, algo dentro de mim dizia que eu precisava chegar em casa o mais rápido possível.
Pensei que Christine poderia ter entrado em trabalho de parto. Essa era a única explicação para minha preocupação excessiva.
Liguei no seu celular várias vezes, mas ninguém atendeu.
—– Papai, você está indo muito rápido — Annabelle alertou
Eu pensei em uma resposta para dar a ela, mas não encontrei, então permaneci calado e cada vez mais tenso com a demora pra chegar.
Maldita estrada.
Comecei a pensar que talvez ter me mudado para o interior não foi uma boa ideia, mas tarde eu iria ter certeza.
Cheguei em casa e a primeira coisa que notei foi que a porta estava escancarada, e isso acelerou o meu coração.
Entrei em casa sorrateiramente.
—– Christi?
Chamei, mas minha voz foi rebatida pelo terrível silêncio.
As luzes estavam apagadas.
Quando acendi, tudo parecia está em perfeita ordem. Caminhei de cômodo em cômodo, e nem sinal dela, então fui até o nosso quarto, e me deparei com uma das piores cenas da minha vida.
Minha mulher estava debruçada sobre a cama, com um único tiro no meio da testa.
Meu corpo gelou, dei dois passos pra trás e agarrei os cabelos em desespero.
—– Não, não .
—– O que foi papai? — Anabelle entrou. Peguei ela no colo e a tirei dali às pressas, antes que ela visse aquela cena terrível
Um vulto passou rapidamente pela janela e fez o meu coração disparar.
—– Filha — Coloquei Ana no chão e me ajoelhei na sua frente — Vamos fazer uma brincadeira diferente, ok?
—– Qual?
Agarrei a sua mão, e a levei correndo para o banheiro que tinha no quarto, e fechei a porta.
—– Fica aqui dentro, e não faça barulho, eu já volto.
—– Vamos cavalinho, papai — Ela pediu
—– Não filha, não é hora pra isso — Cochichei — Agora faz o que o papai mandou.
Ela balançou a cabeça positivamente.
Tranquei ela no banheiro e desci rapidamente as escadas, fui até a cozinha e apanhei uma faca, a maior que tinha.
Caminhei por toda a casa à procura do assassino, e nada.
Até que escutei o grito de Annabelle e subi novamente as escadas.
—– Filha, o que houve?
—– Tem um bicho aqui.
—– Onde?
—– Na janela.
Olhei para a janela e vi que tinha uma mariposa, mas não era só isso, a janela estava quebrada e eu lembro que ela não estava assim antes.
—– Ok, vamos sair daqui, mas tem que fechar os olhos.
Ela apertou os olhos com força, então rapidamente a tirei de lá.
Passando novamente por aquela cena traumática.
A adrenalina não me permitia fraquejar, duas vidas se foram, mas eu ainda tinha que tirar minha filha de lá.
Mas por algum motivo a porta da frente estava emperrada.
E logo as chamas se espalharam pelo lado de fora.
Como se não bastasse.
Entrei em total desespero.
Coloquei a Ana no chão e comecei a esmurrar e chutar a porta com toda a força que podia, ainda assim não consegui.
As chamas adentraram a casa rapidamente.
—– Merda!
Tirei o casaco e cobri a Ana para protegê-la do fogo, e juntos nos direcionamos para cozinha, pois lá havia outra porta.
A casa toda estava indo a baixo, e fogo tomava proporções gigantescas, mesmo assim eu coloquei na minha cabeça que a gente iria conseguir sair dali a todo custo.
E foi o que aconteceu.
Confesso que o fogo ajudou um pouco queimando a porta.
Corri em direção ao carro, peguei o celular que por pura distração havia esquecido lá dentro, e liguei para a polícia e para o corpo de bombeiros para salvar sabe se lá quem.
E só chorei quando eles tiraram de lá de dentro um corpo carbonizado do que havia restado da minha mulher e do meu filho.
Fiquei desolado.
Mais tarde, na delegacia, eles me interrogaram e como não conseguiram achar o assassino, fui apontado como principal suspeito.
—– Isso é um absurdo — Protestei.
—– O galão de gasolina pertencia a sua casa ...
Era impossível saber a causa da morte com o corpo naquele estado, então eles deduziram que foi por causa do incêndio.
—– Eu não fiz isso, mataram a minha mulher, e incendiaram a minha casa, ela estava grávida...
—– Pode ter sido uma tentativa de suicídio, mas como não deu certo, você tentou fugir...
—– Não faz o menor sentido isso.
—– Bom, enquanto não encontrarmos provas, o senhor permanecerá detido e sua filha ficará sob os cuidados da avó, que no caso é a sua mãe, pode levar.
Dois homens se aproximaram de mim.
—– Não, isso é um absurdo, eu não fiz nada...
Infelizmente os meus gritos foram ignorados.
Fiquei um ano preso na cadeia, com os pensamentos a mil, todos na cidade ficaram sabendo sobre o caso e começaram a me atacar, dizendo que eu era um assassino, e por um tempo eu comecei achar que eu realmente era mesmo uma pessoa ruim.
—– Você não é uma pessoa ruim, eu conheci pessoas ruins, e você não chega nem perto delas.
—– Depois desse tempo comendo o pão que o diabo amassou, eles me chamaram e disseram que havia encontrado o verdadeiro assassino. Um matador de aluguel, contratado por ninguém menos que o meu irmão gêmeo.
—– Desculpa — Interrompi assim que ouvi a palavra irmão, só me veio uma pessoa na cabeça — Qual é o nome do seu irmão?
Uma tensão se formou entre nós de repente.
—– Caleb.
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