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Ter aceitado sair com Diego naquele dia foi a melhor escolha que eu poderia ter feito, ele é incrível.
A gente foi em um restaurante pouco frequentado na cidade, mas apesar de simples, tinha um aspecto romântico, sem contar que fomos muito bem recepcionados.
Foi uma noite maravilhosa, regada a vinho, música clássica e uma boa conversa.
E em uma dessas músicas Diego me puxou para dançar, o que foi um pouco constrangedor já que não tinha ninguém além da gente fazendo isso.
—– Puts! Eu adoro essa música — Ele soltou, enquanto me conduzia até o espaço vazio entre as mesas
Eu passei pelas pessoas me desculpando como se a atitude dele estivesse incomodando elas de alguma forma.
Me questionei o porquê de tanta formalidade da minha parte, se estávamos apenas nos divertindo, mas velhos hábitos nunca mudam.
Enquanto a gente estava dançando, notei olhares curiosos e cochichos vindo na nossa direção.
Então eu comparei a minha roupa com as roupas que as pessoas estavam usando e percebi que eu havia me produzido demais para uma única noite.
E o grande motivo disso é que eu havia trazido todo o meu guarda roupa pra cá, com as peças luxuosas que Caleb havia comprado pra mim, coisas que as pessoas simples do interior não estão acostumadas.
Poucas foram as pessoas que me reconheceram.
.....
Me surpreendi ao perceber que Diego sabia dançar, ele era um dos poucos homens que eu conheci que sabia e isso sempre me deixou impressionada. Nem mesmo Caleb com toda a sua perfeição masculina, sabia dançar.
Nossos corpos entraram em perfeita sintonia. Duego sabia exatamente o que estava fazendo. Agora sei porque Anabelle levou menos de duas semanas para aprender todos os passos, a dança deve estar no sangue deles.
O vinho daquele lugar não era dos melhores, e as pessoas gritavam como se estivessem em uma casa de aposta, e o local era um pouco decadente para um primeiro encontro. Depois que fomos dançar, as outras pessoas tomaram coragem e se agruparam todas em um só lugar, tornando nossa experiência um tanto desagradável.
A mistura de bebida com perfume me deixou enojada.
Eu me produzi toda porque achei que ele me levaria para um restaurante mais chique, com pessoas da alta sociedade.
Às vezes me esqueço de que eu não estou mais na minha cidade, e que nem todo mundo é como Caleb.
E eu não deveria me sentir tão decepcionada de estar em um lugar onde eu nasci e passei a infância e parte da adolescência, mas depois das coisas ruins que passei aqui, esse lugar se tornou menos importante pra mim.
Mas o olhar e o sorriso de Diego me distraíam de tudo isso, me distraia inclusive das lembranças dolorosas do meu passado e do momento crítico pelo qual eu estava passando.
Ele faz eu me sentir especial, pelo simples fato de ter disponibilizado um pouco do seu tempo pra me trazer até aqui, um lugar que é de alguma forma uma grande referência pra ele.
Ele disse que nenhum lugar supera a comida daqui.
E realmente a comida era muito boa.
—– É porque você ainda não frequentou o restaurante onde eu trabalho, a chefe de lá faz um trabalho incrível, pode acreditar.
Ele sorriu de boca cheia. E isso pareceu tão desnecessário mas ao mesmo tempo divertido.
Eu percebi que só tinha que relaxar um pouco e deixar as coisas fluírem.
—– Disso eu não tenho dúvidas — Ele concordou me deixando claramente envergonhada — Quem sabe um dia eu não passe por lá pra ver esse trabalho de perto
Em toda a minha vida eu nunca me senti especial pra alguém, como agora. Ele deixa eu me expressar, não dá palpite na quantidade de comida que coloco no meu prato, ele não me oprime dizendo que estou ficando gorda ou algo do tipo, muito pelo o contrário, ele só me elogia.
Mas porque é tão difícil me acostumar com isso, eu sei que ele está sendo sincero, mas lá no fundo do meu coração eu sinto que ele só está tentando ganhar a minha confiança, também acho que está bebendo mais do que o normal, e eu não sei se é porque ele está nervoso, ou empolgado demais com o nosso encontro, mas a forma como ele pede um drinque atrás do outro está me deixando incomodada.
Eu não sou a única lutando para vencer velhos hábitos, mas ele nem parece se esforçar.
É estranho, porque ao mesmo tempo que ele parece confortável, também parece que algo está o incomodando tanto.
Ou pode ser que esse incômodo venha de mim, talvez ele tenha plena consciência de que está exagerando, e só eu estou vendo um futuro marido abusivo que chega em casa bêbado e agride a mulher.
Eu não quero ter que errar dessa vez.
Ele me faz acreditar que é possível me apaixonar de novo, sem medo, sem precisar me preocupar se ele vai me machucar ou não. Mas ao mesmo tempo eu me sinto insegura, talvez tenha sido um erro ter vindo aqui, por mais incrível que possa ter sido.
Depois dali, a gente saiu correndo no meio da chuva para procurar pelo o carro dele, que ele se esqueceu totalmente de onde havia estacionado.
Ele era um pouco atrapalhado as vezes e era isso que o deixava atraente. E ele nem se dava conta de como era bonito e charmoso.
Ele era simples demais para enxergar sua própria grandeza.
Não era como Caleb, que sempre procurava uma forma de se destacar, pra ele era importante que todos soubessem que ele estava por perto.
Mas de que adiantou todo o seu egocentrismo, se ele morreu como um fracassado e hoje ninguém mais fala sobre ele, caiu no esquecimento.
Uma coisa pelo qual ele tinha tanto medo.
Apesar de que eu não o esqueci, eu sei o que eu passei, eu sei quem ele era, mas ninguém sabe quem eu sou, então de nada vale se eu falar.
Diego é uma versão diferente de Caleb, apesar de ter a mesma cor dos olhos e cabelos, ele não era o homem perfeito, não estava usando um terno caro, ou um relógio exclusivo em seu pulso, ele não era tão cauteloso com as palavras, muito pelo contrário, falava pelos cutuvelos, mas acredito que a bebida tenha influenciado um pouco nisso. E pelo visto faltou algumas aulas de etiqueta. Mas a sua maior riqueza estava em suas palavras, e em suas atitudes, e isso é o que basta.
E talvez o cara certo pra você não precise ser perfeito, ele só tem que ser ele mesmo, e te tratar como você merece ser tratada, não te transformar em um fantoche só pra ter o prazer de te manipular.
Nem te ensinar a maneira como você deve se vestir ou falar, te privar de correr atrás dos seus sonhos, só porque ele acha que você não é boa o bastante. Somos capazes de tudo.
Eu fiquei esperando por Diego, embaixo de um telhado de uma casa, por um tempão, enquanto ele perambulava sozinho e na chuva a procura do seu carro.
Eu estava rindo sozinha, me lembrando de suas maluquices. Como quando estávamos dançando e ele se atrapalhou e derrubou um garçom. Eu estava encharcada e tremendo de frio e mesmo assim conseguia ver graça nisso.
Mas o primeiro encontro nem sempre precisa ser perfeito, e Diego conseguiu abrilhantar essa noite ainda mais com o seu jeito atrapalhado de ser.
Minutos depois ele apareceu, encharcado e decepcionado consigo mesmo.
Eu o observei vindo de longe. E creio que era a melhor visão de todas.
Um homem alto, forte, de cabelos molhados e olhos com um tom de azul escuro, combinando com a cor do céu, naquela noite.
Eu também não me lembro de onde ele estacionou o carro, é sempre muito difícil encontrar uma vaga por aqui, ainda mais por se tratar de uma avenida, onde há muitas lanchonetes, bares e um considerado número de pessoas passando pra lá e pra cá.
Uma cidade que nunca dorme, como Las Vegas.
E já passava da meia noite.
Ele passou as mãos pelos cabelos e chutou uma pequena poça de água que havia se formado na rua, acabando assim por molhar a barra de sua calça.
—– Merda! — Soltou atordoado, sacudindo a mesma, em seguida ele se voltou pra mim e viu que eu estava rindo.
Ele sorriu meio envergonhado, e os seus olhos demonstraram que ele estava um pouco transtornado por conta das altas doses que tomou.
Seus lábios rosados e umedecidos despertou em mim um desejo fora do comum.
—– Ella, me desculpe, mas vou ter que chamar um táxi — Ele sorriu as palavras.
Isso rendeu boas risadas da minha parte também.
Por incrível que pareça, eu não estava brava com ele, eu teria ficado brava se fosse outra pessoa, mas ele, é impossível sentir raiva de alguém como ele.
Ele se aproximou de mim, e fixou os olhos nos meus. Não sei se foi o frio, mas meu corpo se arrepiou inteiro.
Eu estava congelando.
Ele tirou o seu casaco e me envolveu com ele, o que me surpreendeu.
Depois se posicionou do meu lado e esfregou uma mão na outra para tentar se aquecer.
Apesar de estar molhado por fora, o casaco estava quente por dentro e a sensação foi reconfortante, assim como o gesto dele.
Eu não estou acostumada com gentilezas, e todas as gentilezas que surgiram na minha vida não foram genuínas.
—– Obrigado — Agradeci com o coração.
Esse é um gesto que todo homem deveria ter, me lembro de inúmeras vezes que Caleb me deixou passar frio a noite inteira.
Só de lembrar, o meu corpo dói.
Quando alguém abre mão do seu conforto para dar conforto a outra pessoa, significa que o seu coração é do tamanho do mundo.
Quando voltei os olhos para Diego, vi que ele estava meio inquieto com a demora do táxi, seus olhos azuis estavam focados na rua enquanto seu corpo se agitava.
Sem contar as diversas vezes que ele olhou para o relógio em seu pulso, parecia mais preocupado em me tirar daquela chuva, do que com a enrola do motorista.
E provavelmente estava arrasado por ter bebido demais e estragado a nossa noite, mas mal sabe ele que essa foi uma das melhores noites que já tive na minha vida, levando em consideração todos os transtornos.
Não sorrio assim desde que me mudei pra cá, tudo tem sido tão traumático, e isso me desperta o medo de voltar pra casa.
Por fim, descobrimos naquela mesma noite que Diego não só esqueceu de onde seu carro foi estacionado, como ele foi roubado.
Mas ele disse que resolveria isso depois, que não era a primeira vez que isso acontece.
E que sempre acontecia, quando ele saia pra beber.
Assim que chegamos na porta de casa, ele parou na minha frente e nossos olhos se encontraram mais uma vez.
Tirei as mãos do bolso do casaco e agarrei a suas, que por algum motivo estavam tremendo.
Suas mãos pararam de tremer, e sua respiração se tranquilizou. Ele parecia tenso.
Ele olhou para as minhas mãos e depois pra mim, como se estivesse surpreso com a minha atitude.
Havia uma enorme tristeza em seu olhar, de alguém que já passou por coisas muito ruins.
Como alguém que antes tinha tudo e agora não tem nada.
Eu consegui captar isso várias vezes durante as nossas conversas, ele evitava ao máximo falar sobre ele ou sobre o seu passado, e quando passava perto disso sua linguagem corporal mudava e ele pedia mais um drinque e não continuava.
E eu também não me sentiria confortável pra falar sobre o meu passado, até porque é uma coisa da qual eu não me orgulho.
E se eu pudesse passar a vida inteira negando pra mim mesma que não aconteceu nada daquilo, eu não me importaria.
Mas eu não posso.
Diego é um cara traumatizado que prefere esconder suas dores por trás de um sorriso e boas ações.
Ele se mudou a pouco tempo, e mora com sua filha e a sua mãe, o que é estranho, porque ele não deixou claro do porquê. E eu também não quero pressioná -lo a nada.
Puxei o seu corpo para perto do meu, e ele agarrou subitamente o meu rosto, e um pouco dessa tristeza deixou o seu semblante, suas mãos estavam um pouco frias.
Mas o calor que senti quando seus olhos adentraram os meus, foi o suficiente para me aquecer.
Ele me olhava como se eu fosse a única mulher no mundo capaz de curar a sua dor.
E eu não era.
—– Me desculpa — Ele sussurrou. Por tudo na verdade, faz um tempo que eu não bebo, acho que perdi o pouco o ritmo.
Ele sorriu.
—– Não precisa se desculpar, eu me diverti muito essa noite, de verdade, eu nunca tinha tido uma noite assim, com ninguém
Ele passou os dedos pelos meus lábios e me encarou como se pedisse permissão para me beijar.
Eu queria fazer isso desde a primeira vez que eu o vi.
Então eu o beijei, foi um beijo lento e demorado. Quando nos afastamos ele sorriu radiante como se tivesse ganhado um presente.
—– Isso foi muito bom — Ele suspirou.
—– Foi sim, mas eu preciso entrar agora, mas foi muito incrível, de verdade, eu amei passar esse tempo com você.
—– Ok, tenha uma boa noite — Ele sorriu fraco.
—– Você também.
Senti que ele ficou parado na calçada até que eu finalmente entrasse, me senti uma adolescente após o primeiro beijo.
As borboletas começaram a se agitar no meu estômago, mas morreram assim que deitei a cabeça no travesseiro, e as lágrimas vieram com força.
Eu não entendo, não era pra eu estar feliz?
—– Acha que consegue ama-lo — Uma voz soou do meu lado.
Paralisei.
—– Logo você, que não consegue se controlar na presença de outro homem — Completou.
Engoli o choro e não deixei pela primeira aquelas palavras me abalarem.
—– Diego é diferente, eu jamais faria algo pra magoa-lo.
—– Você nem resolveu todas as questões da sua vida ainda, e já está correndo atrás de outro, você nem consegue entrar no seu próprio quarto, não vai saber conduzir esse relacionamento.
—– Se você soubesse o que aconteceu comigo naquele quarto, teria ânsia de vômito.
—– Eu não teria não, eu teria tido o prazer de ver você sofrer.
Uma lágrima rolou pelos meus olhos.
—– Caleb...
Eu me virei e o encarei.
Ele olhava fixamente para o teto, sua beleza havia se desmanchado, e ele não parecia mais tão atraente, talvez seja porque eu não sinto mais nada por ele.
E o amor costuma embelezar as pessoas.
Talvez assim ele some de vez.
—– Daqui alguns anos eu nem vou me lembrar que você sequer existiu — Cuspir as palavras.
Eu depositei tanto ódio nessas palavras que ao invés de machucá-lo, elas me machucaram primeiro.
Ele me olhou torto, depois sorriu maquiavélico.
—– Daqui alguns anos vai estar internada em um hospício tomando choque na cabeça, e acredito que não vai querer envolver seu amiguinho nisso.
As lágrimas voltaram aos meus olhos e eu senti um aperto no peito.
—– Eu não vou deixar você me enloquecer como fez com a sua mãe — Falei chorando.
Me virei de costas pra ele, peguei um calmante na mesa de cabeceira e tomei uma boa quantidade.
Logo a sonolência tomou conta do meu corpo, fazendo Caleb e todas as minhas preocupações desaparecerem.
Pelo menos, por enquanto.
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