33
Eu não sei porque temos a estranha mania de acreditar que toda pessoa ruim tem uma passado sombrio que justifique a sua conduta errante. Sendo que essa pessoa pode simplesmente ter nascido má, mesmo em uma lares amorosos com uma boa educação e princípios.
Como é o caso de Caleb, que teve amor e carinho, além de todo um conforto e educação, e mesmo assim se comportava como um garoto rebelde e problemático, que tinha pequenos acessos de raiva que ninguém compreendia. Muitas vezes frustrado, ele fugia da escola, espancava os colegas sem piedade, e era uma criança agitada e incomunicável.
E a forma como sua mãe se refere a ele, me faz acreditar que ela jamais faria algo para machuca-lo.
Porém ao mesmo tempo, eu acredito que há um motivos para ele ser do jeito que é, isso explicaria os pesadelos, ou o fato dele querer controlar tudo e todos. Sua vaidade conturbada, entre outras coisas que tenho observado nele durante os últimos anos.
Quando uma pessoa é má, ela é má e pronto.
E Caleb parece batalhar contra si mesmo o tempo todo. O que há dentro dele é maior do que sua capacidade de demonstrar qualquer sentimento genuíno.
Sinais de alguém que passou por um grande trauma na infância.
Sem contar que ele tem recebido telefonemas misteriosos, e se não era a sua mãe ligando, então quem era?
Só sei que era uma mulher. E essa mulher tinha o poder de abalar suas emoções, o deixando tenso e nervoso.
E por que eu tenho a estranha sensação de estar no lugar errado? Na casa errada. Falando com a pessoa errada.
O que mais a mãe de Caleb não me contou? Que segredos essa família de boa aparência esconde?
Por que Caleb não queria que eu os conhecesse? Apesar de estranhamente ter mudado de ideia e convidado para aquela festa.
Será que ele está realmente arrependido? Ou só é maluco mesmo.
São tantos questionamentos na minha cabeça, que eu chego a ficar tonta.
—– Fico feliz que tenha vindo, Ella - Aurora disse enquanto me acompanhava até a porta.
—– Eu também Sra Miller...
Ela limpou a garganta propositalmente.
—– Aurora — Corrigi — Foi um prazer revê-la, você tem uma bela casa.
—– Obrigado, é uma pena que não possa ficar mais conosco.
—– Infelizmente não posso, Caleb nem sonha que eu estou aqui, e se ele chegar em casa e não me encontrar aí a coisa pode ficar preta —– Sorri nervosa.
—– Entendo — Ela sorriu fraco
Como pode entender, se nem ela mesma conhece o filho que tem.
Além de manipulador, é um assassino.
Passei os olhos por ela e vi Mia descer radiante as escadas, dessa vez com um lindo vestido lilás e os cabelos molhados. Enquanto do outro lado, Mateo se aproximava com passos lentos para se juntar a mãe e a irmã, naquela despedida calorosa.
Eu olhava para todos eles e só o que eu conseguia pensar era em como aquela família era linda. O que me emocionou totalmente, pois me fez lembrar dos meus pais.
Como eu queria que eles estivessem aqui.
A minha mãe iria adorar conhecer a Aurora, as duas com certeza se dariam muito bem. A minha mãe nesse momento estaria na cozinha se gabando dos seus dotes culinários, e contando histórias, como quando descobriu que estava grávida de mim e por pouco não interrompeu a gravidez, pois não havia terminado o ensino médio.
Abracei a senhorita Miller e senti um vazio no peito por ela não ser a minha mãe, que eu queria abraçar realmente.
—– Você sempre será bem vinda aqui querida - Ela disse.
–— Posso te levar pra casa, se quiser, Ella - Mateo se ofereceu com um sorriso malicioso.
—– Não será preciso, eu vou de táxi - Recusei, destruindo essa intimidade que ele havia criado entre nós.
Acenei para Mia, e ela me lançou um sorriso genuíno.
Fui caminhando até o portão que ficava meio longe da casa, fuçando a bolsa desesperadamente à procura do dinheiro que eu havia trazido para o táxi, porém não encontrei.
—– Droga!
Passei a mão pelo cabelo, aflita.
—– Algum problema, Ella?
Me assustei com a voz grave de Mateo, que apareceu de repente atrás de mim.
Sim, ele estava me seguindo, como se não bastassem os olhares.
Parei e me virei para ele, abrindo um sorriso irônico.
—– Parece que esqueci o dinheiro em casa, será que você poderia me dar uma carona? — Perguntei entre os dentes, vendo um sorriso estúpido crescer em seus lábios.
—– Mas é claro - Sua voz soou atraente e animada
Quando ele virou as costas, revirei os olhos e depois o segui com passos relutantes até o seu carro.
Eu decidi trazer o dinheiro do táxi, justamente para não ter que voltar com ele, pois eu pretendia passar no hospital na volta pra ver o Vicent. Mas pelo visto isso não vai ser possível.
A visita ao hospital vai ter ficar para outro dia. Pior que a obsessão de Mateo, é ser chantageado por ele.
—– Obrigado pela carona - Agradeci forçando um sorriso.
—– Disponha.
Suspirei, em seguida abri a porta do carro.
—– Ella? Ele chamou, me forçando olhar para trás, mesmo estando a um passo de entrar em casa.
—– Sim.
Quando ele abriu a boca para falar, foi surpreendido por alguém atrás de mim. Por um momento o meu corpo gelou ao sentir uma presença horripilante e familiar.
Virei o rosto e dei de cara com a expressão nada amigável de Caleb, escorado no batente da porta com o seu olhar implacável de sempre. Depois voltei a olhar para Mateo e fui obrigada a me despedir dele de qualquer jeito.
Ele sorriu debochado, e arrancou com o carro, sumindo de vista logo depois.
Senti a respiração profunda e acelerada de Caleb soprar em minha nuca, o que significava que ele estava furioso.
Tentei passar por ele, mas fui impedida, pois ele me agarrou pelos cotovelos e me pressionou na parede, me forçando a olhar em seus olhos azuis e escuros de raiva.
—– O que estava fazendo dentro do carro do imbecil do meu irmão? — Ele perguntou entre os dentes.
Não respondi, apenas deixei escapar um sorriso irônico.
Ele me soltou e agarrou os cabelos, enfurecido.
—– Voce é tão imprevisível — Soltei com um misto de nervosismo e medo.
Passei por ele, e larguei a bolsa no sofá, depois fui direito para a cozinha, preparar alguma coisa pra comer.
Toda aquela discussão tinha me deixado faminta.
—– Você não respondeu a minha pergunta — Ele gritou descontrolado
Apoiei os dois braços na pia, fechei os olhos e respirei fundo, antes de me virar e encara-lo.
—– Fui ver a sua mãe — Suspirei. Eu esqueci o dinheiro do táxi e Mateo me deu uma carona, foi só isso, mas eu não pretendia te contar, por que ...por que você nunca me conta nada, não é mesmo?
—– O que foi fazer na casa da minha mãe? — Ele fez outra pergunta, tentando controlar os seus impulsos que a todo momento o ameaçava
—– Ora, Caleb, eu fui me desculpar, a gente deixou uma má impressão na festa — Ri de nervoso — Ao contrário de você eu tenho vergonha na cara.
Ele fechou os olhos e suspirou impaciente.
—– E como você chegou até lá? — Ele perguntou com uma voz menos alterada.
Passei por ele e abri a geladeira.
—– Já disse, Mateo me deu uma carona — Falei enquanto procurava algo para cozinhar. Acho que vou cozinhar um peixe, o que você acha?
Ele fechou bruscamente a geladeira me assustando, me obrigando a olhar diretamente para ele.
—– Como comunicou isso a ele? que eu saiba você não tem telefone — Ele me lançou um olhar ameaçador que me fez tremer.
—– E-Ele veio aqui em casa.
Isso foi a deixa pra Caleb se afastar e esmurrar a parede ao lado, enfurecido. Me deixando completamente apavorada.
—– Eu tinha perdido a minha presilha na festa e ele veio devolver...
—– Não espere que eu acredite nisso — Ele gritou cerrando os punhos.
—– Mas é a verdade — Falei antecipando as lágrimas, não tinha como manter a tranquilidade diante de uma situação tão desesperadora
—– Ella, não minta pra mim — Ele gritou ainda mais alto.
—– Eu sei que você tem motivos de sobra pra não acreditar em mim, mas é a pura verdade. Meu deus, Caleb, ele é só um garoto, eu jamais me envolveria com ele, como pode pensar algo assim de mim — Cheguei mais perto dele e encarei seus olhos — Você disse que iríamos tentar, meu amor, então vamos tentar, você só precisa confiar mais em mim.
Ele soltou uma risada incrédula, depois voltou a ficar sério.
Tentei tocar o seu rosto, mas ele se afastou como se eu estivesse com alguma doença contagiosa.
—– Quero que fique longe da minha família, que não volte nunca mais a pisar seus pés imundos naquela casa, você entendeu ? - Ele ameaçou apontando o dedo no meu rosto.
Assenti, balançando a cabeça. Sentindo um nó na garganta.
Depois disso, ele ainda me olhou por alguns segundos com desprezo, e visivelmente enojado, em seguida virou as costas.
—– Caleb? — Chamei
Ele parou e voltou os olhos pra mim.
—– O que vai querer comer?
Ele me ignorou completamente, e subiu as escadas.
Deixei o meu corpo cair pesadamente no sofá, e soltei um suspiro trêmulo de exaustão. Para depois começar chorar.
Enfim, voltamos a estaca zero.
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro