21 de dezembro de 2017
O toque da campainha sempre foi um som inesperado, que podia assustar ou chatear a dona da casa, dependendo se ela sabia que vinha uma visita ou não. Afinal, mesmo quando se esperava por alguém, não se tinha exatamente certeza de em que momento a pessoa iria chegar, a não ser que viessem de carro e o barulho do automóvel advertisse a moradora. Diferente de todas as outras pessoas, Luna sempre ansiou pelo toque da campainha.
Antes, o som metálico e áspero anunciava a chegada da avó Amelia. A bondosa senhora era divertida e falava sem parar, algo que Luna apreciava muito por ser fã de suas histórias. Com o tempo, vovó Amelia se tornou sua melhor amiga e confidente. Para ela, podia falar sobre seus medos e inseguranças, sobre seus sonhos e gostos. Era tão diferente de sua mãe.
Viver na casa dos Brown foi o que Luna gostava de chamar de "kamikaze das emoções". Seus pais eram amorosos e gentis na metade do tempo e, na outra metade, eram desagradáveis e frios. Não só um com o outro, mas com ela também. Aliás, com ela principalmente. Luna aprendeu a aproveitar os momentos bons e a se esconder nos momentos ruins — odiava ouvir que eles só estavam juntos por culpa dela, o maior erro da vida deles. A jovem se esquivou tanto daquelas palavras que passou a realmente esquecê-las, como se apagasse uma parte de sua memória todos os dias.
A única lembrança que tinha dos dias depois que os pais começavam a brigar era a história que sua mãe lhe contava sobre um homem mentiroso e rude que a tinha rejeitado e a enviado para os braços de seu pai. Helena dizia que ele a tinha abandonado, mesmo a amando, pois não acreditava em finais felizes.
Luna só foi entender realmente a história quando sua avó Amelia começou a contar uma outra versão. Por isso Luna gostava tanto das visitas da avó, pois até mesmo a história que ficava na mente de Luna depois das brigas dos pais eram transformadas em fantasia e em alegria.
Vovó Amelia contava-lhe sobre um homem amistoso e atento que perdeu a amizade de Helena sem querer, simplesmente porque não sentia por ela o que ela queria que ele sentisse. Nas histórias da avó, Luna via alguém que poderia ser seu amigo quando não pudesse contar com Amelia.
Enquanto crescia, esse personagem das histórias, tanto de sua mãe quanto de sua avó, tornou-se um empecilho, um alguém que transformava as tardes divertidas com vovó Amelia em tardes de brigas entre a senhora e Helena, assim como eram as tardes com seus pais. Luna quase o desprezou, quase o odiou.
Estava ajudando Amelia a limpar o porão quando achou uma caixa cheia de diários muito antigos, com páginas amareladas e caligrafia bonita, mas borradas pelas manchas do tempo e comidas pelas traças. Só conseguiu pegar um dos cadernos sem que a avó percebesse. Levou para casa e demorou três meses para decifrar o que estava escrito. Quando finalmente o fez, descobriu que não poderia odiar o homem das histórias, pois ele também estava constantemente sofrendo.
Depois disso, exigiu que a avó lhe contasse tudo o que poderia saber. A partir daí, passou a vê-lo com outros olhos. Um homem que sacrificava a paz eterna para ajudar um amigo, um homem que escolhia sofrer em vez de causar sofrimento, um homem que preferia ficar sozinho a causar solidão. A partir daquele momento, Luna desejou conhecê-lo. Não pelas histórias, mas por ele mesmo. E ela desejou que pudesse dar a ele tudo o que tinha deixado para trás.
Agora, Luna estava ansiosa pelo som da campainha de novo. Depois de uma vida inteira, ela finalmente teria a chance de fazer o que desejou por, pelo menos, 10 anos.
Quando finalmente tocou naquela manhã, a campainha parecia que estava conectada ao cérebro de Luna, lançando comandos específicos e rápidos por todo seu corpo, acelerando seu coração e fazendo-a pular da cadeira e praticamente correr até a porta.
A sensação que teve quando removeu a barreira que a impedia de ver o visitante foi totalmente diferente de quando recebia a avó. Engoliu em seco quando o viu, sentindo sua garganta apertar e as borboletas do seu estômago fazerem festa. Quando ele esboçou o início de um sorriso, Luna pensou que teria que ir ao médico para saber se era possível que seu coração errasse as batidas daquele jeito.
Ficaram na porta por um minuto, apenas parados olhando um para o outro, até Luna conseguir sair de seu torpor. Quando aconteceu, Jean não estava apenas esboçando um sorriso, estava sorrindo de verdade, achando graça da situação.
— Entre, por favor — Luna falou enquanto se encostava na parede para dar espaço para Jean entrar em sua casa.
Ela o acompanhou até a sala de estar, onde fariam a maior parte das atividades que programou naquele dia. Queria mostrar alguma coisa a Jean, já que usara a desculpa da data para segurá-lo na cidade. Só tinha esquecido que aquela data específica não tinha nada de extraordinário, além das outras coisas que se faziam nessa época do ano.
Ia falar com Jean sobre o que programou para eles, mas viu que ele estava observando a sala dela com a cabeça inclinada e o cenho levemente franzido.
— Algum problema?
— Na verdade, estou surpreso — ele confessou, virando-se para ela e observando-a tão atentamente quanto observou a sala. — Imaginei que fosse uma daquelas pessoas que têm a casa tão enfeitada quanto a casa de duendes que fica em exposição nos shoppings.
— Agora quem está confusa sou eu. Não sei se isso foi um elogio ou uma crítica.
— Só pensei que teria mais Natal por aqui — ele concluiu, fazendo gestos com as mãos para mostrar que estava falando do ambiente. A ênfase na palavra "Natal" foi para expressar como as pessoas usavam aquela data como desculpa para entupir a casa de enfeites e luzes.
— E o que te faz pensar que não terá?
— Bom, normalmente, quem gosta de enfeitar a casa já começa no início do mês.
— É porque essas pessoas não esperam a data certa para fazê-lo.
Assim que Jean olhou para ela com as sobrancelhas levantadas e a boca entreaberta, Luna percebeu que ele tinha entendido o que ela queria dizer. Por isso, ela não esperou que ele perguntasse, apenas começou a abrir as caixas espalhadas pela sala para mostrar a ele os enfeites que usariam para adornar a árvore que ocupava um bom espaço no aposento.
— Pensei que fosse me mostrar o que se faz no feriado bruxo — ele confessou, andando entre as caixas e retirando as decorações para olhar.
— É isso que se faz... Bom, quase isso. Hoje é o Yule. Assim como o Natal para os cristãos, nessa data comemoramos um nascimento. No nosso caso, é o nascimento do Deus Sol, que trará esperança para a Terra.
— Não é muito diferente da outra história.
— Fala de Jesus? Não, não é muito diferente. Ele também traz muita esperança para as pessoas.
— Por que hoje, dia 21? Por que não comemoram no dia 25 também?
— Hoje é o Solstício de Inverno, a noite mais longa do ano. O que traz mais esperança do que o Sol nascendo depois de uma longa noite? Não é assim que sabemos que a vida continua? Que há outra chance de acertar? Que, depois da noite, há sempre um novo dia?
Jean não respondeu, mas Luna não queria que ele respondesse. Ele tinha ido até ali para entender sobre seus costumes e ela estava lhe ensinando. Duvidar ou concordar não fazia parte do trato.
— Por que enfeitar a casa hoje?
— Não a casa, mas a árvore. — Vendo-o levantar as sobrancelhas em um claro sinal de interrogação, Luna continuou: — O pinheiro é uma árvore de folhas perenes e sempre verdes, independente da temperatura. Simboliza a continuação da vida, além de estar ligado à Deusa. É tradição enfeitá-lo, pois os enfeites, em sua maioria, representam os espíritos que são lembrados e podem estar presentes.
— Nascimento e morte.
Luna assentiu diante do comentário de Jean, depois abriu um largo sorriso. Ele era muito perspicaz por entender aquela associação, poucas pessoas o faziam.
— O Yule representa um pouco da morte e do renascimento. O Solstício de Inverno marca o momento em que as noites ficam mais longas, mas também marca o momento em que o sol volta a brilhar mais forte durante os dias. Mudança e regeneração, introspecção e desapego. São as representatividades desta data.
— Então, vamos adornar tua árvore?
— Preferia queimar coisas no caldeirão?
— Coisas?
— Eu disse, desapego. Tem alguma recordação que quer jogar fora?
— Sou um colecionador — Jean respondeu sorrindo. — Prefiro enfeitar a árvore.
— Então vamos começar!
Desfrutaram, então, de uma manhã agradável e instrutiva. Jean perguntava o significado de todos os adornos que colocavam na árvore, descobrindo que, na verdade, os maiores valores daqueles símbolos eram sentimentais. Muitos dos enfeites Luna havia ganhado das pessoas que gostavam dela e de quem ela gostava. Um ou outro tinha um conceito mais voltado para a bruxaria, como os sinos que simbolizavam a fertilidade e o visco que tinha poder de cura. O que mais lhe chamou a atenção, porém, foi a estrela.
— Não é uma estrela? A estrela de Belém?
— Claro que é uma estrela — Luna respondeu rindo —, mas, para nós, não é a estrela de Belém, usada pelos três Reis Magos como guia até o menino Jesus, é um pentagrama, o símbolo mais associado a nós, bruxas.
— E o que significa?
Luna deu de ombros, ainda rindo das perguntas dele.
— Os cinco elementos, os cinco sentidos, proteção, luz quando virado para cima, sombra quando virado para baixo. É um símbolo antigo demais, possui muita energia, então é difícil saber exatamente.
Jean estava com a estrela na mão enquanto conversava com Luna, mas, depois de saber sobre seu significado, fez questão de que fosse ela a colocá-la no topo da árvore. O único problema era que Luna não alcançava o topo da árvore. Por saber que teria a companhia dele naquele dia, ela fez questão de comprar uma árvore que fosse espetacular, incluindo seu tamanho.
O fantasma pegou um dos bancos dispostos na ilha da cozinha e posicionou para que Luna pudesse subir nele. Enquanto a jovem fazia os procedimentos, Jean a segurou para que não caísse. Luna achou muito difícil fazer a prece a que estava acostumada, por proteção e prosperidade para o próximo ano, com as mãos firmes de Jean em sua cintura.
Quando conseguiu terminar e desceu do banco, a jovem bruxa perdeu o compasso das batidas do coração de novo, ficando muito próxima dele e podendo olhar em seus olhos castanho-claros, quase verdes com a luz do sol batendo sobre eles através da janela. Não conseguiu interromper o contato e se afastar, na verdade, ela nem queria fazê-lo.
Perguntou-se por que Jean também não o fez imediatamente, esperando alguns minutos, olhando-a nos olhos como se pudesse ver sua alma através das órbitas escuras. Quando ele finalmente piscou e se afastou, Luna soltou uma respiração errática que nem sabia que estava prendendo.
— Fizemos um bom trabalho — Jean comentou, soando levemente desesperado para iniciar um assunto que não fosse o breve momento de proximidade dos dois.
Ele estava observando a árvore, então Luna seguiu seus olhos e concordou com ele. A jovem bruxa sabia que o símbolo daquela data ficaria muito bonito quando eles tivessem terminado, pois era assim todos os anos. Luna gostava do Yule e do Natal, não eram seus feriados favoritos, mas eram datas em que ela se sentia feliz.
Seus olhos voltaram para Jean e ela percebeu que ele também tinha voltado a observá-la.
O feriado favorito de Luna era o Halloween.
— Temos mais coisas programadas para hoje? — ele perguntou suavemente, sua voz soando rouca e profunda, como o eco de uma caverna.
— Almoça comigo?
Jean respirou fundo antes de suspirar e sorrir.
— Por que sempre fala como se fosse um pedido difícil de cumprir? Eu te prometi meu dia, não foi? Estou à tua disposição.
— É só... Não quero impor nada a você. Quero que fique porque quer ficar. Sei que imaginou que teríamos festa e um evento extraordinário como a festa do Beltane que minha avó te levou, e imagino que se decepcionou com o que fizemos hoje. Se quiser ir embora, eu vou entender.
— Luna — ele a interrompeu, fazendo-a se arrepiar com o modo como seu nome soava nos lábios dele —, queres que eu fique ou que vá embora?
Ele está nervoso? ela se perguntou. Sua avó tinha lhe contado como ele usava a linguagem antiga quando se sentia até mesmo levemente incomodado ou apreensivo com algum assunto. Minha resposta é importante para ele?
— Quer ficar ou ir embora? — ela perguntou, porque a resposta dele também era importante para ela.
Abrindo mais um sorriso encantador, Jean respondeu sem hesitar:
— O que tem para o almoço?
Diferente da manhã em que passou respondendo perguntas sobre os significados das coisas, o almoço foi preenchido por conversas de cunho pessoal. Jean perguntou-lhe como acabou ficando com a casa que era de Amelia, descobrindo que Luna já residia ali há dois anos, compartilhando o espaço com a avó desde que terminou a graduação em Ciências Ambientais.
Com o assunto de seus estudos, Luna acabou revelando que seu maior interesse era na parte química dos estudos que envolviam as plantas. Foi com esse conhecimento que ela passou a criar os perfumes que vendia na loja. Claro que houve outros estudos também, para que ela pudesse chegar ao que realmente queria, mas tudo valeu a pena, mesmo tendo que conviver com os pais mais do que o esperado, já que a casa deles em Garden District ficava mais perto da universidade.
Quando terminaram de experimentar a carne de porco e o bolo de castanhas embebido em cidra preparados por Luna, Jean sabia bastante sobre a fascinação da jovem bruxa pelos aromas e propriedades auxiliadoras das plantas. Naqueles momentos que ficaram conversando sobre os interesses dela, Jean pegou-se admirando-a de uma forma diferente.
A neta de Amelia não lhe era mais um grande mistério, mas ainda queria descobrir mais sobre ela. Quando estava prestes a perguntar sobre outras áreas de sua vida, entretanto, alguém bateu à porta de Luna, interrompendo o almoço dos dois, que já terminara há um bom tempo na verdade.
Era uma senhora pouco mais velha que Helena quem apareceu, entregando duas sacas de cascas de milho para a jovem que, mesmo claramente surpresa com a quantidade à sua frente, não vacilou em aceitar fazer o que tinha se proposto.
— Acha que consegue terminar até às cinco da tarde? — perguntou a mulher.
Luna abriu mais os grandes olhos castanhos de cílios longos, piscou repetidas vezes enquanto olhava para as sacas e engoliu em seco antes de concordar com o horário da entrega estabelecido pela conhecida.
— Você é um anjo, exatamente como Amelia costumava dizer — foram as últimas palavras da senhora que saiu rapidamente, dando um beijo no rosto de Luna e impedindo-a de mudar de ideia.
Sem parecer que tivesse qualquer intenção de correr atrás da mulher e desfazer o acordo, Luna ficou observando as cascas de milho por algum tempo, até Jean pigarrear e chamar sua atenção.
— Tudo bem?
— Está... é só... — Ela não conseguiu responder, suspirando e coçando a testa como se estivesse tentando tirar alguma coisa de dentro da cabeça, alguma ideia para voltar a ter um bom dia. — Não era isso que eu tinha programado.
— O que é isso?
— Eu não sabia que vovó Amelia tinha prometido fazer bonecas de milho para a festa do coven. Eu lembrava que ela fazia isso todo ano, mas pensei que tinham arrumado outra pessoa depois que...
— Não arrumaram? — Jean perguntou para tirar o foco da frase que Luna não conseguia completar. Ele também tinha dificuldades em aceitar que Amelia não estava mais ali.
— Elas esqueceram, ao que parece. Estavam preocupadas com outros preparativos e nenhuma delas percebeu que não poderiam mais contar com minha avó.
— Então vieram te pedir para fazer? É sua obrigação? Por ser neta de Amelia, quero dizer.
— Não é minha obrigação, mas sei que vovó ficaria triste se ninguém fizesse. E é o que vai acontecer se eu não fizer. — Luna suspirou de novo e Jean viu as lágrimas umedecendo os olhos castanhos. — Era a tradição favorita dela.
— Posso ajudar? — o homem se ofereceu, atraindo os olhos de Luna para si, que pareceu esperançosa, mas ao mesmo tempo receosa. Ele sabia que ela não queria lhe impor nada, por isso não pediria sua ajuda. — Se é uma tradição, faz sentido que eu te ajude, afinal estou aqui para aprender sobre elas, não é? E se Amelia gostava tanto de fazer isso, acredito que eu possa gostar também. Além disso, parece muita coisa para só uma pessoa fazer até cinco horas. Então eu gostaria de ajudar.
— Está falando sério?
As lágrimas não tinham abandonado aqueles olhos profundos nem mesmo depois da oferta de Jean. Na verdade, ela pareceu ainda mais comovida com o que ele disse. Por um momento, Jean se perguntou por que aquela bela mulher estava tão surpresa por ele querer ajudá-la e ficar perto dela pelo restante daquele dia. No entanto, mesmo curioso, ele simplesmente respondeu com um sorriso tranquilo:
— É só me dizer o que fazer.
E ela disse. Depois de carregarem as sacas para perto da ilha da cozinha, onde sentariam para fazer o trabalho manual, Luna pegou uma das cascas de milho e mostrou a Jean como arrumar a casca e amarrar para fazer as bonecas. Era algo bem simples na verdade, mas que mostrava um resultado tão peculiar e fofo que Jean não conseguiu impedir-se de sentir um deslumbramento com o objeto.
Após a explicação, eles passaram a trabalhar em conjunto para agilizar o processo. Luna ajeitava as cascas de forma correta e Jean amarrava tudo e "penteava o cabelo".
Enquanto dedicavam-se à tarefa, Luna voltou a contar-lhe coisas. Primeiro, sobre as bonecas de milho e como a prática de entregá-las nas casas durante o Yule traria as bênçãos da Deusa a quem as recebesse. Luna falou que quem costumava fazer aquilo no coven eram as crianças, pois era uma maneira de participarem sem se arriscarem a quebrar alguma coisa ou se queimar.
Depois, Luna voltou a falar sobre seus perfumes. Nessa hora, Jean sentiu um aperto no peito e apertou os dentes, ao mesmo tempo em que inclinava a cabeça e parava o que estava fazendo para prestar atenção no que a jovem bruxa dizia. Ele estava curioso sobre o trabalho dela, sobre como ela fazia os perfumes e sobre suas essências, mas também se sentia frustrado e com inveja por não poder sentir o que ela sentia.
— Qual deles tu usas? — ele perguntou depois que ela enumerou várias fragrâncias que tinha criado. Sabia que usar uma linguagem mais formal evidenciava o quanto aquela conversa o afetava, assim como tinha acontecido quando perguntou se ela queria que ele ficasse ou fosse embora, mas precisava saber. De todas as curiosidades que Luna lhe despertava, seu aroma era o que ele mais queria sentir.
— Fiz para mim uma mistura de tomilho, açafrão e jasmim. Nunca fiz pra mais ninguém.
Jean tentou se lembrar dos cheiros. Fazia muito tempo desde que ele os sentira pela última vez, mas todas as partes do perfume de Luna eram plantas conhecidas e muito usadas. Ele queria saber, mas sua memória não o presenteou com aquela informação. Na verdade, quanto mais pensava nos aromas, menos perto ele chegava de realmente saber qual era a essência de Luna.
— O que acha que cairia bem em mim? — ele perguntou em vez de simplesmente fingir que conhecia o cheiro dela.
— Na verdade, eu não saberia dizer — ela respondeu rindo. — Gosto do cheiro que exala.
Jean levantou uma sobrancelha, mas acabou impedido de fazer uma piada sobre a fala dela quando viu o rubor subindo até as bochechas morenas. Ela sabia que tinha dito algo com duplo sentido e já estava envergonhada o bastante para que ele comentasse sobre o assunto.
Apesar de gostar de ver suas bochechas levemente rosadas, Jean achou melhor acabar com o constrangimento da moça.
— Acredito que seja o meu sabonete. Um amigo criou a linha em minha homenagem, então só uso esse.
— Ah, então eu estaria roubando um cliente se tentasse fazer outro perfume pra você.
— Então apenas finja que vai criar um. Fale-me sobre os cheiros que acredita combinarem comigo.
Luna não respondeu imediatamente, para surpresa de Jean. Ela apenas ficou olhando para ele — para sua boca, mais especificamente. Depois de alguns segundos, ela voltou a olhar em seus olhos, mas só voltou a falar depois de alguns minutos daquela observação.
— Alguém já te disse que você pronuncia muito bem as palavras? Que o jeito como fala é... instigante?
Jean se ajeitou na cadeira e engoliu em seco antes de responder:
— Não. Na verdade, ninguém nunca usou essa palavra para descrever minha fala.
— Eu acho — ela respondeu, voltando o próprio olhar para a casca de milho que tinha nas mãos.
No entanto, Jean não conseguiu responder, nem voltar sua própria atenção para o serviço que ainda estava por terminar. Em vez disso, ficou apenas observando o rosto de Luna, que estava ainda mais avermelhado que antes. Por um segundo, ele sentiu a vontade de dizer que aquele tom de pele ficava muito bem nela e que a tornava instigante também. Mas ele conseguiu se segurar e voltar à tarefa que tinha em mãos.
Pela primeira vez em muito tempo, Jean sentiu que corria algum tipo de perigo. Ele só não conseguia distinguir exatamente que tipo de perigo aquela jovem poderia lhe causar. Mas ele estava curioso. Depois de muito tempo, Jean se sentia... instigado.
*3643 palavras
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