XV - O Karma é uma vadia
De Jennie Kim:
"Não se permitiu sentir nada além de raiva, pois era mais fácil culpar quem quer que fosse por seus erros do que ela mesma."
Jennie andava rápido, tentando ignorar o frio que a atingia e as lágrimas que desciam como cascatas pelo seu rosto, ela já tinha desistido de tentar limpá-las.
Tropeçou algumas vezes pela calçada, se obrigando a respirar fundo quando parou em frente a sua casa. Morava em um condomínio fechado, branco, assimétrico e solitário. Observar esse fato a fez sentir-se ainda mais raivosa, pois só conseguia comparar tudo aquilo a casa de Lisa, cheia de pequenos afetos em forma de elfos na grama, sorrisos grandes e abraços calorosos.
Passou a ponta da saia no rosto, sujando-a de lágrimas e maquiagem, porém não fez muita questão, pelo menos seu rosto estaria apresentável. Foi com as mãos até os cabelos acastanhados, tentando aquietar os fios bagunçados e abriu a porta principal. Jennie suspirou aliviada ao encarar a sala vazia, mesmo sentindo-se cheia demais, não queria estar ali, admitir isso era doloroso.
Não se permitiu sentir nada além de raiva, pois era mais fácil culpar quem quer que fosse por seus erros do que ela mesma. Culpava Lisa por ser malditamente atraente, culpava Jisoo e até os pais, por serem tão frios e autoritários.
Seus dedos foram até o celular, apertava-o tão forte que a palma estava vermelha, os dedos rápidos trabalhavam até um sorriso certeiro crescer em seu rosto. Marcou todas as fotos daquela pasta - que fazia questão de escondê-la para quando tivesse coragem o suficiente para fazer o que queria. Jennie as tinha há algum tempo, quando por um acaso descobriu o que Jisoo tanto fazia nas noites dos fins de semana.
Guardou as fotos para mostrá-las para toda a escola, para tirar a máscara de boa moça que Jisoo vestia todos os dias, mas nunca teve forças para enviá-las, uma parte de si ainda sabia que aquilo seria errado demais.
E até ali, enquanto aquela raiva irradiava em seu peito, não tinha coragem de apertar o botão de enviar e isso a deixava mais frustrada. Se fizesse, não teria ninguém para culpar além dela mesma, além da inveja, futilidade e soberba. Por mais que sua pior parte estivesse torcendo para mandá-las, para destruir a vida de Jisoo de uma vez por todas, Jennie não poderia aguentar sua consciência depois daquilo, não tinha motivos para odiá-la a esse ponto e estragaria todas as chances que pensou um dia ter com Lisa.
Então voltou a fechar o flip do celular, apertando-o novamente na palma da mão e com uma nova frustração na ponta da língua começou a subir as escadas para chegar ao quarto. Rezou baixinho para que seus pais não estivessem lá em cima, queria chorar em paz e não precisar ter que inventar desculpas. Porém, assim que subia os primeiros degraus uma voz aguda chamou seu nome, fazendo-a fechar os olhos com força.
- Onde estava até esse horário?
Seus pés pararam no meio da escadaria e fechou os olhos com força. Não precisava olhar para a mãe para saber que ela tinha os braços cruzados, a encarando de cima a baixo, com aquele olhar que gelava espinhas.
- Na igreja, depois passei na casa de uma amiga, mamãe - sussurrou, ainda de costas, com medo do que viria se encarasse a mulher.
- Esse tipo de roupa não é a adequada para a casa de uma amiga - ditou ela. Jennie apertou com força o corrimão, era uma péssima mentirosa, então se sua mãe a pressionasse mais um pouco era capaz de lhe contar tudo, para se arrepender logo depois. - Me explique isso depois, agora suba, você fez seu namorado esperar demais.
Quase caiu dos poucos degraus que tinha subido quando se virou, encarando espantada a mãe. Seu corpo estava paralisado, de repente tremia da cabeça aos pés.
- Como... assim?
A mãe revirou os olhos.
- Chinhwa está há um longo tempo te esperando lá em cima, enquanto você estava na "casa de uma amiga", agora suba e se desculpe com ele.
O rosto dela se fechou numa carranca, dando-a as costas para rumar para dentro dos aposentos no andar de baixo, deixando Jennie espantada na escada, pensando seriamente em voltar para a rua, mesmo sem ter um destino para onde ir, apenas para não ter que encarar Chinhwa. Ele tinha aceitado aquele termino rápido e tranquilo demais, o conhecia bem o suficiente para saber que ele não era esse tipo de cara.
Subiu o últimos lances de escadas com a certeza que ele não faria nada contra si, estava na própria casa, e se gritasse alto o suficiente a mãe a ouviria no andar de baixo. Com as mãos trêmulas, empurrou a porta do quarto entreaberta, notando o garoto entretido em sua mesa de cabeceira.
- Não me contou que gostava de Friends - disse ele baixinho, sem se virar para encarar Jennie, que por precaução se manteve na soleira da porta. - Mas você não me contou muitas outras coisas também.
Ouviu a risada grossa dele preencher o quarto, trazendo um arrepio que percorreu toda a sua espinha, o garoto se virou para encará-la, caminhando com um sorriso falso no rosto. Jennie sabia que deveria ir embora ou falar algo, mas os pés fincaram no chão e sua mente era um turbilhão de ideias, todas sobrepondo umas às outras, a deixando confusa e assustada.
- O que faz aqui? - tentou soar agressiva, mas só pareceu ainda mais indefesa. Ele delicadamente trouxe Jennie para dentro do quarto, fechando a porta atrás dela. A garota apertava forte o celular em seu peito, a única coisa que tinha como arma se ele tentasse algo.
- Sou seu namorado, por que eu não ficaria aqui? Hm?
Ele aparentava estar calmo, o que só fazia Jennie ficar ainda mais assustada, estremecendo a cada toque das mãos frias em sua bochecha. Nunca sentiu tanto nojo de alguém na vida como sentia por Chinhwa agora, o desagrado que nutria inicialmente se transformou em pura repulsa, fazendo seu estômago revirar em ter a respiração dele tão perto.
- Nós terminamos e... - Não teve tempo de terminar a frase, um puxão nos cabelos a fez gritar, recebendo a mão de Chinhwa pressionando sua boca, abafando o som do grito que soltou.
- Eu decido isso, não você. Nós estávamos namorando e você foi uma puta por ter me traído com aquela vagabunda estrangeira.
Jennie gritava, tentando a todo custo sair daquela situação, as mãos batiam com força nos braços de Chinhwa, mas quando conseguiu se libertar do aperto, ele deu a volta com os braços em torno dela, virando-a de costas para colar seu troco ao dele.
Ela era uma bagunça, a respiração saía desregulada e lágrimas grossas desciam pelas bochechas.
- Agora você vai me ouvir, ok? Sem gritar ou isso pode ficar ainda pior... - Ele tirou a mão da boca de Jennie e ela pôde respirar fundo, cada parte da sua cabeça doía, porém poder respirar livremente sem o tê-lo machucando-a era um alívio repentino. - Você bloqueou meu número então acho que não viu a surpresinha que eu te mandei, mas eu mostro de novo.
E com um puxão, o celular estava nas mãos ossudas do garoto. Jennie só pôde fechar os olhos com força, esperando a risada que viria assim que ele abrisse sua galeria, assim que visse as fotos que ela escondia.
- Olha só o que temos aqui... O que estava planejando, morena? - Chinhwa tinha a boca colada em seu ouvido, deixando sua voz propositalmente rouca, fazendo-a tremular.
- Você não pode me chamar assim...
- Eu te chamo do que eu quiser, prefere "vadia"? - grunhiu. - Não se preocupe, hm? Podemos acabar com dois problemas de uma vez só, o que acha?
Jennie abaixou a cabeça para tentar acertar com força o queixo do garoto, pegaria seu celular e correria para fora daquele quarto, até encontrar a mãe no andar de baixo, até estar longe de Chinhwa. Mas tudo que conseguiu foi mais ofensas dirigidas a si, mais cabelos puxados, dessa vez até sentir o baque do chão, onde soltou uma lufada de ar quando sua cabeça bateu com força no carpete. Por um momento perdeu a respiração, seu corpo parecia mole e letárgico, a dor presente em cada pedacinho de si.
- Aproveite o buss, piranha. Agora é oficial, estamos terminados - disse ele, chutando-a uma última vez antes de sair do cômodo.
Um grito angustiado saiu de Jennie quando o ar foi interrompido pela dor, fechou os olhos, a cólera lancinante do pontapé sendo processada lentamente.
Não abriu os olhos nem quando ouviu os passos dele no corredor, ao longe. Manteve-os bem fechados para que assim a dor sumisse aos poucos, que a humilhação não doesse tanto quando prometia doer.
Jennie também nunca quis tanto morrer como naquela noite, quando viu que as fotos de Jisoo tinham sido enviadas para toda a escola, junto com suas fotos aos beijos com Lisa, no vestiário.
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro