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Destino

De todo meu coração, naquele pequeno pedaço da mente que ainda não se esquecia das coisas importantes, a consciência vagava raciocinando como podia.

E a consciência pensava em muitas coisas, e até aquele momento pensava no destino.
E ela teorizava demais, a mente e a pessoa que a mente pertencia.
Para as duas o destino era dois em um só corpo, unindo âmago e mente.

Já a mente, que pertencia a menina, era mais curiosa. Origem desconhecida, difícil de ser catalogada. Mas se a mente pudesse se catalogar ela a colocaria como a individualidade do homem, a qual todavia não poderia ser coletiva.

Já a alma era outra questão, nunca na vida pensara sobre isso. Aquele incógnito na escuridão. A mente pensava demais na alma, a alma, o âmago, a coisa dentro de cada ser vivente. Não sabia nem mesmo se ela existia de todo modo, não como Luena pensava.

Para ela a alma era apenas sua mente, e a mente era o âmago. E claro, ela pressopunha que o destino era outro termo com insignificância, ele não fazia sentido.

O destino iria matar ela num futuro próximo, dar a ela uma caixa cheia de desgostos talvez, e sobretudo um fio no dedo, que a interligaria infinita e sem volta com outra pessoa a qual não amaria nem em outra vida.

Sobre o prédio a mente vagava no escuro. Os cabelos castanhos escurecidos e enrolados costratavam-se com a luz furiosa do dia. O olhar pesado e de armagura voava entre os prédios espelhados, e a boa vontade sumia mais e mais de iniciar outra manhã.

A face escura, e com os olhos castanhos era de uma pessoa com receios maiores que si, e o sentimento de juntar-se seu coração ao de outro até senti-lo trazia náuseas.

E os dedos gordos e macios, ela pôs-se a colocar frente ao corpo, analisando o que deveria ser um fio dentre toda a pele. O fio vermelho carmezin navegava na melodia cantavel daquele vento, e nele ressoava o futuro insalubre que para ela era seu fim.

Ela não chorou em nenhum momento daquele dia, a única coisa que teve foi pena de si mesma, por não ter uma única e singela oportunidade de escolher. E descobriu que não ter nenhum fio não era de um todo triste, a própria presença poderia ser as vezes reconfortante, ela era sua única amiga na solidão.

E não se sentia sozinha, de todo modo ela tinha mais a quem compartilhar um bom almoço de manhã. Todavia a companhia que tanto aquele fio a ligava não era o modo de relação que ela estava capaz de se colocar. Uma relação não só numa amizade sincera, mas aquela romântica, ou até mesmo carnal. Aquilo não a encantava, e pensar naquilo só dava a ela mais pensamentos em loop. Não a deixava mais feliz, mas sentia-se forçada a encaixar-se numa caixa miúda.

Pegou aquele pequeno pedaço de cetim entre os dedos, sentindo-os bem longe no mundo e chegar a um lugar a qual a noite a levaria. Aquela noite enegrecida, cheia de estrelas que uma a uma perdiam seu brilho naquela imensidão.

Não se atraia e nem se atraiu por ninguém, e se uma daquelas belas estrelas a pedisse para ficar com ela, com toda a certeza do mundo Luena negaria. E, apesar do que pensava, até aquele momento, o que sentia era a mente clamando a companhia da pessoa do outro lado, quase dolorosa.

Não de um jeito romântico, todavia numa amizade. E a curiosidade era a seu principal motivo para ver a quem pertencia o fio.

E quando raiou no outro dia, ela se pôs a procurar por aquele que seria a gêmea de sua alma.

Correu avulsa e ágil por entre os prédios de mesma cor. O sangue pulsava de ansiedade, e os olhos se focavam no fio a sua frente.

O pedaço de cetim a levou num casebre simples, e o corpo amolecido de tanto correr parou eufórico frente a porta daquela casa. O medo era capaz de ser sentindo naquele turbilhão de pensamentos, mas a mão que repousou sobre a maçaneta da porta era a mais corajosa.

E a porta da casa humilde abriu-se, para mostrar que dentro da mesma havia uma familia de três pessoas, e dentre estás o fio passava até chegar em um dos quartos da casa. Elas olharam assustadas a estranha entrar correndo dentro de sua residência, e rápido se levantaram de seus assentos ao pensar que a casa estava a ser assaltada.

Pratos de comida voaram com a agilidade que ela passou por entre a cozinha, pedindo um licença breve a dona que lavava a louça e um desculpa mais diminuto ainda quando viu o fio adentrar por baixo de uma das portas da casa.

Correu avulsa para o quarto, fazendo as dobrinhas da barriga grande e os seios balançarem quando tropeçava em algo dos móveis. Os olhos em vertigem sentiam a adrenalina fluir veloz nas veias, contendo toda a ansiedade na cara fria de sempre.

Os dedos agitados rodaram a maçaneta ansiosos, sentindo ressumbrar na camisa suor da testa.

E ali estava o fio. Sentado comendo salgado e lendo uma revistinha da Mônica. O garoto a observou inerte, com um pequeno aceno de mão, e a face confusa perguntou seu nome, e ela com um sorriso ladino fechou a porta. Pondo-se a sair daquela casa para sempre.

Aquele momento que julgou especial, não á comoverá, e naquele instante como numa epifania, a vertigem e o pendular confuso dos pensamentos em turbilhão se ajeitaram.

Ou melhor, ela finalmente deu-se uma escolha.

Não serviria a convenções que escreveriam seu futuro, ela escreveria por si. Talvez não fosse o dos mais sábios ou apropriados, mas ela se responsabilizaria por si. E não eliminaria mais eles em pró de boato fictício.

Eliminar o sonho é então matarmo-nos. É mutilar também nossa alma que sofre. O sonho é o que temos de realmente nosso, de impenetravelmente e inexpugnavelmente nosso.

E renegar a um destino que ela não compadecia á tornava mais sonhadora, e a partir dai ela não pararia mais.

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