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04 - CENA - 05

A cada passo que Ian dava, parecia que seu coração palpitava mais de cem vezes. Todos conseguiam sentir sua hesitação.

— Quer sentar ao lado dos meninos, Ian? – indagou Marcela, oferecendo-lhe uma válvula de escape.

— Seria legal. – respondeu ele olhando para o chão.

Ian conseguiu ouvir uns risos fracos. Levantou a cabeça e pôde ver Rose olhando-o incrédula, na medida em que, Miriam, com olhos fixos nele, ficava boquiaberta.

— Menina, - sussurrou Miriam. – num é que ele é racista mesmo. – pausou encarando Rose. – Meu Deus... como pode existir gente assim nos tempos de hoje?

Rose pressionou seus lábios carnudos enquanto brincava com a comida em seu garfo.

— E você pergunta pra mim? – lançou ela sem olhar pra nenhum lugar específico.

Miriam que continuava com a boca aberta, fechou-a.

— Tá, - começou ela. – mas vai deixar como está?

— Esse tipo de gente nem merece resposta, Miriam.

— Não poderia concordar mais com você. – falou rápido antes que Marcela chegasse pra sentar perto delas. – Esses tipos não precisam de respostas... precisam ser execrados, humilhados!

Marcela sentou-se ao lado delas. Rose, dando a ela um riso de canto de boca, virou-se para Miriam.

— Tem razão. – levou o garfo a boca. – Que a guerra comece.

Observou Ian apoiar seus glúteos torneados na cadeira.

— Não gosta de negras ou é viado? – soltou no ar. Mas Ian não respondeu. Tentou mais uma vez. – Essa tendência de ficar sempre muito perto dos meninos é um pouco estranho, devo admitir. – Observou ele pegar os talheres. – Pelo menos pra quem si diz ser hetero.

Ian apoiou um lenço sobre o colo e se pôs a comer. Vita tocou-lhe o ombro.

— Ela tá falando com você cara. – sussurrou, mas como todos estavam quietos observando a merda sendo feita, pareceu uma fala normal.

— Tô ouvindo. – respondeu pra que todos ouvissem.

Rose franziu as sobrancelhas.

— Então responde.

Ian mastigou bem a comida e após engolir, bebericou um copo d'água.

— Suas indagações não merecem resposta.

Rose, inspirando fundo, pegou sua taça e lançou o líquido contra ele.

— Você é um filho de uma puta racista! Você merece morrer, seu merda!

Ian se levantou.

— Você que é histérica, sua maluca! E eu que pensava estar apaixonado por você. – deixou escapar num acesso de raiva, mas continuou. – Só poderia está fora de mim mesmo. Doida. – O celular que havia deixado em cima da mesa se pôs a tocar. Era seu irmão, Marcos. Levantou-se e pediu licença a todos. Olhou mais uma última vez para Rose, que estava com cara de perdida, e saiu para atender o celular.

— Fala, irmão.

— Aqui não é seu irmão. – falou o homem do outro lado da linha.

— Então quem é?

— Sou o oficial Gallati, da policia de Lago di Garda. – Ian conseguiu ouvir seu suspiro. – Seu irmão foi morto na noite passada.

Um silêncio tomou conta de sua mente. Parecia que não havia pessoas naquela casa e, nem sequer, que havia brigado a poucos instantes.

— Ian, está na linha?

— Quem matou? – disse mais pra si que pra qualquer outra pessoa. Repetiu. – Quem matou, droga! – Vita, Trotti e todos os outros saltaram de seus bancos. Rose permaneceu parada em seu lugar, estupefata. Não conseguia entender o que se passava. – Responde, merda! – gritou ele novamente.

— Ian, - respirou mais uma vez o oficial. – Sei que é difícil, mas tenha calma, por favor. – testou Ian fazendo uma pausa. Ao ver que ele se manteve calado, continuou. – De acordo com uma testemunha, um padre o matou.

— Tá de sacanagem?! – Ian começava a se incomodar com aquele bolo de gente a sua volta, enquanto ele segurava seu choro. – Por que um padre faria isso? – Ouviu Vita falar alguma coisa sobre padres, mas não deu atenção.

— É isso que estamos tentando descobrir. – esperou ouvir mais alguma indagação, mas Ian permaneceu em silêncio. – Ele só tem você de parente aqui na Itália?

— Sim.

— Certo. Então, quando puder, venha ao necrotério para ratificar se o corpo é realmente dele. – disse desligando o celular.

Ian, depois de alguns segundos com o celular parado no ouvido, permitiu seu braço descer lentamente.

— Meu irmão está morto. – Seus olhos miravam o chão. Não conseguia levantar o pescoço para ver a reação do povo que estava em sua volta, mas conseguia sentir abraços e ouvir palavras que chegavam ao seu ouvido sem forma, mas que sabia que eram profundas em significado. No meio dessas vozes abafadas, outra realçou e ele levantou seus olhos.

— Me desculpe, Ian. – disse Rose. – Por tudo. – Seus olhos brilhavam, mas não era de felicidade. As lagrimas desciam lentamente sobre as curvas da maçã de seu rosto.

— Você não tem nada ver com a morte de meu irmão, Rose. – deixou um leve sorriso sair de sua boca. – Não tome pra si esse peso.

— Eu não sabia...

— Não te julgo. – respondeu ele antes que ela acabasse. – Nunca fui bom em expressar aquilo que sinto. – levantou suas mãos para Rose. – Eu que te peço desculpa. – disse sentindo as mãos macias de Rose juntar-se com as dele.

— Não quero me aproveitar desse seu momento de fragilidade. – disse encarando os olhos de Ian que estavam levantados para os seus.

— Estou me perguntando quando foi que, você estando presente, eu não fui frágil. – Guiou Rose pelas mãos para que se assentasse junto a ele, mas ela acabou sentando em seu colo. Pôde sentir seu coração, mais cedo, frio, esquentar, por conta das batidas que começavam a acelerar. – Meu coração tá batendo mais forte. – disse sorrindo pra ela.

— Consigo sentir. – ela riu.

Vita gritou lá de trás.

— Tô muito triste por você, irmão, mas não vou ficar de vela. - disse saindo da sala.

Naquele momento de choro, o amor fez sair dali uma risada. Deus juntou esses dois no momento certo, era o que pensava Altrícia embasbacada, observando Ian passar os dedos sobre a face de Rose para enxugar suas lágrimas.

— Rose, te amo. – sussurrou ele. Colocando as mãos entre os cabelos encaracolados dela, aproximou-a de seu rosto e esperou que ela prosseguisse.

Rose riu.

— Não acha que é muito cedo pra dizer que me ama? – indagou conseguindo sentir o calor dos lábios daquele homem que lhe segurava o pescoço.

— Acho. – respondeu ele. – Mas meu coração gosta de me pregar peças. – Os dois sorriram.

— Também te amo. – disse encostando seus lábios ao dele.

Miriam assistia tudo aquilo com uma excitação exótica.

— Amo um plot twist em finais felizes. – sussurrou ela pra ninguém em especifico, mas Marcela ouviu.

— Deixa de ser escrota, garota.

Miriam riu mais uma vez, observando aqueles dois, que se odiavam, agora se amar.

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