10. Um milhão de pensamentos
❀ Capítulo 10 | O Som do Silêncio ❀
Fora exatamente na semana de provas que Liam começou a notar que havia algo de estranho com ele. Sua rotina de estudo sempre era a mesma durante a semana: chegava em casa, almoçava com Marcela e Lana, descansava por uma hora e ia estudar para a prova do dia seguinte.
Liam nunca foi fã de matemática. Por isso, era comum sentir-se inseguro ao fazer a prova. Mas, naquela sexta-feira após o intervalo, o garoto sentiu mais que uma simples insegurança. Era a última prova da semana e estava exausto; então, achou que o problema estava na ansiedade de ir para casa logo e relaxar após aquela semana conturbada. Quando recebeu aquelas folhas repletas de problemas matemáticos, sentiu-se tonto. Sua cabeça girou e ele se obrigou a ficar com os olhos bem abertos. Os alunos ao seu redor já estava focados e em silêncio. As janelas estavam abertas e o ar condicionado ligado; entretanto, o garoto sentia-se um pouco sufocado.
- Algum problema, William? - perguntou o professor que aplicava a prova.
- Não. - ele disse, sentindo as palmas de suas mãos suarem. Ele respirou fundo e iniciou a prova. Mesmo sabendo como aplicar a maior parte das fórmulas e resolver os problemas, a sensação de vertigem não passava.
No momento em que, por fim, finalizou a prova - chutando as duas últimas questões, pois não estava mais conseguindo raciocinar - ele entregou ao professor e saiu da sala. Estava cedo e ele teria que ficar esperando até que Lana pudesse buscá-lo. Aquilo geralmente não o incomodava, mas ele queria sair daquele lugar o mais rápido possível. Suas mãos estavam trêmulas e rígidas, e ele não entendia o motivo. Talvez a tensão daquela semana estivesse finalmente se dissipando.
Liam tomou água e ficou o mais longe possível de todos. Sentou-se próximo à secretaria - se passasse mal, poderia pedir ajuda. O tempo parecia não passar. O garoto começou a balançar as pernas, agitado, e olhar as horas no celular a cada minuto. Pensou em ligar para Lana, mas não queria atrapalhá-la caso ela estivesse fazendo algo importante. Quem sabe pudesse mandar uma mensagem.
O aperto asfixiante em sua garganta começou a piorar. Era quase a mesma sensação que teve quando foi pela primeira vez naquela escola fazer a matrícula. O som das vozes, que geralmente eram-lhe indiferente, começou a incomodá-lo. Ele quis tirar a blusa de frio, mesmo com o corpo cada vez mais trêmulo. Mas não podia.
Liam olhou para o celular e abriu o contato de Marcela. Não, ele pensou. Por alguma razão, ele sentiu que tinha que mandar mensagem à Lana; e não à irmã.
Oi. Terminei a prova. Será que teria como me buscar? Eu não estou me sentindo bem, ele escreveu.
Ele segurou o aparelho nas mãos e esperou. As pontas dos seus dedos começaram a formigar. Definitivamente, havia algo de errado com ele. O celular vibrou com a resposta de Lana um minuto depois. Liam soltou um suspiro de alívio quando ela disse que estava próxima.
- Garoto, você está bem? - o porteiro se aproximou, a expressão preocupada.
Liam mal conseguiu responder. Balançou a cabeça em sinal negativo e levantou-se em direção ao portão, cambaleante. Já podia ver o carro de Lana na avenida. Eu vou desmaiar, ele pensou, mas seguiu com passos apressados em direção ao veículo. Ele ouviu a voz do porteiro atrás dele, mas não entendeu uma palavra do que ele disse. Rapidamente, o garoto abriu a porta do carro e jogou-se no banco ao lado de Lana. Os sons de motores, vozes e buzinas da rua foram abafados. Naquele silêncio, ele pôde sentir seu coração bater fortemente em seu peito.
- Liam - ele ouviu a voz de Lana, tão distante que parecia impossível que ela estivesse bem ao seu lado. - Tome isso.
O garoto olhou para ela. A cunhada colocou em sua mão um pequeno comprimido e lhe ofereceu uma garrafa d'água. Liam não havia dito nada a ela, mas não precisava. Lana tinha uma intuição incrível - ou era apenas um conhecimento prévio; ele não sabia dizer.
- O-obrigado. - ele disse, arfante. Engoliu o remédio com dificuldade, mas a água descendo para a sua garganta foi reconfortante. - Eu não...não consigo respirar. Como você...?
- Não importa. - ela disse, segurando a mão dele. - Eu estou aqui agora. Apenas respire fundo.
Liam apertou os olhos e deixou as poucas lágrimas escaparem. Estava indo tudo tão bem... O que ele havia feito de errado? Será que era a maldita prova? Não, não podia ser só uma simples prova. Ele não acreditava que a matemática podia odiá-lo tanto a ponto de jogar-lhe uma praga.
Ele não conseguiu raciocinar. Um milhão de pensamentos começou a invadir sua mente, deixando-o ainda mais vulnerável àquela sensações. Chegara um momento em que ele achou que fosse morrer - a dor em seu peito e impressão que todo o oxigênio do mundo estava acabando era insuportável. A presença de Lana, porém, fez com que tudo passasse mais rápido do que ele havia imaginado. Marcela não teria ficado tão calma - ela sempre se desesperava quando o irmão ralava o joelho quando criança.
Lana deu-lhe um abraço silencioso, e Liam agradeceu-a mentalmente por entendê-lo tão bem. Como sempre, ela não precisou de palavras para compreender o que se passava dentro dele.
❀❀❀
Fora a pior semana da sua vida. As crises de ansiedade pareciam piorar a cada dia e nunca lhe dava trégua. Quando a noite chegava, temia dormir e não acordar mais. Na primeira noite, ele correu para o quarto de Marcela e Lana; como costumava fazer quando tinha pesadelos aos seis anos de idade. Como um bebê assustado, ele se encolheu em posição fetal entre e Lana e Marcela. Trêmulo e suando frio, ele começou a sentir seu rosto e suas mãos formigarem. Novamente, achou que fosse morrer. Lana e Marcela ficaram o tempo todo ao lado dele até que tudo passasse. Mas, mesmo após tudo terminar, seu corpo ainda estava em alerta - como se algo terrível fosse acontecer a qualquer momento.
Liam sentia-se exausto com se tivesse corrido uma maratona. Porém, por mais que tivesse a sensação que tudo piorava, o garoto aos poucos foi aprendendo a lidar com aquilo. Ainda não conseguia compreender o que se passava, pois tudo estava ocorrendo tão bem antes. Há tempos não se cortava e se sentia deprimido a ponto de de chorar todas as noites. Por que estava acontecendo aquilo?
- Por quê? - ele disse com a voz fraca, enrolado no cobertor do quarto de Lana. A cunhada trazia duas xícaras de chá de camomila. Liam nunca gostou de chás, mas Lana conseguia fazer milagres. Com dificuldade, ele se sentou na cama. Suas mãos ainda estavam um pouco trêmulas. - Por que isso está acontecendo?
Lana entregou-lhe uma das xícaras e Liam bebericou o chá morno. Estava doce e fraco, como gostava.
- Sugiro que converse sobre isso com Priscila - ela se sentou ao seu lado. - Mas, ao meu ver, você está sobrecarregado. Você passou por muitas coisas. Às vezes, não compreendemos isso; sobretudo quando as reações chegam quando tudo parece bem.
- E se isso não passar? - perguntou, angustiado. - Eu já perdi uma semana de aula...
- Não se preocupe muito com isso, menino. Você é estudioso e vai se recuperar. Além disso, a coordenação da escola já está ciente. Não se preocupe - ela deu um sorriso e passou a mão no cabelo de Liam. - Você me lembra um garoto que eu gostava quando eu tinha a sua idade. Era tão nerd quanto você.
Liam franziu o nariz.
- Eu não sou nerd. - ele murmurou. - E como você, hum, lidava com o fato de não conseguir... - Liam parou. Falar sobre aquilo com Lana ainda parecia errado. Mas ela apenas abriu um sorriso, nostálgica; e o garoto percebeu que aquilo não lhe trazia dor.
- Bom, ele nem olhava para a minha cara, é claro! - ela riu. - Sabe, Liam...Eu fico feliz que Zoey tenha você.
O garoto franziu o cenho.
- O que você quer dizer com isso?
- Só estou dizendo que é ótimo para ela ter sua amizade - Lana respondeu.
- Acho que não somos amigos - ele disse. - Eu só a ajudei. No começo, admito que não sabia o que fazer. Então eu a ignorava. Sinto-me um idiota por isso.
- Você fez o que estava ao seu alcance. Não se preocupe. - Lana falou, deitando-se ao lado dele. - É uma situação delicada que até eu entenderia.
Liam ouviu a porta da sala se abrir no andar de baixo - deveria ser Marcela voltando do mercado. Liam virou o pescoço para olhar a cunhada.
- Em falar nisso, Zoey não entrou em contato com você? - perguntou.
Lana balançou a cabeça negativamente.
- Não. - ela deu um sorrisinho malicioso. - Mas aposto que vai.
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