O Natal mágico na casa de Antoniel
~-~Especial de Natal~-~
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Era dezembro, e embora a cidade de Orla dos Ventos se aquecesse com o calor típico do verão brasileiro. A mesma se enfeitava com a neve falsa que remetia o frio que ela mesma não dispunha. As casas ao longo da praia estavam decoradas com luzes piscantes, presépios coloridos e estrelas feitas para cobrir o pescoço nu da cidade com pérolas brilhantes.
Naquela noite de Natal, Helena, uma garota de onze anos e cabelos claros, vagava sozinha pela orla. Seus pés sujos, deixavam pegadas na areia enquanto observava as famílias reunidas nas varandas. Ela vestia roupas simples, rasgadas e inadequadas, e seu estômago doía de fome.
Andando entre as casas, a solidão e o vazio a levaram a procurar por algum alimento. Timidamente ela tentou bater em algumas portas, estendendo a mão em pedido. Mas elas se fecharam, uma após a outra.
Sua barriga implorou, mais uma porta se fechou, ela quase chorou. Se não podia comer de suas mesas, então que comece de seus cestos de lixos.
Com o coração pesado e barriga vazia, ela começou a revirar os recipientes em busca de algo comestível. Em um cesto, ela encontrou uma embalagem de panetone amassada, ainda com o aroma doce e frutado que sempre lhe lembrava da noite de Natal. Ao lado, uma caixa de rabanadas quase vazia, com apenas uma peça no fundo. Estas sobras, descartadas, serviriam como um banquete para ela enquanto outras crianças aproveitavam suas ceias fartas em família.
Helena se perguntava como seria ter uma família, compartilhar presentes e histórias ao redor de uma mesa festiva. No momento em que se distraia com seus pensamentos melancólicos um pequeno rato ousou subir pelo seu braço. Ela saltou para trás, assustada, gritou. Com batidas aceleradas do coração e dos braços, ela afastou o ratinho dali.
Com vários sentimentos ao mesmo tempo se misturando, lagrimas caíram de seu rosto, mas ela não as limpou esperando seus olhos desembaçarem naturalmente, nesse meio tempo, ela parou para olhar ao redor. Fixando-se em uma casa que não havia notado antes. Era uma construção de madeira, com janelas escuras, sem nenhuma das decorações luminosas típicas da temporada. A casa parecia abandonada, ela imaginou que pudesse bater e checar se teria alguém que a ajudasse.
Enquanto pensava, a porta se abriu lentamente, como se convidada por alguém invisível. De dentro dela, uma luz pequena e dourada emanava de lá, "O que seria". Helena, ainda tremendo do susto recente do rato, sentiu uma pitada de assombro. Mas sabia que o verdadeiro medo era o de passar a noite naquela dolorosa miséria.
Atraída pela luz misteriosa, ela deu alguns passos em direção à casa. A porta, agora completamente aberta, mostrava um corredor escuro que parecia arrastá-la para dentro. No chão, uma trilha de balas brilhando com uma luz dourada, parecendo pequenas estrelas caídas.
Helena se abaixou e pegou uma das balas. Ao tocar, a luz dourada se apagou, deixando-a com um brilho caloroso nas mãos. Encorajada, ela pegou outra, e mais outra, seguindo a trilha luminosa. Com cada bala que pegava, a luz se extinguia, mas a sensação de conforto crescia.
O chão de madeira rangia sob seus pés, e as paredes estavam cobertas por quadros antigos, retratando paisagens e rostos que pareciam observá-la com uma espécie de afeição.
Ao final do corredor, Helena encontrou uma porta entreaberta, de onde a luz dourada parecia mais forte. Empurrando-a, ela entrou em um cômodo que parecia um mundo à parte. Era uma sala de estar espaçosa, com móveis antigos, mas bem cuidados, e uma grande árvore de Natal no canto, suas luzes piscando em um ritmo hipnótico.
O que mais chamou a atenção, no entanto, foi a lareira acesa, em frente à qual havia uma poltrona ocupada por uma pessoa que olhava com gentileza para ela. Era um idoso, com cabelos brancos ao lado de um saco vermelho que brilhava com uma luz que lembrava as balas douradas em seu interior. A sua frente, uma mesa estava posta com uma variedade de doces e bolos, emanando um aroma delicioso que enchia a sala.
"Venha aqui minha Helena."
Surpresa pelo desconhecido saber seu nome, ela congelou suspeitosa, mas havia algo na voz dele, no ambiente e no cheiro que a fez se sentir levemente segura. Então ela se aproximou mais dele, ainda segurando as balas apagadas em suas mãos preparada para correr a qualquer sinal de perigo. Quando chegou mais perto, ela perguntou. "Quem é você?"
"Quem sou eu? meu nome é Antôniel. E esta é a nossa casa."
"Nossa casa?" repetiu ela.
"Sim. Nossa casa", confirmou, mas não havia sido Antoniel, e sim uma voz que veio de trás dela, virando o rosto, ela pode ver um homem adulto com alguns fios brancos na cabeça e na barba curta.
"Helena, este é meu filho, José." Disse Antoniel.
José se aproximou de Helena, estendendo a mão em cumprimento. "Bem-vinda à nossa casa. Eu estava ajudando meu pai com alguns preparativos para esta noite."
O homem velho acenou pedindo para Helena e José se juntarem a ele ao redor da mesa repleta de doces. "Nossa casa tem o poder de sentir a necessidade das pessoas e de trazê-las até aqui. Hoje, sentiu a sua necessidade, garotinha."
José, não conseguindo conter seu entusiasmo, completou: "É verdade! Uma vez, a casa transformou um jardim em um campo de girassóis para um pintor que havia perdido sua inspiração. No dia seguinte, ele pintou o quadro mais fantástico que já vi. E ele está ali!"
O homem apontou para um quadro atrás deles. Estava em uma parede de madeira que suporta um quadro de moldura dourada de diversos símbolos. Na imagem um campo de girassóis parecia infinito indo de encontro aos três sois no céu da pintura.
Helena, sentando-se na mesa, perguntou: "A casa fez isso sozinha?"
"Sim," José afirmou sentando-se também. "teve a vez em que transformou o sótão em uma biblioteca para uma jovem escritora. Ela saiu daqui com um novo livro inteiro escrito!"
"Mas o mais importante", disse Antoniel " É que hoje é a noite em que a magia da casa se torna mais forte. A noite em que podemos realizar desejos."
Ele se levantou e foi até a árvore de Natal. Ele retornou com um pequeno pacote embrulhado em papel dourado. "Vamos, abra, Helena. É para você."
Helena, emocionada, aceitou o pacote. Ao desembrulhá-lo, encontrou uma pequena estatueta de uma baleia dourada. "O que é isso?" perguntou.
"É um amuleto mágico", explicou José. "Ele lhe dá a chance de fazer um desejo, um desejo de Natal que a casa ajudará a realizar."
Helena examinou a estatueta, quando uma melodia suave começou a tocar na sala. A música era doce e encantadora, vinda de algum lugar além das paredes. Então, de uma porta lateral, surgiu uma mulher elegante na faixa dos quarenta anos.
Ela entrou cantarolando graciosamente. Os cabelos dela, eram brancos como a neve, brilhando à luz do fogo da lareira. Ela se movia de um jeito que dava vida à música. José se levantou com um sorriso encantador. Estendendo a mão e a convidando para dançar. Ela chegou perto dele e o tirou da cadeira. Então de repente, eles começaram a girar pela sala, movendo-se em harmonia como se estivessem flutuando.
Antôniel observava sorrindo. "Helena, esta é Maria, minha nora. Ela e José têm um tipo especial de magia quando dançam juntos."
Enquanto Helena assistia, fascinada, a sala pareceu transformar-se. As paredes e o teto desapareceram, se transformando em um céu estrelado, e o chão se tornou uma superfície de água calma e espelhada. Maria e José pareciam dançar entre as estrelas e sobre as águas, em um espetáculo de pura magia e beleza.
A música aumentou, e novas sinfonias começaram a tocar, uma tão encantadora quanto a anterior. Todos na sala olharam para a água espelhada em seus pés, onde uma silhueta começou a emergir.
Helena tentava discernir o que estava nadando por baixo de seus pés, até que percebeu que se tratava de um jovem, talvez da mesma idade que ela, com cabelos que brilhavam sob a água. Metade do seu corpo era de um peixe, com escamas cintilantes, das cores do arco-íris. Ele se movia de um lado para o outro, como se quisesse brincar, pulando as vezes por cima da superfície.
"Arthur, filho, venha" chamou Maria parando de dançar com a música parando junto com ela.
Arthur tirou a cabeça para fora da água que parecia sólida para os outros, mas líquida para ele. "O que foi mãe?"
"Temos visitas" Antoniel disse. "ela se chama Helena"
Arthur se aproximou dela, sorrindo. "Helena?"
A garota observava Arthur com curiosidade. "Você... você é metade peixe?"
O menino concordou, um som tão melodioso quanto a música que ainda tocava. "Sim, você não?"
"Não" ela, ainda estava maravilhada. "como tudo isso é real?"
Antôniel acenou com a cabeça. "Vamos dar uma voltinha para celebrar o Natal Helena, e daí explicamos tudo.
Então ele assobiou, e para a surpresa de Helena, duas magníficas baleias douradas emergiram das águas, trazendo consigo um barco de madeira pintado de vermelho com enfeites brilhantes.
"Há, e este é o meu Barco," explicou o velhinho. "Ele e as baleias vão nos levar a qualquer lugar."
Helena olhava, boquiaberta. "Nós vamos viajar para onde?"
"Você vai ver," respondeu José subindo no barco com Arthur no colo.
Logo em seguida, todos embarcaram, Helena olhando para o cenário ao redor, subiu a bordo por último. Então, as baleias começaram a mover o barco suavemente, deslizando através das águas daquela antiga sala. Nem parecia que eles ainda estavam dentro de uma casa, e talvez não estivessem mais, pois neve começou a cair e o céu a brilhar com auroras boreais que apareciam pintando o horizonte. "Seria esse o Polo Norte?" pensou ela.
Enquanto o barco deslizava, eles avistaram um coro de bonecos de neve, cada um com um cachecol colorido e um chapéu diferente, cantando melodias natalinas com vozes doces e harmoniosas. Helena sorriu, completamente encantada, enquanto Arthur batia palmas ao ritmo da música.
Conforme se aproximavam de uma colina coberta de neve, viram uma cidade de iglus iluminada, onde pequenos duendes trabalhavam alegremente, construindo brinquedos e preparando presentes. Eles pararam para saudar o barco.
Helena, observando tudo isso, sentiu uma sensação de pertencimento e maravilha. Ela se virou para Antôniel e perguntou: "Eu estou sonhando?"
"No mundo da magia, querida Helena, sonhar e a realidade muitas vezes se entrelaçam."
Ao ouvir aquilo, ela percebeu que as auroras boreais mudaram de cor, para uma tonalidade vermelha brasa. Ao olhar para cima, imagens começaram a aparecer dentro das luzes, como se o céu fosse uma tela gigante.
Imagens vívidas de Orla dos Ventos apareceram. Famílias dentro de suas casas, algumas discutindo, outras com crianças desinteressadas em seus celulares e videogames. Havia também famílias incompletas, com lugares vazios à mesa de jantar. Entre as imagens, Helena reconheceu rostos de pessoas que haviam fechado a porta em sua cara mais cedo, pessoas que estavam presas em suas cenas de solidão e desunião. Arthur, do lado da garota, exclamou um "há não".
Antôniel na frente de todos, disse: "Às vezes, as pessoas se esquecem do espírito do Natal."
Enquanto o barco continuava, as imagens foram desaparecendo, mostrando o céu noturno sem luz, deixando tudo apagado ao redor. "Se isso continuar acontecendo, nosso mundo não vai ..." Maria não conseguiu completar.
Helena olhou para dentro do barco, notando um fenômeno estranho. A calda de Arthur começou a se transformar em pernas humanas, mas, de repente, reverteu para a forma original de cauda. Helena observava confusa, enquanto Arthur parecia frustrado com a transformação interrompida.
"As transformações de Arthur mostram o equilíbrio entre nossos mundos. Quando estamos em harmonia, ele pode nadar livremente. Mas quando há desequilíbrio, como agora, o seu dom fica instável." Antôniel disse.
Helena olhou para Antôniel espantada. "Não é justo. As pessoas precisam saber que vocês existem."
Ele suspirou, "A magia da nossa casa e da nossa família é forte, mas depende do amor e da união das pessoas."
José interveio, "É por isso que a noite de Natal é tão importante para nós. É a noite onde podemos reforçar essa magia."
Helena, apertando a estatueta da baleia dourada em suas mãos disse. "E se eu fizer um desejo para unir as famílias?"
Antôniel balançou a cabeça afirmativamente. "Poderia funcionar, mas você usaria o seu desejo por nós?"
Helena olhou para toda a família entristecida no barco, "Sim"
Toda família observava a garota com a estatueta dançando entre os dedos, ela fechou os olhos e desejou para que as famílias de Orla dos Ventos, e em todos os lugares, encontrassem a união outra vez.
Uma luz fraca e esverdeada envolveu a estatueta, e as auroras boreais no céu começaram a brilhar mais intensamente, transformando-se em uma miríade de cores frias.
"A magia está funcionando," disse Antôniel, com um sorriso de alívio. "O equilíbrio e as famílias estão bem."
Uma luz forte jorrou do céu, e as imagens mudaram. Agora, mostravam cenas de famílias em Orla dos Ventos reunindo-se, abraçando, rindo e compartilhando felicidade. As imagens de solidão e desunião haviam desaparecido.
Helena sentiu lágrimas de alegria escorrendo por seu rosto. "Mas... e eu?"
Maria se aproximou e colocou um braço ao redor dos ombros de Helena. "Você não está sozinha, querida. Você nos encontrou e nos ajudou."
Antôniel assentiu. "Nossa casa não apenas sente a necessidade das pessoas, mas também sente a família. Você pode ser parte dela Helena, é só você querer."
Ela olhou para eles, incrédula. "Vocês... querem que eu fique?"
"Sim." respondeu José, sorrindo. "você pode ficar"
Helena olhou ao redor, as paredes da casa mágica começaram a surgir novamente, ela voltou a olhar para a família com um sorriso que iluminou todo o seu rosto.
"Eu... eu adoraria."
Ela se sentiu feliz e radiante. Todos da família comemoraram com gritos e abraços. Naquela noite, enquanto a casa celebrava a união e o amor, Helena encontrou um novo lar. Ela não era mais uma criança perdida nas ruas, mas um membro amado de uma família extraordinária.
Uma história de Helena Castro
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