39. Raízes Corrompidas
Aturdido como quando detetive, Mendes acreditava ter gastado muito de seu tempo atrás de uma pista falsa.
— Estão finalmente de partida? — Do outro lado da mesa, Soares pergunta a Mendes.
— Se eu soubesse da outra ampulheta nem estaria aqui.
Irritava-o saber que teria evitado uma série de problemas se tivesse se atentado mais as especificidades do artefato. Enquanto isso, ao lado de Antônio, Aurélia mirava as mãos de Mendes sem conter a ansiedade.
— Vão devolver a ampulheta a mim agora?
Ele estava incerto ainda, mas deu sua palavra que devolveria.
— Acho que sim, não tem mais para que ficar com ela...
— Não! — Isadora se apressa antes que ele decidisse. — Eles fizeram isso de propósito, não vê? Sabiam que essa ampulheta não nos ajudaria. Queriam que você a usasse só para fugirem de nós, já que quem voltaria no tempo seria ela. — Apontou Aurélia que rebateu:
— Estou tão surpresa quanto vocês!
— Você mesma disse a ele: "Está fazendo isso errado". Sabia que não funcionaria.
Aurélia não respondeu, já que uma das empregadas, a mesma que antes havia feito uma careta a Isadora e Mendes, entrou pela sala.
— Estou interrompendo algo, senhora?
Aurélia a olhou suave — Não atrapalhou em nada. Na verdade, chegou na hora certa. — Ela apontou para o chão onde Mendes havia derrubado conhaque. — Parece que o convidado não sabe beber.
A empregada lançou a mesma expressão rude a Mendes, que a mirou de volta sem dizer nada.
— Pode limpar esse chão, por favor? — Pediu Aurélia.
A empregada não pareceu à vontade, e se aproximou de vagar, pedindo a Mendes que levantasse os pés. Quando ele o fez, ela agachou-se para passar o pano e era como na janela, ela o deslizou com força, exageradamente rápido. E quando finalizou, levantou um dos joelhos para se levantar, mas Aurélia a repreende:
— Não, ainda não está bom.
A outra olhou para o chão, e com uma cara de desânimo baixou o joelho recém erguido dando mais algumas esfregadas no piso.
— Mais rápido.
Ela aumenta a velocidade.
— Tem respingos próximos a mesa... não, não, neste canto... isso continue aí...
— Já está bom? — ela retira o pano para que ela enxergasse.
— Sim, sim, está perfeito.
— Estou livre para descansar?
— É claro que não. Deve limpar as janelas direito do lado de fora. Consigo ver as marcas a distância.
A empregada acenou descontente. — Claro... então... me dê licença.
Mendes a vê afastar-se envergonhado por ter derrubado o líquido e, com pena de imaginar o quão explorados os empregados eram pela "Dona Aurélia". A mulher provavelmente os fazia trabalhar sem descanso, visto o tamanho da casa, o número de empregados e seu perfeccionismo exacerbado. Quando o contorno da moça some, Aurélia retoma:
— Voltando ao assunto eu não sabia os detalhes da ampulheta. Foi um mal-entendido.
Mendes balança a cabeça. — Mal-entendido pode ter sido eu quase entregá-la a vocês.
— Como assim?
— Vamos encontrar a outra ampulheta, voltar ao nosso tempo e depois devolver essa para vocês. Assim, não tem como nos enganarem.
— Eu não vou sair em uma caçada com vocês! — Antônio retrucou.
— Vão sim. Porque os Perpétunos ainda estão a sua procura. Os rebeldes estão contra vocês. Se continuarem aqui, eles os encontrarão e já sabem o que farão. Precisam ir para longe e, de preferência, com a ampulheta.
Antônio bufou, passando os olhos para Aurélia. — Não podemos fazer nada? Vamos ter que ir com eles?
— Bom, eles têm a ampulheta, estão nos caçando. E que diferença faz? Já íamos sair de qualquer jeito.
— E para onde vamos? — perguntou ele, resignado.
Isadora tomou a frente — Conhecemos um local, uma cidade pequena com um farol e praias desertas, onde ela pode estar.
Antônio contemplou o vazio, pensativo. — Um farol antigo e praias desertas...
— Esse lugar fica muito longe daqui? — Aurélia perguntou.
— Não se irmos pelo mar. — disse Mendes. — Se me der uma bussola, eu nos levo para lá. Pela localização de Várzea, o lugar deve estar a nordeste.
— Não é possível... — Antônio esfrega o rosto.
— O quê?
Antônio suspirou — Está indo para o mesmo lugar que nós. O lugar que tem o farol e praias desertas. Mas não fica a Nordeste, fica ao norte, quase a Noroeste.
Mendes arregalou os olhos. — Está me dizendo isso mesmo?
— Não é coincidência — disse Isadora. — Como conhece esse lugar?
— Nós sempre mudamos de lugar. Ali era o próximo ponto que íamos. É um lugar isolado, difícil de chegar por estrada, mais fácil por transporte marítimo. Já faz alguns anos que desviei investimento para lá. Fui eu quem mandou construir aquele farol.
— Ainda não consigo crer. — Comenta Isadora.
— Não sei como sabem de lá. Há poucos moradores, e estava trabalhando para me esconder com minha esposa e meu filho por um tempo. Achávamos que as coisas tinham melhorado aqui desde que voltamos da Alemanha, mas nunca desistiram de nós. Arrumamos briga com muita gente, e não quero que meu filho cresça inseguro.
— Vocês voltaram da Alemanha há pouco tempo? — Mendes intrigou-se.
— Voltamos pouco antes da guerra se intensificar. Fomos sucedidos por lá. É fácil conseguir dinheiro quando se pode prever tudo. Você nunca erra.
— E então a guerra atrapalhou seus planos, e tiveram que voltar? — Mendes especulou.
Aurélia balançou a cabeça lentamente. — Nunca houve guerra alguma.
— Como não?
— O mundo nos cobrou de volta. A ampulheta que nos deu riqueza, causou a própria guerra. Não me orgulho em dizer que Hitler não era ninguém até que, sem querer, eu o tornasse alguém.
— O que você quer dizer com isso? — Mendes questionou.
— Usamos a ampulheta para manipular eventos, prever o futuro, evitar perdas e acumular riquezas. Em uma das previsões, vi uma oportunidade de investir em uma empresa de comunicação em Berlim. Acreditei que isso traria ainda mais prosperidade para nós.
— E o que isso tem a ver com Hitler? — disse Mendes sem piscar.
— A empresa se tornou uma plataforma de propaganda poderosa. Sem saber, financiamos campanhas que apoiaram algumas figuras, incluindo Hitler. Já me culpei muito por isso. Tantas mortes e desastres. Depois me perguntam como consigo lidar com os desabrigados. A verdade é que é fácil, quando já se tem uma lista de mortos na consciência.
— Eu jamais imaginaria... quer dizer... Vocês nunca tentaram consertar? — Isadora perguntou.
— Claro que tentei. — Aurélia riu amargamente. — Mas quanto mais tentávamos corrigir os erros, mais problemas criávamos. O tempo não é algo que se manipula sem consequências. Cada ação tem uma reação, e nós desencadeamos uma série delas.
— E como eu disse, voltamos da Alemanha antes que a guerra se intensificasse — complementou Antônio — mas o estrago já estava feito. Nossa riqueza não era mais uma bênção. A guerra era inevitável e tudo por causa das nossas interferências.
— E agora vocês querem dar um tempo? — Mendes concluiu.
— É mais um dos motivos de querermos sair. — Antônio pronunciou. — Queremos encontrar um lugar para nosso filho crescer em paz, sem que nossos erros nos persigam. Mas parece que o destino nunca nos deixará em paz.
Era inimaginável que mesmo com todos os problemas somados que a ampulheta Causou a Arthur ou Mendes, nada chegava aos pés daquela história de Aurélia como guardiã. Mesmo assim, ele não a colocava no papel de vítima, ela foi obcecada e gananciosa. Mas sabia que aquele não era um critério da ampulheta. Com boas ou más intenções, o objeto poderia fazer o portador pagar pelas alterações temporais do mesmo jeito, a questão é que ela não vinha com nenhum manual, a não ser experiências trocadas entre os que a conheciam e temiam.
Mendes não ousou cruzar seus sentimentos de raiva e usou sua voz confiante para perguntar — Já estão com as coisas prontas?
— Nem tudo — disse Antônio.
— Então arrumem o que falta. Vamos sumir daqui o quanto antes. Quando pretendiam ir?
— Aproximadamente em três dias.
— Então vamos levar a ampulheta conosco e voltaremos nesse tempo. Se forem sem a gente...
— Nos encontrariam de qualquer jeito agora. — disse Aurélia.
Mendes percebendo que toda areia já estava na base do lado seguro diz:
— Sim. Encontraríamos de qualquer jeito.
~-~⏳~-~
Assim que saíram da casa de Antônio e Aurélia, encontraram Kaimbe esperando do lado de fora. Ele estava preocupado e Mendes e Isadora lhe contaram o relato de tudo que acontecera. Ao saber que o casal iria com eles, Kaimbe ficou estressado. Esperava assim como eles que tudo se resolvesse já naquele mesmo dia, mas demoraria mais um tempo para a resolução ocorrer.
Nos três dias seguintes, o grupo se preparou para a viajar a antiga Orla dos Ventos. Durante esse tempo, Isadora ficou responsável por cuidar da ampulheta como a guardiã que fora designada, enquanto Kaimbe, passava o período a seu lado, parecendo encontrar um momento de liberdade para expressar seu amor por ela, sem os impedimentos que os separavam antes em sua aldeia.
Eles antecipavam que, uma vez que tudo fosse resolvido, Kaimbe teria que voltar para os Wanakauas, e a distância entre eles como casal se restabeleceria. Então aproveitaram o máximo a união, antes que o futuro ousasse separá-los.
Mendes acreditava que depois de tudo que passaram, ambos poderiam ser bem-vistos como casal, uma vez que resolvessem a questão da ampulheta. Assim finalmente poderiam ser livres em seu lar na floresta. No entanto, Isadora tinha uma visão diferente. Ela não queria voltar. Estava convicta de que sua presença como guardiã do tempo representava um risco constante para os indígenas, e ela não queria trazer perigo à sua comunidade novamente. Estava inquieta com o que faria e Mendes tanto quanto, incapaz de se concentrar em qualquer tarefa que fizesse.
Tentou organizar suas roupas em sequência nas gavetas; ficou parado na sala vermelha, observando fotos penduradas e até tentou calcular quanto dinheiro teria para se sustentar sem um emprego, mas a falta de Paulo o fez derrubar a pilha de roupas, rasgar as fotos dos varais e atirar a caneta longe, frustrando-se ainda mais, ao ver que suas finanças ficariam em zero em poucas semanas.
Ansiava que em dois dias levasse Arthur a seu tempo, mas a sua própria situação o atormentava: sem dinheiro, sem emprego, procurado pelos Perpétunos e sem um objetivo claro. No rádio, naquele mesmo dia de espera, notícias sombrias:
"...A rebelião ocorreu no dia de ontem e resultou em várias mortes e muitos desaparecidos..."
Relatos dos familiares angustiados tentando reconhecer os corpos de seus parentes eram perturbadores. Poucos operários sobreviveram e muitos moradores morreram durante a fuga. Isadora, estava próxima e, conformou Mendes, colocando sua mão em seu pescoço, assegurando-lhe o bem.
No terceiro dia, todos arrumaram-se para a partida. Era hora de navegar. O barco de Antônio e Aurélia estaria pronto, e eles também. As malas do casal estavam feitas, os mantimentos de todos preparados. Eles se juntaram a Antônio e Aurélia em sua casa e foram de lá direto ao cais. Abandonando os arrependimentos naquela cidade e partindo para um refúgio onde quedar-se-iam tranquilos e seguros.
Mendes, Kaimbe e Isadora impressionaram-se com o veículo marinho flutuando na água. Ele era bem equipado e media cerca de 15 metros de comprimento. Além de um casco de madeira reforçada, pintado de branco com detalhes em azul-marinho. Havia espaço suficiente para acomodar confortavelmente o grupo e armazenar todas as suas provisões e pertences.
Kaimbe ajudou Isadora a subir a bordo, seguido por Mendes que havia lhe dado sua bolsa de couro, para que levasse a ampulheta junto ao corpo. Antônio e Aurélia foram os últimos a embarcar, mirando a cidade de Várzea com suas casas velhas e ruas esburacadas. Antônio mostrou aos novatos as áreas do veículo. Por dentro era tão impressionante quanto. No convés, havia um pequeno salão coberto, onde poderiam se abrigar do sol e da chuva, além de uma área ao ar livre com assentos de madeira e varas de pescar. Abaixo do convés, o barco possuía duas cabines: uma maior e outra um pouco menor. Ambas as cabines eram simples, com beliches, armários embutidos e pequenas janelas que deixavam entrar a luz natural.
Kaimbe e Antônio ficaram distantes um do outro tanto no pequeno tour quanto depois dele. No entanto, Mendes esperava que suas desavenças não atrapalhassem a viajem devido ao espaço que teriam acesso.
Uma vez que todos os pertences estavam guardados, Aurélia apressou Antônio para que partissem logo. Cada um se apoiou na borda do barco, observando a cidade de Várzea e a divisa entre o mar e a terra.
O motor roncou suave enquanto eles se afastavam do cais. Antônio assumiu a roda do leme enquanto Mendes observava as águas se afastando lentamente da costa. As ondas criavam uma trilha atrás. O som do motor e do mar, faziam melodias para acalmar seus nervos. Ao olhar para o lado, viu Kaimbe de olhos tão secos sem piscar, mirando o mar hipnoticamente, enquanto Isadora estava abraçada a ele, os cabelos dela flutuando com a brisa marítima criando uma lembrança nostálgica.
Os ventos que refrescavam as memórias de Mendes, o aproximaram de Helena quando essa admirava o oceano junto a ele. Não dum jeito íntimo, mas perto o suficiente para que ele sentisse seu cheiro de sal marinho e algo floral. Lembrava-se das conversas e das risadas, causando aperto em seu coração, levando-o a desviar o olhar.
Decidiu explorar o interior do barco e afastar a melancolia. Atravessou o convés, com a madeira sólida sob os pés, vendo de canto, Aurélia, sentada com as mãos na barriga, os olhos fechados, como se estivesse se concentrando no movimento do barco e no próprio interior.
Em um movimento automático, ele foi andando em direção à outra parte do barco. E enquanto caminhava, o sol saiu por de trás de uma nuvem, tingindo o transporte com tons dourados do entardecer.
Mendes chegou à cabine do piloto, onde encontrou Antônio concentrado no caminho, as mãos fechadas na roda do leme. A luz do sol poente, acentuando suas linhas. O homem parecia em seu elemento; focado, seguro e experiente.
— Este motor a diesel, qual a capacidade do tanque de combustível? —Mendes apoiou-se no batente da porta da cabine enquanto o outro levantava a cabeça.
— Hã...? Cerca de 300 litros. É suficiente para a viagem — Antônio puxou uma bússola.
Mendes entrou na cabine, ainda observando os instrumentos. — E a velocidade máxima? Já verificou as cartas náuticas?
— A velocidade máxima é de 12 nós, mas prefiro manter uma média de 8 para economizar combustível. Temos cartas náuticas atualizadas e a bússola está calibrada.
Mendes concordou. — Para que você usava este barco? Quero dizer, não devia ter muito tempo para navegar.
Antônio levantou as duas sobrancelhas. — Este barco é principalmente para viagens, como esta. Mas eu também tenho outros barcos, que estou deixando. Usava-os para transporte de materiais para a empresa. Gostava de ser Capitão, fazia parte do meu trabalho, mas não precisava fazer isso. Era algo que nunca me cansava.
— Então você era capitão de seus próprios barcos?
— Sim — respondeu Antônio, ajustando o leme cuidadosamente. — Sempre gostei do mar. Mesmo antes de conhecer Aurélia.
— Sei. Eu pelo memos, me sinto mais calmo enquanto navego.
— Gosta de barcos?
— Me deixe sentir um pouco deste, e saberá?
— Talvez mais tarde tenha a oportunidade. — Antônio recusou com uma risada seca — Mas estou impressionado. Você sabe bem. Deve ter herdado mesmo alguns dos talentos meus afinal.
— Então acredita na história do bisneto?
— Talvez. Mas quanto menos coisas eu souber sobre o futuro, melhor será para nós dois.
— Talvez eu tenha falado de mais.
— Pelo menos, sei que se tenho um bisneto significa que meu filho irá crescer bem. É isso que importa.
— Estranho que ele vá se tornar meu avô.
— E é estranho que você seja meu bisneto, mas você não me vê reclamando.
— Certo, certo. — Mendes lubrificou os lábios — E já sabe qual nome dar a ele?
— Eu creio que já deva saber.
— É, mas nunca se sabe. Meu primeiro nome quase foi Carlos, o mesmo nome do meu pai. Mas depois que ele partiu, minha mãe decidiu que seria Sérgio. Não tinha um motivo específico para isso, ela só achou que combinaria.
— Seu pai abandonou uma mulher grávida?
— Sim. E alguns anos depois... ela acabou falecendo.
Mendes se abriu e, as linhas de Antônio inverteram-se no instante em que a notícia fora decodificada, respondendo a primeira coisa obvia que veio à mente:
— Sinto muito.
Ambos voltaram a ficar em silêncio observando a paisagem cuja nuvem passou pelo sol em um piscar demorado, caçoando da escuridão que falhara em cobrir o dia. Antônio interrompeu a beleza silenciosa, respondendo a uma recente pergunta abandonada:
— Se for uma menina terá o nome da mãe e meu sobrenome: Aurélia Augusto Soares.
Mendes abriu um pouco os lábios, quase esperando com que o som saísse sozinho. — É um nome bonito. Se for menino terá seu nome também?
— Sim. Antônio Augusto Soares.
Mendes não podia dizer. Mas no futuro o nome do seu avô não contaria com o sobrenome Soares. Em algum momento, Antônio e Aurélia decidiriam dar ao filho o sobrenome Menezes, que passaria ao seu pai e por último a ele que se segurou para não revelar. Em vez disso, apenas sorriu.
— Você mencionou querer sentir o barco — disse Antônio, estendendo a mão para Mendes. — Seja rápido.
Mendes não recusaria, suas orelhas coçaram até que se movesse para a posição de comando, tocando a direção e, tendo de volta a sensação de conexão com algo maior do que ele mesmo. A sombra nas águas ia e voltava no brilhar nas nuvens no alto.
— Onde está a bússola? — Mendes pergunta, sem desviar curso.
Antônio abriu os dedos e a entregou ele. — É um modelo confiável. Mantenha a proa no rumo certo.
— Certo. E o mapa?
Antônio desdobrou-o detalhado da costa, apontando para um ponto específico. — Estamos aqui — disse, indicando um ponto próximo à Várzea. — E precisamos chegar aqui — mostrou um pedaço de terra isolado mais ao norte.
— Entendi. Vamos seguir nessa direção até alcançarmos a costa. A partir daí, navegamos ao longo dela até chegarmos ao farol.
— É, mas não se anima, porque sou ciumento com meu barco.
O outro quase completou um sorriso. Mas não conseguia evitar, foi abatido pelas lembranças que o cortavam como guilhotina: viu novamente Paulo levando um tiro e caindo com o sangue escorrendo pelo chão. Suas mãos tremeram, e com isso, perdeu momentaneamente o controle do leme, fazendo o barco virar com força.
Antônio o agarrou imediatamente, forçando para ajustar o curso outra vez. — O que está fazendo?
— Eu? — Mendes pisca rápido. — Há, eu... Lembrei de alguém.
— E precisava nos matar por isso?
— Não, o pensamento se tratava de um bom amigo.
— Ele deve ter sido um ótimo amigo para fazer você perder o controle dessa forma.
Antônio voltava a assumir o controle do barco, e Mendes a perder o controle de si. A raiva que sentia, brotou gradual, fazendo-o sentir-se preso numa caixa pregada por todos os lados.
— Ele foi morto no dia da demolição das casas.
— Entendi. E... Você acha que eu sou culpado? Se for isso, para começar, vocês nem deveriam estar lá!
— Para começar, você pode não ter atirado a bala, mas contrataram os Perpétunos que atiraram nele!
— Francamente, ninguém esperava por isso. O lugar estava seguro.
— O único seguro era você em sua casa.
— Fala como se conhecesse essa gente.
— Eu conhecia uma mulher que morava lá, ela tinha um filho, como o mesmo que você quer proteger. Ela não tinha marido e agora eu nem sei se estão vivos.
— Terminou?
— Não. Os seguranças que a sua empresa contratou bateram em desabrigados. Não seja inocente perto de mim.
— Não sou inocente, mas acha que eu queria que as pessoas morressem?
— Mas morreram, assim como milhões na guerra que foi cúmplice. Você tenta proteger seu filho, mas e os dos outros? Quem os protegeu?
— Não importa! — ele largou o leme com força, virando-se de costas para ele. — O meu sangue ainda será prioridade.
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro