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11. A Esperança no Fim da Trilha



Kaimbe soltou um gemido contraindo o rosto, mas continuou a cooperar, forçando as pernas a se moverem até eles alcançaram a trilha. Quando finalmente chegaram, Mendes ajudou Kaimbe a sentar-se contra uma árvore. Ele estava atordoado, a respiração irregular e seu rosto assumindo uma coloração cinzenta e abatida. Isadora se afastou para recuperar o jarro que tinha deixado perto de outra árvore.

Ela se afastou e se abaixou, segurando-o com delicadeza, como se tivesse medo de que qualquer movimento brusco pudesse derrubá-lo.

Kaimbe, embora parecesse estar aguentando, apertava olhos de um jeito que traía sua verdadeira condição. Ele seguia Isadora à distância enquanto ela abaixava-se para pegar o Kashiri.

— Como você está? — Mendes perguntou.

Kaimbe virou-se para ele enquanto se esforçava para sentar-se. —Respirando.

— Aguenta mais um pouco.

Ele fez um gesto concordando enquanto Isadora retornava com o recipiente seguro em mãos.

— Preciso levar o Kashiri. — Disse ela.

Mendes limpou o suor a testa, entendendo o recado. — Está bem, eu vou com ele.

O trio iniciou então a cuidadosa caminhada de volta à aldeia. Isadora a frente, seguida de perto por Mendes, que concentrado, suportava o peso de Kaimbe. A trilha era íngreme e acidentada, complicada ainda mais pela escuridão que os cercava. Tudo parecia agravar a pressão que pairava no ar — o zumbido dos insetos, o chilrear distante de uma coruja. Permaneceram no mesmo caminho até as luzes da aldeia finalmente entrarem em vista.

O rosto de Mendes brilhava com as gotas de suor. Kaimbe mal conseguia manter os olhos abertos, a respiração dele misturava-se com os gemidos da ardência em seu pé parecendo tornar-se cada vez mais insuportável.

Quando cruzaram os limites da aldeia, um dos indígenas, que estava sentado ao lado do fogo, tinha visto a silhueta deles se aproximando.

— Kaimbe! — Ele gritou, se levantando. O grito pareceu alertar os outros, pois de repente, a luz do fogo começou a dançar e os Wanakauas se levantaram, correndo na direção deles para ajudar.

Entre eles, um garoto de feições muito semelhantes às do ferido passou na frente de todos. Ao se aproximar, Turi, o irmão mais novo, conseguiu pegar sua mão.

— Ei Kaimbe! Consegue me ouvir?

Com esforço, Kaimbe tentou focar seus olhos na voz que o chamava. — Turi...

— O que... o que foi que aconteceu com ele? — Turi saltou o rosto de Kaimbe para Isadora.

— Foi uma cobra. Precisamos levá-lo para a cabana do meu pai.

Um deles interveio: — Mas seu pai não...

— Eu sei! Eu vou cuidar dele.

— Isadora... — Turi falhou a voz, engasgando-se. — Ele vai ser curado?

— Vou fazer o meu melhor. — Respondeu ela antes de olhar para o outro lado. — Me ajudem a levá-lo.

Os indígenas ao redor retiraram Kaimbe dos braços do detetive, que já estava esgotado, e começaram a movê-lo com cuidado para longe. A cena causou estranheza para Mendes que questionou:

— Ele precisa de um médico de verdade. Não acha que devemos levá-lo para a cidade?

Isadora balançou a cabeça energicamente. — Não podemos sair da aldeia.

— Por que não?

— Desculpe detetive, ou seja lá quem for, eu não tenho tempo para te explicar nada.

Fugindo os olhos de Mendes, Isadora acompanhou os outros que partiam em direção a cabana. Mendes, cético e preocupado com a recente descoberta do seu outro eu, seguiu-os, até que todos estivessem caminhando juntos.

Enquanto o drama em torno de Kaimbe se desenrolava, uma presença se manifestou discretamente na periferia do caos. A liderança indígena da aldeia, conhecida apenas como Wai'ana, entrou em cena de maneira quase imperceptível.

Ela observou o tumulto à distância, enquanto sua figura criava um círculo de calma ao seu redor. Seu rosto revelava uma mistura de seriedade e preocupação. Quando ela finalmente deu um passo à frente, entrando na luz do fogo de uma fogueira acesa, o burburinho gradualmente diminuiu, os olhos se voltando para ela. Não foram necessárias palavras. Sua presença por si só comandava respeito e atenção.

— O que aconteceu com Kaimbe?

— Uma cobra... uma cobra o envenenou, Wai'ana. — Isadora respondeu, nervosa.

— E está levando-o para a cabana de seu pai? — Wai'ana cravou os olhos na garota, procurando por sinais de hesitação.

— Eu não tenho opção.

— Não tenho certeza disso, como pretende ajudá-lo?

— Eu não sei... meu pai não está aqui. Mas eu não vou deixar que nada aconteça a ele... assim como meu pai também não deixaria.

Wai'ana a encarou poucos segundos até rodar o pescoço para encontrar seu filho mais novo.

— Turi!

O garoto respondeu o chamado em uma outra língua.

— Vá buscar Iaraú, onde quer que ele esteja. Diga-lhe que seu irmão está gravemente ferido.

Turi concordou, correndo para cumprir a ordem da mãe.

Após dar a instrução, Wai'ana buscou por Mendes, que estava calado ao lado de Isadora. — Quero falar um minuto com você, detetive — Seu pedido foi dado com a mesma autoridade que exibia antes de virar-se de costas, e se afastar.

Enquanto a silhueta dela sumia, um dos indígenas empurrou o corpo de Mendes para frente, indicando que ele não deveria ficar parado. Dessa forma, ele caminhou em direção a mulher, que agora estava de costas para a luz do fogo.

Mendes percebeu que Wai'ana estava indo em direção à grande tenda e, ao adentrá-la, notou que a atmosfera da noite mudava o local. A luminosidade entrava por uma espécie de claraboia improvisada, clareando as paredes de tecido. Adornos de penas e contas estavam pendurados nas extremidades, que Mendes se recordava bem. Próximo ao centro da tenda, a linda ave ainda estava pousada.

Ao centro, Wai'ana indicou um banco de madeira, baixo e sólido, esculpido à mão. Antes de falar, ela deu um assobio e, quase que instantaneamente, o pássaro que repousava na tenda voou em sua direção, pousando com graça e precisão em seu braço estendido.

— Sente-se, — ela instruiu.

Mendes obedeceu, acomodando-se no banco com cautela. Sentiu o toque áspero e quente da madeira sob suas mãos.

— Agora que está aqui, está pronto para me falar sobre o que viu na floresta? — A pergunta flutuou pelo ar.

— Eu sei o que aconteceu sim, mas também tem algo que você deveria...

— Isso pode ser deixado para depois, — Wai'ana cortou. — Estou com um guerreiro ferido. E não é um guerreiro qualquer. É o meu filho.

— Com todo o respeito, se é seu filho, não deveria estar com ele agora? — Mendes estreitou os olhos.

— Às vezes, a liderança exige sacrifícios. Todos da aldeia são uma família, alguns de sangue e outros não. Kaimbe é meu herdeiro. E assim é tratado.

— E como pode ficar tão serena enquanto ele luta pela vida?

— Por dentro, estou em pedaços — ela admitiu, a voz amarga. — A raiva fervilha, a dor rói. Mas não me verá chorar. Nem eles. — Indicou a aldeia ao redor da tenda com um gesto vago. — Além disso... — deu de ombros, resoluta — não temo a morte. Se fui bem-sucedida na educação de meu filho, Kaimbe também não a temerá.

Fez uma pausa, avaliando Mendes com um olhar intensamente crítico.

— Você está preocupado com o corpo do meu filho, mas eu estou preocupada com dois. Agora, mais do que nunca. — Ela inclinou-se para frente. — Isadora te contou sobre os pais dela, não foi?

Mendes concordou com a cabeça e Wai'ana prosseguiu:

— Então, você entende por que preciso que me diga o que sabe?

— Sim. — Mendes exalou lentamente, os olhos fixos em algum ponto distante. — Se quer saber, os encontrei na floresta, próximo a cidade. Provavelmente um homem e uma mulher ao lado de um símbolo.

— Por que você disse provavelmente?

— Porque eles estavam... carbonizados. — Mendes engasgou um pouco. — Não era possível reconhecê-los.

Os olhos de Wai'ana mostraram uma luta interna para manter a compostura. Mas, sem perder tempo, ela continuou o interrogatório:

— E o símbolo?

— Tirei uma foto dele, estava ao lado dos corpos.

A figura era a mesma que ele vira no barco de seu avô, aquele que Helena tinha mostrado para ele em sua "outra vida". A lembrança fez com que ele sentisse emoções conflitantes. Era um mal-estar vindo do fundo do seu estômago. Seu coração batia mais forte, e estava incerto se veria Helena e sua família novamente, o que tornava a situação ainda pior.

— Onde está a foto? — Wai'ana quebrou a contemplação interior.

— Ainda precisa ser revelada, mas lembro como era.

Wai'ana fez um gesto, permitindo que a ave pousasse no chão. Em seguida, ela pegou um pequeno recipiente de barro, contendo uma tinta de tonalidade marrom, e passou para Mendes.

— Desenhe. Preciso ver.

O detetive obedeceu, e mergulhou o dedo na tinta, sentindo a textura viscosa. Ele se ajoelhou e traçou o símbolo na areia da tenda. As linhas escuras começaram a formar um espiral, intricado e complexo, e no meio dele, algo que se assemelhava a um ponteiro.

— É assim que me lembro. — Mendes olhou para Wai'ana, buscando alguma reação em seu rosto.

Uma sombra nos olhos dela se destacou. Assim que ela elevou um pouco de seu queixo tentando não mudar o semblante, falou:

— Agradeço a sua cooperação. Agora... você está liberado para deixar a aldeia.

— Não, não, não... — Mendes se levantou de repente — Me desculpe. Mas estou aqui para descobrir quem assassinou essas pessoas, e é isso que vou fazer.

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