Capítulo 32
Capítulo 32, relatos.
— "'Não esqueça, Fera, verdadeiro amor, dado e recebido, antes de a última pétala cair."
E, com isso, as irmãs se viraram nos saltos de suas minúsculas botas pontudas e saíram do jardim, o som se esvaindo aos poucos até elas sumirem em uma névoa repentina e a Fera não conseguir mais ouvi-las.' — li, fechando o livreto. — Fim do capítulo 1.
Olhei novamente para Ruby, parecia mais alerta do que quando tinha começado a leitura. Seus olhos arregalados brilhantes estavam atentos.
— Continua, por favor — disse baixinho ainda em êxtase.
— Não está com um pouco de... medo?
— Não. Eu gostei! Não entendi algumas palavras, como "esvaindo", mas gostei. Continua!
— Não, apenas um capítulo por dia.
— Ah, por favorzinho — disse, arrastando seu tom de voz suplicante. — Já sou uma mocinha.
Usava essa mesma desculpa para tudo desde que fiz o comentário.
— Desculpas, mas daqui a pouco são onze horas e não posso ficar. Tirando o fato de que nenhuma outra mocinha de quatro anos que nem você devem ou estão acordadas a essa hora.
— Por que vocês podem dormir na hora que querem e eu não?
— Porque você ainda não é grande o suficiente — disse, ajeitando a sua coberta. — Então, por favor, dorme, minha Ruby — e dei um beijo em sua testa.
Ela esfregou os olhos, finalmente, desmontando lutar com um sono que se aproximava. Passava pela milionésima vez a língua no dente incisivo, onde tinha conseguido uma pequena falha.
— Boa noite — murmurou por fim.
Em questão de minutos foi derrotada. Levantei-me da cadeira ao lado da sua cama devagar e com o livro na mão saí vagarosamente do dormitório infantil. Fui até o meu quarto guardar o livro, porém sentado a minha porta já estava Ira.
— Eu tenho quase certeza que não estou atrasada. Tomei cuidado com isso.
— Eu sei, cheguei 10 minutos antes — e me esticou um conjunto de roupas. — consegui isso te colocando para a vigilância.
Peguei e abri as peças. Era uma calça preta jeans, uma camisa de manga longa também preta e luvas.
— Os sapatos são os seus mesmos coturnos. E quanto as luvas, já teria elas se estivesse malhando de fato esses braços — disse com seu típico tom zombeteiro de rebaixar qualquer coisa que eu fazia.
Tinha me acostumado, acabei rindo.
— Vá logo!
Entrei no meu quarto e me troquei rapidamente, prendendo o meu cabelo em um rabo de cavalo. No final do ato observei o meu reflexo no espelho, não parecia com a diária Anne. Aquilo me agradou.
Saí, indo com Ira até o final das Fogueiras em uma tenda de lona nas margens do Círculo Central e a floresta — antes apenas dos burgos. Dentro dela havia um grupo cuidando especificamente de algumas dúzias de armas brancas e de fogo.
Eu era do Grupo Um, onde isso tudo era mais do que normal, mas ainda não conseguia agir e achar com tanta naturalidade.
— Cooper — chamou Ira.
Um garoto de cabelo raspado e uma cicatriz na altura da sobrancelha esquerda se virou.
— Ira Beckett! — soltou animado ao vê-lo.
Eles se cumprimentaram.
— Alice Blair, certo? — perguntou, analisando-me.
— Sim — concordei e apertei sua mão estendida. — Prazer em conhecê-lo.
— Sou Cooper Monroe, e o prazer é todo meu — apresentou-se, abrindo um sorriso.
— Ela está aí? — perguntou Ira a Cooper.
— Não sei, mas a contei hoje cedo logo em que avisou — informou, cochichando. — Não reagiu muito bem.
Pelo jeito, não queria que eu soubesse da reação da pessoa.
— Quem é ela? — perguntei, sendo intrometida.
— Wright — respondeu Ira sem me direcionar o olhar.
Ele sabia que Aubrey era a última pessoa que eu gostaria de conviver e para ela também parecia ser o mesmo. Se ele queria que eu desistisse da vigilância noturna, estava conseguindo. Tive vontade de socá-lo e sair dali. A ideia de passar a noite com Jack voltava a me parecer duas vezes mais atrativa.
— Não. Vou. Fazer. Nada. Com. Ela. — resmunguei pausadamente, virando-me a Ira.
— Pois. Não. Irá. Participar. Também. — disse, retribuindo a rispidez.
— Você sabe muito bem que a nossa relação é péssima. A escolheu de propósito.
— Deve ter sido.
— Por que fez isso?
— Não fui eu que escolhi Aubrey para ser sua responsável, por mim pouco me importa se a relação de vocês duas é boa ou não. Mas outra pessoa viu como uma exigência ter alguém da confiança dele sempre por perto.
Entendi de imediato que aquilo não vinha dele, vinha do Garrett.
— Mande o seu senhor ir a merda por mim, por favor. — agi pelo ódio. — E o avise que participarei independentemente se Aubrey estará ou não.
Ele bufou. Meu temperamento o desagradava, estava acostumado a ter tudo sempre a seu controle. Mas por minha parte, não pretendia nenhum pouco facilitar o seu serviço.
— Tome — disse, entregando-me uma Glock.
Olhei para aquela arma de tintura preta, brilhando maleficamente sob a luz do luar e do fogo nas tochas pelo perímetro das Fogueiras, ele começou a ganhar o que queria sem nem saber. Soava um tanto hiperbólico, mas não poderia mentir sobre como andava intimidada por quaisquer armas.
Ignorei o nervoso e peguei-a demonstrando frieza.
— Quer mesmo que eu fique com isso? Tenho uma mira ótima de um modo não lá muito bom.
Ele me fuzilou com seus olhos negros. Provavelmente estava me reprimindo perante as minhas palavras e o que Cooper, que eu tinha até esquecido da presença, fosse pensar sobre elas. Não me importava, minha vida estava mais do que difamada por si só.
Observei-o. Cooper tinha adotado uma expressão um pouco assustada. Mal sabia que estava se sentindo amedrontado por uma pessoa que não conseguia passar um dia sem chorar ou se arrepender por mais de um terço do que viveu. Certifiquei-me de que a Glock estava travada e botei na cintura.
— É... é... acompanhe-me. Vou te apresentar ao pessoal, não que seja necessário... — Cooper coçou a cabeça, embaraçado e sem saber o que dizer direito para quebrar o clima que tinha pairado entre nós. — E vou chamar a Aubrey, vocês precisam trocar algumas ideias antes de começarmos. Mas sinta-se bem-vinda, por favor! Apesar de... de...
— Tudo bem, muito obrigada — interrompi-o, tentando fazer com que não continuasse nervoso ao se explicar por uma situação que não era culpa dele.
— Então, tchau, Ira — disse Cooper em um aceno.
Ira assentiu. Cooper se voltou para mim:
— Vamos! — e apontou para a barraca com a cabeça.
Não me despedi de Ira, esperava que entendesse que não concordava com o fato dele ser mais um capacho de Moore, e segui Cooper.
— Não sei se Ira te explicou, mas a vigilância é de meia-noite até às seis da manhã — comentou, tentando puxar assunto.
Percebia que nem ele acreditava que eu fosse capaz de ter aceitado aquilo.
— Eu sei muito bem, tanto que fui eu quem pedi para trabalhar aqui.
— Pensei que não soubesse... Normalmente, este é o trabalho mais recusado pelo Um. Não são todos que se sentem bem trocando o dia pela noite, muito menos trabalhando na floresta. Acho que a luz, calor e segurança do círculo são essenciais para muitos.
— Engraçado, não consigo associar a imagem daqueles homens carregando sacos de quase cinquenta quilos com completa naturalidade negando trocar seus cobertores quentinhos por umas noites ao relento.
Cooper riu.
— Eles só estão preocupados com colocações no rank e seus corpos.
Eu não tinha lá muita noção sobre esses ranks, mas eram o que mais comentavam. Uma completa questão de honra para o meu Grupo. Supunha que essa pontuação vinha do empenho nos exercícios propostos para os Grupos, pois eles levavam muito a sério. Muitas vezes eu não ia, não via muita importância. Porém, para o resto faltar era algo fora de cogitação. Já cheguei a ver uma garota com a perna quebrada do meu Grupo participando de uma corrida de obstáculos. Tudo bem que ela foi uma das últimas, mas chegou a me admirada toda essa determinação.
"Pena que isso me faltava," pensei.
Abri um breve sorriso ao chegar na barraca, pois aquela sensação horrível — atualmente rotineira — de todos estarem olhando para mim com ar de surpresa e admiração me percorreu. Odiava isso. Senti as minhas bochechas começarem a queimar.
— Boa noite — muitos disseram em um quase uníssono.
— Boa noite — repeti em voz baixa, torcendo em não sair.
Enfiei-me em um canto na entrada da tenda a fim de poder controlar a vontade de sumir.
— Onde está Aubrey? — perguntou Cooper, deixando-me mais aliviada pela atenção de alguns pairar sobre ele.
— Ela ainda não chegou — disse uma garota com aparência de no máximo quinze anos.
— Pergunto por onde ela realmente está, não pelo o que pediu que falassem — reprimiu com extrema certeza.
— Mas... — começou a menina, só que foi interrompida pela voz vinda do final da tenda.
— Deveria ser menos autoritário e chato às vezes, Cooper — reconheci como a de Aubrey.
Ele abriu um sorriso de orelha a orelha. E de onde estava, constatei como ele era bonito. Intimava tanto quanto atraía.
— Prazer em vê-la, Aubrey.
— Gostaria de dizer o mesmo, mas ando tendo um dia nada bom — disse com a cara fechada.
Mesmo seu rosto não muito nítido entre as sombras, vi que desviou o olhar a mim no final da frase.
Repugnante.
— Não vai se apresentar como a responsável da Alice?
Ela se levantou, indo até ele pisando firme. Parou apenas ao chegar em uma mísera distância de Cooper, jurei que fossem se beijar. Mas o olhar dela desviou, persistindo em pousar sobre a minha cintura.
— Não me responsabilizo nem pelos meus atos, muito menos pelos os dela.
Impossível não ter notado a repulsa na voz dela... A Anne valente de segundos atrás estaria recuando novamente. Aubrey tinha tocado em um terrível ponto fraco meu.
— Facilita — pediu Cooper, tentando repreendê-la.
— Não me obrigue a virar babá de garotinha adúltera.
"Garotinha adúltera?" repeti mentalmente, era demais.
Fiquei enfurecida, pois Aubrey era a última pessoa que poderia me julgar.
— Eu e Axel tivemos nada — soltei com toda a raiva que sentia junto.
— Pena que April não pensava o mesmo, não é? — retribui instantaneamente.
— April era maluca.
— E você uma... — ela não conseguiu terminar, Cooper pressionava o braço dela com tanta força que a fez recuar.
— Uma piranha? — completei. — É isso que você pensa, não é? É o que todos pensam.
Os que estavam no alcance da minha visão pareceram um pouco surpresos com a minha iniciativa. Acreditavam enganar alguém com suas caras dissimuladas?
— Mas e você, Aubrey? Não me parece que também seja uma santa. Tenho quase certeza que é do tipo que vende a própria dignidade por bem pouco.
Suas feições mudaram por completo, soube o que seu rosto estava me dizendo apesar de não mover um nervo. Eu não persisti, pois em nenhuma situação, por pior que fosse, o meu ódio por ela me dava o direito de entrar nesse assunto.
— Desculpas, se atrapalhei a vida do seu irmão, não tive a intenção — disse por fim.
Minha raiva se esvaiu na mesma velocidade que surgiu e ao final de minhas palavras já dava lugar a dor. Retirei a arma da cintura e antes de sair dali, segurando o choro preso na garganta, coloquei-a em cima da cadeira ao meu lado.
— Com licença.
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