Capítulo 25
Capítulo 25, relatos.
— Bom dia, senhora Wilson — disse, dando um tapinha em sua bancada e seguindo para os fundos.
— Oh, Anne! — chamou.
Voltei e parei em frente a ela.
— Esqueci alguma coisa?
— Axel pediu para te entregar — disse, esticando uma folha de papel dobrada.
Peguei e abri. Dentro em letras muito bem desenhadas vinha escrito:
"Anne,
Desculpas, mas não vou poder ir hoje à tarde te dar aula. Já avisei a Sra. Perry e ela te deu o dia devido às circunstâncias. April acordou passando mal e me pediu para que ficasse com ela, espero que entenda. Ela tem mais ninguém, além de mim que possa cuidar dela. Passo nas Fogueiras às oito em ponto e te pego. Iremos ao lugar que te prometi, dou a minha palavra. Tenha um ótimo dia e desculpas novamente!
Grato,
Axel A. Wright."
Como eu te odeio, Axel A. Wright!
Acabei amassando o papel com a mão, estava pegando raiva dela. No fundo fiquei culpada por sentir isso, mas não podia evitar. Era mais forte do que eu.
— Notícia ruim, não é? — perguntou Sra. Wilson, observando-me.
Concordei com a cabeça.
— Ele não vem?
— Não — disse em voz baixa.
— April?
— Sim.
— O que ela fez, hem?
— Fez nada não. Apenas ficou doente.
— Mentira! Isso é para ele não vir — afirmou com convicção.
— Por que ela faria isso? Não tem a menor necessidade. Axel nunca que a deixaria de lado ou faltaria com atenção a ela.
Era a mais pura verdade.
— Isso é o que você acha.
Levantei o rosto e olhei para ela.
— Nunca que ele a deixaria precisando dele, mas atenção é algo que não se consegue tão fácil assim. Não adianta você fazer de tudo para conseguir, se a pessoa não está apta a dar.
— O que a senhora quer dizer?
— Que ela está fazendo isso para conseguir uma atenção que nunca vai ter — ela segurou a minha mão. — O modo como ele olha para você, como ele doa todo o tempo do mundo... April nunca vai ter. Ele pode até gostar dela, mas que ele tem um sentimento muito especial por você, tenho certeza.
Fez-se um silêncio.
— Eu também sinto algo diferente por ele.
— E você acha que eu não sei?
Dei uma leve risada nervosa.
— O que vocês sentem é diferente e poucos têm a oportunidade de sentir o mesmo. Esse carinho genuíno e pleno.
Beijei a sua mão.
— Muito obrigada, senhora Wilson.
Ela se aproximou e cochichou:
— Pode me chamar de Harriett.
— Tudo bem, Harriett.
Ela abriu um sorriso.
— Você não quer passar a sua tarde aqui comigo? Axel diz que tenho ótimas histórias.
Tinha a minha tarde livre e já podia dizer que conhecia tudo até o limite dos burgos, adoraria tê-la como companhia. Então, por que não?
— Claro, será um prazer.
[...]
— E esse foi o dia em que ganhei esse corte aqui — disse, mostrando uma cicatriz no braço. — Eu era uma garota levada.
Ri.
— Percebi.
O sino soou.
— Já são sete e meia? — perguntei assustada.
— Sim, já são — informou, conferindo em seu relógio de pulso.
Precisava de um desses.
— Por quê? — perguntou, querendo insinuar algo a mais.
— Axel marcou de me pegar nas Fogueiras às oito — disse entre sorrisos. — O lanche foi ótimo! Estou até apreciando uma boa xícara de chá de camomila, e esses biscoitos estão maravilhosos como sempre. Mas eu não quero correr o risco de me atrasar.
Ela compreendeu e deu um dos seus sorrisos radiantes.
— Nesse caso, eu permito que você vá embora — brincou.
Coloquei a xícara e pires de volta na bandeja e lhe dei um longo beijo na bochecha.
— Tenha uma boa noite, querida — ela disse.
— Você também.
Eu já considerava Harriett como uma avó, uma avó a qual eu nunca tive. Entendia o porquê de Axel ser tão ligado a ela, era muito adorável e acolhedora. Deu o carinho que eu tanto precisava. E, finalmente, começava a sentir que estava me decidindo sobre os meus sentimentos.
[...]
Eu estava nas Fogueiras, mas uma coisa boa para se fazer quando se marca com alguém é botar um lugar mais específico e não tão genérico quando a maior e mais cheia parte do Refúgio. Eu já tinha rodado esse lugar inteirinho, quando Jack me achou.
— E aí? Ainda se perdendo por aqui?
— Um pouco.
— Estava querendo conversar com você.
— Sobre? — perguntei, olhando ao redor.
— Sobre... Procurando alguém? — perguntou, estranhando.
— Mais ou menos.
— Mais ou menos procurando alguém?
— É que... Fala o que você tem a dizer.
— Eu queria que...
Vi Axel se aproximar logo atrás dele.
— Desculpas! — e abracei-o. — Mas eu preciso mesmo deixar essa conversa para depois.
— Ham? O que está acontecendo?
— Perdão, mas eu preciso ir agora.
Dei-lhe um beijo rápido no rosto, pois Axel já estava perto fingindo procurar por alguém. Corri e fui logo até ele na tentativa de que Jack não visse, poderia dá-lo todas as explicações necessárias amanhã.
Segurei forte na mão de Axel e comecei a arrastá-lo dali.
— Rápido! — disse, enfiando a gente entre as pessoas.
Quando passamos às pressas pelos grandes portões, que eu tanto temia, não sentia medo... Sentia-me livre. Só então parei de andar rápido e tive certeza de que Jack não estava mais olhando.
— Oi para você também — disse com um sorriso de canto.
— Você pode ir tirando esse sorrisinho da cara. Eu apenas não quero que Jack saiba agora, ele vai pensar besteira. Amanhã eu conto para ele.
— Podemos pelo menos começar a ir pela direção certa?
Parei depois de perceber que andava puxando-o desordenadamente pelas árvores e ele tinha entrelaçado nossos dedos. Axel começou a guiar e acendeu uma lanterna.
— Então, como que está April? — perguntei um pouco preocupada.
— Bem. Ela disse que acordou com enjoo, náuseas e um pouco tonta, mas até ela pegar no sono já poderia afirmar que estava muito bem. Deve ter sido algo que comeu... ou estava apenas precisando descansar mesmo.
— Enjoo, tontura, náuseas... — repeti os sintomas. — Você não acha que possa ser outra coisa?
— O que você quer dizer? — perguntou, franzindo o cenho.
— Eu não sou lá uma médica, mas me parecem sintomas de... gravidez.
— Mas é claro! Como não pensei nisso antes? — perguntou alegre.
Gelei. Meus pés se enterraram entre as folhas, negando continuarem.
— Pena que eu não sou o pai — completou e saiu andando mais à frente.
Tropecei.
— Você está insinuando que ela te traiu? — perguntei assustada.
— Não! Nunca que April faria isso, mas é porque seria impossível mesmo.
Não nego que nessa hora não fui capaz de guardar a alegria que surgiu em mim, um dos sorrisos mais satisfatórios transbordou em meu rosto.
— Eu vi isso.
— Só estou feliz por saber que você é responsável.
— Você sabe muito bem que não foi isso que eu quis dizer.
— Sim, eu sei! Mas não quero que pense que ligo.
— Sendo assim, fico grato em saber que não vou ter de prestar satisfação em como consigo tais remédios.
Fiquei paralisada, não era o que eu esperava.
— Desculpas, não quis estragar esse sorriso incrível — passou os olhos por mim enquanto abria caminho. — Mas apenas tenho certeza por ter recorrido à meia dúzia de pílulas.
Não sei se recuei ou, simplesmente, continuei sem andar por um tempo, pois ele fez o mesmo metros à frente.
— O que foi, Anne?
— Era você mesmo que estava me dando lição de moral na Biblioteca dias atrás?
— Pensei que esperasse.
— E todo aquele papo? Você quer tentar agora?
— Eu não quero tentar nada. Só aconteceu e dei um jeito.
— Vai ser sempre assim?
— Não.
Bufei.
— Não haverá próxima.
— Como não houve nas anteriores.
— Na anterior — corrigiu. — Foi apenas uma vez. E nem pretendo que o meu relacionamento passe de manhã!
— Como?
— Que não tem como ser April — disse irritado. — Estou tentando terminar com ela desde hoje de manhã, mas ela foge do assunto e continua a agir como se tudo estivesse normal. Eu vou tentar mais uma vez amanhã, continuar não tem mais como.
Estava decepcionado, mas eu não conseguiria me mostrar realmente comovida. Depois de um tempo voltou a me encarar com a cara ainda fechada.
— Devo dizer que sinto muito? — perguntei irritada.
Seu rosto ameaçou esboçar um sorriso, mas ao invés disso me chamou para mais perto com a lanterna me iluminando. Não encrenquei — mais na tentativa de mostrar não ter levado a situação para o lado pessoal do que por estar com vontade — e começamos a andar lado a lado. Para a minha surpresa, alguns minutos depois, ele disse:
— Se ainda quer saber — passou a língua pelos lábios. — Eu vou me preocupar mil vezes mais quando for a sua vez... Minha Alice.
[...]
— Me dê sua mão — pediu, estendendo a sua para me ajudar a atravessar as pedras de um pequeno riacho. — É logo ali.
Obedeci, mas questionava-me sobre o sentido de um lugar extremamente desabitado ser o nosso destino. Não via nada além de árvores e mais árvores.
Teria ele intenções aléns? Não afastei a ideia.
— Preciso admitir que estou bem ansiosa agora — disse, andando até lá.
Axel passou seu braço direito pelas minhas costas, segurando minha cintura. Ele estava se dando o direito de me tocar mais do que normalmente se permitia, adorei isso.
Certificou-se de que não havia mais ninguém ao redor, me parecendo preocupado...
Por favor, me diga logo o que está te levando a ficar assim!
E anunciou:
— Chegamos!
Olhei sobre o seu ombro e vi um lugar lindo, parecendo uma praça antiga com diversas flores e caminhos de terra, que formavam um círculo no centro e levava até um coreto. Um coreto branco de ferro retorcido formando vários desenhos em seu contorno, com uma escadinha de uns oito degraus na entrada e sua base dando a impressão de ter sido construído sobre um aglomerado de pedras cor de chumbo.
— Que lindo! — exclamei impressionada. — Como você descobriu esse lugar?
— Eu não descobri, você quem me mostrou — disse, abrindo caminho para eu passar.
— Era dos seus pais — completou.
— Meus pais? Meus verdadeiros pais, certo?
— Sim, Alexandra e Robert.
Fiquei repetindo os nomes em minha cabeça. Não me lembrava deles, nem conhecia alguém com tais nomes. Olhei para as flores e vi mudas de uma flor branca com detalhes coloridos, pareciam familiares.
— Alstroemérias — informou ao ver minha fixação nelas.
Continuei a estudá-las. Axel me soltou para ir às pressas até o coreto, aparentava estar esperando há séculos para me mostrar o presente. Chegou a lembrar uma criança histérica.
— Vem logo! — pediu.
Não consegui ser tão rápida quanto ele. Talvez por estar cansada ou, simplesmente, por começar a pressentir que não era nada do que eu pudesse esperar.
Mal cheguei em meu destino e notei o telescópio com uma base logo abaixo... Vamos observar estrelas, deveria imaginar.
Ele ajeitava tudo a fim de poder me mostrar algumas das suas constelações prediletas — se não eram todas —, quando, finalmente, decidiu voltar a atenção para mim.
— Deixa eu adivinhar — brinquei, indo até ao seu lado do coreto. — Vou conhecer um pouco mais de Axel Wright.
— Claro — pegou em minha mão para que eu chegasse mais perto dele. — Tudo. Desde que prometa ser uma boa menina.
Suspirei.
Isso seria um "sim"? Uma chance a uma possibilidade?
— Esqueço que preciso ser cauteloso com você. Que droga! Não leve tão ao pé da letra...
Meu semblante deve ter mudado por completo, pois completou:
— Ou leve, dane-se!
"Então me beija, Axel!", implorei mentalmente.
Sua telepatia não foi eficiente, mas suficiente. Senti seus dedos quentes percorrerem meus braços nus, indo da ponta do médio até o cotovelo. Axel gesticulava falando coisas que eu me mostrava incapaz de compreender.
— Tudo bem? — perguntou, sorridente.
Não reagi por não saber sobre o que se tratava.
— Apenas Marte.
Continuei silenciosa.
— Já vi que a minha surpresa serviu de nada — brincou. — Finge que achou interessante, pelo menos.
— Mas está muito interessante — não consegui dizer sem ficar vidrada em seus lábios.
— Você é muito chata, sabia?
Para de fa...
E ele ficou ainda mais grudado em mim apertando os meus braços de leve.
— Punição número um para quem não respeita a hora dos parabéns... — começou. — Guardará segredo.
Engoli em seco, analisava-me com aquele sorriso sinuoso no rosto.
— Punição dois: receberá parcelado e não poderá criticar isso.
Quando terminou, suas mãos já pairavam em minha nuca. Deixei de acompanhá-lo.
— Mas... — e ele botou um dos polegares sobre a minha boca.
— Você está sendo punida, Alice! Silêncio — franziu as sobrancelhas. — Relaxe, serão em longas prestações.
Respirei fundo, ansiava.
— Número três: faça aniversário mais vezes. Estou com um estoque muito grande para uma noite... — interrompeu, mordendo o lábio inferior.
Como quiser.
— Sim, senhor — respondi.
Ele ficou radiante e entregou seu lábio preso pelos dentes a mim. Entre sua sincronia espantosa e os múltiplos tremores que causava em mim, o ritmo era cada vez crescente. Axel era extremamente suave até que tivesse certeza da sua entrega a ele. Seu beijo não era desesperado, mas mostrava o quanto esperou por isso... Era perfeito.
Segurou-me como se temesse que eu fosse me desfazer sob as palmas das suas mãos, não fui contra. Confirmaria como sentia meu corpo se diluindo em vontade e prazer...
Finalmente, confessei para mim mesma, sempre foi ele.
[...]
Não me largue! É uma ordem.
— Feliz aniversário adiantado... — murmurou, soltando sua boca da minha.
— Obrigada — respondi ofegante e recuperando-a antes que estivesse longe demais.
Ele me beijou de volta, embora eu começasse a perceber que sua alegria infantil não bastaria para mais. Já ficava levemente tenso.
— Quer voltar? — perguntei.
— Não. — respondeu de imediato.
Entretanto percebeu não ser o suficiente para me convencer.
— Só estou com medo — admitiu.
Foi aí que notei como a pessoa que mais tentava me proteger era a que mais precisava de proteção.
— Está tudo bem — afirmei, abraçando-o a fim de fazê-lo crer no que eu mesma não acreditava.
Prendeu-me em seu peito.
— Há dias que não largo a sensação de estar sendo constantemente vigiado. E desde que saímos do Círculo Central, ficou ainda pior. Nunca senti tanta aflição.
— Eu tenho sonhos estranhos desde que cheguei aqui — tentei arrumar o melhor jeito de poder falar sobre tal assunto com ele.
— Tem? E são ruins?
— Nem tanto, apenas os em que você está — brinquei. — No caso, todos.
Ele abriu um sorriso forçado e sem graça.
— Sou mal com você neles? — perguntou triste, fiquei surpresa por ter encarado assim.
— Não, Axel! — afastei-me para olhar em seus olhos, brilhavam mais do que deveriam. — Por que seriam assim?
— Eu sei que não fui sempre muito legal...
Acariciei seu peito, não me atrevi a prestar atenção no que pudesse haver sob o tecido.
Seu tormento não seria apenas por esse motivo, mas por não ter terminado oficialmente com April. E eu não deixaria de entender, estava tão errada quanto ele — se não estivesse mais. Ele poderia desejar com todas as forças me beijar, só que não faria isso se não tivesse pressionado. Sei que minhas palavras não eram para servir de consolo ou amenizar, mas por serem sinceras e para que soubesse que não teria sido em vão.
— Eu te amo.
Axel ficou paralisado sob os meus dedos, no entanto havia um coração acelerado demais no meio de tanta inércia. Encurvou-se para encostar sua testa na minha, só assim vi que o brilho vinha das lágrimas contidas neles.
— Pensando bem, melhor irmos embora.
Não deixaria que se afastasse, porém fez isso antes de qualquer reação minha. Queria falar das estrelas e planetas... Ou apenas vê-lo explicando.
— Eu preciso terminar com alguém — disse firme, percebendo o que se passava dentro de mim. — Desculpas.
Então, depois de fazer questão de arrumar o meu "verdadeiro" presente, saímos abraçados e em silêncio. Mesmo que me esforçasse para não ligar para o ocorrido — estava longe de ser um dos meus maiores problemas —, inevitavelmente comecei a me questionar do porquê dele também não ter dito me amar.
E pela primeira vez entendi o que Axel sentia. Com certeza aquele par brilhante de olhos entre as árvores não seriam uma ilusão.
...
Anne.
Engraçado como nos enganamos com tanta facilidade e como um dia pode fazer toda a diferença na sua vida, um único dia. Uma única palavra pode ser capaz de mudar todo um destino.
Muito provável que você já tenha escutado sobre o famoso "Efeito Borboleta", onde um simples bater de asas de uma borboleta pode causar um tornado do outro lado do mundo. Pois naquele dia eu estava escrevendo a minha própria Teoria do Caos.
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