Bublé, Fim De Tarde E... Lena
Abro o frigorífico e retiro uma embalagem de iced tea de manga de uma das prateleiras. Despejo um pouco do seu conteúdo num copo alto que se encontra em cima da bancada e guardo a garrafa de novo no seu lugar antes de pegar no copo e atravessar o minúsculo apartamento até à cadeira na varanda.
Sento-me calmamente com a bebida na mão, ajeitando o biquíni e desfrutando do sol de fim de tarde. Da sala, chega-me o som relaxante de uma das inúmeras músicas da minha playlist de jazz e o suave ronronar de Nyx.
Estico as pernas, quase acertando no vidro que delimita a varanda. Merda! Já aqui vivo há quase meio ano e ainda não me habituei com o tamanho disto.
Quando cheguei ao prédio, estava muito entusiasmada. Não só pelas novas amizades que iria fazer pela vizinhança, já que desde pequena que não costumo ter vizinhos, como pelas possibilidades que o apartamento 4ºB me proporcionava. Tinha vista para um pátio traseiro e estava completamente vazio. Era uma autêntica folha em branco, o que me agradou muito.
Agora, estava decorado completamente ao meu estilo: o chão do apartamento estava revestido com um estrado de madeira (que me tinha custado os olhos da cara) em toda a sua extensão, deixando em frente à porta um desnível tipicamente japonês, que eu tanto adoro. Ninguém, absolutamente ninguém, está autorizado a entrar em minha casa calçado. O primeiro que colocar um sapato sujo em cima do meu pavimento é atirado janela fora. Uma queda do quarto andar não é bonita de se ver.
Adiante.
A decoração de toda a casa é feita em tons de castanho, verde, laranja, vermelho e bege, num esquema relaxante e elegante.
O meu quarto tem uma grande estante repleta de livros de ambos os lados de uma janela generosa com um assento almofadado embutido no parapeito, uma pequena secretária e uma cama quadrada — como sou pequena, não preciso de muito espaço.
A única casa de banho fica no fundo do corredor entre o meu quarto e o dos hóspedes, que tem pouco mais que uma cama, um armário e uma cadeira. A minha cozinha é aberta para a sala, tendo apenas uma bancada a separá-las — metade da qual está inutilizável graças ao aquário do meu querido axolotle, o Nilo.
A sala é bastante ampla e agora recebe muita luz natural, já que mandei substituir a porta da varanda, antes bastante acanhada, por uma mais larga. Tem um sofá e uma poltrona sobre um tapete fofo, ambos virados para um plasma. Tenho também um puff, uma pequena mesa de centro, uma mesa de refeições modesta e uma parede cheia de prateleiras desencontradas e caixas de madeira, interligadas por vezes com pontes de tecido ou postes envolvidos por corda, formando um gigante parque de diversões para Nyx. Dentro das caixas e em algumas das prateleiras que a minha gata não usa para brincar estão plantas, objetos decorativos e livros.
A voz de Michael Bublé invade o ambiente, acompanhando o pôr do sol e trazendo-me memórias de infância.
A vista para o pátio das traseiras não é má, mas não se compara àquela com a qual cresci: o infinito azul do oceano, que se funde com o azul do céu na linha do horizonte. Apesar da falta que essa vista de me faz, não me sinto triste. Algum dia as coisas tinham de mudar. Faz parte do percurso natural da vida.
Só me falta acrescentar que a minha varanda tem um jardim vertical na parede e vasos com legumes e arbustos de fruto nos cantos, para a além da cadeira onde fico refastelada a apanhar sol. Sou uma amante da Natureza e, mesmo estando na cidade, gosto de a ter por perto.
Ah! Felizmente também tenho piscina. Mas é partilhada com o resto do prédio porque é no telhado. Somos o único prédio do bairro que o tem. Os vizinhos da rua roem-se de inveja de cada vez que alguém salta para a piscina com um sonoro splash!.
As gargalhadas estridentes que saem de um dos outros apartamentos lembram-me de que preciso de me levantar e tomar duche. Alguém teve a bela ideia de marcar churrascos no pátio das traseiras todas as sextas-feiras. Hoje é sexta. As minhas amigas estão à minha espera.
Sim. Posso dizer que as minhas vizinhas aqui são minhas amigas. Éramos completas estranhas quando nos juntámos, mas agora somos quase unha com carne. Já não me consigo ver a viver sem elas. Somos um grupo estranho mas, no fundo, parecemos todas farinha do mesmo saco. Não há momentos verdadeiramente mortos e todas as conversas e brincadeiras não lembram nem ao Diabo! Já há muitos anos que não tinha amizades assim.
Desvio-me do Miko, o meu pequeno pangolim, para não o pisar e deixo o copo do iced tea no lavatório. Ao preparar as coisa para o meu duche e escolher a roupa que vou levar para a churrascada, penso se o nosso novo vizinho irá aparecer. Os vizinhos que alugam o apartamento do 0ºA estão sempre convidados, mas raramente aparecem. Será que são sempre todos muito tímidos e introvertidos?
— Coitados! De qualquer maneira, são eles que ficam a perder. Mais fica!
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