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Muita coisa mudou nas últimas semanas. Aquele beijo mexeu muito comigo, todavia uma voz na minha cabeça me mandava ter cautela e eu tenho obedecido. Havia muitas coisas nas quais o Douglas e eu precisávamos nos concentrar. A começar pelo progresso na saúde da nossa filha. A Dra. Layla fez as visitas domiciliares e, em cada uma delas, uma novidade, uma etapa concluída. Na primeira, Bia já pôde sair da incubadora e estrear o berço. Na outra, já não precisava mais dos medicamentos aplicados através da bomba de infusão. Por fim, ela conseguiu alcançar o peso ideal e não precisa mais usar todos aqueles aparelhos.
Douglas tinha, e ainda tem, uma grande reforma para comandar e fiscalizar, então não está sendo tão difícil ter cuidado com o impacto que aquele beijo e aquela conversa tenha nos causado. Ou ele resolveu me dar tempo para pensar, visto que ele não só sabia que eu estava confusa, como disse com todas as letras. A questão é que nós não falamos nada a respeito de eu estar precisando de um tempo para decidir. Eu só acho que preciso de um pouco mais do que um beijo e palavras ditas tarde demais. Ou nem tão tarde assim. O que sinto que devo fazer agora é deixar o destino ditar meus próximos passos.
Sobre o Daniel, aquela conversa que tivemos por pressão das circunstâncias me ajudou a entender muito do que estava acontecendo com ele, comigo e com nós dois. Ele estava revivendo a época em que estudava medicina neonatal. O que a enfermeira Célia disse fez muito sentido. O olhar encantado que ele tinha sobre a minha filha era, além de ter feito o parto dela, um novo interesse pela área. Por algum motivo, fragilidade talvez, eu processei isso de outra forma. Transformei em algo que eu queria e até precisava mesmo. No fim das contas, senti alívio por não ter dito nada do que sentia, pois ele estava em uma frequência diferente. E eu estava certa quando escolhi ser cautelosa e não querer confundir a cabeça dele. Sem contar que seria um desrespeito com Marcela. Seria, se ela não o tivesse desrespeitado primeiro.
Esperei por uma ligação dela ou até mesmo uma visita, mas além disso não ter acontecido, Marcela não apareceu para trabalhar na clínica nos dias que sucederam o término do relacionamento com o Daniel. Minha mãe estranhou e me ligou perguntando se eu sabia de algo ou se tinha notícias. Ela e eu tentamos entrar em contato com a Marcela de todas as formas, mas nem em sua própria casa a encontramos. Eu sabia qual era o motivo, ou pelo menos suspeitava, contudo não podia falar nada sem ter provas. Por fim, mamãe teve que colocar outra pessoa para secretariar para ela.
Todo o progresso da Bia permitiu que Kássia voltasse para São Paulo. Ela partiu na quarta-feira e esses últimos três dias têm sido bem complicados sem ela aqui. Temos nos falado todos os dias e eu omito que estou um pouco atrapalhada. A clínica está se reerguendo e não quero que ela e nem minha mãe se preocupe tanto. E francamente, dar conta de tudo é um desafio que eu me lancei e preciso cumprir.
É manhã de sábado e eu estou tentando organizar a casa. Bia está no bebê conforto em cima do tapete da sala. Durante o dia, é onde ela passa mais tempo quando não está no meu colo, ou seja, raramente. Ela acabou pegando o costume de ficar no colo desde que saiu da incubadora. Foi um tal de todo mundo querer pegá-la que agora ela só quer isso da vida. Não posso colocar toda a culpa nas visitas. Eu também gosto de sentir o calor da minha filha nos meus braços, mais do que deveria.
Cuidadosamente, lavo a louça procurando fazer o mínimo de barulho possível. Com sorte, vou conseguir tomar meu café da manhã antes dela acordar. É uma rotina puxada, porém, eu amo tudo isso. Passei por vários momentos em que pensei que não conseguiria ver minha filha com saúde. Agora ela está ali, ao alcance dos meus olhos enquanto eu cuido da casa. Um ano atrás, eu jamais imaginaria que iria trocar meu centro cirúrgico por ser mãe e dona de casa. Hoje em dia eu não sei se voltarei a exercer medicina novamente. Ser médica já ocupava grande parte do meu tempo. Agora meu tempo é todo da Ana Beatriz e eu me orgulho disso.
A campainha toca de repente seguido de um chorinho de quem teve o sono interrompido às 7h20. Suspiro fundo e enxáguo o último copo. Seco as mãos rapidamente no pano de prato e pego Bia do bebê conforto. Aninho-a enquanto caminho até a porta, mas o choro vai se intensificando. Saio e tento identificar quem está do outro lado do portão através da fresta, mas não consigo. Se não fosse alguém conhecido e de confiança, os seguranças não deixariam chegar até meu portão.
— Quem é?! — pergunto.
— Sou eu. Douglas. — me surpreendo um pouco devido o horário. Ele não costuma aparecer aqui tão cedo. É sempre à tarde ou à noite. Abro o portão e ele entra. — Por que ela tá chorando assim?!
— Acho que se assustou com a campainha — explico enquanto entramos.
— Desculpa, Karen. Eu não me liguei nisso. Da próxima vez eu te ligo em vez de tocar a campainha.
— Tudo bem. — sento-me no sofá e acomodo Bia em meu colo para amamentá-la. Essa é outra das novidades. Ela está conseguindo sugar. Mesmo assim, a Dra. Layla receitou uma fórmula especial para ajudar em seu desenvolvimento. — Eu ia te oferecer um café, mas ainda não consegui fazer.
— Eu faço — diz ele se dirigindo à cozinha. — Por que você ainda não contratou uma pessoa pra te ajudar? — respiro fundo antes de responder, mas ele torna a falar. — Sua casa tem dois andares e a Bia ainda é muito pequena, precisa de você em tempo integral, praticamente.
— Mas ela me tem em tempo integral. E eu gosto de fazer as coisas sozinha. Por mais que seja difícil.
Douglas olha na minha direção por um tempo e depois volta a colocar o pó de café na cafeteira. Poucos segundos depois o aroma do café começa a preencher o espaço. Eu sei que suas palavras não são para serem entendidas ao pé da letra. O que ele quis dizer na verdade, é que se eu quisesse, ele poderia vir para cá e me ajudar. Só que isso está fora de questão. Eu não confio nele a tal ponto. Deixá-lo passar uns dias aqui para me ajudar teria outro significado. Seria como forçar que algo aconteça. E não é assim que eu quero.
Bia volta a chorar cortando a quietude e me tirando dos meus devaneios. Coloco-a em pé contra meus seios e tento acalmá-la acariciando suas costas.
— Por que ela tá chorando tanto? — ele pergunta em tom de preocupação.
— Ela não consegue mamar por muito tempo. Fica cansada.
Levanto-me do sofá devagar e a embalo, balançando-a levemente. Fico de coração partido ao vê-la irritada por estar com fome e não conseguir ter tanta força para sugar. Mas a Dra. Layla já me explicou que com o passar dos dias isso vai passar e ela vai se adaptar.
— O que você faz quando isso acontece? — Douglas volta a perguntar.
— Espero ela descansar um pouco e tento de novo — explico.
Muitas vezes me pego ansiosa para que ela se livre de todas as dificuldades que ainda tem, entretanto, é um trabalho de etapas e Bia tem ultrapassado cada uma com muita força.
— E quando ela pega no sono? — ele faz um gesto com a cabeça na direção dela. Meneio a cabeça para conseguir ver o rostinho de Ana Beatriz e me dou conta que, mesmo resmungando baixinho, ela acabou dormindo. Sorrio.
— Bom, quando isso acontece, eu aproveito para tomar um café. — Douglas sorri e pega as xícaras no armário.
Aninho Bia por mais alguns segundos até que ela entra num sono mais profundo e deito-a no bebê conforto novamente. Estico minhas costas até ouvir uns estalos e caminho de forma arrastada até a mesa. Douglas me entrega a xícara que está fumegando e nos sentamos, um de frente para o outro.
— Eu trouxe umas fotos pra te mostrar — diz enquanto beberico meu café.
Depois que a poeira daquela conversa tensa baixou, ele veio ver nossa filha e começamos a conversar sobre qualquer coisa. O assunto chegou ao tema da reforma do restaurante. Douglas disse que reformar o prédio seria um pouco exaustivo e parecia desanimado, diferente da noite em que me levou até lá e contou tudo a respeito. Mesmo com um pé atrás, tentei aconselhá-lo a não olhar as coisas pelo ângulo das dificuldades. Com o passar dos dias, o assunto surgia e eu acabei virando a pessoa para quem ele mostra todas as ideias.
— Sobre a cor do porcelanato do salão? — pergunto.
— Não, o piso eu já escolhi. Agora eu tô em dúvida sobre as paredes — diz. Estendo a mão aceitando ver as fotos que ele trouxe. Ele pega o celular no bolso e depois de alguns toques na tela, ele o entrega em minha mão. A foto é claramente uma montagem feita em algum aplicativo de teste de pintura de parede, mas dá para ter uma ideia. Na imagem, um lado do salão tem paredes de madeira escura e o outro, clara, da mesma cor do piso.
— Esse piso é o que você escolheu?
— É... Não gostou?! — questiona intrigado.
— Não é isso... É que essa madeira não vai ter contraste com o chão — explico. — Quero dizer, eu não entendo nada disso. É só que...
— Eu sei — diz ele. — Mas gosto de ouvir sua opinião. E faz todo o sentido esse negócio do contraste. — levo a xícara à boca novamente para evitar dizer qualquer coisa. Não estou gostando muito de ser a pessoa a quem ele recorre para decidir essas coisas. — Olha essa outra foto. — ele desliza o dedo pela tela e mostra uma imagem que exibe uma espécie de segundo andar só no entorno das paredes.
— O que seria isso exatamente?! — pergunto confusa.
— Um segundo andar aberto. Dá pra colocar algumas mesas e a vista de lá de cima vai ficar bem legal — diz com empolgação. Coço a cabeça tentando imaginar como seria, já que o segundo andar é fechado.
— Você vai quebrar o segundo andar inteiro para fazer isso?
— Pensei em quebrar a metade e manter o resto para fazer o setor administrativo. — fico um pouco mais perdida e dou zoom na foto para tentar facilitar meu entendimento.
— Eu sei, é complicado e a foto não ajuda muito. — concordo num gesto positivo. — O que você acha de... — ele faz uma pausa hesitante.
— O que eu acho do quê?! — questiono automaticamente.
— De ir lá. Fica mais fácil pra te explicar mostrando ao vivo. — arrependo-me imediatamente de ter perguntado. Olho para Bia em seu sono calmo buscando uma forma de dizer não. — Podemos levar a Ana Beatriz.
— Não sei... — falo pensativa. — A Bia ainda não tomou as vacinas e não é bom ficar saindo assim... Ainda mais para um lugar em reforma, cheio de poeira e cheiro de tinta. — Douglas me analisa pensativo.
— Então pode ser depois das vacinas — argumenta. — Ela já completou um mês de vida e não deve demorar muito, né?
Fico tentada a dizer que talvez eu não seja a melhor pessoa para dar esse tipo de opinião, mas a verdade é que eu tenho medo de que isso nos aproxime ainda mais a ponto de voltarmos e depois eu acabar quebrando a cara de novo. Porém, quando pego fôlego para dizer o que acho, a lembrança de suas palavras me atinge. Ele não me levou para ver e dar opinião sobre o restaurante por querer me impressionar, mas por eu ser a única pessoa com quem ele pode contar.
— Provavelmente daqui a alguns dias — falo. — Na próxima semana a gente marca isso direitinho. — Douglas sorri agora mais relaxado do que quando começamos a falar da cor das paredes. Acho que ele merece esse voto de confiança.
•°• ✾ •°•
Depois que o Douglas foi embora, a tarde passou num piscar de olhos com tantas coisas para fazer. Não foi preciso nem cinco minutos para que minha mente começasse a trabalhar na cor daquelas paredes. E das paredes para os tipos de lustre foi uma linha tênue. Eu aceitei visitar o espaço mais uma vez e agora estou mais do que envolvida nessa reforma. Minha intenção é clara e objetiva: ajudar o Douglas. Entendo que isso deve ser mesmo muito difícil para ele, já que até hoje só trabalhou em uma única coisa a vida inteira e não tinha nada a ver com cozinha. É claro que cozinhar é algo que ele faz muito bem e vai ter ótimas idéias de cardápio para destacar seu restaurante dos demais, contudo, abrir um restaurante vai bem além de saber cozinhar. O Douglas vai precisar entender um pouco de administração e finanças, mesmo que ele contrate profissionais da área, um bom empresário tem que saber pelo menos o básico de cada coisa. Isso se não quiser ser trapaceado pelo caminho.
A noite já caiu. Bia está acordada, mas quietinha. Coloquei uma playlist de um desenho que toca musiquinhas divertidas. Sei que é cedo para ela prestar atenção nisso, mas parece que está funcionando para distraí-la, então estou aproveitando para passar suas roupinhas que lavei enquanto o Douglas ainda estava aqui. Ele deu colo quando ela acordou e a distraiu de todas as formas que pôde para que eu terminasse. Está se esforçando.
Ouço a campainha tocar e respiro fundo tentando imaginar quem apareceria assim sem avisar. Só tem um jeito de saber. Desligo o ferro de passar e o coloco no apoiador. Dou uma breve olhada para Bia antes de sair pela porta. O clima gélido da noite em contato com o meu corpo quente faz minha pele arrepiar.
— Mãe?! — exclamo surpresa. Eu estaria animada também se ela não estivesse com um semblante de preocupação. — Entra — falo abrindo espaço imediatamente. Mamãe passa para dentro e eu fecho o portão antes de lhe dar um abraço.
— Eu pensei em ligar antes de vir, mas não quis te preocupar. Achei que a surpresa seria menos desagradável.
— Do que você tá falando?! — questiono enquanto entramos. Minha mãe atravessa a sala sem responder minha pergunta e vai até Bia. Um sorriso terno toma o lugar da apreensão que ela carregava segundos atrás ao olhar para Ana Beatriz.
— Eu fico só uns dias sem aparecer e você aprende a assistir TV igual sua mãe na sua idade? — sorrio admirando a cena.
— Me conta o que aconteceu, mãe. — ela respira fundo e, com cuidado, pega Bia no colo. Em seguida se senta no sofá. Faço o mesmo e espero por suas palavras.
— Você se lembra da Dra. Amanda Bittencourt? — franzo o cenho e analiso a sonoridade do nome, mas não me recordo.
— Não... — falo.
— Psicóloga. Ela trabalhou na clínica por um tempo. Você deveria ter uns cinco anos... Chamava ela de tia e tudo — explica.
— Mãe, eu cresci naquela clínica. Todos os médicos eram meus "tios". — mamãe sorri.
— É verdade. Não dá pra exigir que você se lembre dela com tanta clareza.
— Mas o que houve? Ela morreu?
— Não, não — diz. — Ela está bem. Somos amigas. Ela, eu e o seu pai.
— Não me diga que meu pai tá querendo que eu agende uma sessão com essa doutora! — digo espantada.
— Antes fosse, Karen.
— Então diz logo o que tá acontecendo! — mamãe engole em seco e muda Bia de posição em seu colo.
— Eu a procurei uns dias atrás e contei tudo o que estava acontecendo. Tudo sobre o seu pai e como ele agiu com você. Com a Dona Ana. — um sobressalto em meu peito coloca todos os meus sentidos em alerta. Minha atenção se prende em suas últimas palavras e fico muda esperando por mais. — O comportamento dele não é normal.
— Não mesmo! Mas por que você foi conversar com uma psicóloga sobre isso? — mamãe me encara parecendo ainda mais angustiada.
— Karen, seu pai tem traços de psicopatia. E a Dra. Amanda concorda comigo. — desvio meus olhos dos dela me negando a acreditar. — Ele é muito bem articulado e faz a maior propaganda de si mesmo como cirurgião.
— Ele só tem um grande ego, mãe. Isso não caracteriza psicopatia — argumento.
— Não é só isso. Lembra de como ele ficou quando aquele paciente do tumor cerebral morreu antes dele concluir a cirurgia? Ele não teve empatia alguma pelo paciente e muito menos pela família.
— Ele se preparou durante meses pra aquela cirurgia — rebato.
— Tudo bem. E todos aqueles sentimentos superficiais que ele demonstrava ter sobre você e a Kássia quererem estudar balé clássico, mas ressaltava no final que seria o pai mais feliz do mundo se fizessem medicina? E a mentira sobre a morte do Douglas sem dar a mínima para as consequências?
— Chega, mãe — falo coçando a cabeça com o máximo de força que consigo.
— Você queria entender a razão disso tudo e agora tá defendendo ele. Por quê?
— Eu não tô defendendo ele, mãe — falo sentindo as primeiras lágrimas escorrerem pelo meu rosto. — Eu tô me recusando a deixar que você transfira toda a culpa que ele tem para um distúrbio mental! Ele escolheu ser assim. Ele escolheu inventar isso porque me odeia de alguma forma e disfarçou todos esses anos.
Minha mãe se levanta e balança Bia levemente ao levá-la novamente até o bebê conforto. Depois pega sua bolsa e abre procurando alguma coisa.
— Um laboratório que fica a algumas quadras da clínica está passando por algumas dificuldades e o dono me propôs anexarmos os dois estabelecimentos. Melhoraria a funcionalidade e o retorno para ambos. Então começamos os processos. Precisei de alguns documentos da clínica que ficam guardados no escritório do seu pai e achei isso enquanto estava procurando. — mamãe estende um envelope branco em minha direção.
Mesmo temerosa, pego-o de sua mão e retiro o conteúdo. Meus nervos estão tensionados me sinto incapacitada de ler. Vasculho toda a página da frente sem conseguir focar em uma palavra específica. Então vou direto para o fim, onde tem a assinatura do meu pai. Olho para minha mãe com confusão e volto a focar no papel em minhas mãos, agora com mais atenção e começando do começo. Em negrito, o título me paralisa. Contrato de compra e venda de imóvel. Abaixo, no campo do vendedor, meu nome completo, meus dados pessoais e o endereço da minha antiga casa escritos com minha própria letra preenchem os espaços.
— Meu pai comprou a minha casa — falo em dúvidas se estou fazendo uma pergunta ou afirmando o que esse documento contesta.
— Eu juro que não sabia, Karen. Eu estava procurando o...
— Ele pagou 200 mil na minha casa para se sentir menos culpado?! — minha mãe abaixa a cabeça diante da minha forma de ver as coisas.
— Acho que seu pai é incapaz de sentir culpa. Incapaz de te pedir perdão. Mas conseguiu entender que você precisava recomeçar e... — nego com a cabeça, indignada demais. — Ele chegou a te oferecer ajuda, lembra?
Meu braço lateja com a lembrança do aperto de sua mão e seu hálito de wiskhy nas minhas narinas.
— Eu recusei e ele pensou: vou dar 200 mil a ela em troca daquela casa manchada com o sangue do Douglas, do cachorro de estimação dela e daquele traficante de merda. Genial...
— Karen...
— O que você tá pensando em fazer, mãe?! Sério. O que vai fazer?! Vai denunciar ele por fraude? — mamãe me encara confusa e com lágrimas nos olhos.
— Eu não sei.
— A Kássia já sabe? — pergunto aproximando-me mais de minha mãe. Ela nega com gestos e afasta as lágrimas com as duas mãos.
— Ela estava tão feliz quando liguei pra ela... Disse que o Eduardo recebeu uma proposta de emprego aqui no Rio e estão pensando em mudar pra cá.
— Nossa! — exclamo encantada. — Pelo menos uma notícia boa.
— Sim. Eles vão passar alguns dias aqui enquanto o Eduardo se reúne com os donos da empresa. Chegam amanhã à tarde. — respiro fundo.
— Então não vamos poder esconder isso dela por muito tempo. — mamãe assente inquieta.
— Eu ainda não sei como proceder, filha. Não sei se aconselho seu pai a procurar um psicólogo ou...
— O maior medo dele no momento deve ser perder o exercício da função como médico.
— O CRM dele foi suspenso assim que as notícias sobre a farsa da morte do Douglas foram divulgadas. Estão reavaliando a conduta médica dele por ter concordado em contribuir com essa forja. — engulo em seco.
— Isso já faz um mês, mãe — falo incrédula por ninguém ter me contado isso antes.
— E foi um dos piores meses pro seu pai. Ele está bebendo muito mais agora. Por isso fui conversar com a Dra. Amanda.
— Por que não convida ela pra um café e depois inventa alguma coisa pra deixar eles sozinhos? — sugiro. Mamãe meneia a cabeça parecendo analisar minha ideia. — Mas, mãe, se o conselho de medicina for mais a fundo nessa questão, é bem provável que ele seja preso. — ela estreita os olhos em minha direção.
— Por que você acha isso?!
— Porque ele quebrou um dos juramentos médicos. Ele não exerceu a profissão com consciência e dignidade e de acordo com as boas práticas médicas.
— Não é bem assim! — mamãe aumenta um pouco o tom de voz me surpreendendo. — Ele guardou os segredos que a ele foram confiados e isso também faz parte do juramento!
— E falsificar um atestado de óbito faz parte de guardar esse segredo?! Ou isso também é uma boa prática médica e eu não sabia? — mamãe parece perder a voz, mas isso não dura muito.
— Você teria coragem de denunciar seu próprio pai?!
— Você teria coragem de deixar ele livre para cometer outros tipos de crime?! — ela se levanta e pega a bolsa do sofá.
— Eu não deveria ter te contado isso agora... — me levanto também.
— Não precisa ir embora tão rápido, mãe. — ela me ignora e põe a bolsa no ombro. — Mãe! — digo mais alto e dessa vez consigo sua atenção. — Se eu quisesse denunciar ele, já teria feito isso. — mamãe assente controlando outra crise de choro.
— Vou ligar pra Dra. Amanda amanhã e ver quando ela pode ir lá pra tomar um café com o seu pai — diz ela. — Não conta pra sua irmã que te falei sobre a mudança. Ela disse que quer te dar a notícia quando decidirem se vêm mesmo ou não.
— Pode deixar — falo. Fico com um aperto no coração ao ver minha mãe tão abalada. Então me aproximo mais e lhe abraço forte. — Eu te amo, mãe.
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Dia 27 de agosto é o dia da Psicóloga!
E não é nenhuma coincidência que a "Dra. Amanda" tenha meu sobrenome, rs. Amanda Bittencourt é minha sobrinha e estudante de psicologia. Ela foi quem me ajudou a enxergar que o Olivier tem traços sugestivos de psicopatia e isso justifica muito suas atitudes. Então, dei seu nome à personagem.
Sei que a expectativa de vocês é sobre o desfecho Douglas X Karen, mas todos os personagens terão um "final". Alguns felizes, outros não. Então, tenham paciência com a Karen porque, pra mim, ela tá certa em querer mais do que palavras pra acreditar no Douglas. Enquanto isso, vamos acompanhar os outros "finais".
Depois vocês vão entender melhor.
Beijinhos e até o próximo capítulo!
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Capítulo publicado em 27/08/2020
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