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09

Mais um dia se inicia ao som do meu despertador cruel, me avisando que são cinco e meia da manhã. Parece que eu pisquei e sol nasceu. Detesto quando isso acontece, pois passo o dia feito um zumbi. Meus olhos não querem obedecer aos meus comandos e mal se abrem. Preciso despertar de uma vez, então me arrasto para fora da cama indo direto para o chuveiro. A água fria bate em meu corpo quente me fazendo tremer, mas é disso que preciso, de um abalo nas estruturas. Ao sair do box e me enrolar na toalha, encaro meu reflexo no espelho e dou de cara com um homem que parece estar sem dormir há uma semana. Meia hora depois estou vestido e finalmente deixo meu quarto. No corredor, há pares de sapatos femininos espalhados, como se tivessem os tirado no caminho desde a porta da cozinha até aqui. Ainda vou reclamar com a Luana sobre isso, mas depois.

Apesar de estar no horário, me apresso e rumo para a clínica. Preciso ser o primeiro a chegar para abri-la na companhia dos seguranças. Dar apoio à família da Karen neste momento tem sido algo crucial para mim, pois anos de parceria médica com o Olivier, me fizeram aprender muito e acho importante retribuir como posso.

Assim que adentramos o estabelecimento, ligo a TV e deixo no noticiário enquanto dou uma breve recapitulada nas atividades de hoje. Infelizmente, todos os dias o caso do cartel colombiano é mencionado nos jornais. A Colômbia questiona a postura da polícia brasileira por não ter contido o Alejandro e o enviado para seu país. O fato é que um grande problema está sendo gerado à partir da morte desse traficante. O Olivier quer processar o delegado devido à maneira com que ele expôs sua filha ao criminoso. Para uma pessoa comum, uma nota daquelas ao Portal Brasil News, seria apenas alguém ajudando a polícia. Já na cabeça do Alejandro, as coisas ficaram muito óbvias e ele foi atrás da Karen. Eu concordo que isso pôs sua vida em perigo, mas processar o delegado só vai estender um problema do qual ela precisa se ver livre: a repercussão. Por isso gostaria que ele respeitasse a vontade dela, de não dar entrevista alguma. Todo esse caos não é algo que eu gostaria de vivenciar, então, não desejo a ninguém.

O som da porta sendo aberta me tira dos meus pensamentos profundos e os transfere para ela, Marcela. Com os cabelos soltos, caídos por um dos ombros. Evito contato visual quando noto que já a olhei por tempo demais e aguardo ela se aproximar.

— Bom dia — ela me cumprimenta sem me olhar nos olhos.

— Bom dia — respondo tentando soar igual aos outros "bom dias" que já disse ao longo dos últimos dois meses, mas sai como um resmungo. — A Paola não virá hoje. Se precisar de alguma coisa me chame.

— Não vou precisar — ela rebate em tom baixo me deixando abismado. Vendo que estranhei sua resposta, ela complementa. — O número de atendimentos caiu muito. Vários pacientes não compareceram às consultas marcadas desde o início da semana e quando ligo para remarcar, dizem que vão em outro lugar.

— Que droga! — falo enquanto coço a barba e respiro fundo. — Preciso pensar no que fazer. Estarei na minha sala — digo e dirijo-me ao meu posto.

Infelizmente, as pessoas estão começando a julgar a Karen e sua família. Na internet, além das informações verdadeiras sobre o assunto, está rolando uns boatos de que a unidade é uma maneira de lavar dinheiro. Levando essa última parte em consideração, pode ser que valha a pena para a Karen ter uma chance de resposta. Ainda assim, eu continuo achando uma má ideia. Quem trabalha aqui conhece a verdade e a apoia como pode.

A Karen não está interessada a voltar a trabalhar, por enquanto. É perfeitamente compreensível. Tudo o que aconteceu a deixou traumatizada e acho melhor ela cuidar um pouco de si antes de retornar ao trabalho. Nós ainda não temos cardiologista para substitui-la, e mesmo que tivéssemos, talvez não haveria muito trabalho, já que as pessoas estão vendo a unidade de forma distorcida.

•°• ✾ •°•

A manhã transcorre enquanto meus pensamentos ficam divididos entre os problemas da clínica, Karen e Marcela. Eu deveria estar me preocupando com outras coisas, como minha irmã, por exemplo. Ela está se mudando para minha casa e acha que não estou percebendo. Eu não me importaria em dividir minha casa com ela, o problema é que a Luana parou no tempo, pensa que tem vinte anos e troca o dia pela noite, caindo nas baladas do Rio de Janeiro. Nossos pais não se agradam disso e tentaram fazê-la entender que a hora de tomar um rumo na vida está passando. Cortaram quase todos os cartões de crédito dela, deixando apenas um, com um limite bem abaixo do que ela está acostumada. Isso está fazendo com que ela veja a mim como uma saída. Eu não sou, só não estou com cabeça para lidar com isso agora.

Meu celular toca me puxando para a realidade. É uma mensagem da Paola.

Paola: Não tenho boas notícias.

Sinto meu coração perder o ritmo de uma hora para outra. Não tenho paciência para digitar e acabo preferindo ligar para ela, que atende logo no primeiro toque.

— Não posso falar alto — ela sussurra.

— O que aconteceu? — questiono preocupado.

— O Olivier acabou de chegar aqui com o advogado deles e estão enchendo a cabeça da Karen sobre dar a entrevista. Hoje!

— Não acredito que ele está tendo coragem para fazer isso... — falo sentindo a fúria queimar em minhas veias.

— Pois é. Estou de mãos atadas e não posso fazer nada. — ela lamenta. — Só quis avisar.

— Tudo bem, Paola. Obrigado — agradeço e encerro a chamada.

Eu já não estava com muita paciência para lidar com o dia de hoje. Agora estou menos ainda. Se eu tivesse como impedir isso... Ainda com o celular na mão, disco o número do Olivier.

— Sim, Daniel — ele diz ao atender.

— Estou com alguns problemas aqui na clínica. Você tem como vir aqui? — pergunto na tentativa de que ele julgue isso mais importante.

— Não — responde de imediato. — Feche a clínica e venha para cá.

— Para quê? — questiono confuso.

— A Karen quer dar a entrevista.

Ela quer não, você fez a cabeça dela! — falo irritado.

— Tanto faz — ele diz de forma neutra, como se não se importasse. — Vai ser melhor pra todo mundo. Se a clínica continuar no ritmo em que está por causa desses falsos boatos, vou ter que fechá-la de vez.

— Está cometendo um grande erro, mas se é assim que você quer, o mínimo que posso fazer é dar apoio à ela — digo ao aceitar contra minha vontade.

— Por isso quero que você venha. Não demore. — ele não espera que eu diga mais alguma coisa e desliga.

O Olivier não consegue pensar nas consequências, mas ele é o pai dela, não posso persuadi-lo a desistir disso.

•°• ✾ •°•

Dá para sentir de longe a tensão da Karen. A equipe do Prócer posiciona as câmeras e toda a parafernália para a gravação. Há vários cabos espalhados onde deveria ter um chão. Em uma poltrona no canto da sala, ela está sentada e o Wesley está passando um monte de maquiagem em seu rosto. Ela não precisa disso. Talvez, apenas para amenizar as olheiras que estão cada dia mais evidentes. Com certeza não tem dormido bem e meu peito dói ao imaginá-la chorando em vez de dormir.

Enquanto a Karen se arruma, a Paola a conforta e sussurra algumas palavras de apoio. Dona Heloísa está preparando algo para servir ao grupo com a ajuda da sogra da Karen. Apesar do Olivier ter insistido muito para que essa entrevista acontecesse, ele também está bem tenso. Noto isso devido ao seu semblante rígido e o copo de whisky em sua mão. O advogado da família está presente e acredito que isso deixe a Karen mais à vontade para responder às perguntas.

— Tudo pronto? — pergunta o Émerson, o entrevistador, direcionando suas palavras à Karen. Ela não responde, parece não estar certa de que quer mesmo fazer isso. Todos a olham esperando por uma resposta.

— Sim. — Olivier toma a frente. Não me resta dúvidas de que ele está forçando a Karen a fazer isso.

Paola e seu irmão se afastam do local onde a entrevista vai ser gravada, mas se mantém mais próximos da Karen do que o Olivier, o advogado e eu.

O entrevistador se senta em uma cadeira ao lado da Karen, em um ângulo que fica visível tanto para ela, quanto para o público que assistirá a gravação. Assim, ele inicia sua primeira pergunta.

— Nós sentimos muito pelo que aconteceu ao seu noivo, Doutora Karen. Isso chocou todo o Brasil e agora, mais do que nunca, todos querem saber: Quem era o Douglas Sant'Anna?

Karen respira fundo claramente tentando buscar forças em algo para passar por isso o mais breve possível.

— Ele era um homem maravilhoso, um policial extremamente sedento por justiça. — seus olhos brilham por um par de segundos, enquanto ela deve estar se lembrando de algo que a faz ter esse julgamento do Douglas. — Se coubesse a ele o fim do tráfico no Brasil, essa seria uma guerra ganha.

O entrevistador se dá por satisfeito com a resposta dela e dá continuidade.

— Para quem não sabe, ou não se recorda, Douglas Sant'Anna é o mesmo policial que reagiu a um assalto no ano passado e salvou a vida de uma mulher. Ele foi atingido por um tiro, certo? — ele indaga.

— Isso. Eu o conheci antes de tomar ciência desse assalto. Fui a médica que o operou. — ela responde tentando conter uma lágrima com um sorriso. - Mas só nos conhecemos melhor cerca de dois meses depois.

— Como está sendo viver esses últimos dias sem ele? — pergunta. Vai ser difícil responder essa.

— Meu desafio mais difícil — ela fala e não consegue impedir o choro. Eu quero me levantar do meu lugar e ir até ela, oferecer meu ombro, limpar suas lágrimas, consolá-la, tirar sua dor. Mas não posso. Ela enxuga as lágrimas e continua. — As noites se tornaram mais longas, os dias parecem não ter mais fim. Ficou um buraco enorme no meu peito, sabe? Desculpa, eu... — ela volta a chorar e não há nada que eu possa fazer.

— Tudo bem, nós entendemos - diz o entrevistador, mostrando compaixão. — Podemos fazer uma pausa se você quiser. — Émerson sugere, mas ela nega rapidamente com a cabeça. Paola afasta algumas lágrimas no canto do olho. Wesley encara o chão, talvez querendo dar apoio à Karen tanto quanto eu ou qualquer outra pessoa nesta sala. — Tudo bem, então vamos continuar — ele fala para o câmera. — Conte-nos um pouco como foi aquele dia para você.

Karen seca o rosto com um lenço de papel, o qual já estava próximo à ela.

— Eu jamais imaginei que terminaria daquela forma — ela começa a dizer calmamente. — Quando acordamos, ele cantou para o bebê, estávamos felizes. — em meio à suas palavras, ela esboça um sorriso. Eu não consigo imaginar aquele brutamontes cantando docemente olhando para sua barriga, mas de algum modo, ele a conquistou, e cantar deve ter sido uma de suas artimanhas. — Ele ainda tinha preocupação no olhar, mas estávamos felizes.

— Como o Alejandro, ou "el camaleón", te atraiu para sua casa naquele dia? — o jornalista pergunta trazendo um pouco mais de tensão.

Karen abaixa a cabeça e começa a embolar o lenço nas mãos sem perceber. Um limbo no qual ela entra e relembra os detalhes.

— Eu recebi uma ligação de alguém interessado em alugar minha casa. Era uma emboscada e eu não desconfiei, assim como nunca suspeitei de quem ele era enquanto estávamos juntos. — sua resposta sai de uma forma que deixa a sensação de que foi ensaiada, mas provavelmente, quem assistir à entrevista não vai perceber. Eu só sei porque a conheço bem.

— Infelizmente, o Douglas foi mais uma vítima da guerra que o Rio de Janeiro tem enfrentado nos últimos tempos. — Émerson afirma. — Como você vê essa situação?

— A dor que eu sinto pode ser semelhante à das outras pessoas na mesma posição que eu — ela responde com o olhar perdido —, mas aquela bala veio na minha direção. Era para eu estar morta agora, não ele. — era o que eu temia, ela está perdendo o controle e entrando em pânico, gesticulando a cada palavra que profere. Olivier percebe o mesmo que eu e entra em alerta. — Ele se jogou na frente dela enquanto atirava no Alejandro. Deu sua vida pela minha. Foi meu herói. Ele me pediu para não sair sem ele, e eu saí...

— Então você acha que se não tivesse saído, teria evitado a morte dele?!

Ela ouve a pergunta, mas obviamente seus pensamentos já estão distantes demais para responder. Estão em um lugar chamado culpa.

Olivier salta do lugar ao meu lado sem que eu tenha tempo para impedir.

— ESSE TIPO DE PERGUNTA, NÃO! — ele grita enquanto pisa forte no chão a cada passo rápido em direção ao jornalista. Me levanto no mesmo instante e o seguro para evitar uma luta. Tanto whisky só poderia dar nisso mesmo. — Eu listei expressamente o que poderia ser perguntado!

— Calma, doutor - pede alguém da equipe ao se colocar entre eles. — Estamos seguindo as diretrizes que a sua filha está dando, ela iniciou o assunto e nós pegamos esse caminho.

A justificativa não parece significar nada prudente para o Olivier, que só se sente ainda mais afrontado. De repente, o punho dele acerta o rapaz que se explicava. Eu entro na frente a fim de encerrar o que deveria ser uma tentativa de apaziguar as coisas, mas que está se tornando algo muito inverso. Minha infeliz ideia me faz ser atingido pelo rapaz com um soco que estava direcionado ao Olivier. Ouço as vozes nervosas e amedrontadas das mulheres na casa, mais a voz do Wesley dando alguma crise de espanto estranhamente mais aguda que qualquer outra na sala. O pobre advogado tenta separar o Olivier dos outros da equipe, pois ele quer alcançar o jornalista.

— PAREM COM ISSO! — uma mistura de vozes grita enquanto ouço uma bandeja caindo no chão.

Braços me seguram, eu seguro o Olivier e finalmente, todos estão sendo segurados por alguém. Não há mais esbofeteamento.

— Vamos manter a calma! — peço, sem rancor do rapaz pelo golpe que me atingiu em cheio.

— Então vocês precisam seguir o que combinamos! — Olivier exige ao bufar de raiva. Eu diria que ele está prestes a cuspir fogo.

— Tudo bem — diz Émerson. — Vamos fazer somente as perguntas que combinamos.

Todos parecem ter entrado em um acordo, mas algo está errado.

— Cadê a Karen?! — Paola pergunta.

Olhamos ao redor e não a vemos. Logo estamos chamando-a e olhando cômodo por cômodo do apartamento sem sucesso algum. Pego meu celular no bolso e ligo para seu número. Nós seguimos o som de seu toque até o quarto, mas ela não está lá.

— Alguém a viu sair??? — Olivier pergunta começando a ficar nervoso novamente.

— Eu não vi! — Paola exclama preocupada.

— Ela não sai de casa desde o funeral, estava com medo de ser pega por alguém do cartel! — diz Dona Heloísa com a voz trêmula buscando alento em seu marido.

— Calma, Heloísa! — pede Olivier contendo sua preocupação para não apavorar ainda mais a mãe da Karen. — Ela deve ter saído para tomar um ar e logo logo vai voltar. Vamos esperar aqui.

— De jeito nenhum eu vou ficar aqui esperando — deixo escapar em voz alta demais enquanto saio do apartamento. A porta se abre atrás de mim.

— Onde você acha que ela está?! — pergunta Paola tentando me alcançar com seu irmão logo atrás dela.

— Não muito longe daqui — digo enquanto avisto a porta do elevador se fechando. Faço sinal para a senhora lá dentro, a fim de que não deixe que se feche. Ela gentilmente o faz. — Eu vou ligar assim que encontrá-la.

— Nós vamos com você! — eles falam em coro.

— Muita gente vai deixá-la ainda mais estressada — explico. — Esperem aqui, por favor.

Nos olhos deles eu consigo ver que não aceitam bem minhas palavras, mas reconhecem que é verdade e ficam assistindo à porta se fechar entre nós.

Eu espero estar certo sobre meu palpite. Se a conheço bem, e sei que a conheço, ela não aguentou a pressão e precisou de espaço, de ar fresco. Óbvio que isso não se assemelha a nada que eu já tivesse visto-a passar em tempos de residência. Neste momento, a cabeça dela deve estar à mil, sem qualquer chance de definir em palavras o que sente.

Não é necessário mais que três minutos para encontrá-la. Lá está ela, sentada na areia da praia, próxima à água. Já me sinto mais tranquilo em ver que ela está aqui, então caminho sem pressa até ela. Seus olhos estão fechados e seu semblante está caído, feito uma rosa murcha.

— Karen — chamo-a quando sei que a distância é mínima e me permite dizer seu nome em voz baixa. Ela fica com os olhos fechados por alguns segundos, sem se surpreender com a minha presença.

— Ele não teve tempo de me responder — ela fala e abre os olhos mirando o horizonte, com o vento soprando e desfazendo a cortina de cabelos castanhos escuros, que ela vem se escondendo atrás.

— De responder o quê? — pergunto.

— Meu pedido de perdão — ela fala e começa a riscar sem rumo a areia com o dedo. — Eu tentei pedir que ele me perdoasse por ter feito a única coisa que ele me pediu naquele maldito dia. Ele se foi com essa mágoa de mim.

— Não foi sua culpa, Karen — falo sabendo que ela deve ter ouvido isso de várias pessoas. — Não tinha como você saber que o Alejandro havia armado tudo aquilo só para te levar até ele. O Douglas não ficou com nenhuma mágoa sua. Não deve ter ficado — falo corrigindo-me.

— Eu estive com ele, Daniel. — suas palavras me confundem.

— Como assim?

— Não sei explicar... Enquanto eu estava sedada, tive um encontro com ele. — um silêncio paira deixando apenas o som da rebentação se fazer único antes de suas novas palavras. — Ele perguntou por quê eu saí... Eu sei que ele estava desapontado comigo.

Isso me golpea muito mais que aquele soco lá em cima. Eu quero tirar essa culpa que ela carrega, quero dizer que esse encontro seria impossível, mas não posso.

— Você contou isso para mais alguém? — inquiro forçando-me a não dizer o que sei que vai tornar tudo pior.

— Não — diz ela. — Sei que todos vão dizer que é impossível ou que estou louca.

Sorte que guardei as palavras na minha boca.

— Eu não acho que você está louca, Karen — falo torcendo para que isso a faça sentir-se melhor.

— Então você concorda que talvez eu tenha encontrado-o em algum tipo de plano espiritual?! — ela pergunta me colocando à prova. Respiro fundo antes de responder.

— Não, eu não acredito — digo dando preferência à verdade. Seu semblante que antes expressava esperança, agora mostra frustração. — Você sabe que eu não sou religioso... Eu creio no que os meus olhos podem ver.

— Eu também — ela fala de imediato. — Meus olhos o viram. Acha que estou louca?

— Claro que não, Karen — digo pegando em sua mão.

— Eu queria que existisse um modo de poder vê-lo mais uma única vez, para que ele possa me perdoar.

Agora é a minha vez de encarar a vista do mar sob à luz da lua, de buscar sabedoria e dizer algo que possa ajudá-la de alguma maneira.

— Têm sido dias muito difíceis — falo, como uma justificativa.

— Eu me sinto sobrecarregada, Daniel. — ela tenta, mas não consegue evitar que algumas lágrimas cheguem à superfície de seus olhos. — Tudo é tão... Pesado. Meu nome está em todos os jornais, as pessoas me julgam o tempo todo... Acho que não vou conseguir aguentar.

Cada palavra dela encrava na minha pele como se fossem espinhos. Se pelo menos quando cada um entrasse em minha carne, deixasse de doer nela, eu estaria mais tranquilo.

— Karen — digo colocando minha mão sobre suas costas, acariciando-a -, alguém que você ama muito foi tirado de você de forma inesperada, cruel, trágica... É normal que você esteja um pouco fora de órbita e se sentindo sobrecarregada. Mas antes de buscar respostas, acho que você precisa dormir, descansar...

Ela volta a olhar o horizonte, como se entendesse meu ponto de vista. Sei que é complicado conseguir dormir quando tantas coisas negativas estão acontecendo, mas ela precisa tentar.

— Você está certo, Daniel. Dormir pode resolver tudo — ela fala perdida em alguma coisa que está tomando seus pensamentos.

Meu celular toca me lembrando de que eu fiquei de dar notícias sobre a Karen. É o Olivier.

— Eu estou com ela — atendo já revelando o que ele quer saber.

Traz ela de volta — fala ele friamente. Não entendo como ele não consegue se colocar no lugar dela nem por um minuto. — Ela precisa terminar de responder às perguntas. Ainda nem entramos na questão da clínica.

— Seu pai pediu para voltarmos — digo sem encerrar a chamada. — Estão aguardando para terminar a entrevista.

— Eu não quero mais fazer isso, Daniel — ela fala enquanto seus olhos clamam por compreensão.

— Ela disse que...

Deu para ouvir daqui fala ele a me interromper. — Ela precisa vir, convença ela a voltar.

— Não — respondo sabendo que isso o irritará. Karen me olha surpresa por eu estar indo contra seu pai. — Ela não quer mais, aceita a vontade dela.

Passa o telefone para ela — ele pede com aspereza e eu simplesmente desligo.

Pode ser que ele queira me demitir amanhã. Amanhã não, hoje mesmo, ele não é o tipo de pessoa que espera muito para fazer o que quer, principalmente se acha que isso prejudicará alguém de alguma forma merecida. Não estará me prejudicando em nada.

Ainda sob o olhar surpreso da Karen, a puxo com delicadeza para um abraço. É isso que se faz quando palavras já não são o suficiente para trazer conforto a alguém. Foi isso o que trouxe mais consolo à ela sempre que passava por momentos de perda em seu começo de carreira. Porém, a perda que ela sofreu, está longe, muito longe de ser consolada por um abraço meu.

Meu celular vibra no meu bolso e eu o pego para olhar a mensagem que acaba de chegar.

Paola: Ela está bem?
Eu: Sim, só precisa dormir.
Paola: Não traga ela agora, a Dona Ana se ofereceu para terminar a entrevista. O Dr. Turrão não gostou muito, mas o pessoal do Prócer achou ótimo.
Eu: Perfeito. Me avise quando forem embora, para que eu a leve de volta.
Paola: Tá bom.

— Sua sogra está terminando a entrevista — aviso para que ela não se preocupe.

— Coitada... — ela fala lamentando. — Eu não queria colocá-la nessa situação...

— Ela não se ofereceria se não suportasse — falo.

— Eu admiro a força dela.

— Você também é forte, Karen. Conhecer os próprios limites também é um traço de força. Nem todo ato de desistência é sinal de fraqueza.

No silêncio das minhas últimas palavras, ela descansa sua cabeça em meu peito. Eu espero que não dê para ela notar que meu coração está batendo muito mais forte agora, mas por que diabos eu esperaria isso? Ela é cardiologista! Que seja... Quero apenas que ela se apegue a qualquer coisa que eu tenha dito e que sirva de estímulo para continuar.

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