Capitulo 20
Jarede POV
Vejo a minha versão mais nova, dentro de um quarto escuro e vazio, sentado no chão frio com as pernas dobradas, a cabeça apoiada nos joelhos, braços interlaçados um noboutro, protegendo a minha testa, apavorado e com lágrimas nos olhos, as minhas mãos trêmulas, minhas pernas bambas e o meu corpo totalmente arrepiado.
- Mãe! - Grito desesperado. - Eu estou com medo. - Choramingo atordoado.
- A sua mãe não está aqui. - A irreconhecível voz afonica ecoou dentro do quarto. - Chame o seu pai, outras crianças como você chamariam os seus pais. - Diz, autoritária.
- Avó, por favor me tire daqui. - Imploro, levantando o meu rosto, para procurar a minha avó dentro do quarto, mas não a vejo. - Eu não tenho pai, meu pai me abandonou.
- Você é sozinho Jarede, você não tem o seu pai para te proteger, você não sabe o que é sentar na mesa com o seu pai e sua mãe, se até o teu projenitor te abandonou, imagina o restante do mundo? - A voz ecoou novamente no quarto, dessa vez com mais raiva na sua fonologia.
- O que você quer comigo? - Choramingo. - Me deixa em paz, eu só quero viver em paz, sem me importar sequer que meu pai me abandonou, eu só quero viver tranquilo. - Grito com o meu coração atribulado.
Com o rosto suado, as minhas mãos trêmulas, a minha pele totalmente arrepiada e o meu coração disparado dentro de mim, abri os meus olhos totalmente assustado e erguo o meu tronco para me sentar na cama.
- Até quando, este pesadelo vai me perseguir, até quando eu terei de ouvir a voz da minha própria avó a torturar-me? - Penso alto, enquanto deslizava as mãos no meu cabelo.
Da última vez que eu tive este sonho ruim, foi aos meus dezoito anos, nunca contei a ninguém sobre isto, resguardava sempre este tormento dentro de mim.
Olho para o ecrã do meu telefone, e são apenas seis horas da manhã, resolvo não voltar a dormir, depois deste pesadelo já é o suficiente para o meu dia ser um inferno.
Irritado, me levanto da cama, vou até ao banheiro, faço minhas higienes, incluindo o banho de aproximadamente uma hora e meia, para tentar acalmar os ânimos, mas foi uma tentativa falhada, a raiva, o recentimento, o vazio paterno que está dentro de mim me preenchem fortemente, enquanto saía do banheiro parei de frente ao espelho do lavatório e a voz do pesadelo voltou a preencher o meu psicológico.
Aperto os meus dentes de tanta raiva, que chegava até a doer, os meus olhos totalmente avermelhados, com toda a adrenalina me subindo, e me atordoando, fechei os meus punhos e soquei o espelho a minha frente, o mesmo caiu todo no chão em pedaços, fazendo um barulho estrondoso, os meus punhos começam a sangrar, mas a dor eu não sentia, a única coisa que eu sinto no momento é a raiva.
- Filho, está tudo bem? - Gritou a minha mãe batendo na porta do banheiro, o desespero em sua voz era notável.
Não respondi, me recompus, e abri a porta do banheiro saindo do mesmo, os olhos da minha mão foram logo parar na quantidade de cacos estavam no chão do banheiro e no sangue que escorria dos meus punhos ainda cerrados, dando de encontro ao chão.
- Olha para mim. - Puxa o meu braço, enquanto passava por ela. - O que é que aconteceu? - O seu tom de voz é tão calmo e sereno que me reconforta.
- Foi só o espelho que caiu. - Respondo frio, sem manter contato visual com ela. - Mãe pode me deixar vestir por favor? - Pergunto, fazendo sinal que eu estava de toalha.
- Eu sei que não foi isso que aconteceu, você não pode mentir para mim, eu sou sua mãe, eu percebo de tudo que você sente, eu sei que algo está te atormentando aí dentro, eu sei. - Os seus olhos pretos bem penetrantes, estavam cobertos de preocupação.
- Seja lá o que for, a mamã está aqui com você. - Me reagrega em um abraço caloroso, que fez com que pelo menos uma boa parte da raiva se desfizesse. - Vou deixar você vestir, vou terminar de preparar o café da manhã. - Se desfaz do abraço beijando o meu rosto.
Faço que sim com a cabeça e ela se retira do meu quarto, vou até ao meu guarda roupa e opto por vestir um calção de tecido fino acima do joelho, com flores de estampas, de couro cinzento e azul, com uma t-shirt branca, prestes a sair do quarto, a melodia de notificação do meu telefone ecoa.
Vou até ao criado mudo e pego o meu telefone, é uma mensagem da Paula.
Mensagem on.
Paula: Bom dia!... Dormiste bem?... Eu já estou a caminho do hospital. 😊
Jarede: Que horas, você vai sair hoje do hospital?
Paula: Por ser sábado, hoje saio ao meio dia, está tudo bem?
Jarede: Então eu vou a sua busca, depois conversaremos.
Paula: OK!
Mensagem off.
Eu preciso conversar com alguém sobre estes pesadelos e só com a Paula eu me sentiria confortável em falar sobre o assunto, com esses pensamentos o flashback da noite passada me preenche. Depois de eu deixar ela em casa e ter chegado em casa ela ligou para mim e conversamos por mais de três horas sobre vários assuntos, confesso que nunca falei tanto tempo com uma pessoa por telefone ou mesmo pessoalmente da forma que eu falo com a Paula, com ela é totalmente diferente, com ela eu me sinto totalmente livre para conversar sobre qualquer assunto, seja ruim ou bom.
Aposto que ela deve estar preocupada e ansiosa, para saber o que é que eu quero conversar com ela.
Com esses pensamentos, saio do meu quarto, indo em direção a sala e dou de cara com a minha mãe tomando o seu pequeno café, sentada na cadeira rolante central do balcão da cozinha.
- Eu estava te esperando para começarmos a tomar o nosso café juntos. - Diz, passando manteiga na metade de pão, que estava em suas mãos.
- Eu estou sem fome mãe. - Me sento na cadeira rolante, que está a sua direita.
- Você tem que comer, obrigatoriamente, daqui a pouco tens de tomar sua medicação. - Exige. - O que está te atordoando tanto?.. Tem a ver com a Paula? - Indaga perplexa.
- Tá bem mãe, eu vou comer. -Digo, pois, não queria contrária-lá. - Não tem nada a ver com a Paula mãe, nós estamos bem. - Esclareço.
- Então o que é que está te atordoando deste jeito? - Pousou as suas mãos no meu rosto para eu encará-la.
- Não quero falar sobre isso agora mãe, por favor, vamos comer? - Digo, praticamente implorando, para não entrarmos neste assunto.
- Tá bom, qualquer coisa eu estou aqui para você. - Sorri simpaticamente me fazendo sorrir também, digo que sim com a cabeça e começamos a tomar o nosso desjejum.
Foi tranquilo, minha mãe tentava puxar alguns assuntos comigo e eu interagia, depois de tomar a minha medicação, estou de volta no meu quarto, para me trocar, para ir buscar Paula, decidi sair mais cedo de casa, pois não há o que fazer, troco apenas o calção por uma calça jeans clara, rasgada entre os dois joelhos, e coloco um vans azul e branco, pego os meus pertences e saio do quarto.
- Mãe, eu já volto! - Me despeço, indo em direção a porta, minha mãe estava na cozinha, arrumando os ingredientes para o almoço, por cima do balcão.
- Tá bem, só não te atrases para o almoço. - Esclarece, sorridente.
- Farei o possível mãe. - Sem prolongar mais a conversa, saio do apartamento descendo as escadas cautelosamente, saindo assim do prédio, desbloqueando a fechadura da meu carro e entrando no mesmo.
O meu trajeto até ao hospital foi ouvindo o álbum Indigo de Chris Brown, um dos meus cantores favoritos, as estradas estavam pouco movimentadas, em quinze minutos, acabei chegando ao meu destino. Estacionei o carro no quintal do hospital e segui o meu caminho até ao primeiro andar do hospital.
O elevador se abriu e lá estava a Paula, vestida desta vez com um jaleco branco, o seu cabelo prendido, o seu rosto tímido, a frente de sua bancada havia um homem vestido com um jaleco idêntico ao dela, parecia que os dois estavam conversando, uma corrente de raiva já estava me subindo pelas veias e só piorou quando vejo as mãos do homem irem de encontro às mãos de Paula, que estava estagnada na sua bancada de serviço, Paula desconfortável e sorrindo envergonhada puxou a sua mão por debaixo da mão do homem de cabelos cacheados.
- Bom dia! - Cumprimento sério, apertando os meus dentes, Paula pareceu surpresa e o homem continuou com os seus olhos no rosto de Paula, me ignorando completamente, fazendo a minha raiva aumentar.
- Hey, chegou cedo. - Disse Paula, surpresa, colocando sua atenção totalmente em mim. - Elisandro, este é o Jarede meu namorado, Jarede este é o Elisandro meu amigo e colega de trabalho. - Apresentou-nos, ainda nervosa.
Sorrio, apertando os meus dentes, com os olhos cravados no rosto do Elisandro, e ele fez o mesmo e voltou a se virar para olhar Paula, olhar este que já estava me irritando.
- Olha aqui. - Agarro pelas golas do jaleco do homem, fazendo o mesmo manter contato visual comigo, ele e Paula pareciam estar surpresos com a minha atitude. - Você pensa que eu sou lerdo ou tenho cara de palhaço? - Indago irritado cuspindo cada palavra com raiva.
- Jarede, larga ele às pessoas estão olhando. - Disse Paula, saindo por de trás de sua bancada se aproximando de mim e do homem, ela estava totalmente nervosa.
- Olhando, bem você me parece um agressivo de merda, além dos dois adjetivos que você já citou. - Retrucou o doutor, em um tom sarcástico.
O meu sangue, já estava fervendo de tanta raiva e às minhas veias pulsando forte, retirei bruscamente as minhas mãos das golas do jaleco do doutor e soquei o seu nariz com bastante força, fazendo o mesmo cair devido ao impacto do soco o que fez seu nariz sangrar de imediato.
- Elisandro. - Gritou Paula, indo de encontro à ele que estava jogado no chão, com as suas mãos no nariz, em questão de segundos, várias enfermeiras apareceram ajudando o doutor a se levantar.
Eu apenas continuei no meu lugar, apertando cada vez mais o meu punho de raiva.
- SEGURANÇAS! - Gritou uma das enfermeiras, enquanto ajudavam ele a se levantar.
- Não é necessário chamar, eu já estou indo embora. - Digo, dando meia volta para ir até ao elevador. - Agora, você sentiu o quão o murro de um palhaço é firme, seu aproveitador do caralho. - Digo, me virando para olhar o seu rosto totalmente ensanguentado, o sangue escorria pelo seu jaleco o manchando.
O homem de cabelos cacheados, estava com os olhos avermelhados de tanta raiva e de punhos serrados, caminhei em direção ao elevador, clicando no botão e entrando no mesmo.
- O que você fez? - Indagou Paula, entrando no elevador, o mesmo só tinha apenas nós dois. - Aqui é o meu local de trabalho. - Diz, novamente estressada.
Suspiro frustrado, decidi ignorar o que ela estava dizendo porque a raiva ainda estava me dominando e não quero dizer coisas para ela que depois eu possa me arrepender, o elevador se abriu, saí caminhando e ela fez o mesmo.
- Agora vai me ignorar? - Indaga puxando o meu braço, me fazendo virar e olhar para os seus olhos. - Você pode ser preso por agressão física. - A preocupação nos seus olhos eram evidente.
O fato de saber que ela estava preocupada comigo, fez com que toda raiva que eu estava sentindo se desfazesse.
- Eu saio da minha casa com o intuito de vir conversar contigo sobre o que me atormenta, chegando aqui, vejo você conversando com um homem, o mesmo tenta se aproveitar segurando nas suas mãos, me aproximo de vocês, dizes para ele que eu sou teu namorado e ele nem se importou, ignorou o simples fato de eu estar ao lado e ficou te encarando com um olhar de desejo, o que você queria que eu fizesse? - Indago, desta vez em um tom alterado.
- Eu e ele somos apenas bons amigos e colegas de trabalho, você deve confiar mais em mim, porque nós estamos juntos agora. - Justifica, ainda segurando o meu braço.
- Você acha que ele quer ser seu amigo? - Indago sarcástico. - Ele estava se aproveitando de você, ele quer algo com você e isso é evidente nos olhos dele.
- Eu sei que ele gosta de mim, mas eu já fui bem clara em lhe dizer que somos apenas amigos e ele entendeu.
- Paula, abre a porra dos teus olhos e enxerga o que tens a tua volta, mas tudo bem se é o que você acha e o que você quer, então ok! - Falo, finalizando a conversa.
- Porquê é que você está tão agressivo hoje? - Indagou, desta vez mais calma. - Eu enviei-te uma mensagem e deu logo para perceber que não estavas bem, eu fiz algo de errado? - Passou as suas mãos no meu rosto, me fazendo soltar um longo suspiro.
- Vem, vamos até ao meu carro. - Seguro as suas mãos, lhe conduzindo até a parte de fora do hospital.
Caminhamos em direção ao meu carro, abri a porta de passageiro para que ela entrasse, seguida entrei no carro me sentando no banco de condutor.
Ela olhou para mim, se apercebendo que eu estava nervoso, as minhas mãos suavam e o meu coração batia tão rápido.
- Eu estou aqui contigo. - Segurou na minha mão esquerda fazendo carinho com os seus dedos me encorajando a falar, contar para ela o que de verdade me atormenta.
Depois de alguns minutos em silêncio, dou um suspiro longo e começo a falar.
- Até aos meus dez anos de idade, sempre fui uma criança bastante alegre, simpática e educado, mesmo sem ter um afeto paterno, o amor que minha mãe e meus avós me transmitiam eram o suficiente para mim, vivia como uma criança normal, não pensava no meu pai por nada, para mim ele não existia.
Os meus avós, apoiaram a minha mãe em tudo, eles sustentavam a casa com os seus salários de contabilistas e pagavam a formação da minha mãe. Eu sempre quis, ser igual aos meus avós, por isso alimentei essa paixão de contabilidade geral, a relação da minha mãe com os meus avós era saudável e bastante sólida, mas com o passar do tempo está relação passou a ser meio fria e bastante difícil, pois a minha avó, por diversas vezes encontrava a minha mãe chorando pelos cantos da casa, se atordoando por causa do meu pai, de certa forma isso frustrava bastante a minha avó porque era difícil entender o porquê da minha mãe ainda continuar apaixonada por ele, depois dele ter a abandonado... Às discussões da minha avó com a minha mãe só pioravam, meu avô tentava intervir sempre pedindo calma a minha avó e para que tentasse entender ou pelo menos se colocar no lugar da minha mãe, mas minha avó parecia nem dar ouvido ao que meu avô dizia. - Cada palavra que eu saia da minha boca deixava-me apavorado, mas eu devia continuar.
- Meu avô, tentava me impedir de ouvir as discussões que ocorriam entre minha mãe e a minha avó, mas era impossível porque a voz da minha avó ecoava por todo canto da casa. Tudo o que eu ouvia me fazia sentir completamente culpado, pois graças a minha existência a minha mãe foi abandonada pelo o homem da sua vida. Ver o sofrimento da minha mãe por perto me fazia ter sentimentos que eu nunca me imaginei a ter, sentimentos estes que são a raiva de tudo e todos, principalmente de mim. Ver os meus coleguinhas de escola com os seus pais todos sorridentes me fazia sentir falta do meu pai, a pessoa que para mim era indeferente se está vivo ou não, eu vivia a minha vida sorridente porque o amor da minha mãe e dos meu avós me bastava. O tempo foi passando e eu estava me tornando num rapaz fechado, com poucos amigos, às conversas e brincadeiras que eu tinha fluentemente com os meus avós e minha mãe raramente aconteciam. Mas a raiva por ser o motivo da infelicidade da minha mãe me torturava por dentro e ninguém se apercebeu, a solidão era a minha melhor compainha, a falta de um calor paterno me preenchia completamente, me tornando em um ser bastante difícil de lhe dar. A partir daí, começaram a surgir os pesadelos, pesadelos estes que sempre foram os mesmos, sempre com a voz da minha avó ecoando e eu dentro do quarto escuro lacrimejando de medo, dor e raiva por não ter um pai para me defender. Nunca contei nada sobre estes pesadelos a ninguém, nem sequer a minha mãe, uma criança normal depois de um pesadelo acordava logo a sua mãe ou o seu pai com um grito enorme de seus choros, mas comigo era diferente depois do pesadelo eu não gritava, nem acordava a minha mãe, sentia aquele pavor completamente sozinho, factor este que me diferencia de uma criança normal... A morte dos meus avós só me fez se sentir mais forte para seguir em frente e tentar dar uma vida confortável à minha mãe, mesmo com a dor de ter perdido os meus avós que eram os pilares para mim e para minha mãe, a raiva de não ter um pai por perto ainda tinha espaço dentro de mim me tornando em um ser de poucos amigos.
Mais um capítulo terminado! Desculpa por qualquer erro e se estiver não exitem em falar! Não se esqueçam do vosso voto e comentários. Desculpem a demora.
Fiquem com Deus!
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