DEL LEE
Ontem mostrei meu antigo quarto para Hyunjin e relembramos boas memórias. Hoje, acordo neste mesmo quarto, e dou de cara com aquela televisão que apareceu no meu sonho. Antes mesmo de poder raciocinar algo, liguei ela, e passei alguns canais. Impressionantemente ainda estava funcionando, então tive a brilhante ideia de colocar no canal 21. Ao chegar nele, vi uma tela estática escrito apenas "Caledon Local 21" e uma musiquinha de elevador ao fundo.
Deixei a televisão intocável lá, e fui para a cozinha. Tomei café da manhã com meu pai e conversamos um pouco. Ele disse o quanto sentia falta de mim, e eu também falei o quanto queria voltar a morar em Brampton. É uma vontade genuína minha, mas não é possível no momento. Brampton não é uma grande cidade como Toronto, e a minha carreira aqui seria mais fracassada do que já é.
Depois de algum tempo ajudando meu pai com algumas tarefas de casa, resolvi sair. Eu queria visitar o antigo parquinho que frequentava junto com meus colegas da escola. Aquele lugar me decepcionou um pouco. Não estava colorido, repleto de crianças, todas sujas de areia correndo e gritando enquanto davam altas gargalhadas. Pelo contrário, o parque estava abandonado, e apenas vi um grupo pequeno de adolescentes conversando em um banco.
Um pouco mais para trás, vi dois policiais encostados em um carro conversando. Percebi que um deles era Lee Minho, então fui andando em sua direção, que percebeu e acenou. Também falou algo para seu colega e o cutucou, que logo em seguida entrou no carro, deixando apenas Minho ali fora.
― Como está? ― Ele perguntou, erguendo a mão.
― Bem, e você? ― Apertei sua mão com minha mão esquerda, e ele se assustou.
― O que é isso? ― Ele perguntou olhando para minha mão. Tinha esquecido desse detalhe. Acho que ele não percebeu da outra vez pois estava usando uma na mão direita.
― Na minha mão? Ah, eu me queimei há uns anos atrás.
Eu tinha uma queimadura horrorosa na minha mão esquerda. Tinha vergonha de contar a história para ele, pois me arrependo amargamente.
Quando era adolescente, queria fazer coisas que os outros meninos da minha idade faziam: beber, fumar, ir à festas, pegar geral, mas eu não podia. Meu pai sempre estava me vigiando, se tornou muito protetor desde que minha mãe morreu, aos meus doze anos. Então quando fui morar em Toronto com Hyunjin aos dezoito, aquilo foi o paraíso para mim. Poderia finalmente fazer tudo o que não fiz na adolescência, mas acabei exagerando.
Um dia, na varanda de casa, eu abri um uísque com mais de cinquenta por cento de álcool, o que significa que é altamente inflamável, e mergulhei um cigarro nele. Depois, coloquei-o em minha boca e acendi com um fósforo.
Percebi um barulho estranho e senti o calor mais perto do que deveria, então rapidamente reagi, tirando o cigarro da minha boca com a mão esquerda. O único problema é que nesse desespero todo, deixei cair um pouco de álcool na mão, então o fogo tomou a minha mão inteira, fazendo com que eu ficasse com uma queimadura de primeiro grau que deixou cicatrizes feias.
Hyunjin me ajudou apagando o fogo com um extintor que tinha no corredor em frente a porta da nossa casa, e depois corremos para o hospital. Pra surpresa de ninguém, eu nunca mais toquei em uma bebida alcoólica ou em um cigarro.
― Ah sim, entendi. ― Minho respondeu.
― Eu tava passando por aqui pra ver como estava o parquinho, mas não está nas melhores condições, não é? Na época em que eu era criança, a gente brigava pelos brinquedos.
― Não posso concordar, eu vim morar aqui pois fui transferido para essa cidade há três anos.
― É? De onde você era?
― Caledon.
Os pelos do meu braço de arrepiaram ao ouvir o nome daquele lugar, e não pude esconder meu sorriso. Essa era minha chance de saber mais sobre o programa que eu assistia.
― Você assistia o canal Caledon Local 21?
― Não, já era grande na época que esse canal fazia sucesso. — Percebi uma hesitação em sua resposta.
― E já ouviu falar do programa do Sr. Urso?
― É.
― Que horas acaba seu expediente?
― Que perguntas são essas? ― Minho franze a sobrancelha.
― Fala aí, quero te encontrar em um lugar.
― Sete horas da noite.
― Beleza, te vejo nesse horário hoje no Boucher's. ― Comecei a andar de volta para minha casa, mas ainda de frente para ele.
― Está me convidando para um encontro?
Eu levantei os dois braços na altura do ombro e inclinei a cabeça para o lado, pressionando os lábios. Boucher's é a cafeteria mais famosa e bem-sucedida da cidade. Mesmo sumindo por dez anos de Brampton, eu ainda acompanhava o lugar pelas redes sociais, e acredito que seja a loja que mais se deu bem nesses anos. Esse lugar é conhecido por ser local de encontros entre casais e reuniões de trabalhos universitários.
Voltei para casa e dei de cara com Hyunjin sentado no sofá da sala vendo televisão com meu pai.
― Hyun, vem cá.
Nós dois entramos no meu quarto e ele sentou em minha cama. Fiquei sentado em uma poltrona ao lado dele.
― Fala aí. ― Ele se ajeitou na cama.
― Eu conheci um policial ontem aqui na cidade, hoje vamos à uma cafeteria. Ele vai me ajudar a descobrir sobre o canal de Caledon.
― Que ótimo! Ele topou?
― Não, mas ele vai topar. Só disse que iríamos no Boucher's, não sei nem se ele vai, mas estou na fé.
― Boa sorte pra você. Vai precisar, eu acho.
— Ele pensa que é um encontro. Hilário. — Ri.
— Poxa, já sei que ele não vai. Feio desse jeito que cê é...
Meu queixo caiu e Hyunjin começou a rir alto. Ele adorava fazer piadas sobre o quanto eu era feio e etc. Típico amigo que você acha que te odeia, mas é só seu jeito mesmo.
— Sério, acho que ele pode ajudar. E muito. Me falou que é de Caledon, conhece conhece o programa e sempre ouvia policiais mais experientes falarem sobre. Não é possível que não saiba de nada.
— Só toma cuidado com essas coisas, tá? Esse programa era esquisitíssimo e não duvido de que tenha algo mais estranho ainda por trás.
— Sei lá, as vezes acho que era só uma brincadeira de mau gosto para assustar crianças. Atores contratados e tudo mais. — Hyunjin riu.
— Quando você vai deixar de acreditar nessas teorias da conspiração malucas? Só falta falar que a terra é plana. — Negou com a cabeça.
— Olha só, respeito, tá? Eu nunca faria tal atrocidade. — Arregalei os olhos e falei, apontando o dedo indicador em sua direção.
O que poderia acontecer de tão ruim? Só iria conversar com o delegado hoje no Boucher's — cafeteria dos descendentes diretos de François Boucher — e seria só um papo rápido, perguntas de sim ou não e chegaria a uma conclusão sobre isso hoje mesmo. Afinal, não tinha tanto tempo. Eram alguns dias ali e tchau tchau Brampton, olá Toronto. Eu e Hyunjin passamos a tarde assistindo reprises de episódios bem antigos de Pokemón, o motivo pelo qual havia ganhando aquela televisão.
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