Capítulo 4
Desespero
– O que está acontecendo??? Onde está a minha filha???
– Sua filha... Ela atravessou o Portal...
– Do que você está falando??? – seu tom de voz estava exaltado.
– Sua filha atravessou o espelho...
– Você só pode estar maluco... – disse incrédula – Ninguém pode atravessar um espelho...
– Isso não é um espelho qualquer... É um Portal.
– E você quer que eu acredite que ela atravessou... Isso???
Por um instante houve um tremor no cubículo e as luzes piscaram. Isabel ficou mais assustada ainda com a situação, enquanto Miguel continuava pensando em uma forma de provar a ela o que havia dito.
– Angelina... – chamou Isabel aflita – Onde você está???
– Não vai adiantar chamá-la. Ela atravessou o Portal, não pode nos ouvir...
– Não brinque comigo!!! – disse em tom de desespero – Quer que eu acredite que minha filha está morta???
– Ela ainda está viva... Só não sei por quanto tempo...
Os olhos de Miguel foram ao chão e ele percebeu uma pulseira delicada diante do espelho.
– Isso é da Angelina? – indagou e lhe entregou a pulseira.
No instante em que segurou a pulseira na mão, seus olhos se encheram de lágrimas.
– Não pode ser... – soluçou – Não... Isso não é verdade!!! seus olhos transbordaram em lágrimas que ela não conseguia conter – Angelina!!! Onde você está??? – gritou pelo corredor como se ela fosse aparecer em qualquer direção.
– Acalme-se!!! – disse Miguel segurando-lhe o ombro e encarando-a – Vai ficar tudo bem... Podemos...
– Eu quero a minha Angelina!!! – disse aos prantos Precisa me ajudar a encontrá-la!!!
– Isabel... Eu sinto muito... Mas não podemos fazer nada ainda... Acalme-se... Por favor... – insistiu ele ao passo que ela deixava as lágrimas lavarem seu rosto.
Ela sentiu o coração apertado e soltou um grito abafado. Não queria acreditar no que estava acontecendo.
– Minha filha é tudo o que tenho na vida...
– Eu imagino, mas não vai adiantar ficar se lamentando, temos que arrumar uma maneira de tirá-la de lá...
– Você fala assim porque não é sua filha que está lá!!!
– Eu tive um filho... – foi então que os olhos de ambos se encontraram – e ele está perdido... – sua voz saiu abafada.
Os dois ficaram parados frente a frente, como se fossem dois estranhos e um silêncio infinito permaneceu entre eles.
– Você teve um filho? – disse sussurrando, um pouco mais calma.
– Há oito anos...
– E por que não disse isso antes?
– Não havia motivo...– E a sua esposa? – indagou cautelosamente.
– Ela morreu em um acidente de carro, logo depois que Pedrinho atravessou o Portal.
–Você perdeu seu filho e sua mulher ao mesmo tempo...
– Eu não gosto de lembrar disso... – ele consultou o relógio Tenho que fechar o Museu.
– Fechar??? Minha filha está dentro desse espelho... Quero levá-lo para casa!!!
– Você não pode levar isso para casa!!! Ninguém pode...
– E por que não???
– Vai arriscar a vida de mais pessoas... Não podemos...
Isabel baixou a cabeça, enxugou as lágrimas e mesmo com o coração apertado, saiu do cubículo acompanhada de Miguel.
Alguns minutos depois, ele tentou confortá-la.
– Você está bem? Perguntou ele com um tom de preocupação
– Isso é impossível...
– Gostaria de ir até minha casa para conversar? A menos que seu marido...
– Sou divorciada... – ela respirou profundamente.
Cada um entrou em seu carro e seguiram em direção à casa de Miguel na esperança de explicar e entender melhor o que aquela situação significava.
– Peço que não se importe com a bagunça... – e destrancou a porta.
Isabel nem sequer ouvia o que ele falava, seus pensamentos giravam em torno de Angelina. Queria saber como deveria ser a outra dimensão daquele espelho, afinal, ela era apenas uma criança inocente de apenas sete anos de idade...
– Sente-se, eu já volto. – ele deixou-a na sala bemarrumada, e foi fazer um chá de camomila para acalmá-la.
Isabel reparou em um retrato com a foto de casamento de Miguel com uma moça loira de olhos claros, que julgava ser sua esposa.
– Essa é Daiane... – sorriu lhe entregando a xícara de chá Beba, isso vai acalmá-la.
– Ela é linda... – disse ao sorver delicadamente um gole de chá.
– E esse é Pedrinho... – e lhe entregou outro retrato.
– Nossa... Ele é tão...
– Parecido com a mãe? Eu sei... É o que todos dizem... sorriu.
Isabel silenciou por um instante. Havia uma pergunta em sua mente.
– Como seu filho atravessou o Portal?
Os olhos de Miguel procuraram a foto de Pedrinho como se buscassem a resposta.
– Ele foi ao Museu comigo, a porta do cubículo estava aberta e...
– E por que você não trancou a porta naquele dia?
– Aquela porta estava trancada, eu girei aquela maldita chave três vezes, verifiquei a fechadura e estava tudo normal. Só eu tenho a chave daquele cubículo.
– O que você quer dizer com isso?
– A porta pode ser trancada milhares de vezes, mas ela abre sozinha, como se quisesse...
– Procurar sua vítima... – completou incrédula.
– Hoje de manhã, tranquei aquela porta, mas quando voltei, estava aberta.
– Desde quando o espelho está no Museu?
– Há anos, antes mesmo de começar a trabalhar lá.
– E como sabe que se trata de um Portal e não de outra coisa?
– Quando eu tinha uns sete anos, meu pai me levou ver as ruínas do casebre de meu avô Leonel. Lá ele enterrou no chão duas cruzes negras, como se quisesse ofender alguém com aquele gesto. Aquele ato se consumou diante de uma árvore. Mas aquela árvore é estranha. Sonho com ela desde aquele dia. É como se ela me chamasse... Meu pai me disse que na época em que meu tio Hugo, com sete anos, morreu vítima de febre amarela, um senhor encapuzado matou meu avô. Meu pai conseguiu ouvir a proposta que o Mago fez ao meu avô em troca da vida de Hugo: teria que conseguir sete crianças mortas e trazê-las até ele na segunda noite. Leonel conseguiu cinco crianças, faltavam duas, mas o Mago não relevou e o matou. Hugo também morreu naquela noite...
Ela o escutava horrorizada.
– Certa vez estava sozinho no casebre de meu avô e vi um espelho enorme perto da árvore. Desta vez algo me chamou até lá e Hugo apareceu chorando. Pediu para que eu não chegasse perto. Sentia que tinha que acabar com aquilo tudo, com todo o mistério. O espelho era um Portal, não entrei nele porque meu pai apareceu e então eu saí correndo.
– Isso é terrível... Você poderia estar preso no Portal agora... Mas como isso é possível, se hoje você se aproxima e não acontecesse nada?
Diante de todas aquelas experiências ele ainda não havia conseguido decifrar exatamente as respostas de que precisava.
– Tenho suposições...
– E quais são elas?
Os olhos de Miguel caíram outra vez na foto de seu filho.
– Se todo esse tempo em que estive perto do Portal e só quando criança me sentia atraído, tudo me leva a crer que ele... – engoliu em seco – ...só atrai crianças.
– Então por isso não acontecesse nada com você... Mas por que crianças?
– Talvez, porque elas são os seres mais puros que existem no mundo. As crianças são puras de corpo e alma, são sensíveis. O Portal é um objeto que procura seres puros pelo fato de precisar de energia viva. Você não o procura, ele lhe encontra, e quando isso acontecesse, não há como fugir...
– Esse é o motivo dele ter levado nossos filhos?
– Não sei... Mas deve haver uma explicação.
– Eu ouvi o choro de uma criança...
– Choro de criança?– Quando atravessamos o corredor, ouvi o choro de alguém... Parecia um menino chorando...
Miguel pensou em milhares de coisas. E se fosse Pedro?
Isabel ficou mais alguns instantes conversando, mas logo foi embora.
Mesmo com o pensamento em sua filha, não adiantava ficar chorando. Por mais desesperada que estivesse, teria que fingir que nada estava acontecendo.
Mais tarde, enquanto Miguel dormia tranquilamente em seu apartamento, Isabel sonhava com algo estranho...
*******
Havia uma encruzilhada em uma rua escura. Lá estava o espelho, ou seria o Portal? E diante dele se refletia a figura de um menino doente, segurava uma coisa brilhante nas mãos... e balançava... balançava... A luz era cada vez mais intensa... A luz se explodiu... E logo estava em uma escuridão absurda... Lápides... Muitas lápides... Estava em um cemitério... Várias covas abertas... Um clarão novamente...Uma montanha... muito alta de onde podia-se ver um lago cristalino... Um lago onde estavam boiando corpos de defuntos... alguém surgiu atrás deles e os empurrou para dentro do lago... não conseguiam respirar... estavam sem ar...
– Ah...!!! – suspirou Isabel despertando e percebendo que estava embaixo do cobertor.
O sol batia na janela do quarto de Angelina. Os olhos de Isabel se encheram de lágrimas ao lembrar que sua filha poderia estar ali, deitada naquela cama aconchegante, naquele quarto aquecido, perto de seus brinquedos, perto de seu piano...
Onde estava aquela música leve e calma do amanhecer? Onde estava a alegria do lar em ver aquela pequena menina se levantar para ir à escola ou correndo para os braços da mãe? Onde estava a alegria nos olhos doces ao tocar piano? Quem havia roubado o tesouro mais importante daquela mãe?
Haviam-se passado alguns dias e ela acabara pensando, como Miguel suportava a falta do filho e da esposa todo esse tempo? Duas feridas ainda não cicatrizadas que enchiam uma vida de angústia e sofrimento. Pedrinho estaria morto, e Angelina também?
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