Capítulo 2
"Lembre-me mais uma vez quem eu sou, porque preciso saber"
You Say (Lauren Daigle)
Belle
A luz incomoda, coloco um travesseiro sobre meus olhos, minha cabeça está doendo, minha garganta está seca e meu estômago embrulhado. Eu bebi demais. Eu estou deitada sobre um colchão confortável, abro meus olhos com calma, olho ao redor, eu estou em meu antigo quarto, não faço a mínima ideia de como cheguei na cama. Minhas lembranças são flashes, minha última recordação concreta são minhas palavras ácidas para Emily, minha amiga não merecia nenhuma delas. Lágrimas acumulam-se em meus olhos, eu sei que magoei minha melhor amiga, eu não sou uma pessoa de descontar minhas frustações em outras, eu não sou maldosa. Eu não gosto dessa Belle amargurada.
A dor em meu peito continua, será que um dia ela irá me abandonar? Sequer a bebida conseguiu a afastar.
Sento em minha cama, eu estou um pouco tonta, encaro a parede a minha frente, o que farei agora? É como se, eu não soubesse como seguir, eu estou me sentindo vazia, fracassada, ao mesmo eu não sinto nada, há buraco em mim. É angustiante. Às lágrimas nublam minha visão, mas não deixam meus olhos, eu não quero mais chorar, eu não tenho mais forças, eu quero apenas voltar a dormir.
Mesmo sem vontade, deixo a cama, caminho para o banheiro anexado no quarto, ao entrar e olhar no espelho, eu posso ver o quão estou acabada, rímel borrado e por conta do choro está espalhado por todo meu rosto, meu rosto está inchado mais uma consequência das minhas lágrimas e há olheiras sob meus olhos. Eu estou deplorável.
Retiro minhas roupas, ligo o chuveiro, entro no box, posiciono meu corpo sob água, eu gostaria que as gotas levassem minhas dores para longe. Elas não tem esse poder.
Não uso sabonete, ou shampoo, somente deixo a água cair pelo meu corpo.
Apenas dou meu banho por encerrado quando minha pele está enrrugada e ardendo, por conta da temperatura elevada da água. Enrolo uma toalha ao redor do meu corpo e outra em meu cabelo, escovo os dentes e deixo o banheiro, caminho para o quarto.
Ecuto uma batida na porta e logo em seguida é aberta, Emily entra, meu coração aperta ao vê-la, eu estou me sentindo culpada, interrompo minha caminhada e olho para ela sem saber como reagir, ela sorri.
— Antes ir embora, eu vim vê-la, queria saber se estava acordada para conversar com você.
Apoia seu corpo na parede ao lado da porta, eu continuo parada entre a porta do banheiro e a cama.
— Desculpe.
Não há mágoa, ou ressentimento em seu olhar.
— Não precisa se desculpar.
Seu olhar é carinhoso, ela sabe que estou prestes a chorar, é a sua forma de dizer "Está tudo bem, Belle."
— Preciso sim. — Balança a cabeça negando. — Eu machuquei você, eu utilizei do que mais dói em você.
Emy sorri, um sorriso triste, mas um sorriso.
— Está tudo bem, Belle. — Suspira. — Por muito tempo, eu me culpei e eu não desejo o que senti a ninguém, mas eu aprendi a conviver com a minha escolha.
Por alguns segundos ficamos em silêncio, ela está olhando em meus olhos, eu estou olhando em seus olhos, eu sei que Emily tem mais a dizer.
— Mas, Belle, tudo aconteceu como deveria acontecer. — Mais uma pausa. — Eu fiz um aborto em um momento de desespero, eu vi minha vida saindo do roteiro perfeito que existia em minha mente, e então eu perdi o controle, eu simplesmente pensei e agi, um impulso, a Emily de hoje nunca faria um aborto, mas a Emily de hoje só existe pelas escolhas da Emily do passado, se você me perguntar se voltaria no passado e mudaria o que aconteceu, eu diria não, porque eu tenho medo de perder o que eu tenho hoje. Você não me magoou com suas palavras.
Eu conheço minha amiga e sei que ela está sendo sincera, mas suas palavras não diminuem a gravidade das minhas palavras.
— Você é muito forte, Emily, eu amo você e ver quem eu amo feliz me faz feliz, eu sinto muito pelo que falei ontem, eu não sou essa pessoa, eu não quero ser como a Belle de ontem, mas no momento, eu talvez, só saiba ser ela. — Ás lágrimas deixam meus olhos. — Eu não suporto mais chorar, não suporto mais esse vazio, é um vazio tão cheio, ocupa tanto espaço.
Meus braços estão ao lado do meu corpo, eu estou em pé no meu quarto, encarando minha amiga, eu estou vulnerável, sem barreiras, sem proteção alguma, eu estou nua, não nua fisicamente, minha alma está nua.
— Ontem ao ouvir as suas palavras, eu chorei por você, eu chorei, porque, eu sei como é esse vazio, o vazio mais cheio do mundo, ele sufoca você, afasta todos seus sentimentos. — Seu olhar está longe, provavelmente no passado, relembrando toda sua dor, após alguns segundos olha para mim, volta ao presente. — É possível voltar a ser feliz, Belle, eu sei que pode parecer fácil falar, mas eu estive onde você está, eu já fui somente dor, é possível deixá-la.
Eu quero tanto acreditar em suas palavras, mas simplesmente não consigo, como ser feliz novamente? Como não sentir mais a dor? No momento parece impossível.
— Eu estou torcendo para você estar certa, Emily.
Sorri, o sorriso de quem superou suas piores dores, um sorriso encorajador.
— Eu estou, mas enquanto estiver sofrendo saiba que estarei ao seu lado.
Minhas lágrimas continuam descendo pelo meu rosto, mas eu sorrio, Emy aproxima-se e passa seus braços ao redor do meu corpo, eu a abraço.
— Obrigada por estar aqui, eu amo você, Emy.
Afasta-se, segura minhas mãos com as suas.
— E eu amo você. — Emy olha para mim como se fosse me contar um segredo. — Por muito tempo, eu não me sentia digna de ser mãe, mesmo após ao nascimento de Valentina, eu me sentia menos e foi ao olhar nos olhos de Mia que toda minha insegurança desapareceu, todos meus medos sobre ser digna ou não de ser mãe naquele momento evaporaram, porque meu coração e minha alma reconheceram minha filha, eu precisava ser sua mãe, não importava meu passado, minhas escolhas, Mia precisava de mim e eu precisava dela.
O brilho em seus olhos ao falar das filhas é tão intenso, tão lindo.
— Com Valentina eu me tornei mãe, mas foi ao encontrar Mia que eu entendi por completo o que é ser mãe, há muitas maneiras de ser mãe Belle, eu reconheci minha filha quando ela sorriu, quando olhei em seus olhos, nem sempre nossos filhos nascem de nós. — Suas palavras são como um tapa e ao mesmo tempo um sopro de esperança, uma de suas mãos desvencilha-se da minha e limpa meu rosto, afasta minhas lágrimas. — Eu imagino que seja difícil, imagino que esteja doendo, mas talvez em alguma parte do mundo, alguém esteja precisando do seu amor, esperando por você, esperando encontrar a sua mãe, o que faz uma mãe não é o sangue, é o amor.
É como se parte do vazio em mim diminuísse, como se parte da minha dor fosse consumida por uma parcela de esperança, eu sorrio agradecida, Emily assente, ela entende, somos amigas há tanto tempo, não precisamos de palavras para entender uma a outra, desvencilhamos nossas mãos, Emy afasta-se alguns centímetros.
— Hoje é apresentação de balé das meninas, eu preciso ir, mas qualquer coisa, ligue para mim.
Assinto e sorrio.
— Pode deixar e filme as fofas das minhas sobrinhas.
Assente, beija meu rosto e faço o mesmo.
— Mandarei vários vídeos.
Vira-se e caminha em direção a porta, suas palavras continuam ecoando em minha mente, continuo a observar, abre a porta, olha para mim.
— Ninguém, além de mim e Edu sabe, mas são gêmeos.
Eu sorrio, trocamos um último olhar, e então Emy deixa meu quarto. Após ficar sozinha visto minhas roupas, escovo meus cabelos e saio do quarto, encontro Andy na cozinha, sento no banco de frente para o balcão que divide sala e cozinha, coloca uma xícara de café a minha frente.
— Como você está?
Andy está em pé do outro lado do balcão de frente para mim, segura em sua mão sua própria xícara com café.
— De ressaca. — Andy sorri. — E você como está Andy?
Dá de ombros.
— Bem, eu não bebi tanto como você, então sobrevivi.
Sorrimos.
— E Ally e Mel?
Não há sinal algum das minhas outras duas amigas pelo apartamento.
— As duas tem compromissos e foram embora logo cedo.
Ficamos em silêncio tomando nosso café, eu sou a primeira a terminar, brinco com a xícara, passo a ponta do meu dedo pela sua borda, em minha cabeça estão ecoando as palavras de Emily.
— Você ama Leia e Athur da mesma maneira? — Larga a xícara sobre o balcão, olha para mim sem entender. — Arthur não é biologicamente seu.
Uma parte em mim tem medo de não amar uma criança como ela merece, uma criança que não seja biologicamente minha e de Luís. Andy olha para mim pensativa, então sorri.
— Eu daria minha vida por eles, Belle, eu amo Arthur da mesma maneira que Leia, meu garotinho travesso, não posso imaginar minha vida sem ele, sem nenhum dos dois.
Seu olhar é sincero, puro, transmite amor. A conversa com Emy trouxe esperança, mas também medos e perguntas sem respostas.
— Você acha que posso ser uma mãe, mesmo sem nunca ter gerado um filho, Andy?
Andy tem uma expressão centrada em seu rosto, de todas nós é a mais alegre e extrovertida e a melhor com palavras.
— Não é a gravidez que torna você mãe, Belle, eu descobri como ser mãe com Arthur, eu fui mãe antes de Leia, eu me tornei mãe antes de Leia.
O som da campainha ecoa pelo apartamento, interrompendo nossa conversa. Andreia sorri.
— Essa é minha deixa. — Afasta-se do balcão, abandona a cozinha e aproxima-se de mim, beija meu rosto. — Permita-se viver, Belle, nada do que falarmos para você pode ser comparado com a experiência real, mantenha-se aberta as suas opções, mantenha-se aberta a vida, não se feche.
Mais uma vez, eu recebo tapas e doses de esperanças ao mesmo tempo. Andy está dizendo para lutar, para seguir em frente, para não permanecer triste, amargura, ressentida com a vida. Sorrio.
— Obrigada, amiga.
Beijo sua bochecha, a campainha toca novamente, Andreia sorri.
— Eu preciso ir.
Eu sei que só pode ser uma pessoa, meu coração acelera.
— Quem é?
É uma pergunta apenas para ter certeza.
— O seu bad boy.
Andreia deixa-me sozinha e caminha em direção a saída. De repente, eu estou nervosa e ansiosa. Eu posso ouvir a porta sendo aberta e logo em seguida sendo fechada. Meu coração está prestes a sair do meu peito. Eu estou de costas para a entrada e não posso vê-lo, mas posso sentir sua presença.
Respiro fundo, fico em pé, viro-me, ele está ali em pé na sala, encarando-me, olho em seus olhos, Luís faz o mesmo, o amor da minha vida, o cara que tem parte do meu coração, há tanto na nossa troca de olhar, há sete anos de amor, sete anos que dividimos nossas vidas, nossos sonhos. Ele está olhando em meus olhos e sabe que existe algo errado.
— Eu estarei ao seu lado, porque eu amo você, sereia, não importa o que esteja acontecendo.
Meu marido, meu bad boy, meu amor. O cara que sentirá a mesma dor que eu, lágrimas acumulam-se em meus olhos e eu corro para ele, corro para seus braços.
Seus braços estão ao redor do meu corpo, minha cabeça em seu peito, minhas lágrimas encharcando sua habitual camisa preta. A dor é gritante, meu choro intensifica-se, aperta meu corpo contra o seu ainda mais.
Eu choro em seus braços, eu compartilho minha dor com Luís, ele aceita minha dor sem questionar. Caminha comigo abraçada ao seu corpo, senta no sofá e puxa-me para seu colo, eu vou, segura-me como seguraria um bebê, imaginar Luís com um bebê não é uma boa ideia, é imaginar algo que nunca teremos. Dói, um gemido de dor deixa minha boca, beija o topo da minha cabeça.
— Quando você estiver pronta para falar, eu estarei pronto para ouvir.
Não respondo, não consigo responder, prossigo deixando minhas lágrimas caírem, Luís sobe e desce sua mão pelas minhas costas. Em algum momento, meus olhos pesam, minha mente distancia-se da realidade, então eu fecho meus olhos e adormeço.
Abro meus olhos, deparo-me novamente com as paredes do meu antigo quarto, mas dessa vez há braços ao redor da minha cintura. Viro-me e meu olhar encontra o seu, Luís está preocupado é perceptível, analisa-me a procura de respostas. Eu respiro fundo, meu peito aperta, eu não quero magoar o cara que eu amo, eu não quero fazê-lo sofrer e eu vou, eu estou prestes a quebrar o seu coração. Saber que eu serei a responsável pela sua dor, dói, queima. Olho em seus olhos, Luís olha nos meus, sua mão procura a minha e entrelaça nossos dedos.
— Eu não posso mais, Luís, eu não quero mais continuar tentando ter um bebê. — Eu posso ver o choque em seus olhos. — Eu sinto muito, mas não posso continuar lendo
negativo em meus exames, não posso mais ouvir que o procedimento não rendeu resultados satisfatórios, eu simplesmente não posso mais.
Seu olhar torna-se surpreso e dolorido, eu posso ver a dor em seus olhos. Choro, sua mão continua presa a minha, seu braço passa pela minha cintura e puxa-me para mais do seu corpo, apoia sua testa na minha.
— Eu sinto muito, bad boy. — Seguro sua blusa com minhas mãos. — Desculpe-me, Luís.
Minha voz é uma mistura de tristeza e desespero. Não é uma decisão que interfere apenas em minha vida, mas eu não posso mais insistir em algo que somente tem me proporcionado dor, cada procedimento mal sucedido é como matar uma parte minha, uma parte feliz, cada negativo é uma tortura, um combustível para minha dor e o meu vazio.
Sua mão deixa o meu quadril, sobe para o meu rosto e o acaricia, seu toque é suave, fecho meus olhos, lágrimas descem pelo meu rosto.
— Você não tem o porquê pedir desculpa. — Abro meus olhos, há lágrimas deixando seus olhos e descendo por seu rosto. — Está tudo bem, sereia.
Balanço a cabeça, sua mão continua em meu rosto.
— Eu não posso te dar um filho, Luís. — Meu coração está quebrado, destruído em mil pedacinhos. — Eu não posso realizar seu maior sonho.
É a sua vez de balançar a cabeça.
— Você é meu maior sonho, Belle.
Abraça-me, minhas lágrimas caem, é um choro silencioso, eu estou aliviado por ter falado sobre minha decisão para Luís, seus braços são meu conforto. A dor segue em mim, talvez, ela siga comigo por algum tempo, mas há uma faísca de esperança surgindo em mim, talvez, de alguma maneira tudo fique bem. Aos poucos às lágrimas chegam ao fim e minha respiração volta ao normal.
Desvencilho-me de Luís, sento sobre o colchão com as pernas dobradas, joelhos em meu peito, apoio minha cabeça sobre ele.
— Aparentemente a cirurgia não foi capaz de retirar todos os focos, ou surgiram novos, Lúcia não foi capaz de afirmar o que aconteceu. — Olho para Luís. — A endometriose não está regredindo, Lúcia sugeriu fertilização in vitro, mas nós sabemos é caro e no meu caso incerto, eu posso abortar e as dores por conta da endometriose tem piorado, eu estou exausta.
Ele senta com as costas apoiadas na parede, seu olhar está sobre mim.
— É o seu corpo, sua decisão, Belle. — Sua voz é um sussurro, delicado, doce, carinho. — Vê-la sofrendo dói, ver o brilho dos seus olhos perdendo a intensidade a cada negativo doeu.
Suspira, desvia o olhar, encara o teto.
— Eu queria ser pai, mas faz um tempo que meu maior sonho é você ser mãe, porque eu quero que você seja feliz outra vez, porque é uma tortura ver você sofrendo. — Seu olhar volta-se para mim, meu olhar encontra o seu. — Ter um filho ficou em segundo plano, Belle, eu só quero vê-la bem e feliz.
Eu sou capaz de lembrar de cada negativo, cada procedimento mal sucedido e todas as dores causadas pelos resultados, eu posso lembrar os momentos que o meu olhar perdeu um pouco do seu brilho, meu coração quebrou e o vazio dentro de mim cresceu. E olhando nos olhos de Luís, eu sei que ele também é capaz de lembrar. Luís lida com a sua própria dor e com a minha.
— Algumas mulheres tentam por sete, oito, dez anos e para maioria em algum momento acontece, eu fiquei um pouco culpada por estar desistindo com dois anos, mas eu quero voltar a ser Belle que eu sou, todas temos nosso próprio tempo e esse é o meu.
Todas somos diferentes, cada uma com sua força, garra e esperança. Eu desistir não me faz menos mulher, ou mais fraca, somente faz de mim humana.
— Eu amo você, Belle e continuarei amando.
São exatamente as palavras que eu precisava ouvir, eu sorrio, um sorriso alegre, um sorriso de quem mais uma vez está prestes a recomeçar.
— Você pode me ajudar a ser a Belle, novamente? Você pode me ajudar a me reencontrar?
Estende seu braço em minha direção, oferece sua mão e eu coloco a minha sobre a sua, entrelaça nossos dedos.
— Sempre.
~❤~
Olá pessoas! Decidi respostar essa serie mesmo sem todos os livros estarem revisados. Então aqui vai alguns avisos:
1 - Essa série foi escrita há muito tempo então os primeiros livros estão mal escritos e com muitos erros.
2- Como estou reescrevendo a série e repostando conforme vou fazendo isso algumas coisinhas não irão bater, detalhes que pretendo mudar.
3-Siga-me no instagram, porque em breve tem novidades aqui no wattpad e eu irei lançar meu primeiro livro na Amazon em Julho, meu insta é @lanasilva.sm.
4 - link do grupo no whats (ou deixe seu número nos comentários).
Bjs e até mais ❤️
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