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A subida ao Sotão




Coisa estranha. Na realidade talvez nem tanto. No sotão encontramos recordações de tempos passados, para além de se aproveitar para uma arrumação e deitar fora «coisas» que achamos que já não nos servem.

O sotão guarda segredos. E alguns até nos podem ser úteis nestes momentos de indecisão. Se por acaso encontrarmos escritos dos antepassados, ou até nossos, a mente abre-se subitamente para um recondicionamento mental e vemos que de tanta dúvida se calhar ficam algumas linhas, mais teimosas.

Neste meu sotão relembro que a casa onde vivo foi construída, em 1925, porque o meu antepassado «sentiu» que algo se passava e preferiu aplicar o valor movel em imóvel. Em 1929 o dinheiro perdeu o seu «valor». Foi o colapso do sistema económico mas a casa ficou, de facto!

Encontro também umas fotos da Dinamarca (que obcessão dirão alguns, ou algumas). Talvez. Para além de visitar o Castelo de Helsingborg, imortalizado por Shakespeare, lembro-me bem do vasto artesanato que proliferava no comércio, valorizando a secular profissão. Eram os mais bem pagos. E tudo faziam. Desde moveis, roupa, calçado e acessórios de couro ou trabalhos em ouro e prata. Economicamente era um mistério para mim. De repente parecia ver os ferreiros, padeiros, merceeiros como nas ruas de outrora. Um remar contra o global, a dependência externa e o empobrecimento do comércio tradicional. Mas não será uma boa ideia? 

No ambiente as cartas baralharam o jogo. O impacto da paragem económica parece que não foi assim tão benéfica para a redução dos gases que promovem o efeito de estufa. E os danos colaterais na sociedade ainda estão em apuramento. Que fazer então? Conviver com este mal? Alterar estratégia de abordagem do problema? Uma coisa é certa o regulador europeu tem de se  esforçar para manter a chama viva. Se as conclusões forem na linha de Trump, os  crentes num mundo mais limpo, vão ficar mal. 

Do sótão continuo a ver as árvores do meu quintal cada vez mais castanhas porque a água que existia e conservava-se no solo tem vindo, progressivamente, a decrescer. Mas quem acredita em mim, se ainda ontem choveu torrencialmente? Pois mas foi só ontem. E noutros tempos chovia muito mais ao longo do ano. A memória é curta. Porque não confirmar com as estatísticas?

Pego num caderno de apontamento do meu outro avô. Era médico militar e foi para S.Paulo (Brasil) no contexto de um protocolo com o governo Português. Teve de lidar com a tristeza da «pneumónica», gripe espanhola para os conhecidos, onde morreram de 17 a 50 milhões de pessoas e infectou cerca de 500 milhões de doentes, possivelmente um quarto da população mundial na época. A incerteza do número de mortos era enorme, facto que me leva a não ir mais longe no intervalo. Cada país avaliava a estatística de maneira diferente. Mas o facto é que levou 3 anos a ser controlada. Inicialmente pensava-se que a doença tinha origem numa bactéria, não havendo tratamento específico. O avô constatando o grande impacto junto dos bairros mais carenciados, levou-o a concluir que as condiçoes sanitárias deveriam ser condicionantes à propagação da doença. Os hospitais colapsaram mesmo e foi necessário fomentar-se o isolamento social, com a constante desinfecção dos espaços publicos e privados. A especulação de medicação inutil disparou, com o apoio dos jornais, não existindo nada comprovadamente eficaz. 

Por outro lado surgiram médicos brasileiros partidários da Homeopatia e a Alopatia, mas o facto é que o número de mortos continuava a disparar, acabando por desacreditar ambas.

Mas não se ficou por aqui. O Serviço Sanitário de S.Paulo procurou alternativas em remédios caseiros, como o limão, canela, folhas de eucalipto, alho e cebola. Porém, dado o insucesso e com o apoio dos médicos estrangeiros, o Serviço Sanitário de S.Paulo teve uma profunda restruturação. 

Os limites dos tratamentos disponiveis e o colapso do recurso à hospitalização, foram logo constatados. Com a restruturação entretanto implementada começa a baixar o número de casos trazendo esperança no fim da pandemia. No entanto, com o súbito decréscimo de casos os números começaram a ser questionados pelas autoridades. 

Facto é que a situação acalmou dada a organização implementada, baseada em medidas de isolamento dos doentes, zonas hospitalares adequadas para estes casos, pessoal médico com máscara e desinfecções permanentes dos espaços.  

Termina o texto, salientando que o agente etiológico, o microrganismo que promove a doença, não se conseguiu isolar, e ficaram muitas dúvidas qual a terapeutica mais eficaz. Mas a população resistente progressivamente vai-se tornando imune e o impacto do virus acaba por ir desaparecendo, matando os mais debeis. 

Explica o avô que se tratava de um vírus, uma espécie de um ser vivo mas que só resiste matando . A terapêutica adoptada foi a usada pelos seus antepassados. Descanso, muito, isolamento, pensos de água fria na testa para baixar a febre e muita higiene com água e desinfecção com etanol, alcool etílico, por toda a equipa hospitalar e doentes. 

Descendo do sótão, suavemente, nada melhor que entrar no carro para a conferência de imprensa. Sem antes não deixar de  tomar um banho bem quente e barbear-me! 

Que olheiras! Óculos com anti-reflexo.

Que a sabedoria nos acompanhe. A força já foi chão que deu uvas.

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