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Capítulo III (Lokine)

Se estou condenado, não estou somente condenado à morte, mas também a defender-me até a morte.

Franz Kafka

— Sente-se, senhor Kimo. — diz o delegado.

Lokine atende ao pedido com um sorriso discreto.

— Obrigado.

A mão perfurada arde, está enfaixada e foi tratada por paramédicos, mas ele se preocupa se os movimentos dos dedos continuarão ágeis. Sem a mão sua música, sua arte, esfacela-se. Observa a sala com armários em todas as paredes e um discreto sofá no canto. Na mesa, pilhas de papéis, pastas e um notebook. Sente cheiro de cigarro.

— Senhor Kimo, ainda não existe uma acusação formal, mas está mais que comprovada sua participação no crime.

Lokine entende o que o delegado diz, mas se distrai. De súbito, a lembrança de um sonho recorrente surge, apavorante. A imagem de sua esposa sorrindo em meio a uma floresta, apreciando a natureza que ela tanto adora. O vento balança os cabelos de seu amor, no colo dela está seu filho. Som de madeira rangendo se mistura com o som do trompete de Miles Davis, tudo soa como se a música viesse das árvores. Um batuque indígena acompanha o solo de Miles. A peroba majestosa, com seu gigantesco tronco, sua casca fissurada como rugas de um velho sábio, sua altura que domina o dossel,

Supere-se ou seus amores sempre se perderão debaixo do horror.

Seja tudo que você pode ser.

— Senhor Kimo? O senhor me entendeu?

Lokine volta da reminiscência, desconcertado. Como pude quase sonhar nesse momento? O delegado estranha o semblante do suspeito. Antes de Lokine responder um homem barbado, de óculos e curvado bate na porta e adentra.

— Com licença, delegado. Vim representar meu cliente.

— O senhor é advogado?

— Sim, senhor.

O delegado olha para Lokine com expressão de interrogação.

— Senhor Lokine, este senhor é seu advogado?

— Sim, delegado. — diz Lokine, sorrindo para o passageiro que havia se prontificado a ajudá-lo.

O advogado senta-se na cadeira ao lado e o delegado continua:

— Senhores, é preciso deixar claro que não existe ainda acusação formal. Nesse momento apenas gostaríamos de um depoimento informal do senhor Kimo.

O advogado ajeita os óculos e toma a palavra.

— Delegado, mesmo que não exista ainda ação penal sobre meu cliente, quero deixar implícito que os fatos e provas a serem investigadas, assim como o depoimento a ser expresso, denotam legítima defesa. Como o senhor verificará não existe crime. Meu cliente, utilizando de seus meios, repeliu injusta agressão e desordem. A atitude de meu cliente de modo algum foi ilícita.

— Doutor, sem problemas. Fica anotado que o senhor Kimo alega legítima defesa. Mas preciso esclarecer alguns detalhes da situação. Como os fatos acabaram de ocorrer é importante que algumas perguntas sejam respondidas nesse momento, isso facilitará a investigação.

O olhar do delegado para os dois homens é neutro. Lokine sente-se olhando para um robô. O advogado e Lokine confabulam em sussurros e, após, aceitam responder algumas questões. O delegado chama seu escrivão, explica que recolherá um depoimento. O escrivão adentra a sala, solicita a documentação de Lokine. A sala fica mais quente. Lokine transpira e tem a impressão que a sala está tremendo, talvez um pequeno terremoto. O escrivão anota os dados de Lokine e acena que o delegado pode dar prosseguimento.

— Senhor Kimo, o senhor conhecia as pessoas que foram mortas no avião?

— Não, nunca havia visto elas antes. — .

Tudo que o escrivão digita no notebook surge em hologramas na parede atrás do delegado. A história sendo escrita em letras de ilusão. Tudo seria um sonho? O que é a realidade?

— Como se deu a agressão? Como a situação culminou na morte de duas pessoas?

Lokine sente o coração palpitar, gotas de suor se espalham pelo corpo. Sente culpa e, ao mesmo tempo, orgulho de seu feito. Olha para o advogado que, com um gesto de cabeça, indica que ele prossiga com a resposta. Imagens de lutas de kung fu, plateias numerosas, lugares que ele nunca esteve, sangue e vísceras. Um tumulto na mente, culminando na lembrança do rosto estranho que ele tem agora, certamente, mais belo que o dele. Sabe que precisa dar uma resposta certeira, sem enrolação, como o advogado indicou. Quer se livrar de tudo aquilo, voltar para casa, quer poder se olhar novamente, ter sua aparência ordinária normalizada no espelho. Não quer parecer louco, quer agradar o delegado. Observa o nome do delegado em uma plaqueta na mesa. Sempre diga o nome da pessoa, isso traz o ouvinte para um recanto mais íntimo. Lembra de ter lido isso em um livro. Alguma auto ajuda. Sugestão de um músico coach.

— Delegado Morais, o cidadão estava sentando na poltrona que eu comprei. Solicitei explicações. Ele foi rude. A aeromoça se aproximou e pediu o bilhete dele. Num rompante de fúria ele a atacou. Não sei o motivo. Não entendo aquela raiva. Na sequência avançou sobre mim. Agi instintivamente, me protegendo.

O delegado fica longos segundos observando os homens à sua frente. Passa a mão com força sobre os lábios e prossegue.

— Qual sua profissão, senhor Kimo?

— Sou músico.

— Qual instrumento?

O advogado estranha a pergunta e interrompe.

— Delegado, qual a intenção dessas perguntas não relacionadas ao ocorrido?

— Doutor, só quero saber um pouco mais a respeito do senhor Kimo.

Lokine com a voz calma prossegue.

— Sou trompetista.

— O senhor pratica alguma arte marcial?

O advogado tenta impedir, mas Lokine responde.

— Não senhor, nunca pratiquei. Não sou chegado a nenhum esporte.

O advogado estende a mão pedindo a palavra.

— Delegado, não responderemos mais perguntas. O depoimento está finalizado. Considero que o viés tem teor especulativo. Poderemos marcar em outra data, meu cliente acabou de passar por imenso estresse, sua situação psicológica não é conveniente para isso agora. Entende?

O delegado ajeita-se na cadeira com um sorriso cínico. Lokine abaixa a cabeça, sente tontura. A lembrança de seu sonho se completa. Um homem com machado está ao lado do tronco assassino, da árvore caída. Ele agora reconhece o homem, sabe que rosto é aquele. O mesmo maldito rosto que ele vê no espelho. Um lenhador, um assassino, um loiro matador de sonhos.

— Lokine, você está bem? Vamos embora? — pergunta o advogado.

Lokine levanta o rosto, seus olhos estão vidrados.

— Estou bem. Sim, seria melhor.

O delegado bufa e diz:

— Sem mais no momento. Acho que temos o suficiente. Os senhores estão liberados, mas poderemos convocá-los para questionamentos futuros. Vou validar isso como o depoimento oficial. Obrigado.

Lokine e o advogado, após as devidas assinaturas e procedimentos burocráticos, se retiram.

Delegado Morais suspira na cadeira e olha para o escrivão, sorri.

— Josué, tem algo estranho neste caso. Ninguém mata um homem com aquela agilidade por puro instinto, sem ter habilidades especiais. Lokine Kimo está mentindo, tenho certeza. Você viu como ele estava abalado?

Josué retira-se da sala meneando a cabeça em concordância. Na porta, o investigador Júlio Tâmara, que chama a atenção por sua altura fora dos padrões, pede licença para adentrar a sala. Ele abaixa-se ao passar pelo umbral, o bigode denso completa a figura extravagante.

— Senta, Júlio.

— Com licença delegado. — diz Júlio acomodando-se.

— Conseguiu algo relevante?

— Sim, considero muito relevante.

Os dois homens sorriem se entreolhando.

— Então, diga.

Júlio coloca na mesa a foto do homem de gorro, caído no piso do avião, com o olho dilacerado por um pedaço de plástico pontiagudo.

— Esse homem acredite ou não é Otávio Ferroso, filho do senador Olavo Ferroso.

— Como?

— Isso mesmo, o que foi prefeito de Arborenses. O famoso, o lendário, o herói das crianças brasileiras.

— Você deve estar brincando.

Júlio balança a cabeça negando, seu bigode avantajado e o cabelo crespo lhe dão uma aparência engraçada. O delegado estica o corpo na cadeira pensativo.

— Delegado, tem mais.

Os olhos do delegado arregalam-se.

— Certo. Desembucha, caralho!

— Adivinha quem mora em Arborenses?

— Nosso matador, Lokine Kimo.

— Exato.

— Júlio, isso não é nada. Quase todos no voo eram de lá, estavam voltando para casa.

— Sim, mas tem um detalhezinho. O tal Lokine foi músico contratado da boate do senador na cidade.

— Interessante, agora sim temos algo. — diz o delegado coçando a barba.

— Não encontramos nada em Otávio que indicasse alguma pretensão terrorista. Ele atacou as pessoas com um abridor de cartas. Um objeto plástico, mas resistente, obviamente.

O delegado entrelaça os dedos das mãos e apoia os cotovelos sobre a mesa, olha fixamente para Júlio.

— Júlio, você sabe o que estou pensando, certo?

— Não, não pode ser.

— Sim, isso mesmo.

— De novo?

— O destino está nos levando para isso. Tudo se encaixa. Uma saída antes do caos.

— É arriscado, delegado. Usar aquela coisa não é seguro.

Ela está sediada em Arborenses. Ela funcionará para esse momento. Tudo vai melhorar, colocaremos os pingos nos "is".

Júlio afaga o bigode com o olhar desconcertado.

— O delegado Palhares não vai querer.

— Júlio, pelo que você me disse acho que meu telefone vai tocar dentro de alguns minutos. O filho da puta do senador vai estar desesperado, vai querer vingança. O Palhares vai receber a mesma ligação. A pressão vai ser forte. Teremos de ter respostas rápidas. Nossos empregos ficarão mais em risco do que o normal. Você sabe o poder que esse maldito desse senador tem, no vespeiro que nós estamos? Ele é muito mais que um senador, ele que garante a ordem em Arborenses e, talvez, no Paraná inteiro, a influência desse cara em Brasílumbra é de assustar. Ele tem laços com . Nós bem sabemos. Precisamos utilizar . resolverá isso, é a peça que falta, saca? Imagina, toda aquela competência, mas agora do nosso lado. Jogando o nosso jogo, sacou?

— E se ela não quiser.

Ela é paga para isso. Porra! Não tem isso de não querer.

— Delegado, a moça, se é que podemos chamar assim, tem um temperamento difícil.

— Júlio, tenho certeza que o Palhares tem como fazê-la trabalhar nisso. Ele sabe como conduzi-la, tem suas técnicas de gestão de pessoal.

Júlio mostra os dentes amarelos. O bigode quase não permite mostrar que ele sorri.


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