{Cap. 28}
Aonde você quer ir?
Quanto você quer arriscar?
Eu não estou procurando por alguém
Com algum dom sobre-humano
Algum super-herói
Alguma felicidade de conto de fadas
Apenas algo a que eu possa recorrer
Alguém que possa sentir a falta
Oh, eu quero algo exatamente assim
Something Just Like This
╰─────────────➤✎The Chainsmokers
Eu realmente estava extremamente dolorida no dia em que me escalaram para fazer uma pequena patrulha durante a noite. Desde o dia do acidente com o lobo, noite após noite, passaram a escalar duas pessoas para fazer a patrulha no térreo, para ter certeza de que não teríamos surpresas desagradáveis.
Lúcio ainda estava sob suspeita para alguns, então, Jéssica sempre o mantinha de fora. A Jéssica era muito boa com essas escalas, fazia de tudo para não sobrecarregar ninguém e fazia o possível para que todos pudessem descansar o necessário, mas apesar disso, sempre havia queixa pelo grupo de busca externas, pois diziam que se ela escalasse duas pessoas despreparadas não iria resolver nada e com tantas queixas, a equipe de busca estava sempre escalada junto com algum outro membro do grupo.
A reunião desse dia havia sido rápida, eu não havia sido escalada para muita coisa, meu dia de limpeza havia sido no dia anterior, apenas me escalaram para fazer uma busca no quinto piso, ou seja, dois andares acima do nosso e nesse dia eu fui escalada para a patrulha noturna.
– Bom, todos já sabem o que precisam fazer – Jéssica falou já quase se despedindo de todos.
– Jéssica – John falou chamando sua atenção – Eva irá fazer a patrulha noturna, mas você não disse quem irá com ela ainda.
– Nossa, é verdade. Obrigada senhor John – ela disse com um pequeno sobressalto e olhando novamente sua prancheta – Veremos... ah, Liam. Você irá com Eva para a patrulha noturna, recorram as áreas pré-definidas e voltem trancando todos os lugares possíveis. E não esqueçam de levarem algo para o caso de vocês precisarem se defender – ela concluiu parecendo preocupada de repente.
"Claro" – pensei já antecipando minha noite – "Com certeza eles fazem isso de propósito. É incrível como minhas escalas gerais sempre coincidem com as dele."
O dia passou rápido, treinei com Ethan na parte da tarde e à noite eu mal aguentava andar rápido.
Quando encontrei Liam, ele estava com uma barra de ferro em uma das mãos e uma arma na outra e quando me entregou a barra de ferro falou rispidamente:
– Não seja imprudente.
– Boa noite para você também, Liam – falei da maneira mais mal-humorada que eu pude.
Havíamos voltado a velha luta de quem conseguia ser mais arrogante um com o outro.
Fomos até o terraço da escola e olhamos desde lá de cima após recorrermos todos os lugares que poderiam dar alguma abertura para qualquer lobo.
Desde lá de cima, vi que Liam seguia um pouco mais para frente e se encostava na grade. Fiquei observando-o por um tempo até que ele se deu conta.
– O que está olhando?
– Aff... – resmunguei revirando os olhos.
Olhei novamente para a paisagem a minha frente, era diferente ver tudo desde o alto e eram raras as ocasiões em que podíamos desfrutar dessa vista. Mas fala sério, de todas as pessoas que poderiam me acompanhar, tinha que ter sido ele?
Olhei para o céu esperando que isso não fosse algo que o "irritasse" também, o que era algo difícil. "Seria bom poder aproveitar uma vista desta sozinha", pensei enquanto percorria lentamente as estrelas.
– Parece aborrecida por estar aqui comigo. Eu deveria ir embora ou algo do tipo? – seu tom era irritante.
Respirei fundo antes de responder:
– Oh, sinto muito, é tão aparente assim meu desagrado?
– Não provoque... – a voz dele era como um pequeno aviso.
– Você começou sendo sarcástico, lembra?
Olhei para ele desafiando-o a discordar de mim. Quase sempre que estávamos juntos, discutíamos por alguma coisa. O tom que ele usava era sempre um convite para uma patada.
– Será que você não pode tentar ser um pouco mais amigável na hora de falar? – perguntei sem me importar se aquilo o machucaria ou o deixaria ainda mais irritado.
– Nossa, olha só quem fala, a moça da fala mansa, não?
Resolvi não responder, sabia que também era extremamente arrogante com ele, éramos assim desde o primeiro momento. Havia apenas uma pequena lacuna entre esse tempo em que não fomos assim, lacuna que eu fazia o possível para esquecer.
Rodei meu olhar pelo terraço, não tinha muito o que ver por ali e para ser sincera me parecia até um lugar seguro de certo modo. Precisaria muito para um lobo subir até ali, apesar de não ser impossível.
De qualquer maneira, sendo ou não nossa rota, valia a pena ir até ali, dava para ver todo o território da escola. Durante a noite era bem difícil enxergar algo, mesmo assim era agradável. Durante o dia, imaginava o quão pequeno eu veria as coisas abaixo, estávamos só a seis andares acima do chão e mesmo assim me parecia uma altura absurda.
Talvez olhar as ruas durante o dia fosse algo melancólico, pois não veríamos a movimentação que costumava ter antes.
Olhei para o lugar onde estavam as quadras, não conseguia ver nada. Imaginei crianças jogando ali, rindo e se divertindo. A imaginação chegava a ser tão vívida que me parecia escutar a gritaria e risadas das crianças nas horas do intervalo.
Meu olhar se voltou para Liam. Curiosamente ele parecia me estudar atentamente, eu corei e abaixei a cabeça. O que será que ele fazia antes de tudo? Além do que ele já havia me contado, é claro.
– Por que estava olhando para o vazio? – ele perguntou, sua voz não parecia tão dura dessa vez.
– Liam – o chamei mais baixo do que eu esperava.
– Que?
– Quando foi que você chegou aqui? – olhei para ele e desviei o olhar logo em seguida – Digo, é que já haviam passado dois anos quando eu cheguei.
– E que classe de pergunta aleatória é essa?
– Só..., bom... é que eu estava me perguntando isso agora.
– Céus – ele disse revirando os olhos, respirou fundo – Cheguei logo no começo. Conheci Ethan logo depois da epidemia e chegamos aqui juntos, Vi e John já estavam aqui quando chegamos.
– Que sorte – resmunguei mais para mim mesma.
– Suponho que sim – ele disse parecendo incomodado com a conversa – Tivemos nossas diferenças, mas nos mantivemos unidos sempre.
– Tinha muita briga antes? – perguntei sentindo a tensão entre nós diminuindo.
– Poderia se dizer que sim, principalmente quando os seletores começaram a nos ameaçar.
– Entendi – respondi tentando examinar a possibilidade de seguir a conversa.
– Nessa época fizemos a eleição de quem seria o líder. Lúcio se voluntariou várias vezes – ele tocou no nome e me olhou fixamente, talvez querendo ver minha reação – mas todos estavam de acordo de que, como Vi e John haviam chegado primeiro e eram os mais velhos, eles seriam os mais indicados.
– Então Lúcio queria ser o líder...? – novamente minha pergunta estava mais destinada a mim mesma.
– Sim, mas já sabíamos que John era diretor de uma empresa e sabia como liderar as coisas e Vi sempre se mostrava bem seguro. Nessa época existiam mais pessoas, a irmã da Sarah, um rapaz que eu não lembro o nome... Eu já não lembro nem como eles eram...
– Sério? – perguntei surpresa por ele ter se esquecido de algo assim.
– Não sou bom para lembrar do rosto das pessoas.
– Então, suponho que vai me esquecer também.
– Como eu poderia? Para ser sincero tenho seu rosto bem impresso na minha cabeça.
Aquilo me surpreendeu e ao mesmo tempo me fez sorrir.
– Sério? – perguntei ainda com o sorriso no rosto. Olhei para baixo para que ele não notasse a cara de idiota que eu estava fazendo – Como você tem tanta certeza disso?
– Acho que já te disse isso – eu voltei a olhá-lo, e lá estava ele, o lindo sorriso malicioso, senti um frio na barriga e um pequeno formigamento nas pernas enquanto ele seguia – Salvei sua vida. Você tem uma dívida comigo e eu nunca esqueço aqueles que me devem.
– Não me estranha – meu sorriso bobo não queria desaparecer.
Ele ficou de frente para mim, seguiu com o mesmo sorriso me examinando dos pés à cabeça. Chegou perto da grade e se encostou nela.
– Não encosta aí! É perigoso! – falei alarmada.
– Meu Deus, deixa de me dar broncas – ele reclamou, mas saiu de perto da grade e voltou a estar próximo a mim – E você? É boa para lembrar de rostos?
– Sim, sou bastante boa nisso. Tem alguns que eu jamais esqueço.
– Sério? Acho que não vale a pena lembrar disso – ele voltou a ficar sério, mas não parecia bravo.
– Acho que estou começando a entender o porquê você não é bom para lembrar rostos.
– E isso significa o que?
– Só foi um comentário.
– Que seja – seu tom havia voltado ao "normal".
– Mas, por que você acha que não vale a pena guardar o rosto das pessoas?
– Oh... – ele pareceu ser pego de surpresa e pensou por um momento. Talvez essa fosse uma pergunta difícil para ele – Normalmente as pessoas não gostam de escutar isso, mas... – ele parou de falar.
– O que é? – encorajei ele a seguir.
– É que... isso é sobre mim.
– Tudo bem. Eu quero saber – sorri e esperei.
– Hum... como você já sabe, eu cresci em uma boa família, mas não era só uma boa família. Meus pais eram de fato muito ricos. Ter pais famosos é complicado, muitos queriam ser meus amigos pela influência dos meus pais, pelo dinheiro que eu tinha ou pelas coisas que eu tinha e teria. Odiava ver todas aquelas pessoas se arrastando por mim. Odiava ver como todos queriam ser agradáveis, como todos faziam qualquer coisa para estar perto. Não encontrava nenhuma razão para tê-los como amigos, não importava o quanto eram bons comigo. Todos eram falsos, todos eram interesseiros. Minha única amiga antes disso tudo foi a minha irmã... Até mesmo as namoradas que eu tive eram descartáveis, elas conseguiam o que queriam e iam embora... um par de joias, uma viagem para o exterior. Você deve estar pensando que eu sou um idiota, mas... que opção eu tinha a não ser evitar cada um deles? Tinha tantas pessoas que se faziam de amigos, mas só me chamavam na hora de pagar as coisas, a frase "oh amigão, faz essa pra gente" era bastante comum. Qual deles estavam realmente interessados no que eu sentia? Como eu poderia confiar em algum deles?
Eu entendia como era estar frustrada com as pessoas, eu era rica, mas não tinha tanto dinheiro quanto ele, mas sabia como era ser rejeitada por ser a "irmã da aleijada". Provavelmente era mais suportável ser detestada logo de início. Eu jamais saberia como ele se sentia de fato. Me mantive em silêncio, não sabia o que dizer, mas acho que seria rude da minha parte apenas ficar calada.
– Obrigada por me contar. E entendo... entendo o motivo de você não querer lembrar dos outros.
– Não lembro nem o nome deles – podia sentir seu olhar fixo em mim – Não é incômodo para você? Me escutar falar assim destas coisas?
– De modo algum. Por que seria?
Ele sorriu, não o sorriso malicioso de sempre, era um sorriso aliviado.
– Isso é bom, gostei de saber disso.
– Liam, isso foi estranho... – brinquei, ri um pouco e vi o sorriso dele se alargando ainda mais – E o que você quer fazer daqui para a frente?
– Que? – sua reação foi realmente de surpresa.
– Você sabe, o que você quer fazer, digo o que quer muito fazer no futuro?
– Nossa, é a primeira vez que alguém me pergunta isso.
– Acha que alguém além de mim se atreveria a perguntar algo assim para você? Logo para você, que está sempre com esse tom pretencioso na voz?
– Isso não é verdade – ele parou ao notar que sim, novamente ele estava sendo arrogante. Não pude deixar de rir – Vamos ver. O que eu mais quero fazer?
Ele pensou durante um minuto e me surpreendi ao notar que estava levando tanto tempo para responder uma pergunta tão simples.
– Não consigo pensar em nada. Não é como se eu fosse para a faculdade, na verdade, esse nunca foi meu plano de qualquer jeito – seu semblante havia ficado triste – Acho que nunca fiz nada útil da minha vida, sinto como se tivesse desperdiçado ela inteira.
– Liam, você está parecendo um velho de 90 anos. Está tudo bem não ter planos, sabia? Nunca tive grandes e luxuosos planos para o meu futuro também. Tudo o que eu tenho são pequenas metas.
– Ah, então eu tenho uma ótima ideia – ele sorriu maliciosamente – irei te copiar nisso.
– Ei! Você não pode fazer isso!
Seu sorriso malicioso se intensificou e ele chegou muito, mas muito próximo a mim.
– Me diz, por que não podemos compartilhar metas juntos?
– Você quer que eu compartilhe minhas metas de vida com você? – eu sentia meu corpo tremendo. Meu estômago era como uma montanha russa.
Ele chegou mais próximo e aproximou sua boca da minha, seu sorriso estava extremamente largo. Eu não havia me movido, meu coração estava a mil por hora. Como era possível que depois de tudo, ele seguia me fazendo sentir aquilo?
– Então me ajuda a estabelecer as minhas.
– Eu? – era visível meu nervosismo.
– Sim, e isso é um trato.
Sua mão acariciou meu rosto, ele estava tão próximo e quando eu não aguentava mais de tanta tensão, ele apenas voltou a se afastar. Me ofereceu a mão e "firmamos" o trato, vi seu rosto se iluminar, como de uma criança pequena.
– Acho que deveríamos voltar – ele falou. O sorriso de seu rosto não se extinguia. Eu queria seguir ali. Eu precisava pedir algo a ele, mas não queria estragar aquele momento.
"Vamos Eva, precisa ser agora."
– Liam, queria te pedir uma coisa, mas tenho medo de estragar todo esse último momento.
Ele me olhou curioso.
– Então não peça.
Eu suspirei, mas não podia simplesmente deixar de pedir. Juntei toda a coragem que eu tinha e pedi quase atropelando as palavras.
– Por favor, me ensina a atirar! – eu não tive coragem de pedir isso olhando para ele.
Vi seu corpo inteiro se tensionar e o clima voltando a pesar. Sim, eu havia estragado o nosso pequeno momento.
– O quê? Por quê?
– Por favor, Liam – meu tom era de súplica, eu não sabia outra maneira de pedir isso a ele.
– Não.
– Por que não?
– Não quero você correndo riscos desnecessários. Não sei atirar.
– Eu sei que você sabe. Por favor Liam, se você não me ensinar, eu vou tentar aprender sozinha.
– Por que você quer tanto aprender a atirar? Planeja ir embora? Planeja sair e buscar lobos por aí?
– Não pretendo ir embora. Temos um trato lembra? Não vou quebrá-lo. Olha, eu sei que você está preocupado, mas quero poder me sentir segura. Por favor, confia em mim quando eu digo que tenho um bom motivo para isso.
Ele olhou para frente, se decidindo se me ensinaria ou não.
– Me promete uma coisa? Promete que você não vai se meter em problemas.
– Liam... eu não posso...
– Sem essa promessa eu me recuso a ajudar. Não poderia aceitar se algo acontecesse com você por ser imprudente. Saber usar uma arma não muda o que tem lá fora. Me promete que não vai ser imprudente.
– Está bem, eu prometo – "pelo menos por enquanto", pensei. Eu não tinha outra saída.
Ele soltou o ar.
– Tudo bem, vou te ensinar.
– Sério?
– Sim.
Gritei e pulei de alegria dando um abraço apertado nele. Logo me lembrei de que eu não deveria fazer isso com o Liam, afinal eu não sabia o como ele podia reagir. Ele não estava sorrindo, mas retribuiu meu abraço. Talvez ter pedido naquela hora, não tenha sido uma má ideia.
Nessa noite voltamos em silêncio para os quartos, mas a emoção, o frio na barriga, a lembrança de sentir sua respiração tão perto, o sorriso de lado mais malicioso que eu já havia visto seguiam bem presentes na minha cabeça.
A noite não havia acabado tão bem quanto deveria depois disso, mas a felicidade em mim era, de algum modo, tão real ainda que mal pude notar o quão sério ele estava. Ele me deixou na porta do meu quarto, se despediu brevemente e antes que ele saísse, eu o abracei novamente, queria sentir seu corpo próximo ao meu de novo. Esse gesto o pegou de surpresa, e tão rápido quanto eu o abracei, eu também o soltei.
A expressão de surpresa dele seguia ali quando eu abri minha porta e me despedi com um sorridente "boa noite". Fechei a porta e fiquei parada ali por um tempo. Como eu podia ser tão infantilmente boba quando estava com ele? Para ser sincera, eu não queria descobrir, só queria mais daquela felicidade.
Dormi rapidamente com o sorriso bobo no rosto e a manhã chegou rápido.
A partir desse dia eu também passei a ter aulas com o Liam, que se mostrou, por incrível que pareça, ser um professor muito paciente.
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