Capítulo 35
E assim entramos os seis em casa da Mara. Não sei o que vai acontecer, como é que a Madalena vai reagir. Apenas espero que ela saiba que fiz o que fiz porque a amo, porque não aguento mais vê-la afundar-se num abismo, sem eu conseguir lá chegar para a resgatar.
Pov Leonor (Prima Madalena)
Assim que entramos consegui ouvir o barulho de crianças. Não era ensurdecedor, mas era quase reconfortante. Pensei no Salvador e no Santiago, se tivessem vindo, com toda a certeza já não haveria tanta calma. Olhei para o Simão que estava com a pensar com toda a certeza na mesma coisa. Mas, seria complicado ter os meus dois "terroristas" aqui, e ao mesmo tempo ajudar a minha prima a recuperar mais uma vez de um trauma.
A primeira pessoa a aparecer foi a mãe do Diogo, e minha tia por afinidade, já que ela era tia do meu esposo. Dona Dulce, era daquelas mães que adoptava as noras e genros quer dos filhos quer dos sobrinhos. Era aquela que sempre acabava por acalmar as discussões e livrar fosse quem fosse de um castigo.
— Bom Dia, bem-vindos. Venham, entrem e por favor desculpem o barulho, mas quatro crianças juntas...
— Não te preocupes Tia, está até muito silencioso para os nossos ouvidos.
— Simão, bem que a tua mãe me disse que o papel de pai se encaixava bem em ti.— Eu sorrio, um sorriso cheio de orgulho e amor. Porque, o Simão era na verdade um pai e tanto.— E tu como estás minha querida? E esta boneca?
— Preocupada tia. E nossa princesa está a crescer depressa demais.
— Ela é linda, como a mãe. Os gémeos são a cara do Simão, mas esta pequena é a carinha da mãe.
— Eu sou suspeita em falar...— e pronto lá vem a avó coruja numero um...— pois sou mãe da mãe, mas também acho.— Tem sido uma "guerra" entre as duas avós: uma diz que a minha pequena sou eu em bebé, enquanto a outra defende que todos os bebés mudam de feições e que a Mariana ainda vai ficar parecida com o pai.
— Que a minha mãe não te ouça tia. Porque vais arranjar uma discussão para as próximas vidas.
— O que a tua mãe tem é ciúmes, isso sim.
Fomos entrando, a minha princesa já estava no colinho bom da Tia-Avó que se deliciava com ela ao colo. Quando finalmente chegávamos onde as quatro crianças estavam, foi como andar para trás no tempo. Era como ver-nos a nós em pequenos a brincar: eu, o Pedro, a Madalena e o Guga. Contudo, o baque maior, foi quando a pequena se virou. Era como se estivéssemos a ver a Madalena em pequena.
— Meu Deus. É...é a Madalena em pequena.— diz a minha mãe, já lavada em lágrimas. E realmente é difícil não nos emocionarmos.
— Mãe, estás a assusta-la.— a pequena levanta-se e corre para o pai. Lucas vira-se, e assim que me vê e ao Simão, sorri.
— Titi...Timão...— e corre para nós.
— Oi campeão. Como estão as férias com o papá?— pergunto-lhe pegando-o ao colo.
— Titi eu encontei. Eu encontei a minha mamã, como tu dixeste. Ela é linda e ama eu.
— Sério, meu amor, estás feliz?
— XIM.— ele grita feliz...— E o eu agola tem uma naninha...— vira-se para a Luz e aponta...— É a Luz, ela é linda né? É palecida com a mãma sabias? A mamã tá doidoi, o eu naum sabe se vais conhece ela.
— Queres que te conte um segredo?— digo e ele olha para mime acena com a cabaça curioso...— Eu conheço a tua mamã.
— Conhexes? Como?
— A tua mamã é prima da Tia. A mamã da tua mamã era irmã da minha mamã.
— Credo filha, tu a explicares parentescos és muito complicada.— diz a minha mãe.— Olá Lucas, lembras-te de mim?
— Xim, és a mamã da Titi.
— Isso, então tu também tens tias e tios não é?— Lucas apenas acena...— A Tua mamã também tem, e eu sou uma delas.
— E onde está a mamã da mamã? Poque ela naum veio? Ela naum gosta da mamã, como a minha mamã de verdade naum gosta de mim?
— Não meu amor. A mamã da tua mamã amava muito a tua mamã. Mas ela virou uma estrelinha há muito tempo.
— Papá, vamos alanjar uma mamã nova para a mamã? Eu conxegui uma nova mamã.
— Não é assim tão fácil filho, para além disso a mamã tem a Tia Marta que é quase uma mãe para ela.
— AH!!! Vieste tatá da mamã?
— Vou tentar Lucas...vou tentar.
De repente começamos a ouvir alguém a chorar. Porém, não era um choro de quem está a fazer birra, era um choro de alguém assustado, de alguém em pânico. O som vinha de trás do sofá. Diogo espreita, e quando a pequena surge ao seu colo, percebemos que está muito nervosa. Diria mesmo apavorada.
— Papa. Quiero a mama...llévame con mami, quiero mama. (Papá. Quero a mamã...leva-me à mamã, quero a mamã.)
— Luz, a mamã está a dormir...
— Yo quiero a mi mama. Llévame papá...(Eu quero a mamã. Leva-me papá...)— a minha Tia aproxima-se da Luz...
— Luz, olha para a avó.— mesmo a tremer, Luz olha para a avó...— Lembras-te daquele álbum que a mamã te mostrava a família toda?— Luz acena...— Sabes onde está?— de novo Luz diz que sim com a cabeça...— Vai lá buscar minha querida.
Luz desce do colo do Diogo, e vai a uma prateleira de onde tira um livro, parece um álbum. Este parece que foi feito todo à mão. Na capa, diz apenas "Família". Tem um padrão de flores rosas num fundo branco, e tem uma fita com um laço rosa, que corta na vertical o mesmo. Luz dá-o avó, e sentam-se as duas no sofá.
— Vamos ver se reconheces toda a gente? Eu vou apontando e tu vais dizendo quem é, pode ser?
— Si. (Sim)
— Maria da Luz, em português, por favor.— diz o Diogo.
— No. (Não)
— Diogo. Deixa a menina, alguma coisa o Martim traduz, é o único aqui que consegue perceber bem o espanhol. Vamos começar meu amor?
— Si. (Sim)
A Dona Dulce, vai mostrando fotografias e mais fotografias. Tem algumas do Tio Pedro, outras da Tia Maria, do Pedro, da Luísa, da Clara, da Sofia. Tem até fotos nossas. De Natais, aniversários. São várias fotos de diferentes anos.
— Abuela. Son ellos? Estos aquí, son ellos? (Avó. São eles? Estes aqui, são eles?)
— São. A Tia Marta, o Tio Luís, a prima Leonor...
— Y el? Quien es? No esta aquí? (E ele? Quem é? Não está aqui?)
— Tens razão, aquele é o Simão. Ele é meu sobrinho e marido da Leonor.
— Xim, é o Timão. Naninha, é bonxinho, naum pexixas de tê medo.
— Luz, posso chamar-te assim? Ou preferes Maria da Luz?— pergunto aproximando-me um pouco dela.
— Solo Luz. (Só Luz.)
— Ok. Podes me dizer quem fez esse álbum tão lindo?
— Fue mamá. (Foi a mamã).
— Ele é lindo. A mamã fez para ti?
—No. Hecho para mí y para ella. Por qué estás aqui? (Não. Fez para mim e para ela. Por que estás aqui?)
— Maria da Luz, que pergunta é essa.— O Diogo, diz sério.
— Põe-te quieto Diogo, e deixa-a falar como quiser.— Digo também com um ar sério, Luz sorri.— Estás a rir-te?
— Regañaste a papá...(Ralhaste com o papá).— faço cara de quem não percebeu nada, porque realmente desta vez não percebi mesmo.
— Ela disse-te que ralhaste com o Diogo.— traduz o Martim.
— Ralhei pois, e vou continuar a ralhar se ele se portar mal.— Luz sorri ainda mais, e é impressionante que até o seu sorriso é igual ao da Madalena.— E respondendo à tua pergunta, viemos os quatro para tentar ajudar o papá a tratar da mamã.
— Mamá está triste. La lastimaron. Ya no juega conmigo, ni va al parque, ni va a trabajar. No me gustaba cuando iba a trabajar, porque la extrañaba, pero no me gusta ver a mami triste. (A mamã está triste. Fizeram mal a ela. Ela já não brinca comigo, nem vai ao parque, nem vai trabalhar. Eu não gostava quando ela ia trabalhar, porque eu tinha saudades, mas não gosto de ver a mamã triste.)— olho de novo para o Martim, porque de facto quando esta menina começa a falar em espanhol, é como se estivesse a olhar para uma "Alien" a falar "alianês"
— Ela disse que a Madalena está triste. Que lhe fizeram mal. Que já não brinca com ela , nem vai ao parque, nem vai trabalhar. Ela não gostava quando a Madalena ia trabalhar, porque ficava com saudades, mas não gosta de a ver triste.
— Eu sei minha querida. O teu pai já me contou isso tudo. Mas sabes, eu, a Tia Marta, o Tio Luís e o Tio Simão vamos tentar fazer a mamã ficar melhor.
— Sério. Vais traxer a minha mamã de volta para mim?
— Vamos sim. Mas, tens que me deixar ralhar um bocadinho com ela, como ralhei com o papá. Posso?
— Sim.— ela fica a olhar para mim...e de repente abraça-me.— Gosto muito de ti Tia Nono. Obrigada.
— Oh, Princesa. Eu também já gosto muito de ti. Podemos ir vê-la, por favor?— pergunto olhando para o Diogo.
— Ela adormeceu, com a Miriam...— diz a Mara.
— Com a Miriam!? Quem é a Miriam?
— É minha netinha mais nova, filha da Mara e do Martim.— Diz a D. Dulce.
— Bem...— diz o meu pai...— Sendo assim vamos esperar que as duas dorminhocas acordem. Diogo, quando é que nos podemos reunir com o vosso advogado?
— Bem não sei, amanhã!? Hoje devem estar cansados...
— Não. Chama-o para vir agora.— diz agora o Simão.
— Mas há novidades?- pergunta a Mara.
— Vamos despedi-lo.— e agora estão todos a olhar para o meu pai que se mantém muito sério no seu papel de advogado.— O Diogo contou-me o que se estava a passar com o caso, e tal como ele, concordo que ele pode estar a ser manipulado. Então vamos cortar o mal pela raiz.
— E ficamos sem advogado?- Pergunta a Mara.
— Não. Claro que não. Sei que o risco é grande, mas eu vou assumir o caso com o Simão.
— Mas e o pai da Madalena? Ele vai descobrir que...— Pergunta a Mara, sabendo que serão os últimos a poder saber de alguma coisa.
— Não vai. Uma das "regras" que colocámos na nossa sociedade, é que podemos assumir um caso por ano sem dar contas a nenhum dos outros. Nunca o precisei de fazer, a Madalena vai ser a primeira vez que uso esse "privilégio".
— Então tu já tinhas isso na manga?— pergunta a minha mãe.
— Sim. Já falei com os dois que iria usufruir do meu privilégio anual. Isso quer dizer, que eles não podem fazer perguntas, nem consultar nada do que esteja em processo com o meu nome, durante o período que eu estiver em privilégio.
— É uma ideia de génio dos três.— diz o Simão orgulhoso...— Desta forma se o que estiver em privilégio fizer algo ilegal, a empresa não sabia de nada, ou seja, não é prejudicada.
— Tecnicamente é isso. Mas nós confiamos o suficiente nos três para saber que nunca faríamos nada que não fosse legal.
— Vó...tou cum fominha. Pudemos comê...— diz o Lucas para Dona Dulce.
— Claro, vamos. O almoço já deve estar pronto. Como não sabia bem o que gostavam fiz a comida preferida aqui do Lucas...
— LAXANHA...
E assim fomos almoçar. Foi um almoço em família, mas onde faltava uma pessoa. Aquela que eu mais queria ver, abraçar, ralhar. A minha prima, amiga, irmã de outra mãe. Quando estávamos a acabar, ouvimos um choro baixinho pelo intercomunicador que estava ao lado da Mara.
— A Mimi acordou. Vou lá buscar e ver se ela acordou a madrinha.— diz a Mara
— Eu vou contigo. Se ela estiver acordada a Mara avisa, e vocês sobem. Mas, não entrem. Primeiro tenho que lhe dizer que vocês estão cá, depois eu dou-vos um sinal, ou...
— Está descansado. Nós vamos esperar o teu sinal.
E assim a Mara e o Diogo sobem. Passado uns minutos ela desce com a bebé, é linda. Diz-nos pra subir, e que deixou a porta meia aberta para nós conseguirmos ouvir e perceber quando for para entrar. Subi eu, a minha mãe e o meu pai. O Simão achou que seria muita gente de uma vez, e ficou com nossa Mariana.
Conseguimos ouvir um pouco da conversa, da ansiedade que a sua voz transmitia, quase terror ao saber que estavam ali pessoas para a ver. O Diogo, pediu-lhe perdão uma quantidade de vezes, que esperava que ela percebesse que o fez por a amar, que já não sabia mais o que fazer para a tirar daquela tristeza toda e por fim ele olhou para mim, e percebi que era a hora...
— Achas bem fugir, sem me dar cavaco? Tu prometeste, eu seria a madrinha da tua primeira filha e descubro que afinal já não vou ser eu, estou capaz de te torcer o miolo do pão.
Quando éramos pequenas, em vez de dizermos "estou capaz de te torcer o pescoço", por piada começámos a dizer "torcer o miolo do pão..." e a coisa acabou por virar uma coisa só nossa.
— Leonor...Nono...És mesmo tu...Nono...
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