Capítulo 27
Pov Madalena
Assim que tenho um pequeno intervalo nas urgências e nas rondas, decido ligar para o Diogo. A esta hora provavelmente ele já teve notícias da Mara. Quis fazer isso assim que deixei o Martim com a pequena Miriam, porém, o trabalho chamou-me e não consegui parar desde daí. Entrei numa das salas de descanso dos médicos, e ligo para o telemóvel.
"— Madalena."
"— Oi, amor. Desculpa. Quis ligar-te depois do parto, mas não consegui parar."
"— Tudo bem. O Martim ligou-me."
"— Onde está a Luz?"
"— A dormir, com o Lucas. Eles não quiserem ficar separados..."
"— Diogo, eu soube que os teus pais estão cá, acho melhor a Marisol levar a Luz para casa."
"— Como assim!? Madalena, achas mesmo que os meus pais iram fazer alguma coisa à Luz? Achas mesmo que eu os deixaria?
"— Eu...eu sei que não. Mas mesmo que sem querer eles..."
"— Amor, tu conheces os meus pais."
"— Eu conhecia-os. Antes de eu fugir, antes de lhes esconder uma neta."
"— Madalena, achas mesmo que a Dona Dulce vai tratar mal alguém? Ainda por cima uma criança?"
"— Eu..."
"— Eu nunca deixaria ninguém, ouviste bem, NINGUÉM fazer alguma coisa que magoasse a Luz. Nem mesmo os meus pais."
"— Desculpa. Eu só tenho medo, a Luz é..."
"— Eu prometo que se eles fizerem alguma coisa, se a Luz deitar uma lágrima que seja, vou ser o primeiro a chatear-me com eles."
"— Desculpa. Eu sei que estou a parecer horrível."
"— Eu percebo-te. Mas também não posso sair daqui, pelo menos enquanto os meus pais ou o Martim não chegarem. E depois, a Luz e o Lucas não vão querer separar-se tão cedo."
"— Eles deram-se tão bem. É incrível..."
"— São meus filhos. Claro que são incríveis."
"— Nada convencido Dr. Diogo..."— vejo a Dra. Diaz a chamar por mim..."— Amor, vou ter que desligar, o dever chama-me"
"— Vai e arrasa...e Madalena, eu amo-te."
"— Eu também te amo. Dá-lhes um beijinho meu quando acordarem..."
"— Eu dou. Até já..."
Desligo a chamada, e guardo o telemóvel no bolso. Supostamente, não podemos usar o telemóvel em horário de trabalho, mas desta vez não tive como não o fazer. Fui ter com a minha "chefe", ao seu lado estava o Rocco, com um olhar de quem se pudesse matava-me com os olhos.
— Dra. Fernandes, necesito que me acompañes. (Dra. Fernandes, preciso que me acompanhe.)
— Yo?! (Eu?!)
— Sí. Dr. Rodríguez, necesito que reemplaces al Dra. Fernandes en la sala de emergencias. (Sim. Dr. Rodriguez, preciso que substitua a Dra. Fernandes nas Urgências.)
— Pero... hoy era el día de estar de servicio con...(Mas...hoje era o dia de estar de serviço con...)
— Dr. Rodríguez, quién es el jefe aquí? (Dr. Rodriguez, quem é a chefe aqui?)
— La Doutora...(A Doutora...)
— Exacto, entonces como tu jefe te estoy ordenando que hagas tu trabajo, que en este momento es ir a urgencias, entiendes? (Exacto, então como tua chefe estou a ordenar-lhe que faça o seu trabalho, que neste momento é ir para as urgências, entendido?)
— Sí, Dra. Díaz.(Sim, Dra. Diaz.)
— Dra. Fernandes, vámonos. (Dra. Fernandes, vamos.)
Eu não sei bem como responder, mas, como ela mesmo disse, ela é a chefe. Então se ela quer assim, quem sou eu para contrariar.
— Sí, por supuesto. (Sim, claro)— Depois de alguns segundos, decido perguntar para onde vamos...— Dra. vamos a ver que paciente? (Dra. Vamos ver que paciente?)
— Uno que ha estado preguntando por ti desde que despertou. (Um que tem perguntado por ti desde que acordou.)
Mara. Só podia ser ela. Mas isso significava que ia estar de frente com... eles. Não, eu não podia, parei na hora. Não era o momento e muito menos o local para o reencontro.
— Dra. Fernandes, pasa algo? (Dra. fernandes, passa-se alguma coisa?)
— Los padres de Mara... Los padres de Mara, están con ella? (Os pais...os pais da Mara, eles estão com ela?)
— Usted sabe que en este hospital se permite que la familia esté presente en el parto o puerperio. En este caso y como se trataba de una cesárea, solo les permitieron entrar ahora. (Sabe que neste hospital e permitido a familia estar presente no parto ou no pos parto. neste caso e como foi cesariana só foi permitido entrarem agora.)
— No puedo... lo siento Dra. Díaz, pero no puedo. (Não posso...desculpe Dra. Diaz, mas eu nao posso.)
—Cómo no puedes?! (Como assim nao podes?!)
— Los padres de Mara y Diogo, ellos no saben de Luz, ellos...(Os pais da Mara e do diogo, eles não sabem da Luz, eles...)
— Muy bien, aclaremos algunos puntos aquí: aquí dentro de estas paredes eres el Dra. Fernandes. No eres hija, hermana, nuera o cuñada de nadie. Entonces te recuperarás y entrarás en esa habitación sin discutir. (Muito bem, vamos esclarecer aqui alguns pontos: aqui dentro destas paredes tu és a Dra. Fernandes. Não és filha, nem irmã, nem nora, nem cunhada de ninguém. então vais recompor-te e entrar naquele quarto sem discussão.)
— Pero...(Mas...)
— Magdadelna. Al terminar tu turno quiero que vengas a mi oficina. (Madalena. No final do teu turno quero que venhas à minha sala.)
Não tenho outra opção senão seguir a Dra. Chiara Diaz pelo corredor e enfrentar seja o quem for que estiver naquele quarto. Por muito que a Dona Dulce saiba por tudo o que eu e o Diogo passámos, que ela nos tenha até ajudado nos nossos encontros escondidos, a minha fuga também a deve ter magoado.
Talvez, o facto de me reencontrar, seja uma boa surpresa. Ela gostava de mim, e eu dela. Sempre me disse que eu era um anjo caído do céu, e que tinha conseguido mudar a vida dos dois filhos que mais a preocupavam: o Diogo e a Rute. Claro que de formas diferentes. A Rute sempre a que era colocada de parte na escola, e mesmo a minha amiga a fazer-se de durona, Dona Dulce sabia que por dentro ela sofria por não ter amigas. E o Diogo, era aquele filho que mesmo sendo estudioso, meigo e atencioso com a mãe e as irmãs, era também aquele que tinha uma relação mais problemática com o pai. E muitas vezes isso provocava discussões feias em casa.
Mas o meu medo era outro. Quando estava a começar a divagar para o outro problema do meu reencontro com a família do pai da minha filha, estava já à porta do quarto da Mara. Só tive tempo de inspirar o mais fundo que consegui...e entrar atrás da Dra. Diaz. Tentei ficar mais para trás, com uma ínfima esperança que ninguém desse por mim. Porém, sou surpreendida com a minha "querida" chefe a falar que se não fosse eu as coisas teriam ficado muito mais complicadas.
Não fui capaz de dizer nada, aliás nem levantar a cabeça consegui. Acho que a Mara no início nem se apercebeu quem estava ali. A Dra. Diaz continuou a falar sobre tudo o que aconteceu. em como eu reagi rápido, ao me aperceber do estado da Mara, mesmo ao chegar ao hospital em como apresentei a situação ao clínico de serviço. E no final eu mesmo tinha feito a cesariana sempre com a sua assistência claro. E eu? Bem só queria um buraco bem fundo para me enterrar.
Depois foi a vez do pediatra, que também entrou connosco, relatar o estado da pequena Miriam. Claro que todos ficaram felizes pela pequena estar bem, mesmo que esta tenha que ficar a noite de hoje na UCIN. É na altura em que o ouço falar de Miriam que levanto o meu olhar e vejo a Mara sorrir, e agradecer-me com o olhar. Tal como eu, ela sabe o que poderia acontecer com a Miriam. E foi também nessa altura que ouvi o que não queria ouvir de todo...
— Eu...eu acho que a conheço de algum lugar. — ouço a Dona Dulce dizer...— Rui, ela não te é familiar?— pergunta ao marido, a que ele simplesmente encolhe os ombros...— Eu sei que te conheço, mas não sei...— bem e se é para retirar o penso que seja rápido e certeiro.
— O meu nome é Madalena. Madalena de Sá Fernandes...
—Não acredito. Madalena!? És mesmo tu? Ai, meu Deus. E o Diogo? Ele já sabe? E a tua avó, eu tenho que lhe ligar, ela tem...
— NÃO. — Gritei. Sem nem me aperceber eu berrei. Todos olharam para mim, assustados talvez. Olhei para todos, olhei para a Mara...não dava mais, eu não podia ficar mais aqui. Olhei ao redor, todos com os olhos postos em mim...
— Madalena, não. — Olhei para a minha futura ou ex-cunhada, já nem sabia...— Não faças isso, nem penses nisso. Não é só a Luz agora, tens o Lucas.
O Lucas. O meu pequeno, o meu principe. Mara tinha razão, eu não podia deixá-lo, eu não queria deixá-lo. Mas, eu também não podia continuar aqui, era uma questão de tempo para alguém da minha família saber onde eu estava. E isso era tudo o que eu menos queria.
— Eu...eu não posso...desculpa Mara, mas eu não posso.
E saí. Saí daquele quarto que por momentos se transformou numa prisão. Corri pelos corredores, desci escadas, que nem sei onde iam dar. Só queria sair dali, queria conseguir respirar o ar que ficara preso dentro de mim. E assim que consegui chegar à rua, deixei soltar o ar que me asfixiava de dentro para fora. Soltei-o num grito. De desespero, de raiva. Saí tão depressa, e sem norte, que nem me apercebi que tinha sido seguida por alguém.
Sinto alguém chegar perto. Um calafrio passou por mim, e tive medo. Nem me mexi, talvez se me mantivesse quieta a pessoa se fosse embora, pensei. Puro engano, claro.
— Portuga,qué está pasando? (Portuga, que se passa?)
— Rocco!? Déjame en paz. (Rocco!? Deixa-me em paz.)
— No sé, al fin y al cabo fuiste como la heroína de una cirugía, que debió ser mía. (- Não sei, afinal tu ficaste como a heroína de uma cirurgia, que deveria ter sido minha.)
Olho para ele, que tem raiva nos olhar. Pior que isso, ódio. E se até àquele momento, a única coisa que Rocco me fazia sentir era asco pelo carácter interesseiro e mesquinho, naquele momento senti medo. Que culpa é que eu tinha. Ele aproxima se mais de mim e eu tendo afastar-me, estou a tremer...
— No tuve nada que ver con eso. Dr. Díaz tomó la decisión. (Eu não tive nada a ver com isso. A Dra. Diaz é que fez a escolha.)
— No tienes nada que ver con eso? Tienes todo que ver en ello: Madalena de Sá Fernandes, hija de la gran María de Sá Fernandes. (Não tens nada a ver com isso? Tens tudo a ver com isso: Madalena de Sá Fernandes, filha da grande Maria de Sá Fernandes.)
— Qué? como sabes... como sabes... (O quê? como é que sabes...como é que...) — Mas como é que ele descobriu?
— Lo sé todo cuando quiero. Y no fue difícil. Me gustaría saber qué pensará tu padre cuando se entere de que su hijita se escapó embarazada del hombre con el que le prohibió salir. (Eu sei tudo quando quero. E não foi difícil. gostava de saber o que o teu pai vai pensar quando souber que a filhinha dele fugiu de casa grávida do homem com quem ele proibiu o namoro.)
— No. Rocco, por favor, no puedes decirle nada a mi padre. (Não. Rocco, por favor, não podes dizer nada ao meu pai.) — Deus, já não me bastava a Dona Dulce, agora tenho este ser a ameaçar-me.
— Quizás no, pero habrá un precio. (Talvez não diga, mas vai ter um preço.)
Sinto Rocco aproximar-se cada vez mais de mim. Tento escapar, afastar-me, até porque o olhar passou do ódio para algo como desejo. Contudo, ele é mais rápido e consegue segurar-me pelos braços.
— Não. Deixa-me...estás a magoar-me.
— Qué? Lo siento portuga, no entiendo lo que dices...(O quê? Me desculpa portuga, não estou a entender nada do que estás a dizer...)
— Rocco. Déjame, me estas lastimando. (Rocco. Deixa-me, estás a magoar-me)
— No. Eres meo..
— Para...por favor...
— No. Te acabo de decir o que te va a costar la cesárea que debí haberte hecho yo. Tu vás a ser mia. (Eu acabei de te dizer o que te vai custar teres tirado a cesariana que deveria ter sido eu a realizar. Tu vais ser minha.)
Tento por tudo soltar-me dele, mas não consigo. As lembranças do que o Ricardo me fez, vêm todas à minha cabeça, e com isso começo a sentir-me fraca. O meu coração acelera, a respiração também. Continuo a lutar, mesmo não tendo muitas forças, e de repente sinto uma dor aguda no estômago. Rocco deu-me um soco no estômago. Fiquei sem conseguir reagir, tudo parecia uma névoa na minha cabeça.
— Por favor, não me faças isto...de novo não...por favor...— e depois de dizer isto, não consigo ouvir mais nada. Não sei se ele me apagou, ou se fui apenas eu que desmaiei.
Naquele momento não mais me importava. Pensei no Diogo, na Luz e no Lucas. Se eu partisse agora, pelo menos a Luz teria o pai e o irmão. Teria avós, tios e tias. Sei que ela ficaria bem, que ficaria segura. Então se fosse para partir, eu partiria com a certeza que a minha filha ficaria segura nas mãos do pai.
Bạn đang đọc truyện trên: Truyen247.Pro