Capítulo 24
— Papá...— Luz diz bem baixinho, como se tivesse a interiorizar o que estava a ver. Diogo coloca o album na mesinha à nossa frente, levanta-se e coloca-se de joelhos, com braços abertos...— Papá...— Luz corre para ele e abraça-o.— O meu papá...é o meu papá.
E repete esta frase vezes sem conta. É como se ao falar alto, conseguisse assimilar melhor o que realmente estava a acontecer. E ficámos assim: eu com lágrimas nos olhos a observar este encontro lindo, Luz a chorar agarrada ao pai, e o Diogo a chorar por ter finalmente a dilha nos seus braços. De repente sinto o Diogo a puxar-me para o abraço, e ali estávamos nós de repente uma família.
— Papá, no te vayas... no dejes más a Luz sola...(Papá, nao te vais embora...nao deixas mais Luz sozinha...).
— Luz, em português por favor.
— Deixa. O Papá promete princesa, nunca mais te vou deixar. Nem a ti...nem a mamã.
— Cierto...seremos una familia feliz? Nunca más se separaron? (Verdade...vamos ser uma família feliz? Nunca mais nos separamos?
— Nunca mais...— estava na hora da conversa, era agora ou nunca.
— Luz, a mamã e o papá, precisam falar contigo. Vamos sentar-nos no sofá, os três juntinhos?
— Papá posso ficar no teu colo?
— Claro que sim, mas e a mamã não vai ficar triste.
— Não, pois não mamã. É que...é...— Luz olha para o Diogo e suspira...— O meu Papá...
— A mamã não vai ficar triste. Agora vamos nos sentar?
— Sim, ao colo do papá.— Diogo sorri com a insistência de Luz.
De repente lembro-me de Lucas, e sorrio também. Tal como Luz, ele apegou-se à figura parental que não tinha contacto: à figura de uma mãe. Também ele não me largou ontem, também ele quis fazer tudo ao meu colo. A minha pequena está a fazer exactamente o mesmo.
— Ei! Estás a pensar em quê?— Diogo pergunta-me. Aproximo-me dos dois, que já estão sentados no sofá, e sento-me. Viro-me para os dois que olham para mim, e apenas dou um beijo ao Diogo.
— Mamã...não podes. O papá é meu...— e abraça o pai possessivamente.
— Ciumenta.— olho para Diogo e sorrimos...acho que só sabemos sorrir hoje.— Pipoca, podemos falar?— Luz apenas diz que sim com a cabeça.— Bom, lembras-te que a mãe te disse que o pai trabalhava lá em Coimbra onde eu vivi?
— Sim. Ele ajuda os senhores com doi-doi...
— Isso. Então e lembras-te da mamã te dizer que o papá trabalhava muito e que por isso não te podia vir ver.— Luz apenas acena com a cabeça...— A verdade meu amor, é que o papá até ontem não sabia que tu tinhas nascido, ele não sabia que tu vivias com a mamã.
— Mas, o papá falava comigo, ele falava pelo teu telefone?!?!
— O que tu ouvias eram mensagens que o papá mandou à mamã há muito tempo.
— Tu mentiste à Luz?
— Desculpa pequena, a mamã só te quis proteger. Eu estava zangada com o papá, pensei que ele já não gostava de mim, então...— baixei a cabeça, era difícil olhar para a minha menina...— Eu fugi e não lhe contei que tu estavas na barriga da mamã.
— Tu mentiste à Luz. E mentiste ao papá...és feia mamã...
— Ei! Luz, não fales assim com a tua mãe. Ela fez porque te amava demais. Foram pessoas muito más que inventaram mentiras sobre o papá. A culpa não foi só da tua mãe.
— Ela mentiu à Luz. E ela sempre disse à Luz que mentir é feio. Então...vou colocar a mamã de castigo, sim.— Luz vira-se para mim, muito séria e...— Uma semana sem beijinhos da Luz e do Papá.
— Ah! Maria da Luz, não está certo, assim vais estar a castigar o pai também. Eu não vou aguentar ficar sem beijinhos da tua mãe...
— Vais sim. Mamã...— ela pede para ir para o chão, o que Diogo faz. Fica a minha frente, e com uma mão na cintura e a outra a apontar para mim...— Meninas feias melecem castigo, então mamã olha bem para os meus olhos...— Meu Deus, não acredito que ela está a usar as mesmas palavras que uso quando ralho com ela...— vais ficar cinco minutos no cantinho do castigo, e ficar sem beijinhos meus e do papá até...— ela olha para o pai, voltando a olhar para mim...— até "amanhã depois".
— Diz-se "depois de amanhã" filha...
— Isso... vá mamã para o castigo.
— Filha.— ela continua a olhar para mim, decidida a levar o seu castigo avante...— Luz, nós ainda não acabámos a conversa.
— Há mais...— diz agora com as mãos na cabeça, nossa senhora esta miúda é muito dramática...— Papá, desculpa eu, mas vais ficar sem beijinhos da mamã durante mais tempo.— chega perto do pai, e abraça-o.— Mas a Luz vai te dar muitos tá bem? Não precisas ficar "tiste"
— Podemos acabar a conversa?— Pergunto, na esperança dela se aquecer do castigo.
— Não. Primeiro...— e aponta para o cantinho onde está a cadeira dela, e onde a sento quando me zango com ela.—...cantinho mamã.
E lá vou eu para o cantinho do castigo. Sei que talvez não o devesse fazer. Que muitos podem achar que estou a ensinar á minha filha de quase 5 anos, que castigar os pais é algo que ela pode fazer. Porém, sei bem que Luz percebe que não pode fazê-lo, e que desta vez foi uma excepção.
Enquanto fico no "cantinho do castigo" olho para pai e filha. Eles estão a brincar com alguns dos brinquedos que, muito embora eu peça á minha filha que arrume, passam a vida na sala. Passado um tempo vejo Luz levantar se e vir até mim.
— Ponto mamã podes sair. Mas pometes que nunca mais mentes para a Luz?
— Prometo minha princesa. Podemos continuar a conversa, para o papá e a mamã te contarem tudo, sem segredos e sem mentiras?
— Sim.— ela pega na minha mão e vamos até o Diogo que já está sentado no sofá. Desta vez a Luz quis sentar se ao meu colo.
O Diogo começa então a contar a sua história, claro que muito por alto. Que como eu tinha fugido, ele namorou com uma outra menina. Que nunca me esqueceu, mas que teve que continuar a viver. E agora era a parte que mais temia: contar sobre o Lucas.
— Então passado um tempo, esta senhora com quem o pai estava ficou grávida, ela tinha um bebé na barriga.
— O Lucas, né?
— Sim meu amor. Tu tens um mano.
— Eu não quelo.
— O Lucas sempre quis manos, ele está muito feliz por ter uma mana mais velha.— diz o Diogo
— Não. Não quelo... mamã...— e começa a chorar.
— Luz, tu sempre pediste um mano á mamã. E agora tens um...estavas tão feliz...
— Mas eu quelia um mano daqui...— ela diz apontando a minha barriga...— Igual aos primos.
— O Lucas não nasceu da barriga da mamã como tu, mas sabes uma coisa? O Lucas para a mamã nasceu no meu coração.
— Como nasce do coração?
— É como vocês nasceram para o pai.— diz o Diogo...— Vocês nascem do coração dos papás. Do amor que temos aqui...
— Mamã...— ela olha para mim com lágrimas a corrar...— Ele vai roubar vocês de mim. Eu não quero...— desce do meu colo e corre para o quarto. Diogo fica com um olhar perdido...
— Achas que ela o vai aceitar? O Lucas estava tão feliz.
— Eu estava com medo disto. A Luz não é uma menina ciumenta ou que não sabe partilhar, mesmo sendo filha única. Mas...—o telemóvel do Diogo toca...
— É a minha irmã. "Estou Mara."
— "Desculpa, espero que não esteja a atrapalhar a conversa"
— "Não...mais ou menos "
— " O Lucas acordou, ele queria falar com vocês. Mas se não for uma boa altura..."
— "Não. Passa-lhe o telefone."
— "Papá. Já falalam com a nana? O Ucas qué vê a Luz..."
— "O papá ainda está a conversar com ela."
— ”Ea naum qué ve o Ucas, né?"
Eu não aguento perceber que o meu bebé está tão triste. Ele já passou por tanto. Pego no telemóvel e começo a falar com o meu pequeno...
— ”Ei, príncipe. Ouve a mamã..."
— ”Mamã, a nana naum gosta do Ucas..."
— "A mana está só confusa. A mamã vai falar com ela sim. Não chores. Daqui a pouco a mamã,o papá e a mana vamos estar aí. Sim?”
— "Pometes?"
— "Prometo. Agora vai papar está bom?."
— "Xim. Gosto muto de ti mamã."
— ”A mamã também gosta muito de ti. Obedece a Tia Mara, sim?"
— "Essa última parte ele já não ouviu."— diz Mara — "A reacção dela não foi boa, certo?"
— "Só a parte do irmão."
— "Mas ela já sabia do Lucas..."
— "Eu acho que é só insegurança, mas eu vou falar com ela. Até já..."
—"Vêm almoçar, certo?"
— "Sim, se houver algum contratempo eu aviso. Até já."
— E agora?— pergunta um Diogo meio perdido...— O que é que eu faço? Eu amo os dois, mas...— Chego perto dele e dou-lhe um beijo.
— Não podes mamã, estás de castigo...— ouço uma vozinha bem fininha e entrecortada, parece que alguém esteve a chorar.
— Tu...— Olho para o amor da minha vida...—...vais ficar aqui, enquanto eu vou ali falar com a nossa filha. Ok?
— Não devíamos ir os dois?
— Não. Eu conheço bem a nossa filha, aquilo ali é apenas insegurança. Ela está com medo...
— Medo? Medo de quê?
— De nos perder. De me perder e de te perder a ti. Ela acabou de te encontrar, e de repente mesmo que a ideia de ter um irmão seja boa, a ideia de ter alguém a competir o nosso amor por ela. Aquela cabecinha deve estar uma confusão.
— Mas, então vamos...
— Vamos não, eu vou. Diogo, confia em mim, eu sei que é difícil. Que tu querias estar ali, mas infelizmente, por minha culpa, tu não a conheces como eu a conheço.
— Tudo bem.— ele abraça-me e dá me um beijo...
— Não podes papá, sem beijinhos á mamã até amanhã depois...
— Ela não esquece, meu Deus.— Diz o amor da minha vida a rir.
— Tem a quem sair.— sorriu, e dando-lhe mais um beijo, sigo para o quarto da minha pequena. Consigo vê-la a levantar-se do chão e a correr para dentro do quarto.— A senhorita sabia que é feio ficar a espreitar os mais velhos?
— Eu só queria ver se o papá e tu não...— ela não consegue terminar de falar, porque as lágrimas começam a descer dos seus olhinhos
— Luz. Minha vida. Anda cá á mamã...anda...
Luz caminha até mim, e eu pego nela ao colo. Sento-me na pequena poltrona que existe no quarto e enquanto ela chora, vou apenas confortando-a. Sei que toda esta cena, toda esta birra é insegurança, é medo. E sei que ela aos poucos vai perceber que não tem que ficar assim. Nós sempre iremos ama-la, independentemente do número de filhos que tenhamos.
— Podemos conversar.— ela assente...— Porque é que tu estás assim? Quando a mamã te contou do Lucas tu adoras te a ideia.
— Porque...porque...a Luz não quer.
— A mamã vai-te contar a história do teu mano, e depois tu decides o que fazer, certo?
— Mamã...
— A mamã ouviu-te, agora vais ouvir a mamã. O Lucas, que é o nome do teu irmão, nasceu doente. Ele tem um problema no coração, e aqui no peito e às vezes fica sem respirar. E quando a mamã dele descobriu, ela deixou-o. O Lucas era um bebé ainda. Mais tarde a mamã dele voltou, mas ela era má para ele, não dava mimos, não dava atenção ao Lucas. O mano cresceu sem saber o que era uma mamã, porque nem isso ele a podia chamar.
— Onde está a mamã do Lucas?
— Ela foi se embora, e deixou o mano com o pai.
— E o Lucas continua com doi-doi?
— Sim meu amor. E ele está tão feliz por ter uma mana. Sabes o que ele disse á mamã ontem...
— Tu tiveste com ele ontem? Tu mentiste a Luz outra vez. PAPÁ...— e lá vai ela a correr até ao pai, parece que se esqueceu até do que se passou há minutos atrás. Como é bom ser criança.
— Papá...a mamã...o castigo...da mamã aumentou. Não pode dar beijinhos nela durante dois dias. Ouviste?
— Filha.
— Filha, nada. E agora vamos come. Porque a Luz tá com fome. E depois vamos pa casa da Tita porque eu quero conhecer o meu mano.
E tudo passou assim tão de repente. Luz esqueceu-se dos ciúmes, da insegurança de ter outra pessoa com quem dividir o nosso amor, ou o medo de perder esse amor. O melhor de ser criança é isto, a simplicidade das coisas. Elas não complicam, não se deixam ficar amarradas a estas guerrilhas de sentimentos.
Bem a única coisa que infelizmente ela não se esqueceu foi do meu castigo: dois dias sem beijinhos dela, do pai e agora juntou os beijinhos do Lucas. Sim, ela diz que vai falar com o irmão e explicar que a mãe deles está de castigo porque foi feia e mentiu. E que mentir é feio.
Só não sei se o "meu bebé" vai aceitar muito bem isso...mas a ver vamos...neste momento estou feliz. Estamos felizes...o futuro a Deus pertence e logo vemos como vamos fazer a partir de agora.
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