Ya'war-e'te
O último a lhe desafiar foi Ururaí. O homem apenas lhe sorriu e disse:
− Cace Ya'war-e'te, a grande onça-negra, devoradora de homens.
No início, não houve reação por parte de qualquer um na aldeia e o único som a ser ouvido era o assobio do vento.
Mesmo Iúna só pôde ficar em silêncio diante do pedido e das mãos vazias de Ururaí. Ele queria que ela caçasse a fera mais perigosa de toda a floresta com as mãos nuas. Nunca antes ficara tão claro para a jovem o quanto seus irmãos a odiavam, não até agora.
Pela primeira vez, sentiu raiva deles.
A índia permaneceu muda. Olhava para o chão e retorcia as mãos nervosamente. Seu corpo estremecia.
E então seu pai surgiu do meio da multidão que os observava. Estava aflito.
− Ururaí! – gritou o pajé. – Você não tem o direito de exigir tal feito de sua irmã!
− Mas é isso o que quero, meu pai – o homem respondeu. – Se ela triunfar, ninguém nesta tribo poderá negar sua bravura. Mas se falhar... Então os deuses terão revelado a verdade.
Nesse momento, Iúna levantou os olhos para o rosto de seu irmão e viu que ele sorria. Um sorriso sádico de zombaria desmedida.
Sua única reação foi sair correndo. Nenhum dos guerreiros da tribo poderia censurá-la por isso. Ninguém poderia realizar o pedido de Ururaí e este apenas gargalhou satisfeito.
Seu pai, Ibura, foi o único a notar que Iúna seguiu para o oeste, a mesma direção do território de Ya'war-e'te.
* * *
A jovem índia correu por léguas a fio, sem nunca parar de sentir medo.
Ya'war-e'te era conhecido como o animal mais perverso de toda a mata. Diferente dos outros, não matava apenas para comer ou para se defender, mas tinha gosto por sangue. Homem, mulher ou criança, para a fera negra não fazia diferença.
Todos sabiam onde seu território ficava, para que pudessem permanecer o mais longe dali.
Não era raro a carcaça de um animal ser atirada como oferenda de paz à Ya'war-e'te. Também não era raro aquele que a oferecia, ser devorado no lugar do animal.
E assim a paz reinava.
No fim do quinto dia, Iúna chegou à morada da onça-negra: uma árvore milenar, alta e muito frondosa. Ao pisar na clareira formada pela ampla sombra, um rosnado pôde ser ouvido.
No alto de um dos galhos Ya'war-e'te se encontrava.
A onça de tamanho descomunal e pelo escuro encarou Iúna com seus olhos verdes e escancarou a boca em um sorriso felino. Saltou da árvore, aterrissando com suas grandes patas, fazendo nada mais que um baque surdo na terra fofa. Sua longa calda balançava como uma serpente nervosa.
Dessa vez Iúna não tinha um plano. Qualquer que fosse seria inútil ante aquela fera. Essa luta só poderia ser vencida usando força e instinto. Sendo implacável e selvagem como seu oponente.
A clareira e a grande árvore eram iluminadas pelo sol poente. Em algum lugar ao leste, atrás de árvores incontáveis e montanhas intransponíveis, a lua surgia no céu.
Iúna pediu forças à sua protetora, coletou toda a raiva e medo que sentia e os liberou em um grito de guerra capaz de apavorar o mais corajoso guerreiro.
Ya'war-e'te em resposta rosnou como nunca antes.
E os dois atacaram.
* * *
Iúna retornou para a tribo mais ferida do que já estivera em toda sua vida. Uma mordida profunda marcava seu ombro e lanhos vermelhos permeavam seu corpo. Trazia nas mãos um manto negro feito com a pele de Ya'war-e'te.
Aproximou-se de Ururaí e jogou o manto a seus pés, seguindo diretamente para sua oca.
Foi a vez da índia se afastar sem dizer uma palavra sequer.
* * *
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