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Tai Wa'su

O segundo a lhe desafiar foi Araí. O homem lhe entregou seu próprio tacape e disse:

− Cace Tai Wa'su, o grande queixada-cinzento.

Mais uma vez os guerreiros da tribo ficaram pasmos com a audácia do irmão de Iúna, pois Tai wa'su não era um animal a ser subestimado.

Dotado de um tamanho descomunal para um porco-do-mato e de presas tão afiadas quanto a ponta de uma lança, Tai Wa'su já foi a última visão de inúmeros caçadores.

Diferente de Suasu'tinga, não precisava ser rastreado, pois sua morada era sabida. Era senhor das terras ao leste e qualquer caçador que seguisse por dez léguas em direção ao sol nascente encontraria seu território e, se dependesse de Tai Wa'su, por ali ficaria até seus ossos desaparecerem sob a terra.

O pai de Iúna mais uma vez tentou convencê-la a não partir, mas foi inútil. A índia estava disposta a realizar qualquer feito para ganhar o respeito dos irmãos e assim deixou a tribo em uma nova caçada.


* * *


Caminhou por dias até chegar ao território de seu alvo, mas antes de atravessar a fronteira e provocar a ira do senhor do leste, parou ali e esperou.

Iúna não sabia como derrotaria sua nova presa. Era sabido que o grande queixada tinha um exército de porcos-do-mato junto dele e que atacavam invasores indiscriminadamente.

Por isso ela esperou. E como seu pai a aconselhara, novamente confiou em sua protetora.

Quando a lua surgiu no alto da floresta, vista apenas por entre as folhas das árvores, Iúna elevou seu espírito até ela, numa prece silenciosa.

A jovem índia pediu por conhecimento e a lua atendeu.

Ao amanhecer, Iúna atravessou a fronteira e caminhou até uma clareira. Não demorou a ouvir o trotar de vários animais se aproximando e, do meio da mata, eles surgiram. Vários queixadas de todos os tamanhos se reuniam em um bando.

E no centro, Tai Wa'su se encontrava.

Como as histórias diziam, o senhor do leste era enorme. Tinha quase dois metros de comprimento e seu corpo era repleto de músculos. Sua pelagem hirsuta era de um acinzentado único entre todos os queixadas.

Tai Wa'su encarou Iúna com seus olhos vermelhos e por um segundo suas presas pareceram brilhar sob o sol nascente. Por mais brava que fosse, a jovem ainda o temeu. As histórias contavam de caçadores que enfrentaram o grande queixada-cinzento com nada mais do que bravura e pereceram sob seus pesados pés ou pelas suas presas afiadas.

Entretanto, diferente de todos os guerreiros antes dela, Iúna tinha a sabedoria da lua.

A deusa lhe contara que um senhor de um exército possui muita força, mas também possui uma fraqueza. O senhor de um exército precisa, antes de tudo, ser respeitado. Respeitado pelos seus súditos e por seus inimigos. E para ser respeitado, um senhor não pode demonstrar medo.

Não pode recusar um desafio.

A índia caminhou até o meio da pequena clareira rodeada pelos inúmeros porcos-do-mato e ali se ajoelhou. Levantou suavemente a cabeça e fitou Tai Wa'su nos olhos.

O grande queixada bufou e grunhiu. Imediatamente todos os outros animais se afastaram.

O duelo de Iúna havia sido aceito.

Ela levou a mão as costas, sacando o tacape de Araí. Segurou o cabo de madeira vermelha com a mão direita e alisou a aresta afiada feita de osso na ponta da arma. Aquela não seria uma luta qualquer. Tai Wa'su não fugiria como Suasu'tinga e por isso aquilo seria decidido com apenas um golpe, dele ou dela.

O grande porco-do-mato avançou, pisoteando o chão com vigor. Iúna fez o mesmo, mas seus passos eram leves como o cair de uma folha. No centro da clareira os dois se encontraram.

Tai Wa'su levantou as presas em direção à índia, mas Iúna só fez saltar, ágil como um veado-campeiro. Ao aterrissar, levou todo seu peso para o tacape, descendo-o com força descomunal em direção à cabeça do queixada-cinzento.


* * *


Iúna voltou para sua aldeia, cansada, dolorida e mais forte do que antes já fora. Trazia nas mãos um grande tacape feito dos ossos e das presas de Tai Wa'su.

Caminhou até Araí e lhe esticou a mão que segurava a arma, dizendo:

− Eu cumpri sua tarefa, meu irmão, e como prova lhe trago este presente.

Assim como Ivair, Araí não teve escolha senão aceitar a oferta de Iúna. E como seu irmão, afastou-se sem uma palavra.


* * *

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