Capítulo 7 - O Ministro da Máfia
Bem longe dali...
Por favor, dois pãezinhos e um café amargo. — Pediu Maresca. Naquele dia tinha-se levantado muito cedo e, após nadar, foi até Georgetown, a capital das ilhas Cayman. Assim que se deparou com aquelas mesinhas sob o toldo colorido em plena rua, decidiu tomar ali mesmo seu café da manhã. O dia estava belíssimo, e ela se recusava a ficar trancada num ambiente fechado.
Fazia calor, e ela se sentia tranquila e relaxada enquanto bebericava seu saboroso desjejum.
Ao acabar, abriu a bolsa e retirou alguns cartões postais, que começou a preencher.
Eram destinados aos seus pais, às três irmãs casadas, ao irmão e a um bando de sobrinhos e sobrinhas. Porém, quando chegou o momento de escrever para o avô, Antônio, Maresca hesitou durante alguns instantes. O velhinho era esperto demais e logo chegaria à conclusão de que ela se encontrava afastada do trabalho por razões que nada tinham a ver com o prazer.
Finalmente, decidiu-se por enviar apenas alguns linhas convencionais: "Estou me divertindo muito. Gostaria que você estivesse aqui!"
Isso pelo menos era verdade! Apreciaria imensamente ver o avô naquele momento e contar-lhe os problemas que enfrentava. Mas isso não seria possível e o envolver em seus problemas não era nada maduro.
Em seguida, vinham os cartões para os amigos de Washington. Para os colegas de trabalho enviou um postal grande. E não se esqueceu de Gabriela Hardt, uma amiga com quem dividia o apartamento e para quem tinha arranjado emprego como secretária de Thiago Santineli. Para completar, escreveu sua amiga intima Suzanna e seu marido Júlio César.
Todas as vezes em que se desanimava com o emprego, Maresca recordava o Natal que havia passado no Novo México, ocasião em que conheceu os Werner. Naquele momento estava para se formar e aproveitava a oportunidade que lhe fora oferecida de trabalhar no FBI. Ela e Suzanna tornaram-se amigas íntimas. Aliás, se não contasse com seu apoio, Maresca não teria sabido como lidar com a morte trágica de seu ex-noivo.
Assim que terminou de escrever o último cartão, ela olhou à sua volta, procurando localizar o correio mais próximo.
Assim que enviou o último envelope, ela avistou um homem alto que parecia vir em sua direção. Por alguns segundos julgou que fosse Valentim, mas enganou-se. Em compensação, a opressão que experimentava sempre que pensava nele se fez presente mais uma vez.
Naquela manhã tinha ouvido o barulho do chuveiro dele ligado, mas quando voltou da praia o carro de Valentim já não se encontrava mais lá.
Decidida a não cruzar com ele em nenhum momento, deixara o carro estacionado num lugar discreto, de onde poderia sair sem ser vista. Não que Valentim a julgasse uma vizinha barulhenta e inconveniente.
Saindo do correio, Maresca foi ate a imobiliária e o corretor geral, Harry Appio, pronunciou seu nome assim que a viu.
— Como me reconheceu?
— Caetano, o rapaz que trabalha na agência de automóveis, disse que você era muito bonita e vejo que não exagerou!
— Protesto! — Exclamou ela, sentando-se na cadeira que o rapaz atraente e bronzeado lhe indicava.
— Ora essa, por quê? Julguei que as mulheres gostassem de receber elogios.
— Não elogios que as deixem desarmadas! Vim fazer uma queixa...
De fato ela tinha ido até a imobiliária reclamar da comida que faltava em sua geladeira. Poderia ter feito isso por telefone, mas cedeu à curiosidade de descobrir se Valentim havia voltado a queixar-se de tê-la como vizinha.
— Oh, tenha pena de mim! — Pediu Harry com ironia. — Acabo de enfrentar o seu vizinho.
— Ele esteve aqui?
— Sim. Você precisava ter visto a quantidade de dinheiro que ele me ofereceu para usar o chalé inteiro sozinho!
—Quer dizer então que ele lhe ofereceu uma propina para se livrar de mim? Sabe a razão disso?
—Não faço a menor ideia. Muita gente vem até as ilhas por motivos que se recusam a revelar. Tome, por exemplo, os banqueiros. Somos o lugar ideal para quem quer abrir uma conta clandestina.
— É verdade. Muitos homens de negócio escondem suas fortunas aqui, não é mesmo?
— Sem dúvida. Georgetown possui mais de quatrocentos bancos e é superada apenas por Londres e Nova York. Nós nos equiparamos à Suíça, a Hong Kong e às Bahamas no que diz respeito à discrição oferecida por nossos bancos. Em mais de um sentido somos a ilha dos segredos. Pode-se dizer que quase todas as pessoas que viajam para cá têm algo a esconder.
— O que foi que você disse a Valentim Salvatore?
— Confesso que fiquei tentado a ajudá-lo. Não é todos os dias que surge uma oportunidade dessas...
— Refere-se ao suborno que ele lhe ofereceu? — Pensar que Valentim insistia em removê-la a qualquer preço deixou-a com um gosto amargo na boca. — E para onde eu iria?
— Descobri que há um quarto vago num dos hotéis. Está interessada? Evidentemente você terá de dar uma bela gorjeta ao gerente. Poderemos rachar a despesa...
— Não estou nem um pingo interessada em sua proposta. — Disse ela, com rispidez.
— Calma, a escolha é sua. Que acha de jantar comigo uma noite dessas?
— Está querendo pôr panos quentes na minha queixa.
— Qual é mesmo o seu problema?
— A geladeira está vazia.
— Só isso? O sr. Salvatore me contou o que aconteceu. Hoje à tarde enviarei alguém para enchê-la. Por acaso, você pediu uma faxineira?
— De modo algum. Não quero ninguém batendo à minha porta caso eu decida dormir até tarde. Precisarei estar no chalé quando a comida for entregue?
— Não, temos as chaves. O que me diz do jantar? — Perguntou Harry, levantando-se e acompanhando-a até a porta.
— É muita gentileza de sua parte, mas ainda não fiz nenhum plano.
Sentimentos de rejeição eram uma coisa nova para Maresca. Pelo menos não se lembrava de tê-los experimentado há algum tempo, e incomodava-a saber que Valentim insistia em sua mudança.
Com certeza, a atitude dele se devia ao que acontecera na véspera. Naturalmente Valentim receava que ela voltasse a procurá-lo... Mas, por quê?
O que ele esconderia?
Subitamente ela percebeu que teria de evitar Valentim, caso contrário começaria a trabalhar nas férias. Nem tudo o que acontecia nas ilhas Cayman era ilegal. Lá havia muitos segredos e, quanto a ela, Valentim podia perfeitamente guardá-los para si. Não tinha a menor intenção de intrometer-se na vida dele.
No entanto, dali a poucos instantes ela descobriria que não seria fácil manter-se isolada numa ilha pequena como aquela. Por uma incrível coincidência, ela e Valentim se cruzaram diante da mesmo bomba de gasolina, vindo de direções opostas. Descendo do carro, Valentim indicou ao rapaz que enchesse o tanque dela primeiro.
—Olá, Maresca.
Ele usava uma calça jeans surrada e camiseta verde. Os pêlos de seu peito eram claros e Maresca recordou o que ele havia contado sobre sua ascendência italiana.
— Está passeando? — Perguntou, embaraçada.
— Sim, mas deveria estar trabalhando na verdade.
— Não veio para cá de férias?
— De modo algum. Tenho serviço suficiente para ficar ocupado durante doze horas por dia.
Afastando algumas mechas de seus cabelos com delicadeza, ele lançou um olhar insinuante para-seu decote ousado, fazendo-a corar de imediato.
— Aonde foi hoje de manhã?
— Procurei me divertir... — Pelo espelho retrovisor, Maresca notou que o rapaz do posto acabara de encher seu tanque. Tirou uma nota da bolsa, pagou e deu a partida. — Bem, até qualquer hora, Valentim.
O encontro deixara-a perturbada, e ela guiava a toda velocidade, procurando descarregar a tensão no volante. Sempre que ficava nervosa dava um passeio, a fim de se acalmar.
No dia em que rompera com o noivo, percorreu toda a região da Virgínia com o rosto banhado de lágrimas.
Esforçando-se para afastar essas recordações, resolveu explorar a ilha inteira. Faria o possível para prestar atenção no nome dos restaurantes à beira da estrada e, quando voltasse para casa, os estudaria melhor em seu guia de viagem. Além disso, pretendia participar de uma pescaria e mergulhar, a fim de conhecer os maravilhosos recifes de coral.
Maresca prestava atenção na tabuleta de um dos restaurantes quando um carro surgiu, saindo de uma estrada secundária. Seus reflexos foram rápidos e ela brecou. O outro carro, porém, oscilou ligeiramente e de repente Maresca sentiu o impacto de uma batida em seu pára-lama traseiro.
Experimentando uma fúria descontrolada, parou o automóvel no acostamento, saltou e correu em direção ao veículo negro, onde havia várias pessoas.
— Você não vê o que faz? — Perguntou, indignada. — Eu estava na preferencial!
O homem sentado à direção era magro, tinha olhos pequenos e cabelos de um loiro desbotado. Maresca olhou rapidamente para as demais pessoas que o acompanhavam.
Ao se acalmar, ela se arrependeu das palavras agressivas e, recordando a discussão que tivera com Arnaldo Dallagnol pouco antes de partir, começou a duvidar de sua capacidade de controlar as emoções.
Com certeza, aquelas pessoas eram turistas como ela, e não havia razão para fazer drama por causa de uma simples batida.
—Lamento o que aconteceu. — Disse o homem lentamente, revelando que o inglês não era sua língua.
— Precisamos chamar a polícia. — Afirmou Maresca.
— Não! — Ele parecia ansioso em evitar a polícia e não disfarçou o nervosismo. — Podemos resolver o assunto entre nos acrescentou, enfiando a mão no bolso e sacando um maço de notas.
— Não posso aceitar. O carro é alugado... — Explicou Maresca com um sorriso. — Vamos
até aquela loja, pedir que chamem a polícia para nós.
— Um minuto!
Dito isso ele se virou, iniciando uma conversa com seus companheiros numa língua que ela desconhecia. Aproveitando a distração deles, Maresca pôs-se a estudar os demais passageiros. No banco da frente estava um homem corpulento, de cabelos e olhos negros, que a fitava com ar pouco amistoso. Este parecia um segurança particular por sua postura corporal.
O terceiro passageiro era uma jovem. Estava com a cabeça inclinada e possuía traços clássicos e cabelos avermelhados.
Desapontada com o fato de eles ignorarem sua presença, Maresca não percebeu que o motor fora ligado. De repente, o carro negro partiu a toda velocidade, obrigando-a a dar um salto atrás para não ser atropelada. Como uma bala, o desconhecido entrou pela estrada de onde saíra e sumiu, deixando uma nuvem de poeira atrás de si.
1685 Palavras
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