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Capítulo 32

Acordei com o despertador tocando e logo pensei "Hoje é segunda. Hoje tem prova. Hoje eu vou ver a Ellie. Hoje vai ser foda". Fiquei cutucando o presidiLenny até ele acordar e fui me arrumar. Abri meu guarda-roupa e fiquei encarando os uniformes. Quer saber? Tudo começou a dar errado quando eu comecei a ser quem eu não era.

Eu não vou mais deixar a camisa pra fora da calça, eu gosto dela pra dentro; não vou arregaçar as mangas, gosto delas compridas; não vou mais ficar sem gravata nem sem óculos. Demorei para achá-lo, e assim que o encontrei - na gaveta de cuecas/coisas desnecessárias/comida - eu coloquei. Ah, que alívio não ter mais que ficar colocando aquelas lentes irritantes!

Me sentei na primeira carteira, fileira do meio, durante as primeiras duas aulas. Eu não desgrudava os olhos do professor, sério. Depois, foi a vez de ir pra aula de artes. Passei no meu armário pra guardar as coisas e tinham pichado "NERD IDIOTA" nele. Não preciso de amigos. Não preciso de vida social. Quando eu estiver viajando o mundo com meu jatinho maravilhoso, eles vão se lembrar que me chamaram de "NERD IDIOTA". Eu vou rir por último.

Entrei na sala de artes e dessa vez eu fui lá pro fundo. Odeio artes. Acho uma matéria muito desnecessária na minha vida. A professora entrou como se fosse uma louca e já começou a falar e gesticular. Eu acho que ela é louca.

- Olá, meus pequenos, meus lindos, maravilhosos. Eu até poderia passar hoje uma foto de algo pra vocês reproduzirem e tal... Mas vamos fazer outra coisa? Quero que todos se conheçam, trabalhem juntos, virem amigos... E aprendam arte com isso, claro né. Então, vou dividi-los em trios, porque dá certinho a conta que eu fiz aqui na minha cabeça. Primeiro grupo: Ellie, Claire e... Théo.

Preciso dizer que todo mundo olhou pra mim? Eu enfiei um cavalete na minha frente, para me esconder. Não vai dar certo. Não vai dar certo. Ela continuou falando os grupos, que iam se juntando. Ellie e Claire se juntaram, mas eu fiquei lá no fundo. Não vou me juntar com elas. Quando a professora acabou de dizer todos, eu fui até a mesa dela.

- Me troca? Por favor?

- Não posso, Théo. Os grupos já estão decididos.

- Tenho que fazer esse trabalho?

- A menos que queira um zero redondinho, você tem sim.

- Mas professora, não posso ir com elas! Eu e a Ellie não podemos ficar no mesmo metro quadrado! Você não sabe o que aconteceu entre a gente!

- Claro que eu sei. Por isso que eu te coloquei junto com ela. - Ela ficou me encarando. - Agora vai sentar com o seu grupo e fazer o trabalho.

Peguei uma cadeira e fui arrastando até elas, fazendo o maior barulho na sala. Eu estava com uma cara emburrada de criança, eu sei, mas me deixa. A cara é minha. Sentei e as encarei.

- Oi - disse, emburrado.

- Olá, Théo - Claire disse.

- Então, Claire, acho que ficaria muito legal se fizéssemos desse jeito... - A Ellie me excluiu totalmente.

- O que é pra fazer no trabalho?

- A professora já explicou - ela me respondeu, grossa.

- Mas eu não ouvi - respondi do mesmo jeito. - Pode me explicar, Claire?

- Bom, temos que fazer uma peça de teatro, que se passa nos dias atuais. A Ellie praticamente já fez a história. Conta pra ele, Ellie.

- Pensei em fazermos sobre um casal, porque é o tema que as pessoas mais gostam. O menino e a menina estão felizes, só que aí ele trai ela, ela descobre e eles terminam, ele tenta voltar com ela, mas se ferra porque ela não quer mais - ela disse tudo rápido e terminou com um sorrisinho no rosto. A encarei com a sobrancelha levantada. - Qualquer semelhança com a realidade é mera coincidência.

- Com certeza... Não quero atuar.

- Você vai atuar.

- Eu não vou atuar. Manda a Claire ser o seu par romântico.

- Ela vai fazer a amiga falsa que fica com o namorado da menina.

- Nossa, que história emocionante - ironizei. - Tudo isso saiu da sua imaginação?

- Pois é, né?

- Então... - Claire começou. - Vamos começar a escrever?

- Ah, faz no improviso. O Théo consegue, não é Théo? Já conheceu várias histórias assim, né?

- Claro, amiga! Sempre tem aquela garota que prefere ficar inflada de orgulho do que voltar com o garoto que quis dar até um anel pra ela! Cuidado pra não inflar demais, porque vai voar, hein!

- E sempre tem aquele garoto idiota que acha que com "desculpa" e presentinho vai resolver tudo! "Ah, eu atropelei ele e ele morreu? Poxa, desculpa. Deixa eu te dar um anel aqui...".

- Então... - Claire começou, novamente. - Temos no máximo cinco minutos, portanto, a peça terá que ser rápida. Primeiro, vocês dois estão passeando, de mãos dadas, românticos... Aí depois você sai e eu entro...

- Chamando o meu "namorado" pra ir pra uma festa.

- Isso, Ellie! Legal. Aí ele diz que não, mas acabamos ficando... Aí ela volta pra ver e os encontra assim... Aí depois, pra terminar, ele vai levar flores pra ela pra pedir perdão e tal, mas ela recusa as desculpas.

- Flores, amiga? Acho melhor um anel.

- Um anel?

- Isso, um anel. Mais legal, né? Não acha um presente legal, Théo?

- Acho super legal! E é mais legal ainda quando é caro!

- Sabe quem gosta de anéis? A Stela. Ela sempre usou vários nas mãos.

Essa menina tá traiçoeira, hein? Não tô gostando desse novo lado dela.

- Acabou? Ou tem mais piadinhas, Ellie?

- Deixa eu pensar... É... Acho que acabei. Vamos começar a escrever o roteiro.

- Ok, deixa que eu escrevo - falei, pegando um lápis.

- Já escreveu quantas cartas pra Stela? - Soltei o lápis num movimento forte e másculo e decidido... Mentira, eu parecia um boiola.

- Puta que pariu. Assim não dá.

- Não dá mesmo - Claire disse. - Professora! - Ela levantou a mão. - Quero trocar de grupo.

- Tá. Escolha o que você quiser. - Encarei a professora, com a boca aberta.

- Sua... Ah! Eu queria trocar também! Deixa eu trocar! Não quero ficar perto dessa menina!

- Pois vai ficar.

- Não vou!

- Sabe o que é isso? - Ela fez um círculo com os dedos.

- Um cu.

- Não. É o zero que você vai ganhar se não começar a escrever seu roteiro agora. - Todos começaram a rir.

- A senhora não é justa!

- Quer que eu chame o diretor pra perguntar pra ele o que é justo?

- Quero! Eu quero sim! Não quero fazer trabalho com ela!

E quem é o garoto que está ensaiando a peça com a ex-namorada atrás da biblioteca? Eu!!! Palmas pra mim!!!

- Por sua causa tive que mudar o roteiro todo, seu idiota. - Ela jogou um caderno na grama.

- Por minha causa? Foi você que começou com toda aquela ridiculice sua, mandando indiretas-diretas! Coisa de criança, Ellie, pelamor!

- Eu que sou a criança agora?

- Sim! E vamos ensaiar logo porque eu tenho mais o que fazer!

- Como o que? Ir pra festas com a Stela?

- Dá pra parar? - Ela ficou quieta e eu comecei a ler o "roteiro" que ela havia escrito. - Apesar de eu não gostar da história, tá uma coisa bem escrita. Parabéns.

- Valeu. E por que não gostou da história?

- Por que acha? Acho que poderíamos fazer uma coisa alegre, não essa coisa... sei lá... decepcionante, triste, escrota...

- Se acha tudo isso, por que me traiu?

- Eu já pedi desculpa.

- Eu não quero suas desculpas, eu quero saber o porquê. Eu não sou boa o suficiente para o capitão do time? Me acha sem graça?

- Foi uma coisa do momento, sei lá. E ser capitão do time tava me transformando numa coisa ruim, então juntou tudo...

- THÉO! THÉO! - Eis que surge o demônio. - Ai, finalmente te achei. Precisamos conversar.

- Vou deixá-los a sós - Ellie disse, se levantando.

- Não. Tem a ver com você.

Stela, colega, por que você não se mata logo? Pra que continuar vivendo e acabando com a vida dos outros? Vai tomar no meio do seu cu!

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