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Capítulo 3

Depois da imensa tortura de ter que aguentar o presidiário comendo quatro cheeseburguers enormes + batata + refrigerante + sundae de sobremesa (do meu lado, quase se encostando em mim!), meus pais me deixaram no internato de novo. Junto com o presidiário, claro. Ah, é, eu esqueci de falar: eu costumo dar apelidos às pessoas. É mais fácil pra mim pra poder identificá-las depois. Mas eu normalmente dou apelidos que, sei lá, combinam com as pessoas. Tipo o presidiário. Ele parece mesmo um presidiário, então...

- Ai, cara, sua família é bem legal - o presidiário disse, me dando uns tapinhas nas costas. Qual é o problema desse povo que vive me dando tapas? Isso dói!

- É.

Ele soltou um arroto muito nojento e passou o braço pelos meus ombros.

- Vamos, carinha, vamos procurar umas garotas.

- Não, valeu, cara. É... Eu... É... Ahm... Acho que vou dar uma volta pela escola, sabe? Conhecer alguns lugares...

- Então vamos dar uma volta pela escola.

- Eu quis dizer sozinho.

- Mas nós estamos sozinhos, carinha. - Ô cara burro.

- É. Na verdade... eu queria... Tá vendo aquelas garotas ali? É, vai lá conversar com elas, porque eu tenho um pouco de vergonha. Aí depois você me apresenta.

- Pode ser, carinha. - Ele jogou a carequinha para trás, no melhor estilo "Sou irresistível, vou pegar todas essas gatas" e foi até elas.

Eu comecei a correr no mesmo instante e parei só quando estava do outro lado da escola. Encontrei o ginásio e entrei, percebendo que estava vazio e um pouco escuro. Acendi as luzes e peguei uma bola de basquete, começando a arremessá-la para a cesta. Eu acertei quase todas. Não, tô brincando, acertei todas mesmo.

- Para um nerd, até que você leva jeito - alguém disse.

Me virei, assustado, encontrando uma garota sentada na arquibancada. Ela estava com uns headphones enormes na cabeça. Começou a descer a arquibancada, dando pulinhos, e parou na minha frente.

- Como assim "Para um nerd, até que você leva jeito"? Nerds não podem jogar basquete? E se eu não for nerd? O que te levou a pensar que eu era um nerd?

- Calma, cara. Bom, o que me levou a pensar foram justamente seus óculos e essa sua blusa ridícula de Star Wars, um filme de bilhõõõões de anos atrás - ela disse, mexendo nos meus óculos. Reparei na blusa dela. Estava escrito "Luke, eu sou seu pai".

- Mas você está usando uma blusa com uma frase de Star Wars.

- Touché, meu caro amigo. Mas eu não sou fã de Star Wars. Sou fã de frases famosas.

- Por que?

- Ora, descubra, querido. Não vou te dar todas as respostas da minha vida, pelo menos não no primeiro encontro.

- Isso é um primeiro encontro?

- Bom, é a primeira vez que nos encontramos, então sim, é um primeiro encontro. Quando nos encontrarmos de novo, será nosso segundo encontro.

- Ahn?

- Essa é outra coisa que eu adoro: deixar as pessoas confusas. Tchau, nerd-que-joga-basquete, a gente se vê por aí - ela disse, pegando suas coisas e acenando pra mim.

- Menina, você é louca.

- Eu sei! - ela disse antes de sair.

Poxa, primeira vez que uma garota bonita conversa comigo sem que eu converse com ela primeiro. Bonita e confusa. Ela era muito gata mesmo. Tinha os olhos castanho-escuros, os cabelos quase pretos em cima e quase loiros nas pontas (acho que isso aí que é californiana, então o da minha irmã é uma faixa roxa nas pontas do cabelo, certo), mas o cabelo dela era muito legal, cara! Era meio que um blackpower muito maneiro! Cara, e a pele morena dela!

Voltei pro quarto pensando naquela garota. Acabei encontrando o presidiário deitado na cama.

- Fui chutado. Parece as garotas não gostam de caras que repetiram dois anos. É. E você, carinha, aonde estava? Pegando uma gatinha?

- Quase... Aliás, você tá aqui já faz um tempinho, né?... Então... Você por acaso não conhece alguma garota negra, com os cabelos enrolados e os olhos castanho-escuros?

- Conheço várias. Tem que especificar melhor, carinha. Tipo, o cabelo dela é meio tonhonhoin? Enroladão?

- É. Com as pontas loiras.

- Ela usa blusas com frases? - Assenti. - Ah. É a Stela. Essa garota é meio que... Aquele cara lá, sabe? O Tales do Milênio. É.

- Tales de Mileto? O que ela tem a ver com ele?

- Ué, o cara não é das filosofia?

- Tá, só que ele é mais pra parte matemática da coisa. Ela está mais para um William Shakespeare. Prevejo muita tragédia, muita mesmo - falei, fazendo um mini drama.

- É aquele cara do Romeu e Julieta, né? Tô sabendo. Olha, uma das gatinhas ficou amarradona em você, carinha. É uma loira gostosona, com uns peitos enormes. "Ai, quem era aquele geek-gatinho que estava com você? Como é o nome dele? Em que sala ele tá? É seu colega de quarto? Qual é o quarto dele? Qual é o RG da vó dele?". E pra mim, pro gostosão aqui, elas nem olharam! O que você tem que eu não tenho, carinha? - O encarei.

- Cérebro.

Mentira, né, gente, eu não disse isso pro coitado. O que eu disse foi isso:

- Beleza.

- Tu tá falando que eu sou feio? - Era melhor eu ter dito a primeira coisa.

- Não, não, é claro que não. Eu só tô dizendo que... O que eu quero dizer é que... Olha! A pia está boa! Meu pai me disse que os banheiros daqui eram uma merda.

Aí eu o prendi numa conversa interessante sobre privadas entupidas e ele não lembrou mais do assunto de ser feio. Ótimo. O que eu menos quero aqui é irritar o presidiário, principalmente porque o cara dorme no mesmo quarto que eu, né?

Dormi pensando no apelido que eu daria para Stela. Poxa, eu tenho a incrível habilidade de olhar pra pessoa e já pensar em um apelidinho pra ela, mas com a Stela foi diferente. Sei lá, ela meio que coisou o meu cérebro.

***

- Hey, carinha, cara, cara, levanta, cara. Carinha, levanta. Cara, cara, cara... - O presidiário me cutucava, repetindo "cara" umas mil vezes.

- Que é?

- Cara, levanta. Daqui a pouco é o coisinho lá do primeiro dia de aula e tals.

- Ah, lá no ginásio?

- É. Pra falar dos professores, e de quanto a escola preza pelos alunos, e apresentar as moças da cozinha, e falar das novidades, e essas coisas aí.

- Eu tenho que ir?

- Tem, carinha. Vai logo, talvez a gente encontre a Stela lá.

- Mas eu não quero encontrar a Stela.

- Como não? Você passou a noite inteira repetindo "Stela, Stela, você é mais bonita do que a Cinderela. Ó Stela, de todas és a mais bela. Minha querida Stela, você acende meu fogo no rabo com uma vela."

- Isso é mentira! Porque eu não sei rimar! E cara: "Você acende meu fogo no rabo com uma vela"? O que que é isso, mermão?

- Pessoas desesperadas fazem coisas desesperadas.

- Não sou desesperado.

- É sim, carinha. Admita, todos nós somos.

Eu me troquei e fui com o presidiário até o ginásio. Ele cumprimentou alguns caras, que eu acho que esperavam meu cumprimento também. E eu lá, super sexy, fazendo a linha: "não quero te cumprimentar e eu sei que você também não quer me cumprimentar então vamos cada um seguir o seu caminho". Fim. É a vida. Não sou obrigado a cumprimentar ninguém. Se minha mãe me visse falando isso, eu apanhava.

Nos sentamos na arquibancada. Olhei para o lado e quem estava ali?... Não, não era a Stela. Era uma garota que não parava de balançar os pés e procurar alguém.

- Moço - ela me chamou e eu a encarei. Minha jovem, nós somos da mesma geração, minha jovem. Não precisa me chamar de moço, minha jovem. - Você viu a minha amiga?

Porque eu tô muito sabendo quem é a amiga dela, claro, com certeza. Não sei nem quem sou eu direito, vou saber quem é a amiga dela?

- Não.

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