*** Ariel ***

Que maravilha! Meu inteligentíssimo marido, Zack, resolve marcar o tal jantar a respeito de Ekena e Anthony no mesmo dia do meu ultra-som. Pois é, esse jantar estava marcado pra uns trinta anos atrás, mas o Owen sempre desmarcava. E pra melhorar: o cara da TV a cabo veio pra instalá-la no porão. É sensacional isso. E a Ekena ainda tem dentista! Aí vocês me perguntam: "Mas a Ekena não está tendo aula?". Tá nada! Foi suspensa de novo! Ela e o Anthony! Preciso conversar com ela sobre como sair da escola sem que o tiozinho veja, porque pelamor, né?

Eu não sei se eu vou pro ultra-som, se eu fico aqui vendo o moço, ou se eu penso no que vou fazer de jantar. Meu marido é um homem sensacional! E o bonito não chegou do trabalho ainda!

- Está tudo bem, senhora Martin?

- Oh, sim, é... Como o senhor se chama mesmo?

- Leonard.

- Ah, que legal. Meu filho tem um amigo que chama Leonard, mas todos o chamam de Lenny. Ai, me desculpa, viu? É que quando eu fico estressada ou nervosa, eu começo a falar sem parar. E eu estou as duas coisas!

- Por que? Desculpa a intromissão, mas... Aconteceu algo?

- Eu tenho que ir fazer um ultra-som daqui a uma hora, minha filha tem dentista, não posso te trancar aqui sozinho, e ainda tem um jantar que eu tenho que fazer. Ai, meu Deus, eu tenho que ligar pra Lucy!

Subi correndo e liguei pro celular dela. A vagabunda demorou um século pra atender.

- Ariel? Amiga?

- Oi, Lucy. É... hoje o Zack quer chamar o Owen e o Anthony pra falar a respeito do relacionamento entre nossos filhos, e... eu queria que você viesse, pois o Anthony é seu filho também. Mas sem as meninas, nem o Devonne... e sem o Tom e Jerry também.

- Ariel, o Thomas não gosta de ser chamado de "Tom e Jerry". Ou é só Tom, ou é Thomas mesmo.

- Ok. Você vem?

- Não sei não, amiga. É que o Devonne está dormindo cedo e ele tem uns problemas de reflux...

- O Tom e Jerry é pai dele, tem que saber cuidar da criança. Lucy, amiga, eu sei que seu sonho é ter seis filhos. Mas você não dá conta nem de quatro! Você cuida do Devonne, ok. Você cuida das meninas... às vezes... ok. Mas e o Anthony? Você tem que amar todos igualmente, mas não está fazendo isso. O Anthony sente sua falta. Como acha que é, quando o Owen aparece com uma mulher nova a cada noite? Eles dois estão sofrendo, amiga. O Anthony não tem uma mãe presente, e, em consequência disso, está se afundando cada vez mais. E o Owen percebe isso. Se isso continuar, não vai demorar muito pra você encontrar seu filho jogado na rua, roubando pra comprar droga.

Nós duas nos emocionamos. Eu amo o Anthony. Demais. Ele é meu afilhado! E também amo a Lucy. E sei lá, esses hormônios loucos das grávidas... É a vida.

- ARIEL! AMOR, CHEGUEEEEEEI. VAMOS, VAMOS, EKENAAAAAA... DESCE LOGO. TEMOS QUE IR AGORA, DEIXAR A EKENA NO DENTISTA, TE LEVAR PRO MÉDICO, DEPOIS VOLTAR E BUSCAR A EKENA E AINDA PASSAR NO SUPERMERCADO PRA COMPRAR COMIDA EEEEE IR NA CASA DO MEU PAI PRA PEGAR VINHO... NÃO, ESSA PARTE NÃO PORQUE VOCÊ ESTÁ GRÁVIDA... EKENA DESCE LOGO.

- É o Zack? - Lucy perguntou, com aquela voz de "Seu marido é problemático".

- É.

- ARIEL, DESLIGA ESSE TELEFONE! NÃO TEMOS TEMPO PARA ISSO!

- VAI CONTINUAR GRITANDO COMIGO? EU ESTOU CONVERSANDO SERIAMENTE COM A MINHA AMIGA, VOCÊ VAI CONTINUAR GRITANDO COMIGO?

- Não, amor, desculpa, é que nós precisamos ir agora.

- Lucy? Aí, Zack, ela desligou! Vai gritar com os vizinhos, comigo não!

A Ekena desceu, com seu mini shorts e sua maxi blusa.

- Vocês precisam fazer esse escândalo todo? Meu Deus, parecem dois loucos!

- Mocinha, o que eu já disse a respeito desses shorts minúsculos?

- Não disse nada, pai.

- Bom, estou dizendo agora: não é pra você usar. Eu não gosto que minha filha saia...

- Zack - o chamei.

- ... Desse jeito. Você é menina-moça, e sabe o que os garotos veem em meninas-moç...

- Zack!

- O que foi?

- Eu vou me atrasar para o ultra-som.

- Ah, é! Verdade, verdade.

Nós fomos para o carro e Zack foi dirigindo. Percebi que a Ekena estava muito calada, então liguei o rádio. Música sempre a anima... mas dessa vez não deu certo.

- Filha, o que foi?

- Nada.

- Depois do seu dentista, nós podemos ir no shopping. Que tal?

- Não tô afim.

- Nós podemos ir no cabeleireiro então. Você pode repintar seu cabelo.

- Não, valeu.

- Tudo bem. - Zack parou na frente do dentista. - Quando acabar, você espera aqui, ok? Nós viremos te buscar. Tchau. - Ele seguiu para a clínica. - Será que a bebê está bem?

- Zack! A Ekena está com problemas e você solta um "tchau" super grosso! Que tipo de pai você é?

- Ela não está com problema não. Por que uma garota de 15 anos estaria com problemas?

- Por que não estaria? Todos temos. Os dela são diferentes dos nossos, mas não deixam de ser problemas. E nós precisamos conversar agora sobre esse jantar. Você não vai mandar indiretas para o Owen, como sempre faz.

- Não sei do que está falando.

- Você vai conversar civilizadamente com todos. E aceitará o relacionamento de nossa filha com o Anthony.

- É, não é bem assim. Nós vamos conversar, ver os prós e contras dessa relação...

- Meu amor, isso não é uma negociação. Isso é um namoro! Ela vai namorar o Anthony sim, porque eu estou permitindo! Esse assunto acaba aqui. Chega.

Nós ficamos em silêncio até chegarmos. Eu fui até a recepcionista e logo o doutor Ramirez veio me atender. Adoro esse velho. É educado, é legal, é bonito - apesar de já ter mais de cinquenta anos... Aí foi aquela coisa legal de deitar, levantar a blusa, passar aquele gel gelado...

- A bebê está bem, doutor?

- Calma, senhor Martin. Eita, nós não vimos isso no outro ultra-som... Ué, mas... Ahn?... Bom, pelo o que parece... serão pais de gêmeos. E vocês já sabiam que uma era menina... São duas meninas. Eeeee, papai! Vai ter que cuidar direitinho, hein?

- Ah...gê-gêmeas... Ah, sim. - Zack se sentou na cadeira. - Ah. Meu Deus. Serão duas. Ah, tá. - Ele desmaiou.

- Devo me preocupar? - o doutor perguntou.

- Não. Daqui a pouco ele acorda. Mas como é possível? O senhor só tinha visto um bebê antes... E era uma menina!

- Sim, é, parece que me enganei. Mil desculpas, senhora Martin. Mas, ah, você ficou feliz do mesmo jeito, não é? E como estão Théo e Ekena? Me lembro dos partos como se fosse ontem. Zack desmaiou nos dois, não é?

- É. É uma coisa dele. Desmaia quando é muita emoção. Aliás, preciso buscar a Ekena no dentista. Zack, amor. Zack. Zack! - Comecei a dar tapinhas em seu rosto.

Ele demorou um pouco pra acordar e, quando acordou, deu uma surtada básica.

- Nossa, eu tive um sonho louco que gente teria gêmeos e...

- A gente vai ter gêmeos.

- Ah, tá. Já dá pra saber o sexo dos bebês?

- Já disse que são duas meninas, senhor Martin - o doutor respondeu.

Nós nos despedimos do doutor e fomos até o dentista, buscar a Ekena. Depois, fomos no supermercado. Nossa filha, super unida com a família, pegou uma cestinha e saiu andando. Eu e Zack ficamos olhamos tudo e eu ainda não sabia o que iria fazer.

- Amoooor, sabe o que eu estou com vontade? - Ele começou a fazer carinho no meu cabelo.

- O que?

- Rolinho primavera.

- Só faço se você fizer a "super sensacional torta de maçã do Zack Lindão".

- Não se chama assim. É a "super mega ultra sensacional torta de maçã do cozinheiro mais sexy que você já viu na sua vida".

- Eu estou grávida. Eu acho... só acho... que você poderia fazer o rolinho primavera também, né? Porque andar pra lá e pra cá cansa bastante, sabe?

- Nossa cozinha é um cubículo. Você dá dois passos e já dá de cara na parede.

- É, mas cansa muito.