Capítulo 7 - Fuja e sobreviva.
O quarto era mais simples do que Daniel podia imaginar. Apenas duas camas, uma do lado da outra, uma mesa com um abajur e um banheiro, tão pequeno quanto o cômodo.
Daniel se deitou na primeira cama, deixando a sua mochila do lado. Sua tia, Adelaide, se deitou na outra cama, que rangeu com o peso da mulher, mas que não se incomodou muito, confiava nos materiais usados pelas ninfas.
A mulher desligou o abajur e logo estava roncando como um motor de trator. Daniel, por outro lado, olhava o teto e o ventilador que nele girava. A luz da lua, que entrava pela janela, dava a ele, ainda, um pouco de luminosidade para os olhos. Não conseguia dormir, a cena da sua mãe sendo rasgada ao meio e depois sumindo misteriosamente, misturada com o sorriso macabro do monstro, não saiam da sua mente e faziam questão de aparecer sempre que o garoto tentava fechar os olhos.
Seus olhos se fecharam, mais uma vez, e a luz do luar foi ficando cada vez mais escassa. Daniel havia pegado no sono.
Estava, mais uma vez, na estrada onde tudo havia começado. Sua mãe deitada, desacorda. E ele, sem poder fazer nada, preso dentro do carro, com sua tia falando coisas e mais coisas que ele não compreendia.
Daniel olhou para o lado e viu sua cópia, aquela que não havia conseguido ajudar Caeme, tentando, de todos os modos, sair do carro. Ele foi empurrado com toda força para fora do carro e viu, do lado de fora a cena. Daniel cópia tentando sair do carro e Adelaide prendendo-o.
Foi até o corpo de Caeme, que estava sendo protegido. O monstro estava sentado no asfalto. Um sorriso tão assustador quanto o garoto lembrava. Ainda estava com o machado enferrujado em sua mão.
A mulher agarrou a sua mão. Daniel não se lembrava dessa cena.
"Sobreviva, querido. Sobreviva!"
E, ainda ajoelhado, ele viu a mulher sendo erguida pela cabeça e cortada ao meio, dessa vez tudo mais perto. Apenas as suas roupas sobraram no lugar. Seus olhos marejaram e a sensação foi duas vezes pior do que havia sido no momento. O corpo da sua mãe havia sumido, novamente, na sua frente.
Acordou assustado. A luz do luar havia ficado forte novamente. Estava completamente suado, o ventilador de teto havia parado. Adelaide não parecia estar incomodada, estava coberta, da cabeça aos pés e ainda roncava como uma britadeira.
Daniel foi para o banheiro. Tinha apenas uma pia, com uma torneira, um vaso sanitário amarelado e um chuveiro remendado. Cheirava a banheiro de posto de gasolina após um longo dia sem lavar. O garoto abriu a torneira, primeiro nada saiu além de ar, mas logo a água jorrou tão forte que ele sentiu que a sua tia acordaria com o barulho, mas nada aconteceu. Lavou o seu rosto e voltou para a cama.
Pegou sua mochila e tirou o livro de dentro da mochila. Aquele livro verde era o motivo de tanto problema nas últimas trinta e seis horas. As letras brilhavam mesmo com a pouca luz do luar. Daniel abriu, mais uma vez releu o aviso sobre o anão de jardim e ignorou.
Passou mais algumas páginas e encontrou uma foto do seu pai. Com a pouca luz ele podia ver apenas que o livro estava na mão do homem e ele estava ao lado de Caeme, sorrindo ainda. O menino passou a mão por cima do corpo da mãe na foto. Agora ele realmente sentia falta dela.
"Você ainda não conseguirá entender ou ler o que está escrito aí.", disse Adelaide, com a voz ainda pesada.
"Ah, eu só estava olhando a foto deles. Pareciam ser bem felizes juntos."
"Realmente eram. Essa foto foi quando seu pai acabou de escrever o livro. Ele estava bastante feliz, e sua mãe estava feliz com a conquista dele."
"O que aconteceu com ele? O que realmente aconteceu?"
"Quando terminou o livro, os monstros consideraram um grande feito e deram a ele o poder de controlar todos os monstros vivos. Naquele momento não era algo ruim. Monstros e humanos, finalmente, lado a lado. Mas nem todos quiseram fazer parte disso, tinham medo de que agora os monstros tivessem mais direitos que eles.", disse ela, se sentando na cama e ligando o abajur.
"E foi aí que tudo começou?"
"Sim, seu pai me deu o livro para que eu escondesse. E, ao não dar a localização, ele foi morto na frente de todos."
"Igual a minha mãe?"
"Sim, igual a sua mãe. Eu escondi o livro por todo esse tempo e por todo esse tempo nós estávamos seguros. Mas você conseguiu retirar o selo. O selo mágico que seu pai colocou, apenas você conseguiu retirar, e eles nos localizaram. Alguns monstros estão cegos com falsas promessas de que estarão a salvos se o livro estiver na mão do Alto Inquisidor, mas é mentira. É tudo mentira...", a mulher foi interrompida por batidas na porta.
"Vocês precisam acordar. Acordem.", disse uma voz baixa, quase sussurrando.
Daniel levantou da cama e colocou a orelha grudada na porta, ainda segurava o livro.
"Flâmia?"
"Sim, sou eu. Eles estão aqui. Peguem tudo e saiam, agora."
Daniel olhou para a sua tia. A mulher já estava se preparando para bater em retirada. O garoto queria descobrir como ela era tão rápida em tudo que fazia.
Ele olhou diretamente para o colar, que ainda estava pendurada no braço da mulher como uma pulseira, mas o pingente não estava tão forte como ele esperava.
"O pingente não está brilhando."
"O nosso problema é como nós, querido. Está pronto?"
Daniel balançou a cabeça. Talvez os problemas não fossem tão assustadores quanto o gigante com um machado na mão, mas ele não queria estar lá para descobrir qual o rosto deles. Agarrou a sua mochila e enfiou o livro dentro.
Adelaide chamou o menino para dentro do banheiro. Ele estava tentando entender como é que aquele minúsculo local caberia os dois e ninguém os encontraria, mas seguiu as ordens da tia.
Ao chegar, Daniel notou que o vaso sanitário não estava mais no lugar e que o banheiro parecia um pouco maior do que ele se lembrava. No lugar do vaso, havia apenas um buraco e uma escada, que dava direto atrás do primeiro andar da pousada.
"Rota de fuga dos monstros. Talvez um pouco nojento, mas vai nos livrar deles."
O garoto não se importou muito com a origem da saída. Desceu, degrau por degrau, olhando sempre para baixo com medo de cair ou derrubar o livro que seu pai havia deixado para ele e que agora era importante que ele protegesse.
Flâmia já o esperava na parte de baixo com o carro que ele e a tia havia deixado no estacionamento. Ela estava no volante. Daniel não confiava muito na direção de uma ninfa, mas entrou e se sentou no banco do passageiro.
"Ela já está vindo. Vamos esperar."
A garota já havia ligado o carro, estava preparada para sair dali, mesmo que se faltasse alguém.
"Eles estão aqui!", eles ouviram uma voz feminina.
"Vamos, tia. Vamos.", disse o garoto, mentalmente.
Olhava na esperança de ver a tia descer, com o corpo gorducho, pela escada a qual ele havia descido. Mas nada aconteceu. O buraco havia sido fechado.
Flâmia olhava, atenta, pelo retrovisor. Esperando o máximo possível para que um daqueles caçadores não conseguisse chegar até o carro.
"Não podemos esperar mais, temos que ir.", disse ela.
A garota acelerou o carro com vontade. O corpo de Daniel foi jogado contra o carro.
O caçador que estava mais próximo ao carro era uma mulher. Nenhum dos dois conseguiu enxergar de fato o rosto, mas sabia que era a dona da voz que denunciou a sua localização para os demais. Ela, agora, estava apoiando as mãos no joelho e tossia enquanto a nuvem de poeira cobria o seu corpo.
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