CAPÍTULO XXIII
Melina soube que Nicolao estava aprontando alguma quando ele foi o primeiro a pular do iate, em direção à casa de Agnes. Sem esperar que a embarcação o levasse até lá, pulou na água e desapareceu, alegando que já estava atrasado sabe-se lá para que. Assim que chegaram à casa da ruiva para buscá-la e deixar quem não iria com eles, seu pai logo tratou de conduzir Hektor para dentro.
Mas não teve tempo de especular nenhuma teoria sobre, pois logo se viu ocupada novamente. Seguiram basicamente o mesmo roteiro, visitando o templo de Hera e prestando culto. Indo até santuários de deuses menos relevantes como o das festas matrimoniais, Himeneo. A deusa do parto, Ilícia. A deusa da harmonia, Harmonia. E afins. Despenderam muito mais tempo se encontrando com a elite da cidade. Pessoas podres de ricas sobre as quais Calisto orientou que mantivesse uma boa relação e os dois olhos bem abertos.
Os nobres ali eram muito mais tranquilos do que em Iliakós. Pessoas contidas e absurdamente bem educadas, chegando a soar falsas, que prezavam pela família, como gostavam de dizer. Melina achou alguns um tanto soberbos. Imaginou que deveria ser pela patrona ser a rainha dos céus e do Olimpo. Melina se surpreendeu com o quanto Agnes podia se mostrar firme. Percebeu que a maioria ali não a respeitava tanto. Era a primeira mulher em séculos a assumir o comando da ilha e alguns não pareciam lidar muito bem com isso. Mas ela não abaixava a cabeça para absolutamente ninguém.
Percebeu que sua mãe começava a agir de modo estranho após algumas conversas particulares que alguns exigiam ter, mas achou melhor não perturbar ainda mais a sua paz. O ambiente ali não era tão acolhedor quanto o anterior.
Sentiu-se mais à vontade com o povão, continuando sua pseudo campanha política. Felizmente, o general dali era o próprio Augustus. Apesar do visível nepotismo, agradeceu a qualquer deus que estivesse escutando por não ter que se encontrar com mais ninguém importante pelo resto do dia. Seus pés imploravam por serem postos para cima e ansiava por um bom banho.
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O sol começava a se pôr quando voltaram à mansão. Todos pareciam aliviados por finalmente poderem descansar.
Mas Nicolao não parecia querer descanso.
Joe quase não pode acreditar quando ele conduziu todos ao salão de banquetes da casa e lá havia grandes espetos de carne sobre a mesa, juntamente com barris de cerveja, grandes porções de farofa, arroz e vinagrete que ele mesmo havia feito junto com Hektor e duas enormes caixas de som que o rapaz imediatamente reconheceu. Aquele velho havia as pego emprestado, sem permissão, de sua mansão. E, claro, muito pão de alho.
Thálles já estava levemente alcoolizado quando eles chegaram e Ikaro ainda estava olhando admirado para os espetinhos de coração de galinha. Questionando a si mesmo quantas haviam morrido para tal. Eis o porquê: não criavam animais em Anamar. De nenhuma espécie. Bichos, no geral, não gostavam muito de sua espécie e não havia espaço para a criação. A dieta era basicamente composta de frutos do mar e frutos da terra que produziam ali mesmo. Carne era um luxo importado que poucos podiam bancar. Mas, Nicolao argumentou que aquela era uma ocasião especial. Queria celebrar a família, finalmente, reunida apenas entre eles. Sem formalidades.
Os pais de Agnes pareciam levemente aterrorizados enquanto uma voz masculina cantava ao fundo "Ela pediu comida, o motoboy também comeu..." Mas, Joe adorou.
Melina, imediatamente, pareceu renovada. Atacou o primeiro pedaço de carne que viu e logo lançou mão de um copo de cerveja. Cumprimentaram os assustados sogros de Augustus, mas Agnes logo lhes explicou que ela e seu marido haviam cedido a casa para a surpresa e estavam cientes de tudo aquilo. Disse também que era justamente para essa ocasião que ela havia os convidado.
Quando todos começaram a ficar curiosos sobre o porquê do casal ter os convidado, Agnes pediu que todos se assentassem para fazer um comunicado. Deu as mão ao marido, quase explodindo de alegria e dando saltinhos automáticos de felicidade.
— Estamos grávidos! — gritou a ruiva.
Os momentos que se seguiram podem ser descritos, simplesmente, como: coisa de adulto. Os avós maternos do bebezinho que estava sendo gerado choraram de alegria, abraçando o genro que também não continha as lágrimas. Nicolao agarrou Agnes pela cintura e a jogou sobre seu ombro direito em comemoração. Foram informados de que a gestação já era de quatro meses, mas o casal estava alegre por terem esperado para contar. Felizmente, Nicolao pôde estar ali para receber a notícia junto de todos os outros. Ele também poderia acompanhar os seis meses restantes. Cibele e Agatha iniciaram uma conversa de comadres com a grávida, perguntando se ela já havia pedido a benção de Ilícia, a deusa do parto, para o grande momento.
Joe percebeu que Melina pareceu especialmente perturbada quando as mulheres entraram no assunto. A garota se aproximou dele, colando seus braços e ficando na ponta dos pés para cochichar ao seu ouvido.
— Os bebês já nascem com cauda? — inquiriu a princesa.
— Uhum. Os partos são feitos dentro d'água. — respondeu no mesmo tom que ela havia usado. Olhou para ela e viu que seus olhos estavam ainda mais arregalados. — Já viu parto de baleia? É tipo aquilo.
— Parece horrível!
— É meu sonho ver! Pena que não consigo ir mil metros dentro d'água.
Os demais do recinto discutiam qual seria o sexo do bebê e faziam suas apostas até que Agatha perguntou:
— Com quem vocês acham que o bebê vai se parecer?
— Com minha filha, é claro — Virginia, a mãe de Agnes, respondeu. — Nossa família estampa as mesmas cores há séculos. É preciso uma genética muito forte para superar.
— Também tô achando — pronunciou-se Nicolao. — Nosso lado da família é uma bagunça. Nereu era completamente diferente de mim.
Qualquer um que não soubesse como aquela sociedade funcionava diria que eles estavam falando sobre o rosto da criança e estranharia a fala de Nicolao. Mas o assunto em questão eram as caudas.
A família de Melina era um show de variações. Porém, as escamas como de carpas, combinando com os cabelos vermelho fogo, eram marca registrada da família de Agnes.
— Ficarei alegre se esse bebê se parecer com você — disse Augustus. — Você é a coisa mais bela que eu já vi em toda a minha existência.
A gestante se derreteu em amor, depositando uma série de selinhos nos lábios do marido. Joe nunca deixava de se surpreender quando via o imponente tritão perder toda a pose de machão quando estava ao lado da delicada esposa.
— Não me importo com isso — ela respondeu. — A única coisa que me preocupa é o parto.
— Não precisa perder o sono — confortou-a Cibele. — Não é tão terrível quanto parece. Se quiser, posso te acompanhar no dia.
— Faria isso? — perguntou a mãe de primeira viagem, incrédula.
— Majestade, seria uma honra imensa — Ion, o mais novo avô, começou a dizer —, mas não precisa se ocupar conosco.
— Não é nenhum problema! Fique tranquilo, faço isso de bom grado — respondeu a rainha. — Agatha e meu irmão estavam comigo no parto de Melina. Fez toda a diferença ter rostos amados comigo.
Partos eram, realmente, um empreendimento. Joe compreendia o senhor Ion. Não era como se descessem ao fundo do mar na primeira contração e logo retornassem com a criança no colo. Especialmente nessas ocasiões, passando dias embaixo d'água. Iam dias antes e ficavam lá à espera da criança. Mesmo depois do nascimento, precisavam acostumar a criança à pressão da água, garantir que suas guelras funcionavam bem e que estava tudo certo com seu nado. Levavam alguns dias para levar a criança à superfície com cuidado. Todo o processo poderia levar semanas. Era uma proposta generosa da parte de Cibele.
— Não consigo te imaginar num parto — falou Melina, se dirigindo ao tio.
— Também não me imaginava — ele lhe respondeu. — Mas quis assegurar pessoalmente que corresse tudo bem.
— Felizmente, foi um parto tranquilo — completou Agatha.
— Foi o dia mais feliz da minha vida — narrou Cibele. — Quando eu vi você pela primeira vez, com os olhinhos e a cauda brilhantes dentro da escuridão.
A rainha pôs alguns fios de cabelo desalinhados da filha para trás da orelha. Joe já havia convivido com ela por tempo o suficiente para saber que aquele gesto era uma maneira inconsciente de demonstrar afeto. Além disso, acrescentou um beijo na testa da filha.
Mas Melina deu um sorriso amarelo. Era nítido que ela não sabia muito bem com pessoas carinhosas.
— Por Hera, eu havia esquecido desse detalhe — Agnes tornou a dizer. — O parto é no escuro!
Não era como se aquilo fosse um grande problema. Seus olhos eram adaptados para enxergar embaixo d'água, mesmo onde a luz do sol não alcança. Mas a mulher parecia apavorada.
— Não existe o risco do bebê fugir? Sair nadando e perdermos ele de vista? — Agnes perguntou, quase que desesperada.
As únicas mães presentes ali, Virginia e Cibele, a consolavam, explicando como seria o processo e todos os preparativos necessários para o grande dia.
Melina parecia completamente alheia ao que falavam. Entrelaçou os dedos da mão com os dele, apertando-a com força demais. Joe não sabia dizer se ela estava consciente do que fazia, mas retribuiu o gesto, acariciando levemente sua pele com seu dedão. Recebeu um olhar de soslaio de Calisto para as suas mãos dadas, mas ele nada disse.
Porém, ela pareceu despertar de ser torpor quando a playlist de Nicolao mudou para Exaltasamba.
Mesmo os que não conheciam a banda foram contagiados pelo humor e as risadas e tentativas de dança tomaram conta do ambiente.
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Assim que notou que todos estavam ocupados comendo, dançando ou conversando, Joe aproveitou para se aproximar de Nicolao, que estava com Hektor na churrasqueira.
Quando o cozinheiro reparou que ele queria conversar a sós, tratou de se retirar, inventando qualquer desculpa sobre precisar de mais álcool.
— Então, desculpa ser direto — Joe começou a dizer para Nicolao —, mas posso te fazer uma pergunta estranha?
O homem o olhou de maneira desconfiada, bebendo um gole da sua cerveja enquanto virava um pedaço de picanha.
— Pode perguntar, só não garanto que vou saber responder.
— A Melina é virgem?
Nicolao engasgou com a bebida, sendo necessário que o garoto desse tapas em suas costas para que ele ficasse bem. Após isso, o olhava como se quisesse o matar.
— Por que tá me perguntando um trem desses? Tá querendo o que com a minha filha?
— Eu? Nada!
— E que diacho de pergunta é essa? Tá ficando doido?
— Não posso dizer pra que que é. Mas, relaxa! Não é isso que tu tá pensando.
O homem ainda o olhava estranho, mas parou para pensar numa reposta.
— Não sei. Ela já teve uns dois namoradinhos, coitados. Levou eles lá em casa.
— Quantos anos ela tinha?
— Uns quinze, dezesseis.
— Mas você acha que ela não é mais?
— Eu não sei! Por que você não pergunta pra ela?!
— Porque seria estranho. Eu hein!
— E perguntar pra mim não é estranho, não?
— Tu é o pai dela, deve ter alguma noção. Acha que ela te contaria?
Joe virou novamente a carne na churrasqueira. Nicolao estava tão desconcertado que nem mesmo estava prestando atenção nas brasas.
— Acho que não — disse, por fim. — Mas acho que é. Ela não toma anticoncepcional.
— Não que fosse adiantar alguma coisa...
Remédios humanos teriam apenas um efeito placebo. E, quando se tratava de anticoncepcionais, nem mesmo isso. Seu útero funcionava de uma maneira muito diferente. Logo que ela voltasse completamente ao normal, também pararia de menstruar.
— Mas acho que ela não seria tão irresponsável — falou o pai da menina.
— Ela pode militar contra anticoncepcionais e tu não sabe — argumentou. — Aquilo faz mal pra caramba.
— Não sei... — disse, pensativo, bebendo mais um gole de sua cerveja e cruzando os bravos sobre o peito. — Eu apostaria que ela é virgem, sim. De uns anos pra cá ela fala que não tem tempo pra homem.
— Mas não tem certeza?
— Não sei. Só perguntando pra ela.
Joe viu Melina avançar na direção deles, então concordou com a cabeça e disse:
— Vou dar meu jeito. Obrigado pela contribuição.
— Do que vocês tavam falando? — perguntou a princesa.
— Nada! — Nicolao esbravejou e voltou a prestar atenção na carne.
Melina lançou sobre o pai um olhar desconfiado, mas não falou nada. Agarrou a mão do rapaz e começou a conduzi-lo para fora do salão.
— Eu vou querer saber pra onde a senhorita tá me levando? — perguntou, fincando os pés no chão para pará-la.
— Vamos achar a Anastasia. — Voltou a tentar arrastá-lo pelos corredores. — Quero ensinar ela a dançar pagode.
— Espera, doida!
— Que foi?
— Dá isso aqui. — Afastou com os dedos a lateral da bota. — Posso?
Melina assentiu com a cabeça, permitindo que ele tocasse em sua coxa direita e retirasse de lá o revólver. O escondendo no cós da calça.
— Pra garantir que tu não mate ninguém hoje a noite.
Gargalhou. — Bem capaz.
Voltou a guiá-lo, não parecia saber direito para onde estavam indo, mas não foi difícil achar a menina, que já havia feito amizade com metade dos funcionários da casa. Difícil foi convencê-la de que era bem vinda ao churrasco.
Joe nunca havia estado na casa de Agnes, mas, voltando para o salão, percebeu que a casa parecia seguir o mesmo padrão que a sua. Exceto, que aquela ali parecia ser um ambiente muito mais familiar e aconchegante que a dele. Desde de que Melina foi levada ao Brasil e ele voltou a morar com seu pai, nunca passou mais de uma semana em Anamar. Voltava para as reuniões trimestrais, visitava algumas pessoas e lugares por quem tinha mais apreço e só. Não despendia seu tempo se preocupando com a decoração de uma casa na qual nem mesmo morava. Tudo que fez foi criar o estúdio, remover alguns quadros de família e acrescentar objetos aleatórios que comprava de vez em quando, como a estátua de Asclépio que tinha em seu hall.
Mas aquela casa ali era, definitivamente, de Agnes e Augustus. Pinturas de paisagens, almofadas coloridas, sofás aconchegantes, vasos de porcelana em todos os cantos, quadros com pavões desenhados e estátuas da rainha do Olimpo e mais retratos de família do que Joe poderia contar. Tudo ali beirava a extravagância, mas de um bom jeito. Os empregados eram todos simpáticos e tudo parecia um eterno e caloroso café da tarde. Agnes era filha única, mas já havia deixado avisado que planejava encher aquele lugar de filhos. Joe estava feliz pela criança que nasceria. Ela teria um lar. Ele não teve.
Pelo menos, não onde deveria ter.
Por isso, quando voltaram ao cheiro de carne de porco, sentiu-se em casa. Amava seu pai e seu avô paterno, mas seu coração lhe dizia que sua família era aquela ali.
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Toda a timidez de Anastasia foi embora após três copos de cerveja. Melina acabou descobrindo que a idade mínima para beber naquele país era dezesseis anos, então sua consciência ficou tranquila por embebedar uma menor de idade.
Thálles havia se juntado a elas enquanto a princesa ministrava uma aula sobre como dançar samba. Decidiu que, entre os três irmãos, aquele era seu preferido. Augustus já se comportava como um senhor de idade e Ikaro ainda parecia ser um tanto intragável. O antigo caçula estava junto de seu pai, Calisto e Hektor na churrasqueira, mantendo uma distância segura das brasas. Nicolao e o cozinheiro já estavam acostumados às chamas e o príncipe não parecia ter medo nenhum do fogo que subia. Já que seu pai não sabia falar baixo, Melina sabia que estavam em uma conversa muito séria sobre como deveria ser o corte apropriado da carne.
Afastou-se de seus dois novos amigos quando já estava cansada o suficiente para necessitar de uma pausa. Saiu do salão para procurar um banheiro e o encontrou após algumas viradas de corredores. Quando ligou a torneira do toalete, lembrou-se do que Joe havia dito sobre os partos. Não conseguia se forçar a lembrar de presenciar um. Concluiu que nunca havia visto. Porém, a ideia de sua mãe dentro d'água, com Calisto e Agatha ao lado dela, levemente temerosos acerca do que sairia daquela barriga, a causava arrepios. Sempre lamentou não ter nenhuma fotografia de si mesma quando bebê. Mas agradeceu mentalmente por isso. Não queria se imaginar como um bebê-peixe.
A imagem que tinha em mente não parecia nada fofa. Assemelhava-se mais a um pequeno monstrinho marinho.
Nem mesmo se lembrava de como era a própria cauda. E não sabia dizer o porquê.
Mas Joe tinha razão. Não fazia o menor sentido a cauda dela ainda não ter dado o ar da graça, mas não conseguia se obrigar a fazê-la aparecer. Aquilo estava fora de seu controle.
Pôs as mãos debaixo da água, interrompendo seu choque direto contra o mármore da pia. Juntou um punhado e o jogou sobre o rosto. Lavou a pele suada sem que nada extraordinário acontecesse e a secou.
Abriu a porta do banheiro apenas para se deparar com Ikaro parado à sua frente.
— Hã... Quer usar o banheiro? Já tô saindo.
— Não, não. Eu... queria conversar com você.
— E tem que ser à sós?
— De preferência.
— Posso sair do banheiro pelo menos?
— O quê? Ah, claro!
Deu passagem para ela. Parecia inofensivo, mas alguma coisa dentro de Melina lamentava não estar com o revólver. Sentia-se culpada por pensar nisso. Ele era filho de seu pai, afinal de contas. Mas sua intuição não tendia a falhar.
— Eu queria pedir perdão.
— Perdão pelo que? — perguntou, mantendo uma distância segura.
— Tenho agido de maneira não muito cortês com você. Não que tenha sido perceptível...
— Percebi, sim — interrompeu. — Mas pode continuar.
— Certo. — Pareceu genuinamente surpreso, acenando com a cabeça e respirando fundo antes de continuar. — Meu pai me disse que eu já tenho vinte e sete anos nas costas e que tenho que parar de agir como se tivesse quinze. Seja lá o que "nas costas" signifique.
Ali ela entendeu. Estava estranhando o posicionamento dele. Mas, se Nicolao havia o obrigado, fazia sentido. Não tinha muitas memórias de Ikaro então deduziu que nunca foram muito próximos. Honestamente falando, ela não queria obrigá-lo a simpatizar com ela. Era um direito dele. Só não queria que ele fosse falso.
— Mas eu espero que nós possamos melhorar a nossa relação — continuou dizendo.
Melina não sentiu verdade da parte dele, mas torcia para estar errada.
— Tudo bem. Águas passadas. — o respondeu. — Vamos voltar?
O rapaz concordou com um sinal de cabeça, fazendo seu caminho de volta para onde todos estavam.
Quando retornaram, todos estavam sentados à mesa conversando, incluindo Hektor. Pelo visto, ele já havia preparado carne até demais. Estava livre para apenas desfrutar do momento. Até mesmo os pais de Agnes já pareciam relaxados. Mas Melina reparou que Joe não estava em lugar algum. Automaticamente, parou na entrada vasculhando o ambiente com os olhos enquanto Ikaro se juntava à família.
— Procurando por mim? — indagou o garoto loiro, surgindo ao lado dela.
— Onde você se meteu? — Virou a cabeça para a direita, para vê-lo melhor.
— Vi o Ikaro conversando com você — respondeu, indiretamente, à pergunta. — Tá tudo bem?
— Tava me seguindo?
— Sim, ué. É meu trabalho te manter viva. Acha mesmo que eu ia te deixar sair por aí sozinha e desarmada?
Não respondeu nada. Apenas sorriu para ele, agradecida, e se dirigiu à mesa onde todos estavam reunidos.
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— Então — Melina começou a dizer, num tom de voz que Joe achou suspeito —, quando que a gente vai pra Seliniakós, tio?
Calisto pousou os olhos sobre ela com curiosidade quando ela se sentou sobre a mesa, ao seu lado, o encarando de volta.
— Será nosso último destino antes de retornar à Capital. Por que a pergunta?
— Ah, nada... Só... gostei da Chloe, ela parece ser legal.
A garota balançava as pernas agitadamente no ar com as palmas das mãos apoiadas no móvel. Todos estavam atentos à conversa, como se ali, na frente deles, estivesse ocorrendo algum tipo de experimento social. Agatha e Cibele pareciam ser as únicas que sabiam o que estava acontecendo, se entreolhando disfarçadamente.
O príncipe sempre fora alguém extremamente difícil de se ler. Ninguém sabia por onde começar a desvendá-lo, nem mesmo sua irmã gêmea. Mesmo após dezessete anos, Joe ainda não sabia distinguir quando aquele homem estava ouvindo a mente de alguém e quando não. Calisto dizia que não fazia isso o tempo todo. Dizia que conhecer de antemão os pensamentos de alguém roubava toda a magia de um diálogo. Por isso, desligava essa parte dele quando assim o desejava.
— Sim, ela é — respondeu, um tanto sem jeito.
— O que você acha dela?
— Por que quer saber, Melina?
— Curiosidade, uai.
— Bom, acho que ela é uma mulher incrivelmente poderosa e equilibrada — declarou de forma técnica. — Também é uma excelente gestora.
— Só isso? — A princesa parecia decepcionada.
— Sobre o que, exatamente, você quer a minha opinião?
— Não acha ela bonita? — Resolveu ser direta. — Ela tá solteira.
— Sim, eu a considero bonita. Mas, não sei se compreendo para onde esta conversa está indo.
— Calisto, pare! — Agatha interviu. — Ele compreende, sim, Mel. — Completou a fala junto com uma risada. — Ele só está fugindo do assunto.
Joseph sacudiu a cabeça em negação. — Que coisa feia — disse, ironicamente —, se fingindo de sonso!
Calisto riu levemente. — Não estou! Realmente não entendo o motivo de tudo isso.
— Melina e eu conversamos — Agatha se pronunciou — e pensamos que talvez te fizesse bem encontrar uma companhia.
Naquele momento Joe teve certeza de que tudo aquilo era ideia de Melina. A própria Agatha era solteira, não tinha porque se preocupar com a solteirice dos outros.
— Já gosto da minha própria companhia — rebateu o príncipe.
— Aí a gente pensou na Chloe — Melina continuou a fala da skopós, ignorando completamente a fala de Calisto. — Ela parece ser gente boa, tem quase a sua idade, vocês já se conhecem há um tempo e ela tem um cabelo lindo. Seus filhos seriam uma gracinha!
— Já imaginou os nossos filhos hipotéticos?
— Sim, eu sou fanfiqueira! — exclamou, alegremente.
Joe apostava um braço que ninguém naquela mesa sabia o que era uma "fanfiqueira", mas a conversa estava interessante demais para que qualquer um interrompesse para questionar algo.
A verdade é que ele próprio também estava curioso. Durante todos os anos em que conviveu com Calisto, nunca o ouviu falar sobre nenhum envolvimento amoroso. Nem mesmo casual. Já havia perguntado para quase todos os empregados do palácio, incluindo os que o conheciam há mais tempo, mas ninguém nunca sabia de nada. Nem mesmo o mais empenhado dos fofoqueiros possuía alguma informação acerca da vida amorosa do príncipe. Tudo levava a crer que ela simplesmente não existia.
— Eu disse que não funcionaria. — falou Cibele.
— Colaborou com esta armação? — questionou Calisto.
A rainha usou como resposta um dar de ombros e uma risadinha.
— Estou solteiro e pretendo continuar assim — explicitou o réu. — Se é isso que as senhoritas tanto desejam saber.
— Droga! Meu plano deu errado — bufou Melina, mas logo se animou quando percebeu que a voz ao fundo cantava "Te filmando eu tava quieto no meu canto..." — Socorro! Eu amo essa música!
Agarrou a mão de Anastasia, que observava toda a cena com curiosidade, e correu com ela para sambar no meio do salão.
— E você, Thálles? — perguntou Agnes. — Não acha que também já não está na hora de se comprometer? Seu irmão agora é um pai de família.
Vu Nicolao sacudir a cabeça negativamente, de maneira nervosa, sinalizando para o gêmeo solteiro.
— Não entra nessa, não! Tá novo ainda.
— Já temos trinta e seis anos, pai — argumentou Augustus.
— E daí? Eu só fui saber de me amarrar com mais de quarenta. Seu tio que foi doido de casar antes dos trinta. — Gritou para Melina: — A senhorita não tá inventando moda não, né?
— Moda de que, pai? Tá doido? — indagou, parando de dançar, sem saber o porquê daquilo.
— De querer casar.
— Eu hein, sai fora! Tô nova demais pra isso — gritou do meio do salão e voltou a sambar com Anastasia.
— Hum. Acho bom mesmo. — Apontou o dedo para o caçula entre os filhos biológicos. — Você também! Não tem nem cabeça pra isso.
— Vocês são completamente loucos... — proferiu Thálles, mais para si mesmo do que para ser ouvido, e se levantou, indo para junto da irmã.
Joe fez o mesmo.
Foi até o meio do ambiente onde os três estavam. Quando Melina o viu se aproximando, apontou um dedo para o rapaz e cantou:
"Deixa eu te dar um beijo
Eu vou mostrar o tempo que perdeu"
A princípio, o garoto se surpreendeu. Mas, devido à quantidade de álcool que ela havia posto no organismo, relevou e entrou na dança.
"Que coisa louca
Eu já sabia
Enquanto eu arrumava algo me dizia"
A princesa abriu os braços, completamente entregue à música e logo colocou as mãos sobre o peito, num gesto dramático.
"Você vai encontrar
Alguém que vai mudar"
A sua vida inteira da noite pro dia"
Agarrou a mão esquerda dele quando ele chegou perto o suficiente, puxando seu corpo para perto do dela e colocando sua mão no ombro dele. Joe não era um bom dançarino mas retribuiu, pousando sua mão em sua cintura e deixando que ela o conduzisse quando o refrão voltou a tocar Pouco se importando se alguns estavam os assistindo com curiosidade. Afinal, estavam entre família.
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Bandeira de Zoe pra vocês:
Voltei, tô viva
Esse capítulo me custou alguns dias pra escrever, nem sei o porquê, mas tá aí, graças a deus ❤️
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