Capítulo XIV - Às vezes, as más ações nascem do amor
Diarmuid retorna à região do ducado eslavo governada pelo marquês de Viy, um poderoso e velho gnomo que é um dos únicos nobres do reino absconditus a não possuir um sobrenome porque sua casa recebeu o nome dele. Este lugar que incomodaria um claustrofóbico, afinal, os seres que moram ai são demasiadamente pequeninos, ainda possui espaço o suficiente para outras espécies serem capazes de se locomover — nem todas em sua forma original, devo admitir.
Uma densa floresta retentora de belos tons azulados que qualquer um julgaria-a como mágica, adornada por cogumelos vermelhos e outros fungos possuidores de um brilho incandescente que aparenta provir de uma vela acesa em uma manhã de natal e atraente para crianças ou adultos que são sensatos em não perder sua valiosa curiosidade.
Ele anda por uma trilha que corta um caminho entre as árvores luminescentes, responsáveis por uma luz azulada que impede a densa flora de privar os gnomos da luz porque nenhum raio das estrelas-gêmeas atravessa-as. Viy anda na frente de Diarmuid, porque ele ainda não é familiar com estes labirintos e, após uma caminhada um pouco longa, eles encontram um grandioso castelo construído com troncos de árvores retorcidas que possui uma escura coloração acastanhada.
Diarmuid entra no lar do marquês e não distrai-se no caminho de seu quarto, ele apenas para quando chega na frente do espelho do toalete. O reflexo ilustra a imagem de um belo homem europeu que aparenta não ultrapassar muito dos vinte e cinco anos, entretanto, o cansaço faz duvidar um pouco desta impressão. A masculinidade e delicadeza, apesar de serem ditas como opostas, dançam unidas no rosto dele que é emoldurado por ondulados cabelos castanhos na altura do ombro. Tudo isso, invadido por uma profunda melancolia.
Ele desfaz as tranças de seus cabelos, que eram parte do disfarce anteriormente utilizado para sair dos locais que os druidas encontram segurança. Diarmuid não é diligente, por um instante, ele apoia as suas mão no balcão abaixo do espelho e apenas suspira enquanto encara o seu reflexo. O olhar trêmulo dele não ganha firmeza, derramando lágrimas que não obedeceram à sua vontade de contê-las.
[Alerta de gatilho: luto (1 parágrafo)]
Seu pesadelo era perder sua família novamente, entretanto, isso já ultrapassou a barreira do imaginário para a realidade. No passado, seus pais, irmãos, tios e primos foram assassinados por um Hazael que desejava roubar a posição de duque, todavia, foi mal sucedido em vencer Aedan e Diarmuid. No presente, todos os druidas que não morreram ou foram capturados, estão escondidos — os que escaparam são a minoria —. Ele sempre tenta proteger quem ama, entretanto, sempre se vê impotente diante da ruína deles.
Após terminar de desfazer as tranças, ele abre a torneira que derrama uma água fria como aquelas encontradas nos riachos durante o inverno. Diarmuid toca nessa agradável cascata gélida e eleva a água para o seu rosto, mascarando tudo que aconteceu e retorna para o quarto, onde coloca outro disfarce.
Ele veste um manto marrom de viajante sobre uma leve armadura de metais e couro, coloca uma máscara e cobre seus cabelos com um capuz. Apesar disso parecer estranho para aqueles que não estão acostumados com a cultura dos absconditus, esta forma de vestir é clássica de viajantes expatriados que vivem de modo errante e não possuem nenhuma conexão com uma espécie ou um ducado específico.
Diarmuid apressa-se para iniciar a sua missão, algo que apenas ele é capaz de realizar. Ninguém poderia suspeitar que um druida mentiria sua identidade e nem mesmo acreditar que testemunhou algum deles enganando, por isso, Diarmuid é o escolhido, ele é o mais improvável. Alguém da espécie dele nunca quebraria seus rígidos princípios, entretanto, se for pelo bem de sua família e raça, ele nunca hesita em utilizar quaisquer métodos.
Com o auxílio das fendas e de outros meios de transporte tecnológicos do reino absconditus, ele não demora mais de uma hora para ir de Syniy Lis⁹ aos arredores terrestres da Cidade de Atlântida. Diarmuid paga uma boa quantia de dinheiro aos guardas para permitirem sua entrada na prisão subterrânea e invade o escritório do major.
Não é nada escuro, sombrio e nem mesmo velho como normalmente seria retratado o covil dos vilões nos filmes infantis. É uma vasta sala branca decorada com os mais refinados adornos gregos e iluminada por uma delicada luz amarelada. No centro dela, há uma mesa de trabalho onde um alto e imponente major de lisos cabelos azuis repicados na altura do ombro está sentado de modo tão imponente quanto sua densa armadura prateada semi-coberta por uma capa da mesma cor do oceano.
O major Zephyros Okeanós aponta a sua pistola na direção da silhueta com uma exímia rapidez, entretanto, a abaixa com a mesma velocidade ao ver a pedra preciosa que o misterioso encapuzado está mostrando em tom convidativo.
— O rei realmente paga muito mal, não é? — suas duas mãos estão levantadas, e em uma delas, há diamantes reluzindo tão fortemente que adentram no coração de qualquer um que os contemplar.
— O que você quer?
— Apenas um de seus prisioneiros que eu escolher.
— Qual deles?
— Aedan Eyrwisdom.
Ignorando completamente o fato de que o rei considera o conselheiro extremamente importante, anseia por obter informações dele e deseja o tornar aliado nem que seja à força, Zephyros consente com o pedido de Diarmuid. O major sinaliza a um de seus servos para trazê-lo. Um dos militares retorna auxiliando Aedan a andar porque a perna esquerda dele está ferida demais para ser possível movimentá-la, ela é capaz apenas de deixar um rastro de sangue no caminho.
Diarmuid se esforça mais do que o imaginado por qualquer absconditus e humano para não esboçar nenhuma reação, entretanto, isso não impede as lágrimas de caírem por trás de sua máscara. Ele aproxima-se, e antes de chegar perto o suficiente, o guarda apenas solta Aedan, todavia, Diarmuid o segura antes de cair e oferece seu ombro como apoio.
O druída joga os diamantes para o Zephyros e teletransporta-se para o seu quarto no palácio do Viy, utilizando uma rara tecnologia que o emprestaram.
Ele posiciona Aedan entre os confortáveis cobertores vermelhos e brancos de sua cama, sendo extremamente cuidadoso para não feri-lo ainda mais. Diarmuid estende as suas mãos um pouco acima de seu primo e uma translúcida névoa azul claro surge com este movimento. A delicada nuvem de energia natural que está presente em todos os lugares desde o princípio da criação dos mundos, entretanto, apenas os druidas são capazes de controlar, aumenta o espectro visível e escurece conforme cresce.
Diarmuid, estando trêmulo, se esforça para permanecer em pé e por uma sorte provinda de sabe se lá onde, mantém-se sem desequilibrar-se, apesar de parecer que não possui as forças exigidas pelo imensurável desafio de utilizar esta habilidade de cura. E para piorar, matéria nunca é criada, apenas transformada, não é possível simplesmente criar mais sangue para repor a grande quantia que Aedan perdeu, a única opção é usar o seu, o que enfraquece-o ainda mais.
Diarmuid respira com dificuldade, é como se o ar tivesse desaparecido da atmosfera, entretanto, ele não se importa e mantém-se impassível como uma estátua. As profundas feridas que marcavam a clara pele de Aedan com um tom avermelhado, a mesma cor que os lençóis outrora alvos compartilham, diminuem, restando apenas cicatrizes, inúmeras cicatrizes. Entretanto, antes de terminar, Diarmuid não suporta e cai inconsciente na beira da cama e a densa névoa escura que cobria todo o quarto desaparece no mesmo instante.
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Notas de Rodapé:
⁹ Floresta azul em ucraniano.
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