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XXV - Meu reino

O salto das botas camufladas invadiam o solo tal como agulhas afiadas atravessam os tecidos em uma máquina de costura. Talvez pelo peso ou pela tensão demasiada que Aveta depositava nos calcanhares cobertos. O cheiro de grama do grande campo onde se encontravam parecia cada vez mais intenso, ou talvez a ansiedade assim fizesse parecer. A mão quente de Laerte procurou a da esposa, que estava ao lado de sua cintura, na tentativa de não parecer nervosa demais, mas era impossível.

— Ele já está chegando — murmurou, notando a face corada de Aveta perscrutar o céu enevoado com certa persistência.

— Eu sei. Está tudo sob controle — ela disse.

Afirmar que tudo estava bem, segundo os pensamentos da princesa, fazia com que seu cérebro trabalhasse com mais calma e sensatez, algo completamente difícil para aquele momento.

Ao longe, o som que parecia o prenúncio de uma tragédia ou talvez da salvação de todos ecoava entre as nuvens baixas. O vento ao redor dos três parecia cada vez mais revolto, moldava-se ao comando do grande helicóptero que se aproximava.

— É ele. — Aveta apertou os dedos de Laerte e o encarou por um segundo.

— PRINCESA!

Uma voz conhecida chamava em desespero. A corrida deixava seu tom ofegante, entre os suspiros exauridos que escapavam dos lábios avermelhados, banhados por alguns fios do cabelo vermelho fogo.

— Wictoria.

— Nós vamos também — disse Valentina, ao lado de Tyliard.

— Não podem. Vocês precisam ficar e ajudar Elijah e o rei — Laerte ponderou.

— Já deixei ordens claras aos meus homens — retorquiu a comandante. — Precisam mais de nós.

— Está de acordo, Wictoria? — questionou Aveta. Sabia das ressalvas que a general tinha ao se tratar do reino delegado à sua proteção.

Wictoria apenas anuiu, sacolejando freneticamente a cabeça.

Já era quase impossível ouvir qualquer outro som que não fosse da enorme máquina aérea cada vez mais próxima. Não tardou a pousar, e assim que o fizera, foi possível enxergar os fios ruivos curtos que emolduravam a face de quem a guiava. 

Os cinco correram na direção do helicóptero, afoitos, na intenção de que menos tempo fosse gasto no trajeto. Eles não dispunham de nem um minuto a mais, sequer. Qualquer segundo perdido era uma chance a menos.

— Me perdoem. Não consegui pegar o helicóptero sem dar explicações, por isso demorei — disse Eros.

Os cinco acomodaram-se sem muito dizer. O clima pouco agradável era quase palpável naquele ambiente.

***

Reino de Salazar

— Calma, meu amor. Respira. — John amparava a esposa, ao tempo que olhava para os lados com preocupação.

— Precisamos chegar lá.

— Ah!!! — a princesa curvou-se diante da forte contração que parecia repuxar todo o seu ventre. — Me deixe aqui. Salve-se, John — implorou.

— Eu jamais deixaria vocês aqui. — Encarou o corredor escuro atrás de si, pondo a mão na cintura da esposa. — Vocês são a minha família. O meu coração bate pelo seu.

— Salazar precisa de um rei. Você ainda tem chance.

— Salazar precisa que sejamos fortes. E você é, Kaya.

A princesa contraiu a face em dor, sentindo os fios de suor e lágrima escorrerem em um só conjunto. Sua cabeça subiu e desceu, concordando com o príncipe. Ela segurou a mão que lhe amparava com toda a força que ainda existia em seu corpo cansado e se ergueu, tomando direção da biblioteca.

***

Os olhos afoitos de Eros pareciam confusos. Seus lábios também nervosos tentavam dizer algo. Algo que não saía. O tremular de suas pálpebras era um sinal...

— Vamos atravessar a fronteira de Salazar — disse, por fim. Mas não era apenas uma informação.

— Eros — Aveta disse seu nome em uma entonação que dizia mais que qualquer coisa.

— Acho que fomos seguidos.

— Como? — inquiriu Tyliard.

Eros calou. E aquele silêncio foi tão perturbador quanto nenhuma palavra poderia ter sido. Valentina e Wictoria se entreolharam. Duas mulheres tão fortes, que diante da imensidão daquele infortúnio tornaram-se tão vulneráveis.

— O que faremos? — Laerte perguntou ao amigo, na esperança de que fosse atendido.

— São muitos — respondeu — Estão em todo o perímetro. Teremos que nos render.

— Não! — Aveta foi sucinta. — Só temos uma chance. Não podemos nos entregar agora.

— Não tem outra solução, princesa. Ou nos entregamos ou seremos abatidos.

— Ninguém vai me impedir de entrar no meu reino, Eros.

— E o que pretende? — o piloto quis saber.

A explosão que seguiu a pergunta fora tão abrupta, que era como se o próprio céu caísse sobre suas cabeças.

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