Capítulo 34
Robert
Tudo estava escuro, a falta de ar pairava todo seu interior. Em um momento estava consciente, e no outro, nada, seu corpo estava vazio, apenas sua alma vagava por um grande abismo negro, o próprio universo. Meio as estrelas, aquela pontada de energia finita, leve como uma pluma, pairou até chegar em um lindo lugar, com um belíssimo jardim, onde as flores brotavam, morriam, e nasciam novamente. As borboletas, recém saídas do casulos acompanhavam o processo das que ainda estavam em desenvolvimento. Os pássaros extraordinários, brilhavam e cantavam até incandescer, depois continuavam com uma melodia nunca vista antes. Ninguém estava à vista, - paz, era a verdadeira descrição para aquela sensação.
A sua frente havia um portal de pedras com símbolos de runas escritas em algum idioma antigo. O corpo feito de energia se aproximou da entrada, uma luz emanava adentro, onde avistou uma linda jovem de pele rosada e cabelos escarlates chorando lágrimas que escorriam junto da chuva, passando entre seus braços e escorrendo até o corpo de um garoto, caído sem vida. O lugar estava totalmente destronado, o dia era noite, o caos gritava, e um aglomerado de corpos definiam a paisagem do piso.
O corpo em forma de energia esticou sua mão, precisava atravessar aquele portal, precisava agarrar aquela garota, salvá-la, algo em si sabia que aquilo era o certo a se fazer. Mas no momento de seu toque, um clarão tomou conta do local, todo o jardim foi esvaziado, o portal se fechou e apenas o vazio do cosmo restou.
- Você não pode adentrar neste portal ainda, pobre alma - disse uma voz calma, porém com tonalidade grave, vindo de uma grande fonte de energia que emanava por todo o espaço.
- Onde eu estou? Eu morri? - pergunta a alma perdia.
- O que você acha?
- Eu não sei. Eu-eu não sei para onde ir - responde, confuso.
- Ainda não chegou o seu momento, isso eu posso lhe assegurar.
- Afinal, quem eu sou? - questiona, sua mente estava uma bagunça, nada parecia certo tampouco errado. - Por que estou aqui? - Suas lembranças começam a fazer sentido a cada pergunta. - E por que fui mandado para aquele lugar? Qual o meu propósito?
- É normal que tenha tantos questionamentos, mas tudo será respondido no seu devido tempo, nada antes, e nem depois. O que posso lhe dizer é que aquele lugar precisa de seus Heróis, não só deles, e não de qualquer um, mas apenas aquele que foi prometido realmente pode, de fato, salvar aquela terra de um terrível final eminente. Nem que para fazer isso o consuma por completo.
- Então o que isso quer dizer? Eu sou esse tal prometido? Mas eu nem pertenço a esse lugar, como posso ser um herói, quanto mais esse alguém?
O cosmo sorriu - riu do questionamento esnobe do jovem.
- Você precisa entender uma coisa, antes de saber seu verdadeiro propósito. O que torna um herói, ser um verdadeiro herói? Sua ascendência? Ou os seus atos? Olhe para si mesmo e universo dirá. Assim como num ciclo de vida de uma estrela, que brilha mesmo após sua morte, jovem Robert.
- Então esse é o meu propósito? Morrer para salvar aquela terra que também está fadada à destruição?
- O ciclo da vida, Robert. Ele não para, você é uma pessoa entendida, então sabe que a entropia sempre vai tender à desordem, essa é a lei mais básica do universo. Todos vão morrer um dia, até aqueles que se dizem imortais um dia se extinguirão. A questão é, quem você quer se tornar antes desse evento natural acontecer? O que você quer para si mesmo, e para aqueles ao seu redor? Encontre a si mesmo, e quando estiver pronto saberá todas as respostas para o que busca. Lembre-se, peregrino, nada é por acaso, mas quem faz o seu próprio destino senão você mesmo? - A voz vai diminuindo cada vez mais, com cada palavra dita.
- Espere, eu ainda não entendi. Ainda tenho muito o que perguntar, só depois que eu encontrar meu verdadeiro destino poderei voltar para casa?
- Robert. Acorde! - chamou uma voz conhecida ao longe.
- Você deve ir agora, - falou a voz do universo, ainda mais baixo - aqueles que precisam de você estão a sua espera. Sua jornada ainda não acabou... Robert, o que faz um herói se tornar um verdadeiro herói? Nunca se esqueça.
Antes que Robert pudesse responder, sua alma foi puxada, aquela energia foi sugada diretamente para seu corpo. Sua consciência estava voltando aos poucos, vozes estavam ao seu ouvido, algumas conhecidas, onde se ouvia também choros e lamentações, sua pulsação começava a voltar aos poucos.
~∻~
Ao retomar a consciência, Robert sentiu uma energia reconfortante percorrendo seu corpo, um calor aconchegante em seu coração, e uma sensação conhecida em seus lábios. Após abrir os olhos, antes de fechá-los novamente, avistou cabelos ruivos a sua frente, aqueles longos e lindos cabelos escarlates que tanto admira, com sua boca de lábios rosados encostada à sua. Pôde escutar seus amigos o chamando, e lágrimas que escorriam sob seu rosto. Em seguida o rosto se afastou.
- Por favor, Robert. Volta para nós... para mim... - falava Hina pressionando o peito de Robert com as mãos.
- Já que está pedindo com tanto carinho assim, baixinha... - fala Robert, fracamente, enquanto solta água salgada de sua boca. Estava deitado debaixo de uma coberta na orla da praia, ao redor estava seu grupo de amigos. Os tritões estavam agitados prestando primeiros socorros aos que sobreviveram à batalha.
- Droga, cabeça de palha maldito - fala a bruxa batendo no peito do jovem, com lágrimas ainda em seus olhos. - Você está ficando doido? Imprevisível como sempre, como pode fazer... - Hina é interrompida por uma Lizzy chorona se jogando em cima de Robert.
- Aaaah, Rob. Que bom que voltou pra nós, Lizzy não saberia o que fazer se você não acordasse.
- Dá licença sua peixe de água doce, você está sufocando ele - fala Hina entre os dentes, já fervendo de raiva.
- As duas estão. - Alberin se aproximou retirando as duas garotas de cima de Robert fragilizado, a emoção de ver que seus amigos estavam bem havia ofuscado o fato de que agora seu peitoral ganhou uma cicatriz, mesmo curado, ainda doía no corte que levou mais cedo.
- Todos estão bem? Vencemos?
- Bom, como pode ver, ainda estamos vivos, eu classificaria isso como vitória - responde Anne se aproximando e estendendo a mão para Robert - Fico feliz que tenha finalmente acordado, pensamos que não voltaria.
- Sério isso? Quanta confiança em mim.
- Robert, sua pulsação literalmente parou por um momento. Realmente pensamos que você tinha...
- Mas Robert está sã e salvo, graças aos deuses - fala Alberin.
- E a ameaça que estava no fundo do mar? O que houve com ela? - questiona Robert, agora ajeitando sua roupa ainda molhada.
- Robert, após você detonar com aquela grande onda - fala Hina - a ameaça simplesmente sumiu.
- Tudo graças ao meu pai - completa Lizzy.
- Não temos certeza disso - protesta Hina.
- A embarcação dele chegou logo após você cair, por sorte divina você foi salvo por eles antes que o pior tivesse acontecido. A presença do meu pai deve ter afastado aquela aberração, e como os abissais que estavam em batalhas foram derrotados...
- Graças a quem mesmo? - se gaba Hina.
- Golpe de sorte, bruxinha.
- Não comecem vocês duas - reclama Anne. - O pai da Lizzy trouxe você à terra, o deixou conosco. Ele iria lhe levar para que as curandeiras lhe tratassem, mas as duas mágicas ai alegaram que te trariam de volta.
- E trouxemos - responde Lizzy, agora com um sorriso no rosto. - Apesar que eu fiz todo o serviço. Essa daí só deu uma desculpa para tocar nos teus lábios - brincou, e Robert sorriu ao ver Hina corada protestando rispidamente. - Meu pai pediu para que quando você acordasse, a gente fosse o mais rápido possível até seu castelo.
- Acho uma boa ideia - fala Robert colocando a mão na barriga para conter um ronco. - Estou morrendo de fome. Quais são as especialidades dos tritões?
~∻~
Após um tempo todos se direcionaram para o centro de Punfart, rumo ao castelo do senhor tritão. O caminho até lá foi marcado com dor e lamentação do povo tritão, alguns em luto pelos seus familiares, outros ainda tratando os sobreviventes. Podem ter saído vitoriosos da batalha, mas a perda foi enorme, não só em quantidade, mas no sentimental também, apesar que pode-se perceber que os tritões não eram seres capazes de guardar essas lamentações por muito tempo.
Ao chegar no castelo que era meio submerso, os aventureiros adentraram na parte do palácio que ficava na superfície - a decoração nas pedras antigas cobertas por algas era composta de seres do mar, e de muitas estátuas dos próprios tritões em suas batalhas - ao longo do corredor, foram direcionados até o salão de jantar, onde se serviram de um belo banquete com diversos pratos da culinária marinha.
- Podem aproveitar, comam e bebam o quanto quiserem, jovens aventureiros - uma voz doce, porém firme ecoou pelo salão. Logo, um macho tritão do mesmo porte físico do general Lumel se formou, mostrando também seus longos cabelos azulados presos por uma trança.
Lirius Belmar, lorde de Punfart estava presente, suas cicatrizes eram tão notáveis quanto as do seu irmão mais novo. Robert podia sentir sua intensa energia a cada passo dado pelo tritão de três metros de altura. Ao se aproximar todos ficaram de pé, Lizzy foi ao seu encontro.
- Meu pai. - A sereia se abaixou para uma breve reverência, depois correu para abraçá-lo.
- Ah, minha pequena e doce Liz - fala Lirius, abraçando sua filha, contendo um choro. - Fico tão contente que minha filhota linda esteja bem. Quer dizer, você está bem, não é? Está machucada? E onde está a Lili? Pelos deuses, onde está minha outra amada filha - continua, bem eufórico. - Eu afundaria os quatro mares se algo tivesse acontecido com vocês. - Cerra os dentes e um tremor ecoa na sala.
- Chega pai, - interrompe a sereia saindo dos braços do pai - estou bem sim, a Lili também, ela está num lugar seguro, não se preocupe. Eu não estaria aqui se não fosse por meus amigos, papai. Principalmente pelo Rob, em especial - fala sereia olhando para Robert, soltando uma piscadela. - Para desagrado de Robert que por um momento pôde ver chamas se acederem nos olhos do senhor tritão ao encará-lo.
- Sim. Me atualizaram da situação. Vocês tem meu total agradecimento, sem a ajuda de vocês, Punfart não estaria de pé agora. Infelizmente eu não consegui chegar a tempo de acabar com a raça deles com meus próprios punhos, a reunião do grande conselho demorou mais do que o previsto, só recebi a mensagem tempo depois.
- Afinal quem era aquele ser das profundezas? Ele parecia extremamente forte, e simplesmente sumiu - questiona Anne.
- Hydrus, é uma criatura abominável, - responde o senhor tritão - líder dos abissais, senhor das profundezas, dominador das águas negras, comandante do exército sombrio, e também era o braço direito de um dos generais da destruição. Ainda não sei como, mas parece que ele se libertou, assim como as criaturas marinhas mais obscuras, tais como o Kraken.
- O Robert o derrotou com apenas um golpe, papai - completa Lizzy.
- É um feito impressionante. O Kraken é uma criatura mitológica, e um dos gigantes das profundezas. Na antiguidade, Hydrus tinha o domínio de diversas dessas coisas, e ao mandato de um certo general, ele dominou os mares por muito tempo, obrigando a todas as criaturas marinhas se curvarem perante si. Nosso povo sempre esteve em guerra com essa raça, e na última guerra mágica, Hydrus finalmente foi selado pelo primeiro rei dos tritões, e o mais forte dos homens peixes que os quatro mares já ouviu falar, Atlus, o destemido.
- Isso explica como surgiram tantos abissais, - fala Robert - e de onde tiraram tanto poder de uma hora pra outra. A questão é, quem libertou Hydrus? Creio que ele seja um dos comandantes fortes do exército sombrio, certo? Já enfrentei alguns antes, e não se comparava aquela presença que senti vindo da água.
- Isso mesmo, como o exército sombrio nunca foi de fato existindo, sempre existiu aqueles que aparentemente se tornaram comandante, mas aqueles que foram selados na antiguidade, eram os mais fortes. Eles foram criados pelos generais, que tiveram sua origem direta do senhor sombrio. Ainda não sabemos como estão sendo libertados, e por quem.
- O rei não tem conhecimento disso? - questiona Robert. - Quer dizer, ele tem forças especiais trabalhando para caçarem e encontrarem as tocas dos seres das trevas, além de um sistema eficaz de purificação.
- Não tem como o rei saber de tudo que acontece nesse continente vasto. É pra isso que reuniões como a que tivemos esses dias, servem. Para atualizarmos os acontecimentos relevantes, e decidirmos os próximos passos, infelizmente nem todos os líderes puderam comparecer. E o maldito Hydrus, de alguma forma sabia exatamente dessa informação, e escolheu o momento certo para atacar. Mas iremos trabalhar nisso, tanto o rei Eliot, quanto o atual rei dos tritões já foram informados da situação.
- Sobre a reunião, papai - interrompe Lizzy. - Não pode nos contar o que vamos esperar para seleção de heróis?
- Ah, minha filhotinha. Você sabe que as informações sobre essa reunião são confidenciais - responde o senhor tritão, e Lizzy entristece fazendo um biquinho. - Mas como vocês salvaram minha terra, e meu povo, meu agradecimento é eterno. Não posso contar tudo, mas posso lhes dar uma dica, façam o que quiserem com ela. Até o momento, o oráculo de Lux só previu um único herói para se qualificar, ainda não sabemos se de fato terá apenas um ou mais, geralmente a previsão é feita com antecedência, sei que ainda tem tempo para ele se manifestar, mas de toda forma tivemos que considerar a possibilidade disso acontecer, e montar uma competição com isso em mente.
- Espera, um único herói? Isso é um absurdo! - protesta Hina, batendo com as mãos na mesa. - Como podem ter um único herói? Existem diversos aventureiros em todo o continente, só pode haver algum engano.
- Logo agora num tempo de calamidade... - fala Alberin.
- Um único herói... será que... - sussurra Robert. O que faz um herói se tornar um verdadeiro herói?... Não um, mas o... O prometido...
- Não houve algum engano? Esse tal oráculo não errou? - pergunta Anne, calma e tolerante.
- O oráculo de Lux foi criado nos primórdios, com a própria essência do deus da luz, nunca errou antes - responde Lirius. - O que nos resta é esperar para ver no que vai dar. De toda forma, não se preocupem, façam o que tem que fazer. Ah, antes que eu esqueça, também há uma recompensa em ouro para vocês, já que cumpriram com êxito a missão de salvar Punfart. Podem ficar quanto tempo quiserem aqui, são meus convidados, além do mais são amigos da minha filha querida que papai tanto ama - acrescenta, abraçando Lizzy com um monte de beijos.
- Pai! - protesta a sereia e todos caem na gargalhada.
~∻~
No fim da noite, todos foram para seus aposentos, Robert se aquece para poder dormir em um dos quartos de hóspede no castelo, as frases ditas no sonho estranho que teve enquanto estava inconsciente não saiam de sua cabeça. - O prometido... O ciclo da vida... O que faz um herói se tornar um verdadeiro herói? - os detalhes daquele sonho ainda estavam escuros em sua mente, mas sabia que era importante decifrar aquilo.
- Não pode ser apenas coincidência, tem que ter alguma conexão. E eu preciso encontrar... falta pouco tempo até a seleção, e nosso próximo passo é a dungeon, foco nisso agora. - Robert suspira fundo, e fecha os olhos, não demora muito para adormecer.
~X~
Olá aventureiros, peço desculpas pelo atraso, mas tá ai o fechamento dessa batalha na ilha dos tritões. Claro que isso não foi o fim.
Próximo capítulo teremos coisas novas.
E a seleção de heróis se aproxima com o final do livro.
Espero que estejam gostando do desenrolar da história.
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