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Capítulo 4 - Cabeça cheia e boa companhia

VOTEM NO CAPÍTULO!

Tenho algumas considerações de final de capítulo para dar e gostaria que lessem para me ajudar com suas opiniões sobre o livro que está em produção do Lakroff e do Tom. Para quem ainda não sabe estou fazendo uma obra original baseado no casal que eu notei ser o favorito aqui, mas pretendo fazer de outros se tudo der certo. Da Lilian e do James, Wolfstar, etc. Enfim. Falamos mais disso no fim do capítulo.

Por hora, espero que gostem, que comentem bastante e que estejam ansiosos para o baile, estamos quase lá.

Atenção: esse capítulo tem algumas doses de fansirvice e fofura, leia por sua conta e risco.

PS: Provavelmente vou ficar chateada se não gostarem porque é um dos meus favoritos kkkk

Uma parte do capítulo eu estava com sono demais e tive que postar sem revisar, então me perdoem pelos possíveis erros.

Boa leitura!

1980.

James tremeu e se aproximou de Lilian, tocando seus braços cobertos como se pudesse verificar sua temperatura. As paredes daquele lugar eram de pedra sólida, mas faziam pouco contra a temperatura invernal do lado de fora nos alpes germânicos. A ruiva sorriu, apesar de revirar os olhos sabendo exatamente o que seu marido estava fazendo, ambos estavam agasalhados e ela não era nenhuma novata ali.

Ele era.

Era a primeira visita de James a Nurmengard e os dois concordaram que era um bom motivo para ela voltar uma terceira vez.

De toda forma, Lilian sabia o frio que enfrentaria e só porque estava grávida, James não devia tratá-la como se fosse feita de vidro.

Eles viraram o corredor, o som das botas dos homens fardados ressoava pelo local quase vazio. Uma fortaleza para prender um homem só.

Lílian sempre se questionava porque tudo aquilo.

Mas tinha a impressão de que não queria saber a resposta.

Pelo bem de seu coração e do que estava fazendo, preferia pensar em Gellert como um homem. Não uma força capaz de realmente destruir qualquer outro menor que aquela que o estavam subjugando desde sua captura.

A tensão no ar que existia e via no rosto de cada guarda que passava quase a lembravam do contrário.

Genocida.

Que família ela tinha, não é mesmo?

Ninguém falava ali, estava escuro, poucas janelas no corredor de pedra e nas escadarias que desciam para a cela, mesmo assim o vento do lado de fora era tão forte no vale que se fazia ouvir, tochas ornamentavam as paredes a cada determinada distância.

— Esperem – disse um dos guardas que assegurava a porta quando chegaram, ele e um colega passaram uma lista de feitiços pelo ferro antes de se voltarem aos visitantes:

— Não demorem.

James se surpreendeu quando, diferente dos pequenos exemplos até ali, a cela possuía uma janela até bem grande, que mostrava as montanhas e a nevasca implacável do lado de fora.

Como ela servia de única iluminação no local, estava bem escuro e mal conseguia distinguir nas sombras quem era Gellert e o que não era, isso é claro, até o homem se arrastar até eles.

Foi como se a neve tivesse conseguido invadir o local. James tremeu da cabeça aos pés e perdeu o ar quando aquela voz grave e macia os cumprimentou:

— Lorde e Lady Potter. Que prazer receber-lhes.

Era perturbador, como ele tratou aquilo como se fosse um anfitrião.

Como aquela já foi um dia sua casa, talvez fosse o caso, pensou James. Um anfitrião e eles convidados surpresas com um pedido. Será que seria atendido?

Tudo naquele lugar era terrível e desconfortável, mas o homem? O homem era algo. Fazia-o se sentir diferente de como via Voldemort, talvez porque precisasse deste, necessitava de uma ajuda e então ele tinha de gostar de James. Para que estendesse sua mão.

Seu conhecimento.

O Potter tremeu de novo.

Eles estavam no território de Gellert, sua fortaleza, feito por ele para prender agora a si mesmo, nada mais nada menos.

Eles nunca tiraram o que era seu. Os guardas eram o que, então? Os criados que receberam e levaram as visitas. Esse era o tipo de força que aquele homem representava.

Um lorde das trevas.

E James podia falar com esse.

Era ridículo quanta expectativa tinha. Vergonhoso. Por isso tentava não demonstrar.

Ele ficou em pé, observando enquanto faziam a revista em Gellert e um pensamento fugaz o perturbou:

"Criados não sejam rudes, não desagradem seu senhor, ou ele não terá piedade".

Ele baixou a cabeça constrangido.

Os guardas preparavam as medidas de segurança extra e se asseguravam de que tudo estava bem. Um deles trouxe uma corrente e a prendeu em uma argola já pré instalada na parede, por fim acorrentou as pernas do lorde das trevas e saiu. A sala, antes pequena com todos ali dentro, de repente pareceu bem maior.

Mas Lilian ainda se sentia sufocada.

Os olhos presos naquela figura emblemática, tensa como sempre ficava.

James lhe deu a mão e ela aceitou, apertando com força.

Ela não viu, mas ele estava completamente vidrado.

Um lorde das trevas.

Um monstro enjaulado em sua casinha de pedra.

"Mas ele era conhecido por fugir" pensou "o que faz esse lugar diferente?"

A própria força de Gellert, uma parte de si respondeu, já que foi sua experiência que construiu aquele lugar à prova de fugas.

"Uma ação e sua consequência".

James se lembrou dos avisos do pai, da única vez que conversaram sobre artes das trevas e o quão ruim foi aquilo:

"Artes das trevas sempre tem consequências, James, as piores. Aqueles que acham que estão acima delas são os que ficam loucos e isso nem é o pior que pode acontecer. Negação e loucura, esses são os primeiros passos. Auto destruição, James, esse é o único caminho que está diante de um bruxo das trevas e quanto mais longe ele vai, mais alta é a queda tenebrosa".

O homem de cabelos brancos a sua frente naquele momento, já bem velho, olhos heterocromáticos, moveu-se e sorriu para James, que não temeu.

Para seu próprio crédito.

Porque o homem o olhava como se soubesse. Como se pudesse ver seu interior e decifrar a euforia lá dentro, a curiosidade amaldiçoada que sempre nutriu e tentou destruir, mas que crescia de novo como fungos em sua cabeça não importava o que a razão dissesse.

Ele sentiu aquele impulso de negar, de fingir ser o bom James bruxo da luz que nunca iria tão longe. Abriu a boca para falar, apesar de não saber bem o que, até que o próprio homem se levantou.

James e Lilian recuaram enquanto o som das correntes batia no chão.

— É um prazer conhecer o homem que desposou com minha...

— Não me chame de neta – interrompeu Lily.

— É claro – concordou o homem, um sorriso estranho, se curvando em aceitação.

Todos os seus movimentos eram firmes e nobres, como um lorde devia ser, como James viu tantos outros.

Mas nenhum estava preso a décadas.

Era perturbador como o homem não havia perdido a pose:

— Como posso ajudá-los desta vez? O que o traz aqui, de verdade, garoto?

James engoliu em seco e pensou na melhor forma de dizer aquilo, sem que os guardas talvez ouvindo do lado de fora, achassem estranho, mas como sempre Lilian se adiantou:

— Temos um problema. Um amigo amaldiçoado.

— Pensei que vocês estivessem fora da guerra?

— Estamos. Nossos amigos não.

— Certo, estão no apoio então, não conseguem abandonar os seus completamente.

— Não é do nosso feitio – ela estava firme, mais rígida do que James a vira na vida, provavelmente.

Aquele homem a deixava assim.

Cautelosa, desconfiada.

James quase sentia vergonha de seu próprio estado.

Ele estava inquieto, mas não pelos mesmos motivos.

Extasiado.

Ah, ele decididamente deveria sentir vergonha de gostar tanto daquela situação.

— Grifinórios – Gellert brincou com um sorriso. – Se me permite a pergunta cara, lady Potter...

— Não permito.

Ele apenas sorriu mais e voltou a se curvar:

— É claro então.

Lilian trocou o peso nos pés e começou a mão nervosamente:

— Que pergunta? – cedeu.

— Você disse que precisava de ajuda com seu filho e agora com uma maldição. Foi atrás do que lhe disse? Do meu filho?

— Como eu havia dito antes, e se ele não for acessível?

— Ele não é?

— E se ele estiver morto?

Houve uma pausa, uma tensão no ar, Lilian ainda sentia a morte do pai e estava contando a um homem que seu filho estava morto.

E James viu que Gellert sabia disso, ele só queria a confirmação.

Lhe causou dor tê-la.

"Ele sente pesar" pensou.

— Não finja que se importa – disse Lílian bem quando uma lágrima escorreu dos olhos do homem. – Você já sabia.

— Eu vejo coisas, mas nem sempre posso confirmar a veracidade delas.

"Ele não parece louco" foi tudo que James conseguiu decifrar de sua mente. "Mas teve uma grande queda... não pelas artes das trevas".

Negou com a cabeça, aquela linha de pensamento era perigosa.

Lilian, por sua vez, estava segurando as próprias lágrimas e irritada:

— Já conversamos sobre isso, o que você realmente sacrificou por essa família ou não.

— Sim, senhora Potter, o bastante para respeitar os sentimentos de um homem em relação a um filho. Meu filho – silêncio, quase um minuto até ele perguntar de novo. – Ele ainda se chamava Garden?

— Se o filho não é uma possibilidade, o que eu faço? Me dê um conselho melhor.

— Quer meus conselhos?

— Preciso de alguém que seja mais forte do que aquele desgraçado e se você não for, então eu me farei.

Gellert voltou a sorrir com aquela frase:

— Isso é uma atitude digna Grindelwald.

— Sou uma Evans. E uma Potter. Sangue não é mais forte do que experiência.

— Mas corre por suas veias, por seu cérebro, lhe move, abastece as ideias.

— Gellert – ela tremeu ao chamá-lo pelo nome. – O que eu faço se não tenho meu pai para acessar sua biblioteca? Se ele de nada sabia sobre o mundo mágico para ajudar? Me responda e me deixe ir embora desse lugar – e, em um sussurro, acrescentou: – Aposto que você também queria sair.

— Outro pode ajudar.

Tanto ela quanto James estreitaram o cenho.

Outro?

— Como assim?

— Se Garden não é possível, há outro modo de acharem os segredos na minha biblioteca, apesar de que... – ele murmurou, então cantarolou, olhando para o dedo de James. – Vocês já fizeram, não foi? Você é a Lady Mitrica agora, não é?

— Havia outro modo? – perguntou Lily, completamente em choque.

— Vocês vão querer conhecer uma pessoa – respondeu no lugar. – Ele sabe muita coisa, dependendo da maldição, o suficiente para que não precisem vir até aqui sempre, se não for do seu desejo.

— Ótimo, quem? – Lilian não podia ser mais clara sobre seu desejo de nunca mais voltar ali.

James, por outro lado, estava bem decepcionado com a mesma perspectiva.

Gellert não foi tão receptivo também e fez uma pergunta no lugar de responder à mulher:

— Que maldição seria essa?

— Já ouviu falar de Inferius?

As esperanças de James foram revividas, junto de uma preocupação latente quando aquele homem arregalou os olhos.


-x-x-x-

1980.

Lily estava na segunda biblioteca da Mansão Mitrica. O lugar ficava em um canto da União Soviética bem isolado da humanidade, no meio da neve e James ficou sozinho para explorar a primeira, se perguntando porque uma casa, mesmo que fosse uma daquele tamanho, tinha de ter mais de uma biblioteca.

Por que não investir em um único grande cômodo?

Que irritante.

— Pretende fazer do zero um feitiço para resolver essa questão? – James ouviu a voz de Lakroff, mais ao fundo do lugar, e se pegou sem resposta para aquela pergunta.

Ele tinha essa capacidade?

Criar um feitiço novo em artes das trevas?

Seus estudos bastavam?

Um feitiço para anular uma maldição teórica antiga, um mistério para os necromantes a gerações, que nem mesmo Gellert foi capaz de completar.

Mas o maldito Voldemort sim.

— Se eu precisar, vou – foi o que respondeu à Lakroff.

Não havia outra opção, não é mesmo? Ele tinha que fazer algo, ou tirar a força de seu criador.

Ele quase riu nervosamente com isso.

Se fosse capaz de arrancar algo de Voldemort, já teria feito a tempos. Maldito covarde. Só tinha se encontrado três vezes em todas as suas lutas contra os comensais. O próprio lorde das trevas era um trunfo no baralho, não aparecia sem necessidade, eram poucos os sortudos da ordem que tinham uma chance de vê-lo.

Apesar de que não consideravam sorte quando uma missão acabava com ele. Geralmente implicava na derrota e até na morte de um colega.

James não tinha esse medo. Nas três missões em que o bastardo apareceu, foi diretamente até ele e o impediu de fazer qualquer coisa. Lily ao seu lado.

Para impedir que James fizesse alguma coisa imprudente.

Uma besteira, muito provavelmente.

Saíram vivos e isso, para a ordem, era a vitória para uma missão interrompida por Voldemort.

Não era a vitória para James. Aquele monstro ainda estava vivo e respirando. Coisa que precisava resolver.

Conforme o exército de comensais aumentava com o avanço da guerra e do desespero das pessoas em proteger o que lhes era importante, ou buscando estar do lado que achavam que venceria, menos Voldemort dava o ar de sua graça.

"O que foi primo? Não quer mais colocar a cara na sua própria batalha?" pensou acidamente. "Não é tão bom quanto pensa?"

O número de aliados estava, entretanto, diminuindo mesmo sem o lorde das trevas e havia um maldito traidor para completar as baixas constantes, James não tinha como perguntar dentro da ordem sobre os Inferi sem parecer estranho, levantar suspeitas ou ser relatado para o próprio Voldemort.

Estava em uma encruzilhada.

— Ei, velho!

Lakroff resmungou:

— Espero que não esteja me chamando dessa forma tão indelicada.

— É você mesmo! – James podia sentir que o Mitrica havia revirado os olhos. Exatamente igual Lilian faria. Genética era uma coisa muito interessante, não importava quantas gerações se passavam, ou se não tivessem contato, alguns rostos eram pintados com as mesmas pinceladas. – Você não teria uma dica de como revelar um traidor, teria?

— Quem suspeitou disso primeiro?

— Dumbledore. Mas está meio óbvio – tossiu, momentaneamente incapaz de continuar a falar.

Havia muita poeira ali.

Mesmo que os elfos, pobres elfos, estivessem tão animados em voltar a ter mestres e motivos para limpar a mansão, alguns lugares eram desabitados a muito tempo, alguns livros acumularam poeira demais.

Ainda era uma mansão.

Lakroff pareceu decidir que podia dar um desconto a James e saiu de seu cantinho para mais próximo do Potter que ficou bem grato com isso.

Ele momentaneamente se perguntou como seria se estivesse no lugar do outro, se não se cansaria de passar tantos anos num mesmo lugar. Lakroff morava na Mansão desde 1929 e não saia daquela biblioteca. Então também tinha Gellert, preso na mesma cela desde 1945, o quadro do homem no segundo salão com Lilian. A sina daquela família era viver em uma prisão. Vivo ou morto, se considerasse os quadros. Começava a entender a decisão dos Potter de preferir se livrar disso tudo.

— Emboscadas? – o loiro perguntou atrás de James.

— Sim.

— Você suspeita de alguém?

— Estou muito dividido entre minha lealdade aos meus amigos e a desconfiança completa de todos. Lily e Harry são minha prioridade agora, então eu posso amar meus amigos, mas não posso deixar esse sentimento me cegar para a possibilidade de machucarem minha família.

— Entendo.

— Estou pensando em usar o plano do feitiço Fidelius para testar os mais próximos e armar uma armadilha.

Lakroff fez uma careta, mesmo que James não pudesse ver com o rosto enterrado nas pilhas de livros que tinha feito a sua volta:

— Armadilha?

— O traidor vai querer ser o guardião, não acha?

— Seu amigo mais leal talvez também queira.

— Por isso vou perguntar sozinho para cada amigo se ele quer ser o fiel e depois vou mudar de ideia, para ver o que vão falar.

— O que insistir é o traidor?

— Quase isso mesmo. Remus não ligaria se eu dissesse "pensei melhor, suas missões são muito arriscadas, vou usar outro", Pedro não diria nada se eu levantasse que "não quero que você corra o risco de ser torturado por minha causa, tenho uma opção melhor", Sirius não deveria negar se eu disser que vou escolher outro porque meu irmão não deve carregar esse fardo e se algo acontecer comigo, ele será o novo pai de Harry. Assim por diante. Para todos eu tenho um argumento, uma forma que eles agiriam previsivelmente se ainda estiverem do meu lado.

— E você acha que nenhum vai insistir em ser seu guardião mesmo não sendo o traidor?

— Pensa comigo, se eu escolho Sirius, por exemplo, ele conta a todos os nossos amigos que eu e Lily existimos, o segredo continua impossível de ser contado pelos outros, só por Sirius.

— Eu sei como um feitiço Fidelius funciona, Potter.

— Mitrica. Sou seu lorde agora lembre-se disso – e riu convencido, levantando a mão para que seu anel de lorde fosse visível.

Lakroff novamente revirou os olhos:

— Arrogante.

— Enfim, se Sirius é o guardião, ele não pode mais lutar, não pode se pôr em risco, se ele morre, todos da ordem se tornam guardiões do segredo e o traidor pode vazar a informação. Correto?

— Sim, mas não entendi seu ponto ainda.

— Eu conheço cada um dos meus amigos, não sou idiota, mesmo que eu aja como um as vezes. Sei como cada um funciona e consigo calcular variáveis baseadas em seus comportamentos padrões. Se eles não agirem como o normal, então é digno de suspeita.

— Você assume que conhece tão bem eles que se não agirem como você pensa então é porque mudaram quem são?

— Basicamente. Por melhor ator que esse maldito traidor esteja sendo, eu sei qual seria a reação normal de cada um. Remus é inseguro e nunca aceitaria parar de lutar, ele acha que deve aos amigos, não iria querer ser o guardião do segredo porque teria que se esconder e sabe que muitos desconfiam dele. Ele vai imediatamente negar. E vai me implorar para não dizer quem eu escolher. Sirius vai querer, mas quando eu argumentar sobre Harry, vai perceber que também vai ter que ficar escondido e isso não é para ele. Ficar parado. Isso o deixaria louco. Pedro é outro inseguro e argumentaria que Dumbledore é a melhor opção porque é aquele com menos chance de morrer. Dumbledore vai querer ser o dono do segredo porque é um convencido de merda.

— Você falou como Gellert agora.

— Se o ex também acha isso, então quem sou eu para negar? Enfim, vou dizer na cara dele que não o quero e ele tem que aceitar.

— Você acha que Albus pode ser o traidor?

— Não, mas quero ver quem ele sugere, vou desconfiar dessa pessoa também. Moody vai me xingar e apontar para alguma cicatriz dizendo que nem fodendo arruma outra para proteger minhas bolas, eu que faça isso sozinho. Ou peça para Dumbledore. Enfim. Todos têm personalidades que conheço bem. Se eles agirem fora do personagem eu vou descobrir o traidor.

— Você confia demais na sua habilidade de ler seus amigos.

— Ela não falhou até hoje.

— E o que pretende fazer quando descobrir?

— O que? – James riu. – Se Lily não mudar de ideia até lá, bem... – mas não continuou.

Lakroff estreitou os olhos para o Potter de forma muito desconfiada.

— James... o que vocês estão pensando?

— Em dar ao traidor exatamente o que ele quer.

— Voldemort os atacará com um exército!

— Aí que está. Ele não vai. Ele vai querer me matar com as próprias mãos. Se souber quem eu sou. Souber quem é Harry.

— E você acha que vai vencê-lo?

De novo uma risada. Essa tinha ainda menos emoção que a anterior. Ou tinha tanta emoção que transbordava até ser ilegível. Era um pouco insana, se Lakroff tinha algo a dizer sobre aquele som.

Lembrou-lhe de Gellert.

Uma mariposa motivada, era uma mariposa olhando para a luz da morte.

— James.

— Vamos vencê-lo. Em seu próprio jogo. De um jeito ou de outro.

— Isso não... – mas não conseguiu terminar, James o interrompeu.

— Só preciso fazer meu feitiço até lá. Você tem que me ajudar.

Lakroff bufou. Aquele garoto era muito obtuso e cabeça dura, não conseguiria convencê-lo a voltar a esse assunto se não tinha a intenção. Seu objetivo era Regulus, então apenas nisso iria se focar, não importa o quanto Lakroff tentasse voltar para o plano dele de derrotar o lorde das trevas e salvar seu filho.

Era frustrante lidar com mariposas, mesmo aqueles que não nasceram na família.

Talvez os Potter fossem muito parecidos para o próprio bem da linhagem.

— Gellert é o necromante.

— Você sabe algumas coisas.

— Ele é melhor. Aprendeu muito mais.

— Estamos perguntando a ele também, mas uma segunda opinião não fará mal. Eu tenho pouco tempo.

— Pouco tempo você diz...

James bateu o livro que estava lendo ao fechar e uma névoa fina de poeira o fez tossir novamente.

— Regulus precisava ser salvo logo – continuou. – Os médicos bruxos tem uma forma de manter uma pessoa entre os vivos enquanto tentam reanimá-la, não? Um jeito de prender a alma antes que ela vire fantasma. Preciso fazer um feitiço desses de longa duração, por garantia. Caso eu não consiga ajudá-lo a tempo, alguém pode conseguir salvá-lo. Lily disse que os trouxas voltam de comas mesmo sem uma magia dessas, mas concordou que se eu tiver como fazer algo parecido deveria, mas também tenho que considerar se não é perda de tempo quando eu deveria me focar na contra maldição logo.

— James?

— Lakroff, nós dois sabemos que seja lá qual for meu plano, você não tem como me impedir, então vamos focar no que eu preciso e não no que eu vou fazer que você pode ou não desaprovar?

— Malditos Grindelwald, você é o lorde Mitrica, um chacal e não uma mariposa, garoto.

— Neste tempo, Lakroff, somos os dois – sorriu.


Capítulo 04 ­— Cabeça cheia e boa companhia


"O amor é complicado e imprevisível, é difícil entendê-lo e às vezes nem percebemos se formando, como uma planta que se esgueira pelo cimento rachado criando raízes e destruindo o chão para conseguir mais espaço

O amor vem em diferentes formas e não é preciso reconhecê-lo para apreciar sua beleza ou sua companhia".


05/12/1994

Era sábado de manhã e Harrison tinha muita coisa na cabeça.

Quando é que ele não tinha, afinal?

Terminou sua corrida diária antes dos amigos e imaginou que logo a neve estaria profunda demais para que continuassem o costume pelos terrenos de Hogwarts, até mesmo as fãs de Viktor que esperavam para vê-lo chegando suado após o exercício vieram em menor quantidade. Uma pena (sobre a neve) já que gostava do ar nos pulmões para começar o dia.

Foi para o barco que rangia em cima da água gélida do lago escuro, tomou um banho demorado devido ao cérebro trabalhando como um louco e se distraiu do horário até ver Ivan saindo e perceber que já tinha passado da cota. Seus dedos estavam até mesmo enrugados.

"Lakroff já tem muito o que pensar e você também. Às vezes... só não dá para salvar todo mundo" as palavras de seu bisavô ecoavam em sua cabeça todo momento que suas ideias se viam em uma encruzilhada, se vestiu quase no automático e foi para o grande salão da mesma forma.

De certa forma o pegou desprevenido que no instante em que se sentou para tomar seu café da manhã, Luna agarrou sua mão e apertando com força:

— Não há nada que você não consiga fazer sem esforço, alteza, mas nós dois sabemos o que acontece quando fica com a cabeça tão lotada de zonzóbulos.

O garoto sentiu como se um caminho fosse aberto no meio de todo barulho em sua mente, não completamente aplacado, mas suportável agora, enquanto olhava para a preocupação nos olhos da menina mais jovem.

Ele decididamente não queria preocupá-la.

E se ela estava cautelosa com seu estado, bem, talvez devesse dar um jeito naquilo.

Ao menos aquele caminho aberto permitiu que toda a energia tensa que se acumulava por ele fosse para o peito, em formato de carinho intenso pela amiga. A qual puxou as mãos e levou aos lábios, para um beijo delicado e grato.

Sabia que era um sentimento volúvel, por mais que já o tivesse ajudado com isso antes, Luna não conseguia impedir que logo estivesse borbulhando em pensamentos de novo, estava assim desde o começo da semana e, por Morgana LeFay, estavam apenas na primeira semana de dezembro.

"Muita coisa ainda vai acontecer" tanto Harrison quanto Luna pensaram e sabiam, olhando um nos olhos do outro, que era uma conclusão compartilhada.

Harry tinha que saber lidar com aquilo, de um jeito ou de outro. Suspirou e acrescentou, com um ar jocoso:

— Esses zonzóbulos... Acho que preciso de um pesticida.

Os amigos envolta sem dúvidas estavam confusos, atentos a conversa e a troca de olhares dos dois, mas incapazes de entender exatamente do que se tratava.

Eles eram pessoas "comuns" no fim. Não tinham Nargles. Nem Shinisus.

Pansy Parkinson estava encarando Harrison quase com a mesma fúria que encarou Ivan Tshkows ontem, na primeira refeição que tiveram depois que a fofoca de Luna como seu par já tinha se espalhado.

Lovegood sorriu, alheia a isto:

— Pesticida não – murmurou pensativamente para Hazz. – Acho que precisa de cookies.

O menino teve que rir e olhou para a mesa, à procura de alguns cookies para seu café da manhã.

Notou, para seu espanto, que não havia nenhum.

Era uma dica então?

— Os gêmeos sabem onde pode conseguir – explicou a menina.

Sim, era uma dica. Harrison acenou:

— Vou pedir a eles. Todos sabemos que nada melhor para espantar zonzóbulos do que gotas de chocolate.

— Só não se esqueça de comer antes de dormir, para ter certeza de que eles não vão entrar nos seus pesadelos.

— Sim, minha lua.

Novamente, como se já estivessem se acostumando, e talvez fosse o caso, afinal já haviam tido daquilo por um mês a este ponto, ninguém entendeu do que aqueles dois estavam falando então apenas ignoraram.

Era como se tivessem inventado a própria língua, mesmo que a base fosse o inglês, não compensava perder o tempo tentando entender o que se ocultava ali.

Para a maioria.

Alguns ainda tentavam inutilmente.

Àqueles que aceitavam a troca como era, assim que viram que o assunto tinha se encerrado e a garotinha começado a fazer seus pratos e Harrison começado a beber seu café, já passaram a se movimentar para incluí-los em suas próprias conversas.

Havia uma coisa nova naquele café da manhã, entretanto.

Mesmo que fosse fim de semana, Harrison ainda era uma incomum sem as habituais pilhas de folhas de documentos do conselho à sua frente. Portanto era uma oportunidade. Os sonserinos como moscas a sua volta começaram a zumbir, visualizando uma chance.

Uma oportunidade para se fazerem ouvir pelo lorde e famoso Harrison Peverell-Potter.

Draco, já nem de longe em sua primeira vez, escolheu assistir.

Alguma coisa tinha acontecido dentro de si desde que viu Hazz contra a parede, alguma sensação de que não precisava se esforçar como os outros, ou pelo menos não jogar o mesmo jogo. Não precisava dançar à sua volta para que Potter o olhasse.

Draco Malfoy tinha a total atenção de Harry Potter se quisesse.

Por algum motivo.

Duas semanas depois do ocorrido e ainda sentia que não precisava ser mais, fingir ou sapatear como um bobo da corte para que o bruxo ouvisse o que tinha a dizer. Precisava apenas descobrir a razão daquilo. O que Potter via nele? O que queria dele?

Ele perguntou, mas o menino em questão não o respondeu... tinha ficado sem palavras rapidinho para alguém que sempre tinha muito a dizer, ria Malfoy.

Mas então, em proporção semelhante, haviam perguntas a fazer para si próprio.

O que ele via em Potter?

Era uma lista extensa, mas havia algo além que sentia estar ali, mas não conseguia nomear.

Porque sempre que todos estavam competindo por sua atenção, seus olhos ainda se encontravam e eles conseguiam rir daquilo sem emitir nenhum som?

Como sabiam o que estava acontecendo, mesmo sem dizer?

E não diziam. Duas semanas e a comunicação verbal entre eles ficou bem escassa. Não sabia o que houve por parte do Potter. Provavelmente estava reagindo ao próprio Draco ter se afastado, mas não tinha muita escolha.

Não sabia o que fazer com sua própria cabeça confusa.

Imagens de Harrison passavam por sua mente com tanta frequência que era como se uma foto dele tivesse sido colada dentro de suas pálpebras e provavelmente a culpa era dos seus colegas da Sonserina, que não tiravam mais o nome dele das bocas.

O salão comunal de Slytherin era quase que um bate papo constante sobre Potter.

E os jornais.

Não podíamos esquecer dos jornais.

Ele era o centro de tudo e a mente de Draco acompanhou isso, é claro, não tinha nenhuma outra grande motivação para estar sonhando com o garoto. Certo?

Mesmo assim...

Malfoy inspirou fundo e desviou o olhar, louco para ter qualquer outra coisa na cabeça que não aquele menino.

Ele viu os alunos da lufa-lufa na mesa atrás, percebeu alguns dos bottons que tinha feito de "Potter fede" e riu baixinho.

Potter tinha um cheiro ótimo que ficou preso na cabeça do loiro por dias.

E Diggory não tinha a menor chance contra ele.

Mas os lufanos podiam ter seu pequeno momento sob o sol da esperança. Quer dizer, ao menos seu campeão tinha sido escolhido para tentar se igualar ao lorde Peverell-Potter. Sintam-se honrados pelo elogio. Um prêmio de consolação.

Draco tomou um gole de seu chá e segurou-se para não rir abertamente das tentativas do grupo de Adrian Pucey para conseguir engatar um assunto que interessasse Harrison.

Patético, realmente a única vantagem que tinham era estar no mesmo ano escolar, do contrário Draco já teria ganhado a competição pela liderança da casa. Ou, ao menos, estaria competindo apenas com Félix, que conseguia vez ou outra se infiltrar e chamar a atenção do presidente do conselho da Durmstrang.

A mesa dos professores estava cheia, exceto pela cadeira de Alastor Moody que ainda estava adoentado e em contato com Dumbledore, pelo que se sabia. O diretor estava presente e sem a mancha preta no rosto, e Bins... Draco notou que o professor fantasma não havia comparecido a nenhuma refeição a tempos. O que será que mudou sua rotina?

Estava distraído e entretido com o que ouvia aqui e ali na mesa, como estavam em um sábado as coisas tinham um ar de diferença.

Alguns dos amigos de Potter não vieram, Viktor Krum e Heinz Horváth, por exemplo, não apareceram até então. Ivan e Axek tinham ido para a Corvinal falar com Rusev Spasova, do comitê de disciplina, e Neville Longbottom tinha feito o favor de sentar-se na Grifinória pela primeira vez na semana em um horário como aquele, aparentemente estava discutindo com Weasley, enquanto Granger ou a Weasley fêmea não davam o ar da graça.

Aquela disposição incomum permitiu mais espaço para os sonserinos tentarem sentar perto de Harrison e buscar sua própria chance de alcançá-lo.

Nenhum foi tolo de simplesmente tomar um lugar diretamente ao seu lado ou na sua frente se já não fossem parte do grupo de sempre, mas Draco, por exemplo, estava estranhamente mais próximo do que o habitual do grupo de Rosier e Gemma Farley, a poucos assentos de Pansy.

Abelhas atraídas por mel.

Ou por uma abelha rainha...

Realmente interessante de se assistir de fora.

O fazia perceber algumas coisas e poderia até aprender com aquilo. O movimento das cobras mais velhas.

Félix foi brilhante em sua própria abordagem, conseguindo não só se incluir de repente, mas também diminuir Adrian ao um homem qualquer que ele era, tudo com alguns poucos comentários sagazes.

Ele e Blaise falavam animadamente com Potter quando a correspondência chegou e trouxe um novo assunto.

Primeiro foram algumas, depois mais e mais corujas passaram a rodopiar pelas cabeças do grande salão, baixando-se a frente de seus donos deixando os jornais ou, e o que mais interessava a Sonserina atualmente, "O Pasquim".

Foto de capa: uma montagem com ilustrações de Hogwarts, Durmstrang e Beauxbatons, um pássaro voava de uma escola para a outra girando pelas torres dos castelos.

Manchete principal: As diferenças entre as escolas participantes do torneio tribruxo e o que as levou a se juntar para um torneio mortal.

Outras matérias mencionadas na capa que giravam e trocavam de lugar eram: "Como funciona o sistema de conselho estudantil e como Harrison Potter se tornou presidente tão jovem".

"Eletivas! Como matérias opcionais podem mudar totalmente o sistema de ensino das escolas".

"NOMs e NIEMs, como alguns alunos podem adiantar suas provas e algumas dicas para passar com louvor".

"Quais as provas que representam os NOM e NIEM pela Europa e suas maiores diferenças. Existe um sistema para converter as notas?".

"Curiosidade: O que o ministro tem a dizer sobre a próxima tarefa do torneio?"

"Entrevista exclusiva com o diretor da Durmstrang e suas apostas para vencedor tendo dois competidores".

Harrison quase gemeu de frustração com esta última enquanto pagava a coruja que lhe entregou seu exemplar.

Luna riu:

— Meu pai disse que não precisa se preocupar, alteza, ele não foi tão intragável quanto poderia.

Harrison duvidava:

— Acho que ele é burro demais para não ser intragável.

Alguns em volta riram.


-x-x-x

Neville, na Grifinória, estava tendo dificuldades em achar alguns galeões para pagar sua edição d'O Pasquim e a ave começou a ficar impaciente, por isso lhe deu uma de suas fatias de bacon para distraí-la.

Ron olhou para os dois lados:

— Onde está Hermione? O jornal dela está esperando.

— Eu pago pelo dela – Neville dispensou se levantando para conseguir achar melhor o dinheiro e pagar agora um total de três aves. Dois exemplares d'O Pasquim e um Profeta.

Quando enfim entregou o valor aos bichinhos, elas estavam bem inquietas, mas satisfeitas o bastante com os lanchinhos para não o picar antes de se retirarem.

Talvez as corujas d'O Pasquim fossem menos agressivas que as do Profeta também, já que esta foi a que o encarou com o olhar mais odioso.

Neville suspirou de alívio que seus dedos foram poupados e se sentou, virando-se para Ron:

— Alguma coisa interessante?

O amigo já tinha pego e estava lendo o jornal, mas resmungou para Nev antes de responder:

— Não pense que nosso assunto acabou.

— Pelo amor de Merlin, Ron! Já disse que só queria ir como amigo com sua irmã. Não precisa fazer todo esse drama. Eu chamo outra pessoa!

— É Ronikins, não precisa de todo esse drama – disse um dos gêmeos, quando eles e Lino Jordan tomaram lugares à frente da dupla.

— Ela é nossa irmãzinha e nem tem idade para ir ao baile! O que vocês dois estão fazendo aqui?! Vão para lá! Chô!

Fred, Neville supôs, se levantou e acertou um tapa na cabeça do irmão, foi tão rápido que Ron não conseguiu desviar e fez um barulho alto.

Enquanto Lino ria e murmurava: "amor de irmãos" o outro gêmeo comentou:

— Gina pode ir ao baile se quiser, ficamos de olho nela e você não fale assim com a gente ou te acerto outro.

— Vai a merda, Fred.

— Sou o George – disseram os dois.

Ron mostrou o dedo do meio para ambos. Uma mão para cada gêmeo.

— Bom dia meninos – Neville preferiu apaziguar a situação.

— Oi pequeno leão – disse um deles e o garoto teve quase certeza de que era George.

Quase.

Ron ainda não estava satisfeito:

— Temos coisas importantes para falar, vocês estão atrapalhando.

— Como se alguma coisa importante entrasse nessa cabeça oca – resmungou Fred.

— Olhe quem fala – retrucou e abaixou-se imediatamente quase para baixo da mesa, para se prevenir de qualquer tapa.

Que não veio.

Lino riu.

Neville negou com a cabeça, divertido:

— Não seja assim, Ron.

— É, não seja assim Ronikins – concordou Lino. – Então você queria convidar Gina, Neville?

— Sim, e sugeri que Ron chamasse Hermione, mas agora os dois brigaram e Mione nem veio tomar café conosco.

— Ela estava confraternizando com o inimigo!

— Por favor! – bufou. – Hazz não é inimigo, nem Viktor! Você nem torceu por Diggory naquela maldita competição, pare de ser hipócrita!

Lino estreitou os olhos:

— Por que "confraternizando com o inimigo"?

Neville fez o favor de explicar:

— Hermione foi convidada por dois meninos da Durmstrang.

Ron abriu os braços indignado:

— E aceitou! Além de que não quer me falar com quem foi!

— Dois? – perguntou George acenando positivamente com a cabeça. – Ela está com tudo. Perdeu Ron.

O mais novo imediatamente corou com aquele comentário e negou a cabeça, desconversando:

— O que quer dizer com perdeu?

George revirou os olhos e pegou uma torrada:

— Você é muito burro para entender, pelo jeito, não compensa explicar.

— Nos deixem em paz!

— Não – disseram os gêmeos e Lino.

— Bom dia meninos – cumprimentou Hermione, que acabara de chegar e se sentar ao lado de Neville. – Ronald. – acrescentou de forma ríspida.

Os três mais velhos riram e zombaram de como ele foi excluído do bom dia.

A garota ignorou revirando os olhos e sussurrando "meninos" enquanto olhava a mesa:

— Meu jornal e a revista chegaram?

— Aqui.

Neville foi pegar o jornal, mas Ron o puxou teimosamente para o outro lado:

— Estou lendo.

Hermione bufou.

Fred riu e olhou para Mione:

— Parabéns senhorita Granger, arrasando corações.

A menina corou e coçou a garganta, decidindo que seu café da manhã era mais importante naquela hora:

— E o que fazem aqui meninos?

— Agora só perturbando nosso irmão.

Hermione olhou para Neville, que esclareceu:

— Ron estava falando sobre a teoria do Karkaroff de novo. E sobre como eu não deveria convidar Giny.

Ron arfou:

— Neville!

— O que?

Fred inclinou a cabeça curioso:

— Teoria do Karkaroff?

— Nada que seja da sua conta!

Hermione tornou a revirar os olhos:

— Não seja infantil, Ronald.

— Pensei que você não estava falando comigo – retrucou ainda mais infantil.

— Eu deveria parar mesmo, você é uma criança.

— E você é uma traidora.

Bufo:

— Ah, por favor!

— É! – exclamou um dos gêmeos. – Por favor, Ronikins, só porque você não tem ninguém te convidando.

— E provavelmente nenhuma menina que aceitaria mesmo se fosse convidada – acrescentou o outro gêmeo.

— Não precisa ser um chato com quem tem – disseram ambos.

— Vão pastar!

— Vai você – retrucaram.

— E por acaso um dos dois patetas já tem um par?

Os meninos se olharam e deram de ombros:

— Não.

— Ah! Não podem zombar de mim, são dois idiotas sem par.

Fred bufou com aquilo e olhou para Lino:

— Me empresta um pergaminho seu?

Lino revirou a bolsa e achou a coisa entregando para Fred, que amassou em uma bolinha e arremessou direto no ombro de Angelina Johnson um pouco mais adiante.

A menina, que estava conversando com Alícia e Kate da equipe de quadribol, além de Lara Dimitrika da Durmstrang, olhou para o garoto meio indignada, meio confusa.

Fred gritou para que ela pudesse ouvir daquela distância.

Sinceramente, boa parte do salão comunal também:

– Oi! Angelina!

– Que foi? – perguntou em resposta.

– Quer ir ao baile comigo? – perguntou pausadamente e fazendo uma dancinha de mímica que tirou risadas do grupo que o acompanhava.

Angelina lançou um olhar a Fred como se o avaliasse e levou um instante para responder:

– Tudo bem – depois tornou a se virar para as amigas, retomando a conversa com um sorrisinho no rosto.

– Pronto – disse Fred a Rony –, moleza.

Ron lhe mostrou o dedo do meio de novo, que foi prontamente retribuído pelos dois gêmeos.

Haviam três dedos do meio agora e Hermione resmungou desagradada:

— Parem com isso, estamos na mesa!

— Claro, mãe! – provocou Ron.

Hermione não lhe deu atenção.

Lino se inclinou para mais perto no centro da mesa:

— Que história é essa de teoria do Karkaroff?

— Não vamos contar a vocês! – espantou-se Ron.

— Por que não? – perguntaram os meninos.

Neville deu de ombros:

— É. Qual o problema, Ron?

— O problema é que eles são uns intrometidos e não deviam estar aqui.

— Viemos porque queremos Pichitinho emprestado – explicou George.

Pichitinho era a coruja nova que Sirius dera a Ron como agradecimento pela ajuda no ano passado.

— Ficamos porque você é um idiota e despertou nossa curiosidade – continuou. – Silencie ela e vamos embora.

— Não vou emprestar Pichitinho. Por que vocês querem?

— Porque George quer convidar sua coruja para ir ao baile – disse Fred sarcasticamente.

— Porque nós gostaríamos de mandar uma carta, seu panacão – retrucou George bufando.

Ron cruzou os braços:

— Para quem é que você tanto escreve, hein?

— Não mete o nariz, Rony, ou vou queimar ele para você – disse Fred, acenando a varinha num gesto de ameaça. – Então, teoria Karkaroff?

— Vamos – incentivou Hermione. – Não há mal algum dizer e eles vão ser mais insistentes se não dissermos nada.

Ron arfou de frustração:

— Está bem – e começou a explicar a teoria que o trio tinha de que Igor Karkaroff tinha colocado o nome de Harrison no cálice.

Hermione e Neville liam por cima o jornal de sábado que repetia e dava novas informações sobre o incidente no ministério e como a névoa misteriosa ainda não tinha sido dispersa mesmo com o passar dos dias.

— Se encaixa direitinho, não é! – dizia Ron. – Malfoy disse no trem para nós que o pai dele era amigo de Karkaroff. Já sabemos que estavam correndo mascarados na Copa Mundial. Só que Karkaroff está marcado como traidor, você sabe quem vai querer sua cabeça, a menos que talvez ele elimine o seu maior desafio, o menino que sobreviveu. Isso explica porque eles não se dão bem. Harry sabe que foi ele, só não tem como provar. Mas vou dizer uma coisa, se foi Karkaroff que pôs o nome de Harry no Cálice de Fogo, ele agora vai estar se sentindo muito idiota, não acham? Não funcionou. Ele não levou um arranhão de um dragão, o que faria diferença depois disso?

— Teoria interessante – murmurou Fred, não parecendo nem um pouco interessado. – Será que você deixa de ser um idiota e nos empresta Pichitinho? Te damos uma recompensa se deixar.

— Que tipo de recompensa?

— Que tal vestes a rigor melhores? Assim talvez consiga um par decente.

— Ou não envergonhe ainda mais a pobre coitada que aceitar ir com você – levantou George.

— E como é que vocês vão comprar?

— Se nos emprestar a coruja, nós daremos um jeito, deixe de ser insuportável.

Os gêmeos não queriam usar uma coruja de Hogwarts e nem a belíssima Edwiges de Harrison para conseguir alguns ingredientes para seus novos projetos de pegadinhas enquanto esperavam o próximo processo da poção de sua alteza terminar com o tempo de cozimento para os próximos passos.

Dito isso, todos sabiam como Rony reclamou no fim do verão de suas vestes a rigor e como tinha dito que preferia andar nu. Era uma troca justa, uma vez que Harrison estava pagando bem aos gêmeos e poderiam ajudar os irmãos sem levantar suspeitas.

Gina aceitou contar-lhes como tinha conseguido terminar e usar a pegadinha do fogo em troca de um vestido melhor para o baile.

Que ela estava decidida a ir com Neville desde que essa informação chegou a si, Ron Weasley querendo ou não, ela não ia perder a oportunidade de ir só por causa do ciúmes do irmão e os gêmeos não eram contra.

O menino pensou por um tempo, mas aparentemente sua repulsa pelas vestes era pior do que por ajudar os irmãos:

— Está bem.

— Ótimo – se levantaram.

Fred acrescentou:

— Só não conta para a mamãe.

— Fechado.

George ainda olhou para Hermione, lembrando-se de outro detalhe:

— Aqui Hermione – e lhe entregou um pequeno rolinho de pergaminho. – O que você pediu.

— Obrigada meninos.

Quando eles já estavam longe seus amigos a encararam.

— O que é isso? – perguntou Ron.

A menina deu um sorriso que imediatamente os fez se arrepender de perguntar:

— A localização de algo que eu preciso conferir e vocês vão vir comigo.

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— Se eu não gostasse tanto da sua companhia já estaria te mandando para fora. Vir sábado para um bar é uma coisa, mas sábado de manhã?

Minerva encarou Aberforth que sorria para ela com sua brincadeira e a bruxa apenas revirou os olhos, se sacudindo para tirar a neve das vestes e seguindo para acompanhar o amigo, que foi até o balcão.

Aberforth se abaixou para pegar um copo novo, que comprou na cidade a alguns dias depois que percebeu que Minne e suas visitas estavam mais frequentes e mereciam uma louça adequada.

Era o copo dela, escondido e longe dos outros.

— Bom dia para você também, Aberforth.

— Dia, Minie. O castelo é tão sem graça aos sábados para vir me visitar?

— Talvez – provocou.

— É uma honra lhe servir de entretenimento neste sábado então.

— Pensei que fosse ficar rabugento por eu aparecer tão cedo.

— São onze horas.

— Para você é cedo.

— Você tem razão nisso – e riu. – Imagino que já tenha tomado café em Hogwarts?

— Sim.

— Aceita chá?

— E você tem?

— Surpreendente, não é mesmo?

Na verdade, essa era outra coisa que Aberforth tinha se ocupado em comprar naquela semana.

Tinha agora, na falta de informações de quais Minerva gostaria, um conjunto completo de chá que consistia em uma caixa com os mais diversos tipos de ervas guardadas em gavetas expansíveis e que preservavam a coisa. Haviam desde opções mais suaves, que parecia ser o tipo da mulher, até algumas mais fortes que o vendedor insistiu que faziam sucesso entre as mulheres.

— Do que gosta? – perguntou tentando soar despretensioso.

— Qualquer um que tiver.

Ele quase bufou:

— Sabia que nenhum bartender gosta disso? Se veio aqui ao menos escolha sua bebida, não deixe tudo nas nossas costas.

— Está bem, o que você tem?

— Só diga do que gosta!

— De maçã.

— Sortuda, eu tenho.

— E canela?

Aberforth fez uma careta:

— Que mistura, que bom que você vai tomar, não eu – e pegou uma jarra, enchendo com um feitiço de água e começando a aquecê-lo com outro.

Minerva já deveria esperar, mas ainda era surpreendente o uso de magia de forma tão habilidosa e despreocupada por parte do Dumbledore. Madame Rosmerta, no três vassouras, usava torneira e um fogão a lenha para preparar suas bebidas, nada como o que Aberforth estava fazendo naquele instante.

Logo a fumaça começou a subir indicando que a água estava suficientemente aquecida e Aberforth tirou um pequeno baú, ou caixa de baixo do balcão e abriu uma gavetinha, de onde tirou uma colher cheia de cada ingrediente e colocou por cima da água antes de guardar.

— Você deveria ter me oferecido chá nas outras vezes – comentou a bruxa.

Aberforth resmungou alguma coisa inelegível:

— Aceite o que tem ou não compro mais e vai ter que suportar o álcool. Isso ainda é um bar e você apareceu num horário que só os mais irritantes aparecem. Viciados estranhos e fedidos.

— Que agradável sua clientela.

— A maior.

Eles ficaram em um silêncio que o Dumbledore achou ser agradável enquanto terminava de preparar a bebida e buscava a peneira que tinha conseguido para segurar as ervas na chaleira. Depois de fazer tudo da melhor forma que conseguiu e deixar o copo na frente da mulher, percebeu então que o silêncio havia se estendido demais.

Aberforth finalmente se virou e olhou a amiga de forma direta, notando que estivera distraída encarando o copo.

Só faltava.

Estava quebrado?

Tinha algo de errado com ele, não é? Ou estragou o chá mesmo depois da explicação detalhada do vendedor de como fazer a coisa sem queimar as ervas. Ficou tão idiota que sequer conseguiu notar algo assim especialmente para a mulher?!

— Você comprou louça nova? – ela perguntou, após alguns instantes.

Aberforth quase corou. Quase. Conseguiu conter a reação com um bufo e uma caminhada até outro canto do balcão:

— Precisei – deu de ombros, para disfarçar. Sim, sim, ele apenas tinha comprado novas coisas para seu bar. Minerva não precisava achar que era especial.

Mesmo que fosse.

Muito.

— Entendo. Como foi sua semana?

— Geralmente quem vem em um bar é que precisa responder essa pergunta ao bartender. Não o contrário.

— Como se você fosse ouvir se qualquer um dos seus clientes começasse a desabafar.

—Você não é qualquer cliente.

Aberforth foi pego de surpresa pela própria fala, assim como Minerva, que lhe ofereceu um sorriso tão grato e simpático que ele não teve como disfarçar aquela frase. Deixou que ela ficasse como estava. Verdadeira e cheia de significados.

— Obrigada, Abbie.

— Não me chame assim em horário comercial – avisou.

— Tecnicamente você ainda não está no seu horário comercial.

— Você tem um ponto – sorriu.

— Não se preocupe, não vou usar seu apelido quando seus clientes estiverem aqui, Abbie, não está querendo que pegue?

— Merlin me livre, se um cliente engraçadinho achar que pode me chamar de Abbie.

— Você o jogaria para fora.

— Eu faria pior. Não sei que tipo de coisa me possuiria, mas alguma certamente. Ninguém poderia me chamar assim sem levar uma forte para casa.

Minerva riu:

— Então sou especial? Só eu posso te chamar de Abbie?

— Sim – admitiu antes que pudesse impedir.

Ele desviou o olhar e Minerva sorriu satisfeita, sem entender o quão especial ele tinha concordado que ela era.

Aberforth puxou seu banquinho, para ter o que fazer que não fosse entregar seu constrangimento e para ficar de frente com a bruxa:

— E então? O que te traz aqui hoje?

— O prazer de sua companhia não basta?

Aberforth riu abertamente:

— Até parece. Só não me diga que meu irmão aprontou de novo.

Minerva respondeu com um simples levantar de sobrancelha que já fez o Dumbledore bufar desagradável:

— O que foi dessa vez?

— Quer saber? Não sei se quero falar sobre isso hoje. Albus está me cansando, Aberforth.

— Bem vinda ao clube. Eu só precisei de uns dez anos para me cansar dele, mas tudo bem você ter levado décadas a mais.

— Não seja um chato sobre isso.

— Quer falar sobre o que? O que aquele jornaleco publicou hoje? – se perguntou apontando a varinha até a mesa onde uma coruja sempre largava um exemplar para ele. – Accio Profeta Diário – e a coisa voou até ele.

Minerva suspirou, soprando o ar quente de sua caneca:

— Incrível como o assunto se volta para ele de novo

Aberforth franziu o cenho:

— Meu irmão soltou esse peido mágico no ministério por acaso?

De alguma forma, a bruxa conseguiu não rir nem engasgar com seu chá:

— Peido mágico?

— Desculpe, mas é uma forma de resumir "névoa opaca densa mágica desconhecida e cegante". O que aqueles caras na sessão de mistérios estavam pesquisando dessa vez afinal?

— Vá saber, mas seu irmão acredita que não tenha sido culpa do ministério.

— Como assim?

— Aparentemente ninguém no ministério está se responsabilizando por isso. Estão tratando como uma invasão, alguém querendo roubar uma das informações do ministério.

— Mesmo? E o jornal não noticiou uma invasão?

— Parece que Lucius Malfoy conversou e pagou o jornal para tratar como um incidente e ignorar quem disse que foi invasão, mesmo que os Aurores estejam tentando descobrir a fonte daquilo.

— Lucius Malfoy?

— Sim.

— É, isso torna a coisa mais suspeita.

— Ele pode estar apenas querendo fazer mais contatos no ministério para se eleger em algum cargo. Talvez até esteja querendo concorrer com Crouch para Ministro ou querendo colocar alguém mais ligado ao seu partido.

— Talvez, mas não é a teoria do meu irmão, imagino.

Minerva bufou:

— Não.

— Manda, estou preparado seja lá pro que for.

— Ele acha que é Voldemort.

— Merda – e riu, riu primeiro um pouco, depois caiu na gargalhada, negando com a cabeça e prensando a barriga, bem humorado.

— Aberforth!

— Voldemort soltou um peido mágico no ministério.

— Aberforth! – reclamou mais incisiva.

— Desculpe – mas ele continuava rindo. – O que foi? Ele acha que é um plano do Voldemort invadir a sessão de ministérios para achar um jeito de voltar a vida?

— Não – e suspirou. – Albus pensa que Voldemort mandou os comensais pegarem a profecia.

— Por quê?

— Porque a fumaça começou no hall das profecias.

— Sério?

— Não foi confirmado nada, mas Albus deduziu pelas pistas que juntou indo no ministério esses dois dias.

— Que bom uso do seu tempo como diretor – murmurou.

— Foi melhor assim. Os aurores conseguiram desfazer um feitiço que tinha manchado a cara dele de cinzas.

— O que?

— Algum aluno colocou uma pegadinha flamejante na sala dele. Uma complicação.

E explicou ao homem tudo que havia acontecido, ou tentou, entre as várias risadas que o irmão mais novo dava ao imaginar seu mais velho preso a uma situação como aquela.

Minerva quase perdeu a paciência ou a vontade de estar com o amigo neste meio termo, se vez ou outra ele também não a fizesse rir com o que dizia.

— Então não foram os gêmeos?

— Tudo indica que não.

— Nenhum suspeito?

— Nenhum.

— Isso é péssimo para o pobre Albus – e não parecia nem um pouco pesaroso. Pelo contrário, estava sorrindo bem feliz.

— Ele terá que arrumar roupas novas.

— Espero que sejam decentes agora, mas então. Voldemort, hein?

— Então – suspirou com pesar. – O que você acha?

— Eu?

— Sim. É muita loucura ou não?

— Sinceramente não sei Minnie. O cara conseguiu possuir um professor como espectro e invadir não só o banco como a escola que dizem ser a mais bem protegida. O ministério não me parece um tipo de desafio para ele e se tem um lugar que pode ter alguma informação sobre como voltar é a câmara da morte, mas a profecia? Me parece mais uma forma de distrair os outros do principal objetivo.

— Acho que sua teoria é mais crível do que seu irmão.

— O que Albus acha que Voldemort iria querer com a profecia?

— Saber quem faz parte dela.

— Harry Potter, isso não é óbvio?

— Dois meninos podiam assumi-la.

— Bem, sim, mas o idiota não marcou Neville.

— Ou fez? Não sabemos, os dois se enfrentaram nos primeiros dois anos do menino e no terceiro ele conseguiu levar a justiça um dos poucos comensais que tinha o disfarce quase perfeito.

— Vocês acham que a profecia pode ser dos dois de novo?

— Sim.

— Mas Voldemort, numa oportunidade de invadir o ministério, ia priorizar isso?

— Ele pode ter feito os dois. Ninguém consegue andar dentro da névoa.

— Isso o jornal não falou.

— Albus descobriu. Estão todos preocupados, os indizíveis não podem trabalhar. A névoa é tão densa que não suportam ficar nela por muito tempo, além de não enxergarem nada quando estão nela. É magia pura, mas também suspeitam que seja uma poção. Uma bomba de fumaça, Albus disse.

— Isso é um tanto suspeito. Esse tipo de coisa realmente é o tipo que meu irmão tomaria por sinal de ataque.

— Aberforth, é pior do que parece, ele está pensando em chamar os membros da Ordem.

— As malditas galinhas, já? Meio cedo.

— Você é uma das "galinhas", se esqueceu?

— Enquanto meu irmão estiver envolvido, vou continuar fazendo questão de participar de alguma forma.

— Albus é sua motivação?

— Alguém tem que supervisionar ele antes que arruíne a vida de todos.

— O bom e velho amor que você tem por seu irmão. Sempre belíssimo.

— Um encanto sem dúvidas. Me conte mais. O que ele descobriu? – e se inclinou, bem mais interessado.

— Ele pediu para Kinglsey Shacklebolt garantir que seria um dos aurores a averiguar a situação e vem mandando dicas de feitiços que poderiam dissipar a coisa.

— Nada funciona.

— Não, Shacklebolt relatou que sente enjoo quando fica muito tempo próximo da coisa, como se fosse magia e a sua não reagisse bem a ela. O cheiro também parece incomodar e foi relatado que todos parecem mais inconstantes, emocionalmente afetados. Mas talvez seja só frustração por não estarem conseguindo nada já a dois dias.

— Imagino que Shacklebolt esteja mandando relatórios sobre todos que entram e saem.

— O problema são os indizíveis.

— É claro.

— E o ministro se convenceu de que seja lá quem puder ajudar a parar aquela coisa, está convidado a tentar.

— Comensais.

— Exatamente. Lucius Malfoy foi o que mais durou dentro da névoa, infelizmente.

— Suspeito, realmente – suspirou, se inclinando para trás e olhando para o teto. – Não gosto quando meu irmão está certo – sussurrou.

— Você acha que ele está certo?

— Voldemort quase voltou na última brincadeira de Lucius Malfoy nesta escola, se tiver algo que ele quer no ministério... Lamento dizer, mas existe uma chance real de estamos diante de um problema.

Minerva não queria aquela resposta.

Ela não precisava disso agora, não Voldemort. Não as sombras de uma guerra. Aquilo só justificaria as ações de Albus. De novo. Ele seria o perfeito soldado como sempre foi e as pessoas perdoariam suas falhas como se fossem apenas isso, não crimes, pois era mais importante o bem da nação.

Voldemort era mais importante do que um professor lendo uma mente de aluno para tentar salvar outro e toda aquela besteira. Potter e a profecia eram mais importantes do que Dumbledore mentir para ele para tentar convencê-lo ao nosso lado.

Tudo se tornaria irrelevante.

E talvez... para Minerva também.

Ela não podia derrubar Dumbledore quando ele era a única coisa que mantinha Hogwarts e seus alunos totalmente seguros contra aquele monstro. O que ia fazer? De quantas pistas precisava antes de realmente tomar uma atitude?

Poderia continuar com o que estava fazendo com Sirius quando poderia causar mais mal do que bem?

Aquele que não deve ser nomeado só temia uma pessoa no mundo e essa pessoa era Albus Dumbledore.

Poderia estar fazendo um favor ao lorde das trevas acabando com a credibilidade de Albus.

Ou poderia estar confiando demais em Dumbledore para desistir de tudo na simples pista de Voldemort.

Podia ser tudo uma coincidência, não?

Aberforth não partilhava dessa opinião. Ele estava pegando uma garrafa de uma de suas bebidas mais fortes nas prateleiras atrás de si e abastecendo um copo.

— Aberforth – murmurou Minerva.

— Oi Minnie?

— O que está fazendo?

— Se vou ter que ter dores de cabeça por causa de um maluco homicida pela quarta ou quinta vez, então prefiro aproveitar o pouco tempo que ainda tenho.

— Um único ataque no ministério...

— Minnie, eu sei o que parece. Meu irmão é paranoico, mas tem um motivo para ele ser assim. O idiota já ignorou muitos sinais antes e evita-los no começo só causa destruição.

— Como se ele não fosse capaz de causar destruição em vão – resmungou cruzando os braços e virando o rosto para a porta.

Aberforth deu um bom gole em sua bebida e pensou bem antes de dizer qualquer coisa. Havia algo a mais que Minerva não estava contando, tinha certeza.

— Tem certeza de que não tem nada que queira me dizer sobre meu irmão?

— Não.

Ela não queria falar, mas tinha, Aberforth estava certo disso.

"Ah Albus, porque você sempre complica tudo?".

— Muito bem, e você o que está pensando de tudo isso?

Houve uma longa pausa antes que a mulher respondesse. Aberforth conseguiu dar mais três pacientes goles em sua caneca antes de ouvir qualquer coisa e a própria bruxa bebericou o restante de seu chá, pedindo silenciosamente para que fosse reposto. O que o bartender fez.

— Seu irmão leu a mente de um aluno.

— Sim.

— Porque já estava achando que o nome de Harrison Potter no cálice era um sinal de que você sabe quem estava envolvido.

— Sim.

— E precisamos de Potter para a profecia.

— Ou Neville. Preferencialmente os dois, imagino.

— São crianças, não deveríamos envolvê-los.

— Concordo totalmente, mas Voldemort irá atrás deles. Dos dois, para se vingar.

A bruxa abriu os braços:

— Devem ser protegidos, não envolvidos!

— Na medida do possível, é claro.

— Mas Albus está fazendo tudo errado com aquelas crianças.

— Albus sempre fez tudo errado! – resmungou abrindo os braços. – Com crianças? Principalmente.

— Ele é o diretor de uma escola... – choramingou.

— E levou perigo para seus alunos mais de uma vez, Minerva por favor. Ele não sabia o que fazer com crianças, como protegê-las desde Ariana – e tremeu, porque aquele assunto era duro para si.

Ainda tomou o resto de seu copo e metade de mais um. Minerva esperou pacientemente enquanto dava tempo ao Dumbledore.

Talvez fosse a bebida, ou a raiva, seja lá o que motivou Aberforth, mas ele acabou sussurrando:

— Até aquele filho da puta era melhor com as crianças.

— Como?

— Nada – ele bebeu mais.

Minerva encarou o amigo preocupada, sua expressão estava daquela forma azeda que fazia quando estava lidando com um bêbado especialmente chato, algo o estava incomodando.

Ela suspirou. Se ele não queria falar, o que podia fazer?

Mas ainda era curiosa:

— Qual filho da puta?

— Ninguém, Minerva.

Oh... ele usou seu nome, pensou.

— Grindelwald?

A careta horrível e outra virada de caneco provou que estava certa.

Ele encheu uma terceira e, para alguém dono de um bar, já estava com as orelhas vermelhas quando fez, o que com o coque que prendia seu cabelo deixava bem claro:

— Ariana gostava dele... – sussurrou de novo, como se não gostasse daquelas palavras.

— Mesmo? – e não disse mais nada. A situação era claramente delicada.

— Eu não confio no meu irmão com muita coisa Minerva, mas ele aprendeu a ver o perigo onde há. Ele nunca foi muito de limites e sutileza não é um de seus vários nomes, a forma como ele lida com as coisas não é a melhor, mas estamos com essa droga de fantasma nas florestas da Albânia a anos, essa coisa que invade Hogwarts e tenta roubar a pedra filosofal, toma sangue de unicórnio ou usa um diário embutido com magia sombria que poderia trazer uma memória a vida. De repente o nome de Potter aparece num torneio mortal que ele jura não ter se inscrito e tem a marca negra.

— Seu irmão te contou?

— Sim. Como a marca do Sinervolos.

— Severus.

— Tanto faz, como a marca está mais escura, mais viva, como parece que seu antigo mestre está por aí de um jeito que não pareceu mesmo nas últimas tentativas onde ele chegou a matar uma aluna. É preocupante.

— Entendo... – ela murmurou, porque era tudo o que conseguia dizer.

Aberforth ficou em silêncio junto dela, ambos apenas bebendo de seus copos e pensando.

O mais velho olhou pela janela e assistiu a neve cair, distraído, preso de repente em lembranças.

Provavelmente era a bebida.

Sua boca falou muito antes de sua mente registrar:

— Lembra-se de quando me perguntou o que de pior Albus já tinha feito?

Ele se arrependeu no mesmo momento de ter dito aquelas palavras. Sabia agora que Minerva não sossegaria até descobrir aquela informação e ele não estava disposto a falar sobre isso.

Nunca mais.

Teve uma briga com Albus sobre isso e só. Foi o bastante para destruí-lo.

Foram três frases.

"Como pôde?"

"Você é podre".

"Eu nunca vou perdoar".

Então nunca mais.

Ele fingiu que não tinha acontecido, mesmo com a dor, continuava fingindo, porque era melhor assim. Porque o que Albus tinha feito era o pior, mais nojento e cruel que um ser humano podia decair antes de ser apenas um monstro.

Como Voldemort ou Gellert.

Foi horrível e Aberforth ainda tinha uma ferida aberta e pulsante no peito causada por aquele imbecil.

Nunca vou perdoar. Era verdade.

Não tinha como.

Minerva uma vez quis saber tudo de ruim que seu irmão já fizera, talvez para não ter mais surpresas, mas Aberforth esqueceu daquela parte de propósito. Talvez o melhor legilimente do mundo olharia diretamente em seus olhos e não conseguiria ler aquela informação, apenas sentir a dor horrenda que lhe causava, mas nunca nada além daquelas três frases.

Aberforth tratou de apagar.

Para sempre.

Não aconteceu. Ninguém iria tão longe. Nada.

Vazio.

Como o buraco de repulsa em seu peito.

Só havia aquelas emoções, mas o fato? Nunca falaria sobre aquilo.

Não aguentaria aquilo.

Minerva, pobre Minerva, cairia da cadeira com aquela, mas Aberforth não estava disposto a fazer isso. Não era vingativo para causar aquele rancor na professora também. Destruir a relação dela com Albus. Um prego macabro em uma amizade de décadas.

E o que faria depois?

Ela podia até ir embora.

E Aberforth a perderia, assim como perdeu tantos outros pelas ações de seu irmão.

Não, aquilo morreria com ele.

Mas agora Minerva queria saber e isso era um problema.

Ele tinha que pensar em alguma coisa, algo que ainda não tivesse sido dito, ruim, mas não... aquilo que nunca aconteceu.

— Lembro – ela disse, depois que o silêncio se estendeu em demasia para ser normal. – E o que tem?

A primeira reação foi responder "nada", mas isso a faria suspeitar de que tinha alguma coisa e não era o ideal, por isso ele tinha que tentar outra coisa.

Ficou em silêncio, como se precisasse pensar nas palavras e buscou achar algo.

— Aberforth? – ela chamou, levemente preocupada com a palidez do homem e como agora ele nem bebia mais.

Apenas segurava com força sua caneca.

Muita força. Se não fosse de madeira...

— Aberforth tem alguma coisa que você não me contou?

Talvez tivesse, mas não conseguia lembrar. "Aquilo" não existia.

Algo que existe, Aberforth, pense.

— Porque se tiver algo que não me contou, você precisa me dizer, Abbie, não posso aguentar mais uma surpresa.

"Isso não é uma surpresa, Minnie, é uma facada em forma de ajuda. Ele ganhou fama por aquilo, o desgraçado".

— Quem Albus está querendo chamar da ordem e o que pretende fazer?

— Não mude de assunto.

— Tecnicamente você está mudando, começamos com a ordem. Mudar de assunto seria perguntar qual o boato que Albus está querendo espalhar sobre o filho daquele escroto.

— Aberforth.

— Minerva.

Ela o encarou intensamente.

Não, não iria desistir.

Tudo bem, ele se lembrou de outra coisa. Ainda envolvia Ariana, ela poderia acreditar em sua relutância. Falar doía da mesma forma.

Mesmo que não na mesma intensidade:

— Ariana gostava de Albus, mas ele tinha vergonha dela.

Minerva piscou, espantada sem dúvidas, mas era controlável e de certo desconfiado.

Aberforth continuou:

— Aquele lixo demonstrava mais simpatia por Ariana do que o próprio irmão.

Pronto, agora ela estava suficientemente tomada.

— Tem certeza de que era esse o sentimento?

— Grindelwald gostava mais de Ariana do que Albus, posso garantir.

Aquelas não eram as melhores palavras, estavam muito próximas da verdade, não gostou delas.

Negou com a cabeça e tomou outra boa bebida:

— Eu o odiava desde sempre. Albus já era ruim, mas se tornou péssimo com aquele cara. Sempre desconfiei da peça, mas... houveram momentos.

— O que quer dizer?

Outra pausa, não tão longa dessa vez. Ele bufou:

— Conhece a ideia do inferno trouxa, Minerva?

Ela estreitou os olhos, confusão correndo pelo olhar:

— O que tem isso?

O homem balançou a cabeça, definitivamente já estava um pouco alto. A velocidade com a qual consumiu goladas de bebida alcoólica e provavelmente antes de comer qualquer coisa, já que Aberforth parecia só funcionar depois do almoço, Minerva talvez devesse aconselhá-lo a parar com aquela... Quinta? Era quinta caneca?

Se ao menos fossem pequenas...

Aberforth falava:

— Alguns acreditam que no inferno você vai viver seu pior pesadelo se repetindo pela eternidade. Sabe porque eu concordei com prenderem Gellert de novo, mesmo que ele já tivesse fugido de mais de uma prisão?

— Não, na verdade.

— Além do fato de que ele mesmo construiu Nurmengard e devia ter experiência o suficiente com fugas para fazer a coisa direito, bem... Eu acho... tenho pistas de que Gellert era ao menos em algum ponto claustrofóbico.

— Como é? – Minerva fez uma careta, ainda mais confusa.

Aberforth deu de ombros:

— Meu irmão não queria ter que matar seu antigo amorzinho, mas acho que ele fez pior mandando direto para uma cela apertada e fria numa montanha onde, de certo, não devem ter muito sol no inverno.

— Você está supondo que Albus teria...

— Teria mandado o amor da vida dele direto para o Inferno ainda vivo? – questionou com um sorriso satisfeito. – Sim. É a única coisa que me motivou a não gritar aos sete cantos por uma pena de morte direta. Ele merecia pagar por tudo que fez e ia, desse jeito ia.

— É uma suposição estranha. Ele te disse alguma coisa ou...

— Claro que o babaquinha pomposo nunca viria correndo me contar um de seus medos. Não. É uma suposição mesmo. Um trauma de infância, eu diria. Ouvi Batilda dizendo algo do tipo uma vez. Sobre a criação de Gellert pelos pais. Como era bom ele e Albus estarem se dando bem, porque tinha medo que o menino continuasse sendo distante "depois de tudo". E você já viu Nurmengard?

— Não, eu não.

— É um casarão com uma torre grande no topo da montanha onde ele ficava com os aliados e agora onde habitam os guardas, visto de costas é muito maior, porque a fortaleza em si é esculpida nas rochas, para baixo, onde ficavam as celas e, agora, ele. É direto para um vale imenso então não importa onde esteja, é alto.

— O que tem?

Aberforth sorriu, olhando para sua bebida. Um sorriso cruel, cheio de significados, algum prazer sádico:

— É cheio de janelas para o vale. A casa tem uma vista gigantesca para um espaço de céu aberto imenso, na neve ainda por cima, tem luz sendo refletida de dia como um farol luminoso. Estrategicamente falando, se já foi um lugar para protegê-lo também não tinha que ser mais... difícil de ver e entrar? Mas não. Era aberto. Nem muros tem. Supondo que Grindelwald tinha uma claustrofobia, aquela quantidade de janelas faz mais sentido. O escritório dele tinha uma parede inteira só de vidro. Dizem que na cela ele ficava sentado do lado da janela da cela o tempo que podia, mas essa informação é antiga, pode ter se acostumado. Tem gente que acha que ele era um sádico que queria os prisioneiros sonhando com a liberdade, a tivessem ao alcance da vista, mas sem nunca poder alcançar.

— Faz sentido, não? Pela descrição que está me dando.

— Eu acho que as pessoas sempre encontram um modo de transformar a fraqueza de um homem desses em uma força tenebrosa. Eu boto fé no medinho dele, de estar numa sala pequena, apertada, preso, no escuro do vale na maior parte do ano. Eu espero que ele seja claustrofóbico. Ele merecia ser. Então estaria pagando por seus pecados lá dentro mais do que qualquer outra coisa poderia ter feito.

E tratou de pegar uma nova garrafa. Sexta caneca.

— Só que... claustrofobia é apenas... uma fobia. Ele deve ter se adaptado com o tempo. Seria só no começo. Já se passaram décadas.

— Algumas coisas pioram mais do que melhoram com o tempo, mas quem sabe – e deu de ombros.

— O que te fez começar a acreditar que ele tinha claustrofobia?

— Ariana – sussurrou com pesar, olhando para sua caneca.

Minerva deu um tempo, porque sabia que aquela área era um assunto delicado, que os Dumbledore sempre precisavam de tempo para revisitar qualquer memória da irmã.

Quando achou que era adequado abriu a boca para falar, mas Aberforth fez um sinal com a mão, para calá-la.

Houveram mais alguns instantes e ele mesmo se explicou:

— Teve esse dia – começou baixinho. – Albus tinha chamado o "cachinhos dourados" para casa, de novo – revirou os olhos. – Mas uma das vizinhas pediu ajuda com uma coisa, não tenho ideia do que era, só sei que ele saiu e deixou Gellert no quarto e gritou para que eu ficasse de olho em Ariana. Meu quarto era logo do lado do dele. Era só ter ido verificar e teria visto que eu não estava em casa. Mas ele não verificou. Eu estava fora o dia todo e ele nem notou. Então, por algum tempo, Grindelwald estava sozinho. E Ariana também.

Aberforth juntou suas mãos, como se de repente fizesse frio. Ele soprou, para mandar algum calor para elas e ficou um tempo assim. Parado, as mãos em frente a boca, os olhos fechados.

— Aconteceu alguma coisa? – incentivou Minerva.

— Grindelwald foi para a cozinha pegar alguma coisa e encontrou Ariana lá. Ela... você sabe... não falava, mas de alguma forma aquele homem.... aquele monstro conseguiu fazê-la se comunicar com ele. Ela estava assustada, sem os irmãos... sem nós... ela recorreu a ele, conseguiu fazer entender que estava assustada e me procurando, então eles... Não sei como conseguia isso...

— O que?

— Ariana sempre ficava ansiosa com qualquer pessoa em casa, mas ela nunca... pareceu se importar tanto assim com ele. Na verdade, essa não foi a última, por mais que eu ameaçasse Grindelwald, mandasse nunca chegar perto dela, parece que de alguma forma eu continuava os vendo juntos de novo e de novo. Eles... se davam bem.

Minerva se afastou, encarando Aberforth como se visse algo novo ali:

— Mesmo? Albus nunca me disse isso...

— Meu "irmaozão" nunca via – murmurou, ainda baixo, ainda com uma lentidão que apenas aquele assunto causava. Uma delicadeza. – Albus estava focado no homem, não na irmã – bufou. – Também concordava em afastá-los. Mas como eu disse, acontecia de tempos em tempos, já que ele vivia em nossa casa por tempo demais. Grindelwald tentou no começo, quando descobriu sobre Ariana, tentou ser... não sei como explicar. Amigável? Viu como fiquei incomodado, pediu desculpas por estar invadindo nosso espaço pessoal, tentava puxar assunto, mostrar que era compreensivo com nossa situação, jurou voluntariamente por sua magia que não falaria sobre aquilo tudo e avisou que se precisássemos de ajuda...

Foi muito de repente.

Minerva pulou quando Aberforth socou o balcão.

O barulho, uma lasca de madeira. Aquela coisa era resistente, mas Aberforth era forte.

Muito.

E estava frustrado.

— Aber... – ela tentou chamar, ele negou com a cabeça e se levantou, como se não aguentasse mais ficar sentado e isso o queimasse.

— Nunca gostei do tipo, nunca confiei em Grindelwald, sabia que tinha algo errado e gritei que não precisávamos da ajuda do senhor perfeitinho. Nem da sua pena. Insuportável e nojento, mandei a merda o quanto podia, até que parou de ficar nos rodeando. Que ficasse só com o Albus, bem longe de mim e Ariana! Eu nunca confiei no lorde das trevas mirim e estava certo. Albus já não tinha uma cabeça boa, mas depois daquele idiota... nunca foi o mesmo. O que tinha de parafuso solto, Grindelwald arrancou e afrouxou outros. Com aquela magia sombria instável dele...

Minerva escolheu não comentar sobre aquilo e ficou um tempo quieta apenas observando. Aberforth não encarou a mulher, andando por seu balcão, procurando algo que não achou, pegou uma lata e jogou no canto da sala, onde estava sua cabra e isso quase fez Minerva rir.

Estava tudo tão tenso.

Mas havia uma cabra.

E Aberforth lhe dava latas porque ela gostava de masca-las.

Péssimo momento, ela continuou quieta.

Mesmo assim, o Dumbledore mais novo pareceu notar algo, alguma diversão no olhar da mulher, tão magra e pequena se comparada com ele, isso o fez se acalmar um pouco.

Minerva o acalmava.

— Grindelwald, naquele dia – continuou a história. – Disse que perguntou a Ariana se ela queria que ele saísse para nos encontrar, mas minha irmã insistiu em não ser deixada sozinha. Pediu para que ele ficasse. Agarrou a mão dele e não soltou. Ele perguntou então se tinha algum lugar que Ariana preferia ficar para esperar. Ela o levou para seu quarto...

Aberforth fechou os olhos. Minerva ouviu a cabra mascando a lata.

— Você nunca vai me ouvir falar bem do homem mais do que isso. Mas Grindelwald foi. Para o quarto dela. No porão, onde nossa mãe podia esconder o que ela era. No escuro, debaixo da terra. Minha irmã não gostava de estar sozinha com desconhecidos, foi ensinada a não ficar perto deles, mesmo assim aceitou a presença dele, pediu por isso para consolá-la. Eu não sabia. Quando os peguei juntos fiquei tão irado que o mandei para fora no chute. Estava furioso. O xinguei como louco. Principalmente quando notei que Grindelwald pareceu aliviado de fugir do quarto. Achei que ele estava aliviado de sair de perto da própria Ariana e isso foi um insulto.

— Você achou?

— Ariana o defendeu. Disse que eu estava errado. Foi uma das vezes que mais ouvi palavras saírem de sua boca... mesmo que do jeito dela, sabe? Frases incompletas e muitos gestos...

A voz de Aberforth estava grave e Minerva percebeu que era uma voz bonita, máscula, mas estava transmitindo tanta dor que quase ocultava toda a força daquele homem. Dos timbres de sua garganta.

— Ela me contou o que tinha acontecido e como percebeu que foi difícil pro idiota estar lá. Ele ficou com Ariana aquele dia e essa é a única prova de alguma decência do homem, porque o quarto era no porão, ele teve que deixar a porta lá em cima aberta, ou não aguentaria. Foi o que ele tinha dito e que Ariana tentou me repetir... ela mais gesticulou do que qualquer outra coisa, mas ainda foi suficientemente clara. Mostrou a porta aberta, depois fechou e mostrou medo, então eu perguntei "Você estava com medo de fechar?" e ela negou e apontou para fora "O loirinho estava?", perguntei. Ela acenou que sim. Daí por diante. Apontou para um canto e disse: "medo", depois para fora de novo, para seu quarto, "medo" repetiu e tremeu, chegou a abaixar no chão, colocando as mãos na cabeça, mas levantou de novo e apontou para fora. Estava muito agitada. "Grindelwald tem medo de você?" ela negou. "Quarto. Pequeno. Escuro. Pai mau".

— Você se lembra das palavras – Minerva murmurou depois que Aberforth tinha voltado a ficar tanto tempo quieto que parecia que não voltaria mais a emitir qualquer som. — Por isso acha que ele tinha claustrofobia?

— Demorei para entender tudo daquele dia e acho que nunca consegui totalmente... No geral, sei que os dois ficaram segurando a mão um do outro. Que Grindelwald não parava de tremer quando chegaram no fim das escadas e que ele conversou com ela. Ele falava muito mesmo. Era irritante como não calava a boca, quando engatava em um assunto que gostava, ia longe e nem tudo fazia sentido. Mudava de assunto, depois voltava, perdia o foco como ninguém. Ele e Albus ficavam murmurando nos jardins por tanto tempo que eu queria ir lá e lhes acertar na cabeça antes que qualquer um parasse de abrir a maldita boca. Faziam isso enquanto eu ficava e limpava a casa, fazia a comida, cuidava dela...

— Eu sinto muito.

Aberforth bufou e não respondeu àquilo, voltou para a história:

— Ele conversou com Ariana e ela gostou dele. Ou ao menos eu pensava que era isso sabe?

— O que?

— O fato de Ariana nunca o ter odiado. Ela... não queria sua magia, tinha medo de si mesma e do que habitava dentro dela, podia explodir com esse medo, essa tensão, mas ver um homem com medo... isso a afetou. O desgraçado ainda agradeceu a ela, acredita?

— Agradeceu por quê?

— Por dividir o irmão dela com ele. Disse que Albus o ajudava a tornar as coisas menos difíceis e esperava que a tranquilidade que tinha com meu irmão, também fosse a que Ariana tinha, só que em dobro, já que eram dois irmãos para si.

Minerva piscou e acabou ficando estática um tempo, encarando-o com um misto de emoções. Confusão, curiosidade, espanto.

Aberforth encarava seu próprio pé, vagando para outros caminhos.

Para o passado.

— Admitir suas fraquezas, agradecê-la como alguém que estava lhe fazendo um favor, mostrar-se daquele jeito... fraco. Isso a conquistou. De um jeito que nunca mudou. Mesmo com tudo – então sacudiu a cabeça.

Sua distração mudou de uma forma intensa para uma raiva mal contida:

— Babaca de merda, mentiroso do caralho – murmurou cruzando os braços.

— Aberforth.

— Talvez, Minerva, se ele não estivesse lá naquele dia. Se não tivesse conquistado a confiança dela com essa babaquice toda de medo do escuro ou o caralho de asa, se nunca tivesse feito Ariana se importar com ele e perguntar sobre ele para mim...

— Aberforth – chamou de novo, porque estava com medo de como ele estava tremendo e...

Com lágrimas nos olhos.

— Naquele dia... Quando ela... no dia que ela morr... Ariana... – a voz do homem embargou, ao ponto que teve que parar e inspirar fundo para continuar. – Ela foi lá porque nós três estávamos brigando. Queria que parássemos. Não era o simples medo de ver pessoas bravas, ela não queria que os três homens que gostava estivessem discutindo... – então piscou, para conter lágrimas que ameaçavam sair.

Minerva se levantou e foi instintivo, algo que não pensou antes, apenas aconteceu. Ela só queria ajudar a aplacar a dor que ela mesma tinha causado ao fazer aquele homem se lembrar de memórias tão ruins.

Ela o abraçou.

Enterrou a cabeça no ombro largo dele, os braços apertando como podiam seu corpo forte e alto.

Abraçou e tentou passar todo o carinho que sentia por ele e todos os pedidos de desculpas que podia.

Levou um tempo com Aberforth tremendo para que enfim conseguisse se recuperar. Era raro ele quebrar daquele jeito. Mas aquilo tudo o fez se lembrar das piores coisas em sua vida.

Gellert e Ariana.

Albus e Gellert.

Gellert e Creedence.

Aurélios Dumbledore.

Ele abraçou Minerva de volta e quis chorar, queria mesmo, mas não era um homem adaptado a chorar.

Alguém tinha que ser o forte da família.

E não era Albus.

Ele inspirou fundo e tentou tirar tudo aquilo da cabeça. Irmãos, filhos, uma maldita pedra filosofal e apenas se concentrar no cheiro de Minerva.

Isso o ajudou, em contraste com seu humor normal que o deixaria louco com a aproximação, com o formato da mulher magra e alta em seus braços, a maciez de seu cabelo contra o pouco que tinha de pele exposta no pescoço.

Será que ficaria com o cheiro dela depois?

Isso o enlouqueceria.

Quando se sentiu melhor, tentando não registrar tanto o fato de que Minerva era a coisa que o deixava bem, que ela tornava não só seus dias melhores, mas seu humor, sua vida. Era uma péssima linha de raciocínio.

— Desculpe forçá-lo a pensar nessas coisas.

— Está tudo bem – ele garantiu. – Só... é isso, sabe? Albus tinha vergonha de Ariana, afastava o coiso ruim dela...

— Coiso ruim? – riu, porque era engraçado e era melhor Aberforth sorrindo para ela por rir de algo assim, do que Aberforth tão triste quanto antes.

Os dois ainda não tinham se afastado.

Ela podia ouvir o coração dele batendo rápido.

— Sim, coisa ruim. Albus o afastava de Ariana como eu, mas pelo motivo errado. Ele só não queria deixar o namoradinho ver uma falha sua, de sua família. Não era para protegê-la.

— Não precisa mais falar disso.

— Você ficou curiosa...

— E já pedi desculpas.

Aberforth deu um tapinha em suas costas, sentindo-se mal por virar o jogo daquela forma a seu favor. Agora Minerva não perguntaria mais.

Mas às custas de se sentir culpada por ter sido ela mesma.

E Aberforth mentiu.

Não sobre a história, mas definitivamente a vergonha de Albus enquanto a própria condição da irmã não era nem de longe o seu pior.

Mas que seja, ele não seria aquele que reviveria aquela história como um maldito...

Bem...

Que seja.

— E então? Voldemort?

Minerva tremeu e Aberforth a apertou mais em seus braços, como se pudesse protege-la do mundo assim.

Bem que ele queria.


-x-x-x-


As detenções com Snape eram horríveis.

Isso era uma certeza na vida como tantas outras, tal qual a gravidade, a morte, que ao apanhador que pega o pomo de ouro são dados 150 pontos.

Então porque essa foi tão tranquila?

Era contra as regras naturais da vida e da ordem.

Neville observou horrorizado quando o homem o dispensou depois de uma hora antes do almoço.

Tinha algo muito errado acontecendo.

O objetivo da vida de Snape era acabar com a paz de Neville, então porque ele lhe deu uma tarefa tão simples quanto limpar os caldeirões, permitiu o uso de magia, então o liberou sem trocar uma palavra consigo?

Certo, ele parecia concentrado em algo em sua mesa, mas mesmo assim, nada distraia aquele morcego velho e ranzinza de sua missão de tornar o dia de Longbottom um inferno.

Tinha algo muito errado acontecendo.

Ele nem perdeu nenhum ponto para a Grifinória, mesmo depois de ter derrubado um dos caldeirões no chão!

Claro que, quem era ele para lembrar aquele bicho papão de sua existência? Assim que foi dispensado, explodiu para fora das masmorras tão rápido que acabou trombando com Viktor Krum em algum ponto.

E quase caindo.

Se não fosse imediatamente agarrado.

Ao menos Viktor estava rindo quando comentou:

— Estou começando a achar que você tem uma "queda" em mim – e piscou o olho.

Neville ficou mortalmente vermelho do pescoço às orelhas e quis enfiar sua cabeça embaixo da terra, onde poderia sumir e se poupar do trabalho de cometer o oposto de viver.

Desculpe – pediu cabeça baixa, mãos nos braços de Viktor, onde notou que estava apertando o que permitiu que ficasse ainda mais envergonhado.

Ele deveria mesmo se enterrar vivo.

— Não por isso, você é uma pluma.

Neville baixou mais a cabeça.

O cérebro nem mesmo conseguindo registrar fatos o bastante para que se afastasse de Viktor e de seus braços.

Mas conseguiu identificar uma segunda voz falando:

— Vamos nos atrasar Viktor.

Era Natasha. Natasha Sidorov, se Neville não estivesse enganado com aqueles sobrenomes estranhos dos alunos na Durmstrang. Era uma mulher alta e assustadora, mas que havia sido selecionada para a Lufa-lufa e não tinha sido nada além de simpática até então, o que lembrava Neville para não ter medo dela. Era apenas uma pessoa decidida e de personalidade forte.

Ele levantou o rosto porque percebeu que não a havia notado e era falta de educação não cumprimentá-la. Ela estava séria, mas sorriu quando Neville a olhou:

— Bom dia, Longbottom.

— Pode me chamar de Neville.

— Como quiser – acenou, ainda sorrindo. – Desculpe interromper... vocês dois, mas eu e Viktor temos que ir.

Neville olhou para Krum e levou incríveis e vergonhosos cinco segundos inteiros para se afastar.

— Desculpa.

O búlgaro tornou a rir:

— Já disse que não é problema. Como vai Neville?

— Bem e você?

— Ótimo. Estamos indo para a aula de dança.

O grifinório franziu o cenho:

— Aula de dança?

— Lakroff está oferecendo para que não sejamos especialmente um bando de brutamontes na pista de dança durante o baile.

— Isso é ótimo. Lakroff é um bom dançarino e professor. Eu acho – se corrigiu assim que percebeu a gafe que estava quase cometendo.

Não sabia se algum aluno de Hogwarts não podia ouvir e, por enquanto, Lakroff não era nada de Neville ou de Harrison, como seu tutor.

Sua tentativa de ajeitar as coisas foi tão fraca, entretanto, que causou risada na dupla de estrangeiros.

— Não riam.

— Desculpe – pediu Viktor. – Bem, seu chute está certo, nosso vice diretor é um bom dançarino e professor. Se Harrison não tivesse me contado que você não aceita dançar com homens em bailes, eu o convidaria para ser meu par hoje.

O rosto de Longbottom voltou a ficar rosa:

— Como é? Eu nunca disse... eu só... eu...

— Boa tentativa, mais algumas e você consegue – apontou Natasha com um sorriso que talvez deveria ser tranquilizador, mas fez Neville cobrir o próprio rosto com as mãos.

Viktor, para sua sorte, veio ao resgate:

— Não se preocupe, sei o que quis dizer quando dispensou o Hazz, só estou brincando com você.

Neville ainda levou um tempo para sair da proteção de suas próprias mãos envergonhadas, mas o fez e encontrou Viktor nada mais nada menos do que divertido e acolhedor, o que o acalmou a normalidade.

— Você tem detenção hoje, não é mesmo?

— Acabei de terminar.

— Terminou cedo.

— Alguma divindade iluminou meu dia.

— Se é assim, talvez queria se juntar a nós. Está convidado a participar, vai ser divertido.

Neville sorriu acanhado:

— Talvez eu vá.

— Podemos achar uma garota para você acompanhar já que é tão importante.

— Pare com isso! – pediu ainda se sentindo quente nas bochechas.

Viktor levantou os braços em rendição:

— Ainda só brincando.

Neville suspirou:

— Hazz é uma péssima influência para você.

— Ou eu posso ser para ele.

— Ah não, Hazz sempre foi assim – então olhou para Natasha que estava quieta e provavelmente se sentindo excluída enquanto os dois brincavam e teve uma ideia, que o fez se inclinar em uma reverência cortês – Será que você me daria a honra? Ou já tem um par, milady?

A garota sorriu de forma gentil e retribuiu a reverência:

— Seria uma honra, lorde Longbottom, mas Ivan já me chamou como par.

— Krum! – alguém chamou ao fundo do corredor e o grupo se virou para a pessoa que chamava. Neville não o reconheceu. – Vem cá, preciso da sua opinião numa coisa.

— Já vou! – Viktor gritou, se virando para os outros dois. – Já encontro vocês. Eu acho – e voltou-se para Neville. – Se você for.

— Acho que vou.

— Nat pode te levar então. Nos encontramos lá – e com uma última piscada deixou o grupo.

Neville quase se parabenizou por não corar uma última vez enquanto via o outro se afastar.

— Ele gosta de você – comentou Natasha quando ambos estavam sozinhos.

E pronto, Neville não merecia mais parabéns, já que suas bochechas tornaram a escurecer de vergonha:

— Como é? – se virou para a menina, que estava séria olhando para o corredor.

Parecia muito perdida em pensamentos:

— Viktor gosta de você e normalmente ele tem bons instintos, sabe? Ele foi o primeiro a se aproximar e proteger sua alteza.

Neville não soube o que dizer sobre aquilo.

Não precisou, entretanto. Mesmo que tivesse encontrado palavras, elas teriam sumido junto com todo o ar de seus pulmões quando a garota o encarou.

Longbottom já tinha estado diante da morte. Encontrado o próprio Lorde das Trevas.

Ainda assim sua espinha se arrepiou como se pela primeira vez na vida estivesse em perigo real com o olhar que a garota lhe lançou.

Era tão difícil explicar aquele olhar, havia alguma vastidão nas pupilas, uma imensidão de significados e nenhuma gentileza mesmo com tudo aquilo, não era uma cobra, nem mesmo um dragão, não era frio nem quente.

Apenas perigoso.

Muito.

Vazio como um peixe, em um rosto de predador.

Ela inclinou a cabeça de um lado para o outro e depois sorriu para o completamente em choque Neville:

— O que foi?

Ele não conseguia responder.

Aquele sorriso não era normal.

Visto enquanto o encarava de cima, as sombras da pouca luz que havia ali no fim masmorras criavam formatos bizarros que ressaltavam aquele olhar terrível.

Houve um tempo de silêncio onde Neville tentava achar rumo, palavras ou mesmo sua respiração, enquanto Natasha ficava lá, apenas o encarando.

Até que ela falou.

Havia uma calma estranha em suas palavras, como a fluidez da água, mas o perigo de um oceano:

— Viktor gosta de você e realmente acha que você é um bom amigo para Harrison, mas quer saber de uma coisa, Neville?

Ele não queria.

Decididamente não, ele tremeu e ela continuou:

— Eu não confio mais em você.

— Eu...

— Não precisa dizer nada, nem se defender. Você fez sua alteza ficar preocupado por dias, semanas, o deixou triste como nunca o vi e eu não gosto quando as pessoas o deixam triste. Não gostei nada de ver o poder que você tem sobre ele. Ninguém deveria ter tanto poder sobre sua alteza.

Ele realmente não tinha respostas para a forma calma que ela falava.

Tubarão.

De repente Neville se lembrou que esse era o símbolo de sua casa.

Ele estava de frente para um maldito tubarão, a água entrando pela boca, a certeza de que nada do que fizesse seria o suficiente para nadar para longe porque estava no território dela e aquele era o maior predador que encontraria que não fosse as próprias águas salgadas do oceano.

E ele, de alguma forma, tinha deixado sangue pingar na água.

— Claro, sua alteza gosta de você e por isso, eu não posso fazer nada – ela se aproximou e Neville deu um passo para trás tão vacilante que quase caiu. – Mas eu juro, se você fizer algo de novo, se aprontar e ele, por qualquer motivo tolo que seja, acabar machucado, eu acabo com você. E não é brincadeira, Longbottom. Você estará morto antes que sua alteza possa mudar de ideia e te dar mais poder de novo e nem os ratos vão achar restos do seu corpo para comer – ela se agachou e agora Neville quis que ela estivesse de pé.

Impressionantemente olhá-la de baixo era pior.

Como nadar na praia, olhar para o chão e perceber uma sombra escura de um tubarão se aproximando.

— Entendeu? – ela perguntou.

Levou um longo tempo para que ele tivesse coragem de responder, ainda mais porque ela estava esperando a resposta pacientemente. Ele tirou coragem de onde nem sabia que tinha e a encarou:

— Eu não pretendo machucar o Harry, nunca. Então não precisa me ameaçar. Não vão passar de palavras.

Ela sequer estreitou os olhos para ele. Continuou o encarando com aquela expressão vazia, mas profunda e depois de um longo tempo, onde Neville foi ganhando mais coragem e arrumando sua postura de forma desafiadora, enfim cantarolou e se levantou:

— Pelo seu próprio bem, é bom que assim seja.

-x-x-x-

Durante toda a tarde com os amigos e mesmo de noite, Neville ainda se lembrava daquele olhar e da troca que teve com Natasha Sidorov. Aquela garota era decididamente assustadora.

Ele, entretanto, não comentou nada com ninguém por um bom tempo. Principalmente com Harrison na aula de dança, ao qual quase como um desafio idiota de grifinório, Neville puxou para dançar sob o olhar de Natasha (e de metade da escola, porque, por Merlin, antes de Neville tomar a iniciativa houve uma briga de olhares intensa para ver quem convidaria sua alteza).

Entretanto, se viu desabafando com Ron enquanto subiam para os dormitórios perto das nove:

— Quer dizer, o que ela quer com isso? Hazz ficaria furioso se eu tivesse contado.

Ron deu de ombros:

—Ele ficaria? Ela só o está defendendo.

— Ela me ameaçou.

— Você faria o mesmo. Jogou aquilo na cabeça de Dumbledore e tudo mais.

— Ron! – reclamou, olhando para os lados para ver se ninguém ouvia.

— Relaxa. Mas olha cara, eu entendo, também não gostaria que uma garota de quase dois metros me ameaçasse.

— Não é só a ameaça. É ela achar que precisa defender Harrison de mim! Como se eu fosse um problema, como se não fosse confiável.

— Bem, isso é porque... – mas ele não terminou a frase.

Hermione apareceu como um raio ao lado dos meninos falando algo desconexo sobre como ela tinha uma notícia incrível e como precisava falar com os dois e mostrar uma coisa.

De repente, Neville e Rony acompanhavam Hermione que se recusava a dar respostas por um lance de escadas próximo ao grande salão, descendo como se fossem às masmorras, um caminho que nunca pegaram, mas que na verdade os deixou em um corredor de pedra largo a qual nunca viram antes.

Era muito bem iluminado e decorado com alegres pinturas, na maioria, de comida.

— Ah, espera aí... – disse Neville lentamente, a meio caminho do corredor. – Espera um instante, Mione...

— Quê? – ela se virou para olhá-lo, o rosto que era só expectativa.

— Já sei do que se trata.

O garoto cutucou Rony e apontou para o quadro logo atrás de Hermione. Era a pintura de uma enorme fruteira de prata e o ruivo imediatamente se lembrou da amiga perguntando aos gêmeos, no dia da comemoração pós primeira tarefa, qual era a entrada para a cozinha onde ficavam os elfos domésticos e a comida que sempre conseguiam para eventos como aqueles.

— Mione! – exclamou Rony, frustrado. – Você não está tentando nos levar para aquela história de fale outra vez!

— Não, não, não estou! – apressou-se ela a dizer. – E não é fale, Rony...

— Você mudou o nome? – perguntou franzindo a testa. – Que somos então? A Frente de Liberação dos Elfos Domésticos? Não vou invadir a cozinha para fazê-los começar um motim!

Hermione bateu os pés irritadiça no chão, cruzando os braços:

— Não estou lhe pedindo isso! Desci aqui agora há pouco para conversar com eles e encontrei... ah, anda, Neville, quero lhe mostrar!

A garota agarrou-o pelo braço e puxou-o para diante do quadro da fruteira, esticou o dedo indicador e fez cócegas na enorme pêra verde. A fruta começou a se contorcer e rir e, de repente, transformou-se em uma grande maçaneta verde. Hermione segurou-a, abriu a porta e empurrou os amigos pelas costas, com força, obrigando-os a entrar.

A cozinha era um lugar grande de teto alto, repleto de tudo que se imaginaria em uma cozinha dos sonhos, panelas empilhadas ao redor das paredes de pedra, um grande fogão de tijolos no extremo oposto. Neville não teve muito tempo para observar o lugar, uma coisa pequena se precipitou do meio do aposento ao encontro dele, guinchando:

– Neville Longbottom, meu senhor! Neville Longbottom!

No segundo seguinte todo o ar dos seus pulmões foi expelido, o elfo, aos guinchos, colidiu com ele na altura do diafragma, abraçando-o com tanta força que o garoto pensou que suas costelas iam partir.

— D-Dobby?

— É o Dobby, meu senhor, é sim! – guinchou a voz na altura do seu umbigo.

Por sorte aquilo pareceu bastar para a criaturinha que se afastou e permitiu Neville respirar e vê-lo um pouco. Tinha quase exatamente a mesma aparência com que Nev o conhecera em seu segundo ano; o nariz fino e reto, as orelhas de morcego, as mãos e os pés compridos – exceto pelas roupas, que eram muito diferentes.

Quando Dobby trabalhara para os Malfoy e veio até Neville para avisar que Hogwarts estava em perigo e que "aquele que enfrentou o lorde das trevas no primeiro ano, deveria ficar atento", este usava roupas horrendas, um saco na verdade, rasgado nos lugares para forma uma espécie de roupa.

Agora, porém, ele estava bem mais apresentável. Uma escolha muito extravagante, sem dúvida alguma, pior do que a dos bruxos tentando se passar por trouxas no acampamento para a Copa Mundial, mas ainda sim era visivelmente melhor e mais feliz, isso enchia o coração de Neville.

— Dobby, o que é que você está fazendo aqui? – perguntou surpreso, porém contente.

— Dobby veio trabalhar em Hogwarts, meu senhor! – guinchou o elfo excitado.

Neville olhou para o lugar e de novo para as roupas coloridas da criatura e sorriu feliz, inclinando-se para fazer carinho em sua cabeça:

— Fico muito feliz por você, Dobby.

Aquilo pareceu horrorizar os outros elfos que trabalhavam por lá, que sussurraram aos montes coisas sobre como um mestre estava tendo que acariciar um elfo em desgraça.

Dobby achou aquilo uma oportunidade para ir contra os companheiros:

— Dobby não é um elfo em desgraça, Dobby quer ser livre e é feliz!

— Muito bem Dobby – concordou Neville, muito feliz vendo a meia que ele mesmo retirou para enganar Lucius Malfoy e libertá-lo em um dos pés da criaturinha.

Havia outra, de uma cor completamente diferente, no segundo pé.

Era engraçado e fofo.

— Neville Longbottom gostaria de tomar uma xícara de chá?

— Hum... ah, ok.

Instantaneamente, uns seis elfos domésticos vieram correndo atrás dele, trazendo uma grande bandeja de prata com um bule de chá, xícaras para Neville, Rony e Hermione, uma jarrinha de leite e um grande prato de biscoitos.

Ron olhou-os admirado e muito contente:

— Serviço de primeira!

Hermione franziu a testa para ele, mas os elfos pareciam encantados da vida; fizeram uma grande reverência e se retiraram.

— Há quanto tempo está aqui, Dobby? – perguntou Neville, pegando um biscoito.

— Só uma semana, Neville Longbottom, senhor! – respondeu Dobby alegremente.

O elfo, então, começou a contar como fora até Dumbledore depois de uma jornada muito difícil para achar emprego que recebesse um salário.

Os elfos domésticos por toda a cozinha, que estavam escutando e observando com interesse, desviaram os olhos ao ouvirem isso, como se Dobby tivesse dito alguma coisa grosseira e constrangedora.

Hermione, porém, exclamou:

— Assim é que se faz, Dobby!

— Muito obrigado, senhorita! – disse o elfo, dando a ela um sorriso que era só dentes.

Mas aquela história toda só deixou Neville constrangido e com dor na barriga, como se tivesse engolido algo pesado como uma pedra.

Enquanto todos os bruxos ignoravam Dobby durante aqueles quase dois anos procurando, o Professor Dumbledore foi o único homem capaz de estender a mão e oferecer ajuda.

Dar um emprego ao coitadinho e realmente se dispuser a tratá-lo como elfo-livre, com salário e dias de folga. Por mais que estivesse bravo com o professor, ser lembrado de que era uma boa pessoa e que Neville arremessou um jarro de balas contra sua cabeça o fazia se sentir muito constrangido.

Ele tinha que pedir desculpas ao professor.

De algum jeito tinha de fazer. Dumbledore estava errado e Neville não se arrependia de defender Harry, mas o que fez foi errado e ele ignorou tudo de bom que o professor fazia constantemente por causa dos erros do passado.

Claro, alguns recentes também, mas todos cometem erros, não?

Ele corava a cada vez que Dobby exaltava como Dumbledore tinha sido gentil e benevolente com ele, enquanto os outros elfos se afastavam como se Dobby tivesse um tipo de doença contagiosa.

Nem mesmo os seus entendiam Dobby, mas Dumbledore sim.

Ron pareceu notar que Neville estava se sentindo um tanto incomodado e tentou mudar de assunto:

— E Winky?

Hermione se iluminou, na mesma proporção de que ficou vermelha de fúria ao se lembrar do que Bartolomeu Crouch havia feito a sua elfa na copa mundial depois de tê-la pego com a varinha de Ron.

— É verdade, Dobby! – exclamou animada. – Tem essa elfa, Winky, que também está livre, você poderia ajudá-la a encontrar emprego aqui em Hogwarts também!

— Winky, a senhorita quer dizer a elfa do senhor Crouch?

— Isso! Você a conhece?

Dobby pareceu momentaneamente abatido, mas nada muito extremo:

— Conheço Winky sim, senhorita, mas Winky, diferente de Dobby, não queria ser um elfo livre. Winky estava arrasada quando seu amo a dispensou. Muito envergonhada.

— Envergonhada? – perguntou Hermione perplexa. – Mas é o Sr. Crouch que devia estar envergonhado e não Winky! Ela não fez nada errado, ele é que foi realmente horrível com ela.

Dobby tremeu, como se a sugestão de falar mal de um bruxo o incomodasse muitíssimo, mas continuou sua história:

— Dobby chamou Winky para procurar emprego junto, mas Winky foi chamada para trabalhar em uma nova casa e Dobby não teve mais notícias de Winky desde então.

— Como assim? – perguntou Neville.

— Faz parte da escravidão do elfo doméstico, meu senhor. Guardamos silêncio e os segredos dos amos, meu senhor, defendemos a honra da família e nunca falamos mal dela ou a expomos sem que ela deseje. A nova casa de Winky, mestre Neville Longbottom, pelo jeito é bem reservada e Dobby ainda não teve a chance de conversar com Winky. Dobby não tem acesso a ela.

— Mas você consegue aparatar até em Hogwarts.

— Winky não quer Dobby na casa de seu amo. Winky deve pensar que seu amo prefere assim e se Winky pensa que seu mestre não quer Dobby, Dobby não entra para falar com Winky. Ela nem mesmo me contou seu novo nome.

— Novo nome?

— Winky foi rebatizada pelo novo amo, as vezes acontece, novo lar, novo elfo, Winky não deve carregar a lealdade da antiga casa consigo, e seu nome está atrelado a isso. O professor Dumbledore não espera que Dobby seja fiel a ninguém, já que Dobbby é livre...

Naquele momento os elfos todos se agitaram e olharam em direção a porta, que parecia estar se abrindo novamente.

Foi uma tremenda surpresa para Neville quando viu os cabelos rebeldes de seu melhor amigo entrando pela passagem secreta da cozinha de Hogwarts.

Também impressionante foi Dobby correr como um louco e replicar a saudação emocionada que havia lhe oferecido antes. Se jogando contra a barriga de Harrison que se curvou com o baque, chorando e cumprimentando "Harry Potter, meu senhor!"

— Olá Dobby – Harry cumprimentou, como se já o conhecesse.

— Oi Hazz.

O aluno da Durmstrang olhou para o canto, onde estava o grupo e sorriu abertamente, uma mão nos ombros de Dobby, outra levantada para acenar:

— Olá pessoal. O que fazem aqui?

— Poderíamos te fazer a mesma pergunta.

— Eu vim comer Cookies, eles ajudam contra os zonzóbulos, aparentemente. Se comer antes de dormir.

— O que? – questionaram completamente confusos enquanto um bando de elfos se agitava para preparar os tais cookies para Harry.

— Oh não! – se adiantou. – Dobby, os outros também, não façam os cookies agora, por favor, voltem para as tarefas que estavam antes de eu chegar, vou conversar com meus amigos primeiro.

Foi como se eles tivessem recebido a ordem de um Deus, todos os elfos imediatamente se curvaram e disseram em coro:

— Sim, mestre Harry Potter – e voltaram a trabalhar no que faziam antes.

Isso incluiu Dobby, que voltou a mesa com os grifinórios:

— Onde Dobby estava?

Aquilo espantou o grupo, mas o pior foi a reação de Hermione:

— O que você fez com eles? – perguntou acusadoramente.

— Desculpe, como?

— Hermione – Neville chamou, antes que ela dissesse algo terrível.

— Não, Neville, ele tem que ouvir. Escute aqui, Potter, não sei o que fez para os elfos obedecerem a você dessa forma, mas...

— Eu pedi por favor, eles gostam quando somos educados.

Hermione não ouvia, tinha começado um de seus discursos:

— Acho que foi a melhor coisa que poderia ter acontecido a esses elfos, Dobby ter vindo trabalhar aqui. Os outros elfos vão ver como ele está feliz, depois de libertado, e podem aprender e desejar a mesma coisa ao invés de apoiar um sistema escravista e senhores de escravos como você, Potter, com quatro elfos, tratando-os como se fossem servos sem vida e direitos que...

— Hermione! – gritou Neville.

— Meus elfos não são escravos e eu concordo com você – disse Harrison sorrindo com divertimento.

— Estão lá para obedecer a suas ordens sem descanso ou recompensa monetária. Eles são seres vivos e merecem ser tratados com igualdade e...

— Hermione, pelo amor de Merlin! – gritou Ron agarrando o braço da amiga. – Escute o que estamos te falando!

— O que foi Ron? Eu já disse que isso é errado e...

— Eu sei, inferno! Harry Potter acabou de dizer que concorda com sua maldita ideia e você ainda está dando bronca no pobre coitado!

Isso enfim trouxe a Granger para a realidade, fazendo-a piscar para os amigos e por fim olhar completamente espantada para Potter:

— Você concorda?

— Sim. Onde que eu assino para entrar no F.A.L.E?

— Ele falou o nome certo – sussurrou espantada, como se nem conseguisse acreditar.

Harrison riu e se juntou ao grupo, agradecendo quando um dos elfos ofereceu uma xícara para que tomasse chá com os demais.

— Neville me contou por cima – disse Harry. – Mas eu concordo que os elfos deviam ter direitos, mesmo que eles não acreditem nisso na maior parte do tempo. Os meus odeiam ser livres, às vezes. Na maior parte do tempo, na verdade, mas o sistema enraizou em suas mentes de que eles só terão honra se forem escravos, quando podem perfeitamente serem os elfos da minha família por livre e espontânea vontade, não por serem escravos forçados a isso. Era o que meu bisavô sempre dizia, que se conquista muito mais daqueles que querem estar ao seu lado e lhe servir, do que forçando uma condição. Assim nascem rebeldes insatisfeitos como Dobby, que vão querer a liberdade da qual tem direito. Não é mesmo Dobby?

— Sim, Harry Potter senhor!

— Seus elfos... – murmurou Hermione ainda desacreditada.

— São livres. Quatro deles, pelo menos. O elfo de Sirius, Monstro, é velho demais. Não consigo ensiná-lo a suportar uma realidade onde seja livre. Ele entraria em depressão e não tem saúde para lidar comigo libertando-o, então faço o máximo para lhe dar uma vida digna e descobrir como ele se sente confortável para estar sempre garantindo que isso se repita. Os outros eram novos quando meu bisavô os libertou e pediu que o servissem por própria vontade e magia.

— C-como...

— Eu disse que falaria com Hazz – explicou Neville. – Mas é que ele está sempre ocupado e você tem tantas ideias que eu não queria que fosse incomodado com isso. Do jeito que Harrison é, assim que ele ouvisse seu projeto, ia querer adotar como mais uma de suas revoluções pessoais e ele tem que aprender a dormir uma quantidade de horas saudável e comer antes de se enfiar em mais um projeto!

Harrison levantou as mãos em rendição:

— Tudo bem, já disse – e olhando para Hermione sorriu afetuosamente. – Prometi a Neville que assinaria sua petição e te ajudaria apenas no mínimo. Que esse é um projeto seu e que não era para me envolver.

— E você – apontou Neville para a amiga. – Não vai pedir coisas demais a ele, porque ele vai fazer e eu vou ficar muito bravo de você estar querendo libertar elfos domésticos e tratar meu amigo como um.

— Eu nunca – Neville a interrompeu sem deixar que terminasse.

— Você não o conhece. Hazz gosta de abraçar todas as causas e ajudar todo mundo, é o maior coração que já conheci – Harrison corou com aquilo e se sentiu culpado. Não era nem de longe um coração tão bom quanto o amigo o considerava. Neville continuou: — Se você enfiar na cabeça dele em qualquer coisa, qualquer pedido, ele vai levar isso muito a sério e não vai olhar para os próprios limites, ele vai priorizar te ajudar e isso que você está querendo não é uma coisa fácil. Nem rápida. É mudar uma sociedade e como pensar, é uma batalha árdua e ele vai querer ser parte dela a menos que seja parado. Hazz já tem muita coisa para fazer, está sempre cheio de compromissos e eu não queria que se enfiasse em mais um, então não me faça me arrepender Mione. Seja uma pessoa legal com ele e aceite sua assinatura, pode até falar com ele sobre suas ideias, mas não peça ajuda, porque ele já está tentando ajudar gente demais.

Hermione piscou para Neville que a encarava com a respiração ofegante depois de seu discurso, mas uma intensidade febril que a fez entender que, apesar de todas as suas dúvidas, o certo agora era ouvir.

Se Harry Potter não podia ajudar naquela luta, ela não pediria demais dele.

Mesmo assim ela quis fazer perguntas e depois de confirmar que podia, ela desatou a falar com Harrison. Ficou maravilhada com Dobby contando como, graças a Harry Potter e sua vitória contra Voldemort a vida dos elfos melhorara, como ele já tinha influência para as criaturinhas e como seu nome poderia por si só fazer a diferença, apenas por ser quem era.

Aquilo era muito poder para um menino só e Hermione constatou com preocupação, mas em pouco tempo falando com o menino ela criou uma nova certeza.

Era merecido.

Harry Potter merecia o poder que tinha.

Ele não era uma cobra a qual Deus havia dado asas.

Era gentil e usava seu poder para o bem.

Se entendesse um pouco melhor ela teria percebido que uma cobra com asas era nada mais que um dragão, mas não percebeu.

Neville e Ron praticamente foram esquecidos enquanto ambos debatiam conceitos, trocavam experiências (Harrison com centenas de vezes mais) e discutiam possibilidades, das quais Neville enfaticamente lembrava que Harrison não participaria.

Quando Ron começou a reclamar que estava cansado e lembrou Mione do toque de recolher, o que a fez decidir que podiam continuar a falar outro dia, Hermione já tinha se decidido sobre algo que vinha pensando desde que Dumbledore plantou a semente da dúvida.

Seja lá o que as artes das trevas faziam com um bruxo, não fizeram a Harry.

Ele era bom.

Estava do lado deles.

-x-x-x-

— Olhe só – comentou George com um sorriso confuso, mas divertido. – Não está muito tarde para dragões bebês andarem por aí?

Harrison, que ainda estava na cozinha de Hogwarts e decididamente não tinha visto as horas, apenas levantou o rosto da tigela que estava batendo sua massa e encarou o ruivo por um tempo. Como se estivesse tão distraído em seu próprio mundo que demorou para assimilar que havia mais alguém com ele.

Os elfos começaram a cumprimentar o mestre George e perguntar quanto de comida ele queria, mas o Weasley gentilmente garantiu que estava bem e que queria apenas um pouco de suco de abóbora, se pudessem.

Eles energicamente o serviram e nesse meio termo ele e Harry não trocaram mais que olhares. George notou que em algum ponto sua alteza tinha se recuperado e voltado a seja lá o que estava fazendo, mas sorria para ele.

Quando se aproximou, viu que o menino, pela primeira vez desde que o conhecera, parecia muito... normal.

Sujo de farinha, uma bacia de prata no braço, um batedor tipo pera na mão suja com pedaços de massa grossa e a roupa.

Ele estava com roupas quase trouxas.

Uma calça com certeza trouxa, já que nunca viu um bruxo usando uma coisa larga e cheia de bolsos como aquela. Ou correntes. E tinha uma camisa branca com padrões de veludo verde e gola alta. Havia uma capa, em cima da mesa deixada de lado e parecia bem maior que o menino, não combinava nada com todo o resto e parecia até deslocada ali.

Ele estava de óculos.

Era sempre fofo ver sua alteza com os óculos que bloqueavam sua visão mágica. Provavelmente estava usando por causa dos elfos e da magia que devia circular pela cozinha de Hogwarts.

— Boa noite, George – cumprimentou baixinho, um sorriso estampando as feições dóceis.

— Tem farinha no seu cabelo.

— Mesmo? – olhou para cima, como se pudesse enxergar a coisa, mas levantou os ombros despreocupado. – Depois eu limpo. O que faz aqui?

— Sinceramente?

George tomou um assento em uma das enormes quatro mesas que replicavam o salão principal acima de suas cabeças, o lugar mais próximo possível do balcão que Harrison usava, haviam vários ingredientes abertos por ali. Provavelmente o menino teve que pedir pessoalmente aos elfos para não tocar ou já teriam limpado.

— Você me pediu a localização da cozinha e fiquei curioso, mas não achei realmente que fosse achá-lo aqui. Ainda mais tão tarde.

— Não tenho ideia de que horas são.

— Duas da manhã.

— Quer Apfelstrudel?

— Como é?

— Tem Apfelstrudel. Decidi fazer antes dos cookies. Minha família gosta e...

— Alteza, não tenho a menor ideia do que seria isso, acho que não consigo nem consigo repetir a palavra.

— Apfelstrudel – Hazz repetiu, porém mais devagar, com menos o sotaque alemão, mais como uma imitação do que seria similar para um ouvinte britânico.

— Strudel de maçã?

— Isso. Quer experimentar?

— Alteza?

— Sim?

— Por que está fazendo doces de madrugada?

Porque estava de cabeça cheia. Porque ele tinha uma câmara secreta para decidir o que fazer logo depois de ter conseguido reestruturar sua amizade com seu melhor amigo. Dumbledore estava de olho em si. Ele e Tom tiveram toda a noite juntos em seus sonhos, mas isso era uma notícia ruim por si só porque queria dizer que Voldemort tinha percebido a ligação entre os dois e passado a usar oclumência, então ele não tinha ideia do que o homem estava pensando ou fazendo. Sabia que provavelmente era o culpado do último ataque ao ministério e que, quase certeza, estava atrás da profecia, mas o que faria quando tivesse a coisa inteira? Não tinha a menor ideia. Lakroff que tinha tomado as decisões desta vez e ele era um vidente do apocalipse, alguma coisa muito ruim ia acontecer, para ele ter uma visão aquilo era a má notícia número dois e Harrison estava no escuro sobre tudo. Além de tudo ele tinha Regulus, aquele homem inconsciente e sem alma que precisava de ajuda e que Lakroff não conseguiu nenhum grande avanço nos últimos anos. Um Remus Lupin desesperado para conseguir salvar o irmão de seu noivo, um padrinho que surtaria se descobrisse em um momento nada oportuno, amigos para se preocupar agora com o maldito comensal na escola, sua magia ainda estava instável, as poções de controle mágico tinham oficialmente acabado e idealmente os gêmeos ainda precisavam de dois meses para terminar uma, isso se não errassem a primeira tentativa, o que era muito possível, tinha um baile e jornais o observando para noticiar coisas mundialmente o que era uma chance que não deveria perder para seus planos, mas ao mesmo tempo era tanta coisa para pensar que...

Que ele estava ali.

De madrugada.

Fazendo os doces.

Então tudo que respondeu para Weasley foi:

— Por que não?

George riu, completamente encantado com o olhar quase vidrado do pequeno príncipe focado em seus cookies.

— Porque não – repetiu sorrindo para o garoto. – Onde está o negócio de maçã?

Hazz parou de mexer sua massa e foi até o balcão, pegando um prato e servindo um pedaço gentil de uma coisa de massa enrolada e recheada, com bastante caldo e açúcar de confeiteiro por cima.

— Você prefere chantily ou sorvete?

— Como?

— Os dois são bons para acompanhar, mas tem que ter pelo menos um – explicou com calma.

George teve que rir:

— Alteza porque não faz como gosta mais, tenho certeza de que qualquer coisa que tenha feito esteja ótima.

— Mesmo que seja da culinária Alemã? Alguns julgam muito. Apesar de esse prato ser originário da Áustria...

— Sinceramente as pessoas também não tecem grandes elogios à culinária britânica então...

Hazz sorriu:

— É verdade. Bem, vou fazer do meu jeito então.

Harry colocou o prato na mesa onde George estava, então voltou para o balcão, de onde pegou uma colher e um pote de metal, trouxe, colocando uma bola de sorvete de baunilha em cima do doce, então antes que George experimentasse, o parou, dizendo que ainda não havia acabado. Voltou a andar para o balcão, pegou um sifão e acrescentou chantily por cima.

Assim como "porque não cozinhar às duas da manhã?", George pensou que a resposta de Harrison para o doce era "porque não colocar os dois?" e achou aquele detalhe sobre o menino extremamente fofo.

Por algum motivo, ficou feliz de descobrir que sua alteza era, no fim, uma formiguinha.

Quando enfim foi liberado para experimentar, uma explosão de sabores maravilhosa se juntou à sua boca, com uma massa suave que era acompanhada lindamente por todo o creme, o sorvete e o chantily.

— Muito bom.

Harrison voltou a sorrir, parecendo muito satisfeito que George tivesse gostado e isso aqueceu o coração do ruivo que se sentiu tentado a acrescentar:

— Eu comeria mais dez.

Agora, ele foi agraciado por uma risada:

— É uma pena que não fiz o suficiente. Vou levar para meus amigos no barco, mas posso te fazer um pouco outro dia.

— Outro em que você estiver tentado a cozinhar até lá pelas duas da manhã?

— Algo assim – acenou.

— Alguma coisa o motivou para decidir que hoje era um bom dia para arregaçar as mangas e fazer seus próprios doces?

Hazz voltou para sua massa de biscoitos:

— Na verdade, Luna. Ela acha que estou com a cabeça muito cheia e que precisava espairecer.

— Cozinhar te ajuda com isso?

— Eu sempre achei cozinhar uma tarefa divertida. Até quando morava com meus tios, era uma das coisas que menos parecia uma punição. No orfanato eu me oferecia para ajudar sempre na cozinha. Teve um dia... – ele se calou.

Seus olhos brilharam com algo que parecia pesar, a recordação não era boa, George não teve dúvidas, mas mesmo assim ele continuou. Por algum motivo, Hazz se sentia tranquilo em contar algo assim para os gêmeos. Para George. Talvez porque eles já soubessem muito, já tivessem o pior de seu passado, então mais um detalhe cruel aqui e ali não pioraria as coisas. Talvez só os motivasse mais a ajudá-lo. Como os leões cuidadosos que Hazz sempre imaginou que fossem.

— Um dia na cozinha que foi tão tranquilo que até minha tia pareceu contagiada. Ela cantou naquele dia.

"E me deu uma cicatriz horrenda de óleo quente" essa parte não precisava ser dita.

— Acho que ela gostava de cantar, não sei. Minha mãe gostava. E meu tutor. Cozinhar e música, isso me distrai, não necessariamente os dois juntos, mas enfim...

George não precisava dos detalhes sórdidos, que sabia que estavam presos às entrelinhas. Passado é passado. Com sorte ele e Fred poderiam ajudar Harrison a esquecer mais um pouco dele, sentir menos o peso do que ele carregava, em breve. Por hora, presente.

Ele e Fred gostavam de tornar o presente algo divertido.

Por isso se levantou e se aproximou do menino, ainda com seu prato de doce na mão.

Não ia deixar um único farelo para trás, estava realmente uma delícia.

— Você canta, alteza?

Hazz corou muito levemente, se George não estivesse perto provavelmente nem notaria, e murmurou:

— Prefiro tocar instrumentos, meu tutor é um cantor bem melhor.

— E precisa ser um bom cantor para cantar? Minha mãe é péssima nisso, mas faz um show completo enquanto limpa a casa.

Isso tirou uma risada do mais novo:

— Ela parece com meu tutor então.

— Seu tutor limpa a casa? Mesmo com seus elfos?

— Às vezes. Para distrair a cabeça. Limpamos todos juntos. Os elfos são bem mais rápidos e provavelmente se esforçam para ganharem na velocidade de nós, pois assim conseguem limpar mais cômodos antes que cheguemos neles, mas enfim, nós tentamos completar ao menos um.

George riu:

— Seus elfos são realmente ótimos.

— Eles são.

— Mas você sabe que não pode ficar até tão tarde, não é? Você precisa dormir também, alteza.

Harrison revirou os olhos, mas ainda estava sorrindo:

— Sim papai, pode deixar.

— Ei, não me chame assim, eu sou mais velho, tenho que ser responsável.

— Sua mãe estaria orgulhosa.

— Talvez, quem sabe – e deu de ombros.

Hazz imediatamente percebeu que havia algo ali.

Aparentemente George tinha problemas com a mamãe.

Que coisa, não? Uma casa com sete filhos, quem poderia imaginar que algum acabaria se sentindo diferente?

Na casa de sua mãe havia duas irmãs e já tinha dado naquele desastre.

Não ia perguntar sobre aquilo de toda forma:

— Sabe cozinhar, George?

— Muito pouco, geralmente nossa mãe pede minha ajuda para outras tarefas da casa, como caçar gnomos de jardim.

— Meu tutor não tem muitos problemas com eles, mas acho que é a barreira mágica.

— Me ensina a fazer uma? Nem sempre quero desperdiçar meus dias de férias caçando aquelas coisinhas.

— Vou pensar no seu caso.

— Que cruel! – dramatizou fazendo Hazz sorrir, então o cutucou. – Ao menos vai me deixar comer seus cookies, certo?

— Claro. Pegue as gotas de chocolate para mim.

George se espichou para olhar para a bancada e pegou a pequena travessa com os chocolates, jogando dentro da massa de Harrison e o assistiu mexer mais um pouco.

— Minha mãe também usa muitos feitiços e magia caseira para ajudá-la com esse tipo de coisa – comentou distraidamente.

— Sim, eu conheço a maioria, mas não uso. Prefiro fazer do jeito trouxa.

— Mesmo? Porque? Não é mais trabalhoso?

— É, mas também é mais prazeroso.

— O doce ou fazê-lo?

— Um pouco dos dois.

— Quer falar sobre o que está ocupando sua cabeça ou apenas se distrair? – isso ele tinha que confirmar. Talvez Harrison precisasse de uma opinião seja lá sobre o que o afligia e não ia simplesmente deixá-lo se corroendo por dentro enquanto tentava dar uma de brincalhão.

Mas se ele dissesse que queria distração, George aprenderia a cozinhar se fosse preciso.

Só queria ter certeza em que pé estavam primeiro.

— Aqui não – sussurrou o menino e George entendeu.

Haviam literalmente muitos ouvidos leais a Hogwarts, seja lá o que fosse, deveria ficar na encolha.

— Nada que eu posso ajudar?

— Talvez. Você já estudou sobre rituais?

George riu. Era óbvio que não. Hazz também sorriu, apesar de não ter tanta diversão em seu olhar:

— Imaginei.

George mordeu o interior da boca. Não iria perguntar que tipo de ritual, nem o que estava acontecendo se aquele não era o momento, mas de uma coisa sabia: não queria ver sua alteza com aquele olhar perdido.

Nem receber sorrisos falsos.

Isso nunca.

Ele estreitou os olhos e pegou uma boa garfada do doce:

— Coma – mandou e mostrou o garfo para Harry.

Doce, podia muito bem começar por isso.

Ele e Fred tinham o objetivo de trazer alegria para as pessoas. Tornar a vida mais divertida, menos monótona e cheia de assuntos sérios, compromissos que faziam as pessoas perderem parte do que eram quando ficavam mais velhas.

A seriedade podia fazer parte da maturidade, mas também da morte de algumas pessoas, eles acreditavam, porque muitos deixavam de viver. Já viam isso em Percy, por exemplo, que não parava de fazer relatórios para um chefe que nem lembrava seu nome desesperado para ser alguém em uma carreira que o sugaria e daria pouca ou nenhuma felicidade genuína.

Aquilo não era viver.

Não para os gêmeos.

E seja lá o que sua alteza tinha, não podia deixar como estava. De todo modo, para sua pergunta Hazz não respondeu não. Ele queria poder falar, só não tinha como, isso era complicado.

George esperou o menino comer um pouco de seu próprio doce antes de perguntar:

— O que te incomoda. Tem a ver com algo que eu saiba?

— Com meu pai, eu acho.

— Bem, isso é complicado, senhor órfão.

Hazz cantarolou:

— Não é?

Adorava como os gêmeos não o tratavam como se fosse de vidro, mas também não ignoravam suas fraquezas. Havia um bom equilíbrio rolando ali e tão natural que ainda o espantava.

Mas vamos lá, teve algo parecido com Luna.

Mesmo que ela fosse uma vidente como ele e os gêmeos fossem apenas... os gêmeos.

— Já pensou em perguntar ao mapa? – sugeriu George.

— Não sei nem como perguntar, mas não acho que ele saberia alguma coisa, era muito mais novo. Preciso de outro James.

— O lorde Potter. Não Pontas.

— Exato.

— O que mais?

— O que te faz pensar que tem mais?

— Porque sua vida é uma confusão e você, alteza, se enfia em muita coisa de uma vez, aposto que tem mais, ou estaria conseguindo lidar.

— Ainda não me acostumei com o anel de lorde.

— Era de se esperar – ele tinha pego três títulos de uma vez. – Ao menos isso vai ficar para Bill, eu estou livre.

— Seu pai ainda é o Lorde?

— Não tenho ideia como ele e Bill se resolveram sobre isso. Se meu pai vai abdicar cedo ou se vão esperá-lo morrer para William assumir o posto de Lorde da casa.

— Não é o tipo de assunto que te pega.

— Definitivamente não. Vantagens de ser o quinto filho.

Hazz inclinou a cabeça, divertido:

— Fred nasceu primeiro.

— Um minuto, mas é o bastante para ele me encher a paciência com isso.

— É claro que os demônios não deixariam nem um ao outro em paz.

— Nunca. Somos péssimos juntos, mas sozinhos um com o outro somos pragas.

O mais novo tornou a rir baixinho e começou a enformar seus cookies na assadeira. George levantou, perguntou como podia ajudar e os dois fizeram aquilo juntos. Quando terminaram o grifinório alegremente aceitou os restos na tigela e na colher para comer e já foi garantindo que ficariam deliciosos.

Os dois se sentaram na mesa e aguardaram a coisa assar.

— Uma vez – contou o mais velho se inclinando no assento para dar uma boa espreguiçada. – Fred se engasgou com uma uva e espirrou, a uva estourou e saiu pelo nariz.

A reação imediata de Harry foi rir de tal modo que quase não foi natural, como se engasgasse com a ação mais de uma vez e lutasse com ela para não se tornar um ataque de risos. Ele não tinha ideia do porque George lhe contara aquilo, mas o gêmeo não parou de falar:

— Você comentou sobre sua casa, não acho que há muito para falar sobre a minha, as partes mais divertidas são meus irmãos. Ser em sete gera situações ótimas. Bill tropeçou nas escadas uma vez e quebrou um degrau, nossa mãe ficou furiosa porque ele estava pulando os degraus de dois em dois e ela jurou que foi isso que causou o problema, ele já era mais velho, então tirou o pé e tentou consertar. Ele ficou vinte minutos brigando com a madeira que não reparava até perceber que alguém devia estar fazendo um contra feitiço. Saiu correndo atrás de Charlie jurando que era ele, mas no fim era nosso pai. Os três levaram bronca.

Harry riu mais um pouco:

— Acho que meus irmãos fariam esse tipo de coisa se tivessem chance.

Ele queria ter a chance de contar algumas das coisas que seus irmãos fizeram, mas haviam muitos elfos e não tinha certeza se poderia sem que Dumbledore também ficasse sabendo.

— Uma vez... – começou, cautelosamente. – Alice foi fazer a janta. Ela pegou uma colher e encheu com metade de sal, depois encheu com a comida, de um jeito que não dava para ver o sal. Então levou para o meu tutor. Ele comeu e não teve coragem de dizer que achou horrível, mas o pior foi que ele nem reagiu, sabe? Ele só engoliu e a mentira já saiu "está ótimo querida, você é uma cozinheira maravilhosa, me daria um pouco de água?", eu e meus irmão quase morremos de rir dele. Nota de centavos, como diria um amigo nosso.

— Uma vez Fred pegou o prato de Charlie quando ele saiu porque tinha mais carne, mas ele esqueceu que ou não viu que ele tinha colocado um bando de pimenta. Ele quase gritou de tão ardido que estava e ainda levou uma bronca imensa da nossa mãe por tentar roubar o irmão.

— Diego colocou uma barata numa caixa e deu de presente de aniversário para Alice porque assim ela podia ter outra como ela em casa.

— Como ela reagiu?

— Quase teve um surto, o bicho subiu no braço dela e normalmente Alice é a mais durona da casa, mas nas próprias palavras dela "uma barata no braço é o limite de qualquer um". O pior é que ela estava de manga comprida e a barata entrou por dentro da blusa.

— Não... – murmurou rindo.

— Ela teve que arrancar a roupa e ficou se batendo feito louca até nosso tutor lembrá-la que somos bruxos e que ele já tinha atraído e matado o bicho, mas ela dizia que não parava de sentir as patas.

— Falando nisso, acho que dei um medo duradouro no meu irmão, o Ron, de aranhas com uma pegadinha que eu e Fred fizemos. Transformamos um urso de pelúcia dele em uma aranha gigante quando ele tinha três anos.

— Que maldosos.

— Em nossa defesa, tínhamos cinco anos, foi proposital, mas nem tanto.

— Um pouco impressionante que vocês conseguissem fazer uma transfiguração aos cinco anos.

— Olha quem fala!

Os dois riram.

De alguma forma, foi assim que Harrison passou a próxima hora. Comendo cookies e trocando experiências sobre os irmãos e os momentos mais engraçados em família. Foi, além de divertido, muito calmante para Hazz, que teve o prazer de lembrar vários momentos com sua família que, no começo de suas vidas, não era tão grande e que agora tinha até mesmo aumentado.

Perceber, entretanto, que considerava Sirius e Remus como da família em tão pouco tempo foi meio chocante, mas nem por isso ele se perdeu em suas preocupações sobre Regulus, Tom ou todo o resto.

Ele apenas se divertiu e encheu a barriga.

Era a segunda vez que os Weasley conseguiam fazê-lo se distrair àquele ponto.

Se esquecer dos problemas e sorrir.

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-x-x-x-

O café da manhã de domingo estava calmo e meio letárgico como geralmente era naquele dia da semana no grande salão.

As corujas que chegaram para entregar os jornais Dominicais apareceram no horário e os alunos da Sonserina logo se surpreenderam em não só receber o jornal, como várias cartas pessoais.

Aquilo era incomum.

A maioria na Sonserina já tinha assinaturas mensais pagas e por isso as aves apenas soltavam as encomendas e se dirigiam para fora. Nott virou a carta com o símbolo de sua casa nas mãos e Draco encarou a sua própria, com o emblema oficial dos Malfoy.

O que será que aconteceu?

Ele rasgou o envelope e começou a desdobrar a carta de seu pai, lendo-a curiosamente.

Os burburinhos no salão principal, entretanto, chamaram sua atenção e o fizeram olhar para frente. Bem no momento em que Viktor Krum começou a rir lendo o jornal.

Ivan, um pouco ao lado, arfou:

— Puta vaca de merda!

Axek lhe acertou um tapa:

— A língua.

— O caramba minha língua. Olha o que essa barata loira escreveu.

Isso despertou o interesse dos sonserinos, Draco abandonou por hora a carta de seu pai e abriu seu jornal, arregalando os olhos para a manchete. Nott, ao seu lado, se esticou por cima de seu ombro para ler consigo, os dois ouviram Pansy soltar um som completamente indecoroso para uma dama que deveria ser uma risada, então caiu na gargalhada, seguida imediatamente por Draco.

Luna encarou os dois:

— O que foi? – e se inclinou deitando no ombro de Pansy, que imediatamente parou de rir, mas logo retornou quando a loira simplesmente sorriu e comentou: - Que situação.

Harrison olhou para as meninas que davam risinhos para ele, Blaise, Heinz, Adrian e outros agora também estavam rindo e Nott foi o primeiro a fazer uma piada sobre aquilo:

— Parabéns, Potter, parece que você ganhou um par de chifres.

— Dado pessoalmente pelo jornal britânico mais popular – acrescentou Ivan. – A propósito, me desculpe pela facada terrível nas costas.

— Oh Baba Yaga, não me diga? Imagino então que os chifres foram presente de... – e olhou para o lado.

Luna levantou a mão, só risinhos com Pansy.

— Essa é nova, nem sabia que tínhamos esse tipo de relação, minha lua.

— Chamá-la de "minha" pode ter dado essa impressão, já pensou nisso Potter? – perguntou Blaise.

Harrison levantou os ombros:

— Se essa é toda a fonte que um jornal sério precisa, eu lamento por vocês britânicos, que não possuem uma publicação diária séria. Que tipo de relacionamento eu e Luna temos afinal?

E se espichou para o lado de Pansy, que gentilmente mostrou ofereceu o jornal:

— Você deveria assinar também, sempre precisa de um dos nossos.

— Eu vou assinar essa porcaria para que? – e diante do espanto dos demais na mesa imediatamente se corrigiu – Quero dizer, não vejo motivos para financiar algo que não se preocupa em espalhar notícias falsas.

Era tarde, entretanto, as risadas que tomaram a mesa da Sonserina, tanto pela notícia de que "A namorada de Harry Potter o trocou por um de seus melhores amigos", quanto por Harrison ter chamado o jornal de porcaria, duraram um tempo considerável.

— Pobre príncipe abandonado! – zombou um dos gêmeos Weasley, aparecendo da mesa da Grifinória direto para as cobras, se agarrando a Harrison por suas costas, os braços em seus ombros e o queixo em sua cabeça. – Quem poderia imaginar que Luna seria tão má.

— Quem olha para essa menininha jamais poderia imaginar tamanha traição – comentou o outro, bagunçando o cabelo de Luna que ria, uma risada tão doce e sutil que poderia dar inveja a outras damas que levavam anos aperfeiçoando sons como aquele.

— Devemos nos vingar dela por você, alteza?

— Oh não, eu mesmo cuidarei disso – comentou olhando com apenas carinho para a amiga. – Ela e Ivan conhecerão minha fúria.

— Estou morta de medo.

A zombaria da loirinha fez as risadas aumentarem.

Harrison, por outro lado, estava seriamente lendo a reportagem pensando que Rita Skeeter não podia ter usado tanta energia para que suas sinapses nervosas criassem uma conexão entre duas unidades de neurônios e no fim formar aquilo.

Ele e Luna? Seriamente? Era essa a manchete de primeira página que queria preencher os domingos?

O povo era mesmo tolo e obtuso.

Louco por informações despreocupadas que pudessem ocupar sua mente com tudo menos problemas reais.

Fofoca simples e despreocupada vendia e um jornal precisava ser vendido.

As pessoas não querem ter de pensar o tempo todo. Se preocupar com coisas como mais um problema no ministério, como no dia anterior.

Uma impressão chata lhe acometeu e Luna se aproximou para sussurrar em seu ouvido no mesmo momento:

— Eles querem que a notícia suma.

— O ministério?

Não. Ele sentiu que não era o ministério. O incidente era algo maior, alguém estava querendo tirar os indizíveis da sessão de mistérios.

Luna acenou com a cabeça:

— As cobras escuras.

Voldemort.

O que ele poderia estar querendo?

Olhou para Luna:

— A esfera?

— Ele precisa saber o restante.

Fred bufou acima de sua cabeça:

— Ei, não me excluam da conversa.

A corvina abriu um largo sorriso para o menino:

— É coisa de namorados.

Isso tirou outra onda de risadas do grupo.

George, descaradamente e sem problemas, indicou para que Adrian, sentado a direita de Harry, abrisse espaço e foi sentando, sem nem esperar que o garoto o obedecesse. Sentaria em seu colo se enchesse o saco. Pucey se viu forçado a ir para o lado para evitar contato com o Weasley que leu a manchete:

"A MÁGOA SECRETA DE HARRY POTTER".

— Realmente eles escrevem qualquer coisa aqui. E depois querem diminuir seu pai, Luna, que fez um trabalho muito melhor ontem.

Alguns concordaram com o Weasley enquanto liam a matéria ou conversavam entre si sobre seu conteúdo.

"Um garoto excepcional, talvez – mas um garoto que sofre todas as dores comuns da adolescência. Privado do amor desde o trágico falecimento dos pais, Harry Potter, catorze anos, pensou que tinha achado consolo com sua namorada mais recente em Hogwarts, a garota Luna Lovegood ao qual se vê muito frequentemente acompanhado e da qual, romanticamente, chama de 'minha lua e estrelas'. Mal sabia que em breve estaria sofrendo mais um revés emocional numa vida afligida por perdas pessoais.

A Srta. Lovegood, filha do dono e principal editor d'O Pasquim, revista de cunho duvidoso publicada semanal e mensalmente por Xenófilo Lovegood e que teve uma matéria enaltecida recentemente até por este jornal, é uma garota jovem e considerada por vários colegas tão excêntrica quanto as publicações da revista da família. Vista descalça pelos corredores ou usando brincos de rabanetes, parece simples à primeira vista, mas é ambiciosa. Parece ter uma queda por bruxos das trevas que somente Harrison, presidente do conselho estudantil da Durmstrang, não basta para satisfazer.

Desde que Potter chegou em Hogwarts para o torneio tribruxo, a Srta. Lovegood tem brincado com as afeições do rapaz, mas de repente aparece como par de seu melhor amigo, Ivan Tshkows, um membro de uma antiga e tradicionalista família Russa, antigos aliados políticos de Gellert Grindelwald, o notório lorde das trevas que aterrorizou a Europa décadas passadas.

Visivelmente apaixonado pela dissimulada Srta. Lovegood, Harrison já a convidou para visitá-lo em sua tão misteriosa casa nas férias de verão e insiste que "lamento profundamente ser ignorado tão depressa".

Contudo, talvez não tenham sido os duvidosos encantos naturais da Srta. Lovegood que conquistaram o interesse desses pobres rapazes.

"Ela é realmente feia", diz uma entrevistada anônima, uma estudante bonita e vivida da mesma casa, "e estranhíssima. Ninguém gosta dela, mas é bem capaz de preparar uma Poção do Amor, tem bastante inteligência para isso. Acho que foi isso que ela fez."

As poções do amor são naturalmente proibidas em Hogwarts, e sem dúvida Alvo Dumbledore irá querer apurar essas afirmações. Entrementes, os simpatizantes de Harry Potter fazem votos que, da próxima vez, ele entregue seu coração a uma candidata que o mereça. Além de que consiga amigos mais leais que não lhe esfaqueiem pelas costas. Talvez uma triste semelhança com seu pai, James Potter, que havia confiado em um de seus melhores amigos Pedro Pettigrew, preso em Azkaban desde 1993 por traição e pelo assassinato de sete trouxas, depois de ter entregado a localização da família Potter Àquele-que-não-deve-ser-nomeado. Mais informações vide edição nº735 de 1993 do jornal.

Quem nosso herói convidará após essa situação para o baile de inverno, sediado pelo torneio tri-bruxo em todas as edições e que se repete em 25 de dezembro deste ano, ainda é uma incógnita".

Harrison estreitou os olhos para aquelas palavras e bufou:

— Ela perde horas do seu dia me vigiando e isso é o melhor que consegue?

Estava, na verdade, muito incomodado que aquele maldito besouro tinha conseguido passar despercebido no meio daquele bando de magia no castelo de Hogwarts, o suficiente para que não a notasse e realmente tivesse escutado alguma de suas conversas com Luna, uma vez que haviam sim palavras ditas por ele naquela matéria.

Imediatamente olhou embaixo da mesa.

Não haviam insetos ali.

George riu, apoiando-se na mesa:

— Alteza, Sketeer está ficando sem opções.

Fred murmurou, esperando Hazz se levantar novamente para abraça-lo. Percebeu como o menino parecia se sentir confortável com contato físico e estava muito disposto a oferecer sempre que pudesse:

— Como se o senhor deixasse que Rita Sketeer realmente tivesse sucesso ao vigiá-lo.

— Cuidado Forge, daqui a pouco você será considerado o próximo namorado de sua alteza.

— Seria uma honra, mas acho que nem Sketeer inventaria uma coisa dessas.

Harry bufou:

— Não sei, talvez tenha escutado eu contando ao irmão de vocês alguns dias atrás que tenho uma queda por ruivos e, ao que parece, uma coisa tola dessas pode ser fonte o bastante para criar uma manchete.

— Você tem uma queda por ruivos? – Viktor perguntou de imediato e Harrison riu.

— Por loiros também. Acho que minha fraqueza é um cabelo diferente do meu.

— Arrume um metamorfo e terá todos os cabelos – zombou Nott.

— Boa solução, pena que o único metamorfomago que já ouvi falar é prima do meu padrinho.

— Uma Black? Então nada te impede.

Harrison riu e Fred se moveu, indo sentar-se também o que forçou Pucey e seu grupo a irem ainda mais para o lado com caretas bem incomodadas.

Draco achou aquilo hilário.

— Que contexto de conversa você estava tendo com nosso irmão para falar algo assim? – perguntou Fred.

— Pares para o baile.

— Já pensou em alguém?

— Na verdade, eu ia chamar Luna, mas Ivan foi muito mais rápido.

O russo riu e se encolheu divertido:

— Desculpe.

— Luna e Ivan vão juntos, minhas opções acabaram.

Luna cantarolou:

— Eu era sua única opção?

— Não, você e Ivan eram. E os dois acabaram juntos! Foi a maior ironia da semana!

— Eu era uma opção?! – perguntou Ivan em choque.

— Eu estava contando com você para ser a única pessoa a descaradamente me fazer um convite.

— Tenho certeza de que receberá muitos convites, alteza – comentou Fred, rindo da expressão que Ivan estava fazendo enquanto se desculpava de novo.

— Eu tenho minhas dúvidas, mas obrigada.

Pansy soltou uma risada sarcástica que chamou imediatamente a atenção da maioria:

— Por favor, você tem alguma dúvida de que será convidado? Você?! Então eu virei um pônei.

Hazz sorriu:

— Devo dizer que você é um belo pônei, senhorita Parkinson.

— Deixe disso, você vai receber um rio de convites, se ainda não aconteceu é porque as pessoas estão tomando coragem.

— Fico lisonjeado que pense assim, Pansy, mas com todo o respeito, eu estava falando de convites... decentes. Quer dizer, alguém que queira realmente ir comigo e não com o futuro lorde Black, ou pior: Harry Potter, o menino que sobreviveu. Deuses me livrem de convites assim. E sejamos sinceros, é o que vou receber.

Pansy fez uma careta e se afastou, certa de que sim, era exatamente o que aconteceria.

Houve um momento tenso onde os sonserinos pensaram sobre isso e até os gêmeos, com pesar pelo garoto, mas durou menos de um segundo com Luna cantarolando como uma fada:

— Ivan ainda pode te convidar, eu deixo.

Isso fez o grupo rir.

Ivan esticou o braço, para pegar a mão da menina que cedeu com aquele ar distraído:

— Lua, querida, não posso. Agora sou todo seu para o baile, a menos que não me queira mais, entendo completamente se outro conseguiu sua atenção.

— Não, você está ótimo.

— Viram, acabaram minhas opções – murmurou Harrison derrotado.

Viktor mordeu sua própria boca para não falar nada, o mesmo com Axek, que já havia convidado a garota que estava saindo.

— Você não tem alguma amiga da Durmstrang? – sugeriu Pansy. – Quer dizer, você pretendia chamar Luna, talvez alguma outra amiga...

— Todas têm pares – dispensou negando com a cabeça, então bagunçou ainda mais os cabelos rebeldes, parecendo pensar em algo. – Pansy você já foi...?

— Draco me convidou.

Ele se inclinou para trás derrotado.

Ao menos Pansy gostava de Luna e não iria tornar aquilo estranho, mas nem ela era uma opção.

"Nem Draco" algo no fundo de sua cabeça foi certeiro ao incomodá-lo, mas ele foi ainda mais ligeiro ao ignorar.

— Ótimo, todos tem pares. Alguém aqui, além de mim, está disponível?

Blaise pensou em levantar a mão, mas optou que era melhor não, por uma questão de decoro.

Um dos gêmeos Weasley, por outro lado, não percebeu a mesma coisa e se prontificou.

Draco imediatamente revirou os olhos:

— Ele está querendo dizer alguém que possa ser a convidada dele. Obviamente.

— Ah – murmurou George sorrindo abertamente. – Eu posso ser melhor que a convidada. Alteza, se me permite a honra, adoraria convidá-lo para ser meu par para o baile de inverno.

— Obrigada pelo convite – agradeceu Harry, com a mão no peito, então olhou para Luna – Pode ficar com o Ivan, eu consegui um ruivo para me chamar.

Ivan arfou:

— Assim me ofende! Eu faria um convite muito melhor, não é justo que eu seja moreno.

George estufou o peito, sorrindo:

— Meu convite foi ótimo e foi feito, diferente do seu.

Blaise riu:

— Ele não respondeu, entretanto.

— Até parece que ele precisa – resmungou Draco. – Foi uma brincadeira.

Harrison fez uma careta e se virou para George, o encarando com intensidade que o outro soube imediatamente que estava tendo sua alma olhada, tanto quanto a si mesmo:

— Foi uma brincadeira ou um convite sério?

Muita coisa se passou pela cabeça do Weasley naquele momento e decididamente ele entrou em pânico.

Pensou em sua mãe, em como ela odiaria vê-lo indo em um baile formal, o seu primeiro, com um homem. Como ela veria aquilo como uma brincadeira de mau gosto dele. Como poderia fazer comentários horríveis que o fariam se sentir mal consigo mesmo por ser diferente dos irmãos e gostar do tipo de pessoa que gostava.

Como várias pessoas fariam comentários para ele durante todo o ano, como os jornais o destruiriam e tornariam toda a experiência de ir com um amigo, com Harrison, péssima o forçando a uma espécie de saída do armário onde mesmo sem se assumir, todos assumiriam sua sexualidade por ele e tudo se tornaria um inferno.

Ir com Harry Potter era a pior coisa que podia fazer e o apavorava.

Hazz sentiu isso e sorriu:

— Claro que foi brincadeira, eu vou ser o último daqui a arrumar um par e é isso. Condenado a ser a solteirona da alta sociedade! – brincou fazendo os amigos rirem.

George negou com a cabeça:

— Na verdade, não foi brincadeira, se quiser ir comigo, eu me sentiria honrado em ser o felizardo que terá sua mão para dançar, alteza – admitiu.

O coração na boca.

Pânico total. Ele estava em pânico.

Por fora sabia que ninguém devia ter notado, apesar de todos o estarem olhando com total espanto. Fred tinha um sorriso idiota no rosto que quis socar, de toda forma conseguia disfarçar bem.

Mas não para Hazz.

Isso só o deixou com mais medo.

Harry poderia não aceitar seu convite, mesmo depois de toda a coragem que precisou para fazê-lo, porque pensaria em não forçar George aquelas coisas que o estavam apavorando.

A este ponto ele estava prestes a vomitar as próprias tripas de tão tenso.

Mas... não conseguia se arrepender.

Queria ir com Harrison.

Queria ir com um menino e com alguém que pudesse se divertir. Era a melhor chance que tinha. Ele pensou no momento divertido e confortável na cozinha e como George se sentiu ele mesmo e confortável mesmo sem seu irmão, o que nem sempre acontecia. Como se sem Fred algo sempre faltasse, mas Harrison conseguiu o fazer se sentir completo sem nem tentar.

Era isso que ele queria como acompanhante para um baile.

Por pior que fosse sua vida ao tomar aquela decisão, a liberdade de ter tido a força para tomar o deixava feliz. Então ele queria tanto ser aceito que quase doía.

Por sorte não precisou sofrer.

Harry respondeu:

— Eu quero.

Aquelas palavras fizeram George soltar o ar que vinha prendendo e agora apenas sorriu, apesar de querer gritar de felicidade. Não sabia como a ideia de que tinha recebido um sim poderia deixá-lo tão em choque, mas deixou.

Sua alteza lhe disse uma vez que sua alma era como fogos de artifício, coloridos e chamativos.

Eles deviam estar fazendo uma festa agora, porque era como se sentia por dentro.

Como se tivesse tomado a melhor decisão de sua vida e não importasse o que acontecesse depois, ele conseguiria lidar.

— Nos encontramos na entrada de Hogwarts? – surpreendente sua voz não falhou.

— Claro.

— Perfeito então – e ainda com um sorriso que rezava por todos os bruxos do mundo que fosse charmoso e não maluco, ele se levantou com a graça de sempre, divertido e despreocupado, completamente contrário de como estava por dentro e apontou para a porta. – Eu e Fred estamos indo, nos vemos mais tarde.

Fred teve a decência de não forçar o irmão a ter um ataque de pânico na frente de todos e se levantou animado, puxando o irmão pelo braço e se despedindo:

— Bom café a todos, eu desejaria boa sorte com o coração partido, mas parece que já superou alteza – e saiu, arrastando George para tentar manter o irmão o menos aparentemente tremendo que conseguiu.

Foi bom o suficiente, já que ninguém notou além dele que George parecia um bambu sendo empurrado por um terremoto e uma tempestade de vento em seus braços.

Na mesa, houve um breve instante de silêncio chocado enquanto os gêmeos se afastavam, onde todos olharam para Harrison, que estava parado olhando para nenhum ponto específico, parecendo de repente tão alheio quanto Luna.

Quando ele se recuperou, estava olhando para a amiga:

— Eu tenho um par?

— Tem – ela concordou sorrindo.

— Você não pode ir com um homem! – escandalizou-se Draco Malfoy, o único que teve a coragem de dizer algo que muitos dos sonserinos pensavam.

Harrison suspirou, negando com a cabeça e disfarçando como suas mãos tremias ao escondê-las debaixo da mesa:

— De novo isso, Neville me falou a mesma coisa.

— Oh, que milagre, o Longbottom usando o... – tossiu. – Quer dizer, ele tem razão.

— O lorde Black, meu padrinho, vai com um homem. O que me impede de ir também?

Qualquer resposta que Draco pudesse dar pareceu completamente idiota de repente. Principalmente a pior delas "Porque não sou eu".

Theodore Nott estava com vontade de se acertar um soco por não ter pensado naquilo, Blaise estava rindo abertamente, Pansy completamente chocada, assim como boa parte da mesa.

Mas era isso, eles não tinham argumentos.

Se o lorde da casa que Harrison assumiria estava com um homem, nada em sua visão social poderia dizer que ele não deveria fazer o mesmo.

Argumentar era se colocar contra os Black diretamente.

E ninguém faria aquilo. Não em voz alta.

O choque daquilo foi muito grande para que se lembrassem de ler as cartas de seus pais, que contavam do baile de ano novo que os lordes iriam participar na mansão Malfoy no dia primeiro.

Pelo menos, por hora.

-x-x-x-

George estava deitado em um sofá olhando para o teto por pelo menos meia hora. Vindo dos gêmeos, era muito tempo parado. Fred ficou no chão, ao lado da cabeça do irmão e rindo vez ou outra.

O mais novo da dupla logo se irritou:

— Para com isso.

— Não dá, você parece ridículo.

— Ridículo é essa sua cara estúpida.

— Que bom que temos a mesma, estúpido.

— Eu claramente sou o mais bonito.

— Talvez seja, você que vai levar um príncipe para o baile – George gemeu a menção daquilo e Fred tornou a rir. – Vê se fica bem bonito para a primeira página.

Outro gemido, o ruivo cobriu o rosto com as mãos:

— Eu não tenho nem roupa para isso.

— Tecnicamente tem, já compramos roupas novas para todos, até para nossos irmãos com o dinheiro que sua alteza está nos pagando, mas podemos arrumar algo ainda melhor se está inseguro.

Fred se encolheu de susto quando George se levantou de repente, quase como um vampiro saindo da escuridão, os braços esticados e os olhos arregalados.

— Que merda! – reclamou para o irmão.

George negou com a cabeça:

— Que merda mesmo!

— O que foi?

— Eu tenho que lhe dar um presente.

— Presente, do que está falando?

George parecia que tinha perdido todo o sangue do rosto:

— Um presente, eu o convidei formalmente, Harrison é o maldito lorde de tudo e mais um pouco, é parte da tradição, tenho que dar um presente. O que se dá para alguém que tem tudo?! – perguntou em desespero, a voz ficando decibéis mais aguda.

— O presente não é só quando se está cortejando ele?

— Eu não sei! Eu sou um desastre nisso! Que merda, você é o quarto na linha de sucessão, devia saber mais que eu. Tem certeza que é só quando se está cortejando?

— Não tenho ideia.

George gemeu de novo, esfregando o rosto, Fred evitou rir daquele idiota de novo e ofereceu:

— Faz diferença?

— Como assim?

— Você sabe se está ou não? Cortejando Harrison eu quero dizer. Sabe responder o que queria com esse convite

George choramingou:

— Não tenho a menor ideia.

— Então não faz diferença, dê o presente.

— E se eu não estiver tentando cortejá-lo? Ele é bem mais novo que eu, seria errado não?

— Seu problema é a idade então, não a ideia de cortejar Harrison?

George voltou a choramingar e se jogou no sofá olhando para o teto.

Fred riu e levou um tapa.

Eles não conseguiram deixar de ouvir algo como um furacão de tamanho pequeno correndo de repente em sua direção e os dois olharam na direção de uma muito ofegante Ginevra que os encarava.

— O que foi? – perguntaram juntos.

— Qual de vocês foi?

— Eu – responderam juntos.

— Não brinquem com isso. Qual dos dois patetas convidou Harry Potter para o baile?

— Ele – um apontou para o outro.

Gina gemeu de raiva.

Ao menos isso acalmou George que estava agora apoiado nos cotovelos para olhar a irmã.

— A fofoca já se espalhou? – perguntou o que estava sentado no chão.

Gina chutou que aquele poderia ser George, já que Fred geralmente era o mais folgado e pegaria um sofá todo só para si mesmo que fosse domingo à tarde e muita gente passasse, principalmente no inverno, esse tempo na comunal.

Passou a olhar para esse:

— Como você convida Harry Potter para o baile?!

— Convidando – disseram os dois. — Você vai lá, abre a boca e fala.

E bateram com as mãos, foi uma frase bem grande, era um sucesso que conseguissem tão sincronizadamente pensar nela. Sempre comemoravam essas pequenas vitórias da telepatia de gêmeos.

Gina não estava feliz com aquilo:

— Caramba, é Harry Potter e vocês dois... – mas ela foi interrompida por outro furacão ruivo que se aproximou e quase a empurrou para se aproximar mais.

Ronald, também ofegante:

— Primeiro, como você é tão rápida? – ele perguntou para a irmã, depois se virou para os meninos. – Qual dos dois?

— Eu – tornaram a repetir juntos.

— Que seja – desistiu Ron indo até eles e mostrando o punho para ambos. – Toca aqui, eu sabia! Sabia que Harry ia preferir ir com você do que o idiota do Malfoy! Você é incrível para caralho.

Fred aceitou o soquinho de comemoração, também achava que o irmão gêmeo era incrível. George se sentou:

— De que merda está falando?

Ron se deu a liberdade de sentar no carpete também e contou, escolhendo retirar as partes que decididamente não eram ideais, como o fato de que a primeira opção de Harry havia sido Neville ou como ele parecia querer levar um amigo.

George tinha potencial para tentar mais que isso.

Se quisesse, de toda forma.

— Neville e Harry estavam conversando sexta sobre pares para o baile, Harry queria chamar um menino e Neville mencionou Malfoy, eu sabia que ele não convidaria aquele engomadinho. Harry pode até ter paciência e, sinceramente, considerando como Malfoy parece agir bajulando Potter, até eu não o acharia tão insuportável, mas convidá-lo para um baile? Ele teria uma noite péssima. Então pensei que você poderia fazer isso, ia até te contar, mas você foi mais rápido e o conseguiu, parabéns.

Fred sorriu:

— Obrigada.

— Cala a boca – mandou George para o gêmeo.

— Você foi ótimo, admita. Agora só precisamos daquele presente.

Ron olhou para aquele que, pelo que parecia, era Fred:

— Presente?

— Gred precisa de um presente para dar àquele que ele fez um convite formal. Nós achamos. Não entendemos de tradições antigas.

— Pergunte a Neville, ele deve saber, ou Bill, nosso pai... Eu acho que ensinou ao menos um pouco dessas coisas, não? Quer dizer, ele deve ter cortejado a mamãe.

— Vindo dele? Não duvido que tenha se esquecido de todas as tradições puristas e apenas chamado ela para sair.

— Você tem razão, Neville então?

George gemeu e voltou a se jogar no sofá. Fred riu e desviou do novo tapa, voltando-se para o irmão mais novo:

— Será que Neville vai saber?

Gina enfim sentou-se também, apesar de sentir que os irmãos a estavam ignorando.

Como de costume.

— Claro que vai, Augusta sempre tentou ensiná-lo a ser um lorde. Ele me deu um presente, se querem saber. Ou vai me dar. Disse para aguardar a coruja.

Ron ficou vermelho e se virou para a menina:

— Aquele filho da... Ele está te cortejando!

— Não está, Ronald. Ele disse que é algo para eu usar. Ia me comprar um vestido, assim suas vestes e as minhas iriam combinando, aparentemente é parte da tradição, mas eu disse que os meninos já tinham me dado um novo que e preferia ir com ele...

— Eles deram? – Ron ficou confuso. – Eles também vão me dar vestes novas por emprestar Pichitinho. O que é isso? De onde estão tirando todo esse dinheiro?

— Do: não é da sua conta e companhia – responderam.

Entretanto, como se fosse chamado, naquela hora Lino se aproximou do grupo:

— Desculpem atrapalhar a reunião de família. Fred, Thompson pediu mais vinte cremes de canários e perguntou se você não faz um preço legal para ele por pedir em quantidade.

— A gente faz – respondeu George, que geralmente cuidava da parte financeira do esquema de pegadinhas. Fred vendia as coisas melhor. – Um galeão para ele.

— Perfeito, quanto tempo?

— Podemos entregar amanhã – disseram os dois.

— Vou avisar. Também queria uma daquelas balinhas de enjoo. Quero fugir de uma aula, sabem como é.

— Dois galeões e pode pegar na minha mala, só não confunda com as balas explosivas.

— Obrigada – e enfiando as mãos no bolso jogou no peito de George as moedas e saiu.

Ron fez uma careta:

— As brincadeiras estão dando tão certo assim?

Ele se lembrava da festa que deram após a primeira tarefa e como Dino acabou virando um canário gigante depois de comer o tal "creme", criou uma onda de risadas enquanto Fred o tranquilizava "Ah... me desculpe, Dino. Me esqueci... foram os cremes de caramelo que enfeitiçamos, mas logo passa" depois de um minuto Dino realmente começou a soltar penas e quando todas acabaram de cair, reapareceu tal qual era. E até engrossou o coro de gargalhadas, aparentemente muito divertido com sua pequena aventura como pássaro.

"Cremes de Canários!" anunciou Fred para os alunos facilmente excitáveis. "George e eu inventamos, sete sicles cada, uma pechincha!"

Aparentemente estavam fazendo mais sucesso do que Ron achou que uma pegadinha daquelas faria.

E haviam mais.

Os meninos estavam fazendo um tipo de negócio clandestino em Hogwarts verdadeiramente rentável? De onde achavam dinheiro para fazer as coisas a princípio? Sua mãe nunca daria nada a eles se soubesse disso.

Não que Ron fosse contar, ou se intrometer. Ele e Gina preferiram ficar em silêncio se os meninos ainda estavam sendo gentis o bastante para dividir por tão pouca ajuda esses louros com eles.

— Não pergunte dos nossos negócios e não perguntamos dos seus – disse Fred.

Aquele que Ron achava que era Fred, ao seu lado.

— Que seja. Então Neville vai te dar um presente?

Gina acenou:

— Algo para ambos usarem da mesma cor.

George olhou para ela, guardando suas moedas no bolso.

— Então os pares devem ir combinando?

— Aparentemente algo mínimo já basta, ele perguntou como seria meu vestido e quando expliquei que ainda não chegou, disse que vai me dar um bracelete, assim não tinha erro. Dourado. Dourado aparentemente é o que combinaremos.

— Que ótimo! – resmungou George olhando em desespero para o gêmeo. – O que eu faço?

— Acho que tem que começar conversando com Harrison, como Neville fez com Gin, que tal?

— É, conversar – murmurou tentando se acalmar.

Ron inclinou a cabeça, percebendo uma coisa. Se os meninos tinham dinheiro para comprar suas vestes, de certo tinham novas também.

— Mamãe vai ver no jornal que você estará usando vestes diferentes da que comprou para você, já pensou em como vai explicar isso?

George deu outro gemido e se jogou de cara contra o sofá agora. Fred acertou um tapa em Ron que ficou muito bravo.

— O que foi que eu fiz?!

— Não precisa deixá-lo mais nervoso do que ele já está, palerma.

— Você está nervoso?

Fred fez uma cara de indignação bem marcada.

— Não, ele está nas nuvens, não está vendo?! – e acertou outra bem na nuca do mais novo. – Usa o cérebro Ronikins, será que eu bati tanto que parou de funcionar?

— Vai a merda, Fred.

— Sou George.

— Claramente não é!

Gina olhou para George:

— Porque está nervoso?

Fred arfou:

— Vocês dois são burros por acaso?

— Olhe só – reclamou Gina. – Eu quero saber exatamente o motivo, porque tem vários. É Harry? Não saber as tradições? Ele pode ser lorde mas não é como o restante da Sonserina.

Fred negou com a cabeça:

— Mas é alguém que apoia algumas tradições, nós bem sabemos, até a forma dele de cumprimentar as pessoas é tradicionalista.

— Esse é o motivo então? Podemos descobrir juntos o que George tem que fazer. Esse é o menor dos problemas. Posso pedir para Luna descobrir com os Sonserinos. Tenho coragem até para perguntar a alguém da Sonserina, mas não sei se não vão mentir só para me sacanear. Ainda acho que Neville saberá o que fazer, de toda forma e o que ele não souber, perguntamos para sua avó.

— É um plano – murmurou Fred, mas ele sabia que aquele não era o único problema.

Nem o pior, com certeza.

Molly Weasley.

Aquilo estava deixando George louco.

Fred conhecia o irmão bem demais para não saber.

Como a mulher reagiria? O que George diria a ela? Era sua chance? Tinha que admitir de uma vez por todas que não gostava de mulheres? Que não queria se casar com uma e ter filhos apenas para agradá-la? Que se sentia péssimo pensando que sim, teria coragem de fazer exatamente aquilo e viveria com essa parte significativa de si mesmo enterrado para sempre apenas para não decepcioná-la mais?

Porque eles já a decepcionavam. Constantemente ela falava de seus irmãos, os comparava com os irmãos e deixava claro como eles a decepcionaram.

Em uma onda de monitores, quer dizer os três antes deles foram monitores! Os três! Grandes notas, desempenhos exemplares e coisas assim. Charlie foi capitão de quadribol. Os três tinham empregos exemplares. Percy estava no ministério logo após a formatura, não importa o quão inúteis fossem seus relatórios sobre caldeirões.

Enquanto isso os meninos tinham algumas notas medianas e não eram capitães de time algum, monitores ou qualquer coisa do tipo, viviam recebendo recados, "não levam nada a sério e não pensam no futuro".

Eram os fracassos.

Gina e Ronald ainda tinham potencial, mas os gêmeos?

A mãe já os via como uma falha.

Sua primeira e talvez única falha.

Ela não veria o potencial que tinham com as pegadinhas e não iria querer que abrissem uma loja, não importa que alguém como Harrison Potter tivesse acreditado nisso e os estivesse patrocinando.

Pelo contrário, provavelmente se sentiria insultada se soubesse que tinham envolvido Potter nas suas "coisas inconsequentes".

Um filho gay.

Era o que faltava para que eles completassem o bingo de decepções, não?

"Você não pode ser tão inconsequente!" George já conseguia imaginar o berrador que viria quando a mãe soubesse pelos jornais que ele estava cortejando Harry Potter.

"Ele deveria levar uma dama e você também, mas não, você quer levar tudo na brincadeira, não pensou em como seria ruim para a imagem do pobre menino aparecer e dançar com um homem, não pensou nas consequências para seu pai, para sua família e para você. Que mulher vai querer se casar com um homem que não consegue levar nem mesmo um baile de escola a sério o bastante para cortejar alguém no lugar de chamar um amigo que arrastou para uma de suas travessuras? Uma pública dessas! Sempre uma travessura, sempre uma brincadeira".

"Mas..." pensou George. Dessa vez não era brincadeira.

Estava levando muito a sério.

Pensando no seu futuro e quem queria ser.

George não queria ser uma mentira para sempre.

Não queria casar com uma mulher e lhe dar filhos apenas para agradar a mãe.

Harrison lhe deu coragem, Harrison foi o primeiro a realmente dar valor aos meninos. Acreditar neles.

Não queria decepcionar sua alteza.

Não queria ser fraco e mentir sobre quem era quando sua alteza lhe dizia que gostava de quem George era.

Sua alteza merecia o verdadeiro George e George queria lhe dar isso.

"O quanto você quer dar?" uma parte de si perguntou. O quanto de si próprio queria dar àquele menino?

O quão longe iam suas intenções?

Ele pensou em Harrison. Em seus sorrisos, na forma que também tentava ver as partes boas da vida mesmo com todas as desgraças, como tinha irmãos trouxas quando os trouxas o machucaram e odiaram tanto. Em como usava seu dinheiro para incentivar sonhos e não para se exibir. Como pensava sempre no bem dos outros, mesmo que o mundo por anos não tenha pensado nele. Como se controlava para ser algo que fosse gentil com todos, mesmo que tivesse todos os motivos para se fechar para o mundo.

Como era corajoso, justo, cavalheiro como um grifinório.

Mas era um sonserino.

Como era inteligente, astuto, como enganava as pessoas mas sem nunca ultrapassar limites básicos. Nunca forçando ninguém a nada, apenas acolhendo aqueles que pensavam como ele.

Era um garoto incrível.

Com o mais bonito sorriso que George conhecia.

E como George queria fazê-lo sorrir. Ele sorria por educação com frequência, mas não era sincero.

Era tão mais bonito ver a coisa real.

Pensar que ele tinha conseguido dar felicidade para aquele menino tão machucado era tão... intenso. Dava felicidade a ele próprio cada risada, cada momento descontraído com ele.

George queria levar Harrison. E queria lhe dar uma noite incrível. Queria vê-lo sorrir, rir e dançar. Queria que ele se esquecesse das cicatrizes e talvez ouvi-lo cantar alguma das músicas no baile, já que ele admitiu cantar um pouco na noite anterior.

Quão bonita seria sua voz cantando?

Seria tão bonito como seus sorrisos?

George queria dar a Harrison o seu eu verdadeiro e fazê-lo se divertir com ele. Isso o faria feliz, faria George sentir-se completo de uma forma que só podia mostrar para o irmão até então, mas Harrison mostrou todas as fraquezas para eles, lhes confiou suas dores e fragilidades, George não podia perder para as suas.

Harrison, como era costume, cuidaria dele de volta.

Um dragão que adota o mundo.

Mas gostaria de mostra-lhe um mundo onde poderia sair de sua caverna e voar despreocupado pelo céu.

Ele faria isso.

Sua mãe teria que aceitar George assim.

Se Harrison, um amigo podia, porque não a mulher que lhe deu a vida?

O grifinório se levantou do sofá com essa motivação:

— Vou mandar uma carta para ela.

— Como? – perguntou Fred.

— Mamãe vai saber por mim, não pela maldita Rita Skeeter.

— O que você pretende dizer a ela?

— Tudo.

Fred e Ron arfaram, Gina não entendeu bem, mas sentiu que sim e foi até o irmão para abraça-lo.

Foi uma reação espontânea e a princípio George não entendeu, mas de repente ele a estava abraçando de volta, sentindo o peso do mundo em suas costas, mas ao mesmo tempo mais leve.

Haviam quatro Weasley ali.

E todos o aceitavam.

Era alguma coisa.

— Mamãe nunca poderá dizer mal de sua decisão. Eu não a perdoaria se dissesse algo – sussurrou Giny.

Ele apertou mais o abraço e deu tapinhas nas costas da mais nova e querida. Aquela que todos sempre sentiram que precisavam proteger e que estava, naquele momento, protegendo George.

Ele não estava sozinho.

Podia lidar com a bomba que cairia sobre si.

Ele tinha seus irmãos.

E teria Harrison.

Seja lá o que isso significasse além daquele maldito coração acelerado.

— Alguém viu Neville? Precisamos falar com ele.

O restante do domingo para George foi bem movimentado. Ele teve uma carta muito difícil a escrever, por menor que fosse, já que não conseguia encontrar palavras para explicar para sua mãe tudo que estava sentindo; teve que surtar mais um pouco com a realidade de que sim, se queria seguir as tradições teria que ir combinando com Harrison ou no mínimo lhe dar um presente para que usasse na noite, então ir com Fred para a cozinha preparar a encomenda do creme canário e tentar se focar na produção da coisa sem que sua mente fugisse o tempo todo para imagens de Harrison e do momento que tiveram no dia anterior naquele mesmo lugar.

Os doces de Harrison eram realmente ótimos.

-x-x-x-

Lakroff estava tocando violino intensamente quando Tom Riddle entrou na sua sala pela madrugada. O homem estava aparentemente tão focado naquilo, os olhos fechados, os dedos esbranquiçados pela força com que segurava as notas, suor escorrendo pela testa de cenho franzido, uma combinação que a princípio fez com que não notasse alguma coisa em seu escritório.

Riddle não era o tipo de pessoa que esperava os outros educadamente, quando ele entrava em um ambiente as pessoas deveriam parar para lhe dar atenção.

Mesmo assim...

Era Lakroff.

E ele claramente estava em um daqueles momentos estranhos de foco intenso em que se enfiava em uma coisa e parecia tão inútil se importar ou tentar interrompê-lo, que Riddle apenas aguardou o Grindelwald terminar sua apresentação.

Sua vitrola tinha um solo de piano que Lakroff acompanhava, era provavelmente a única coisa que estava prestando atenção além de si mesmo. Talvez, conhecendo o homem, um feitiço alarme na porta caso alguém batesse, mas aquela que dava acesso aos alunos, nada na porta para seu quarto por onde Riddle entrou direto.

Beethoven, sem dúvidas alguma, Sonata número 9 "Kreutzer", primeiro movimento. Era uma música intensa, com muitas notas onde o violinista praticamente não parava em um ritmo frenético onde a vara acertava as cordas com força ou velocidade extrema.

Era tão óbvio que o homem estava tentando fazer barulho que também ficava óbvio que estava tendo alguma visão.

Ou evitando pensar em alguma.

Riddle provavelmente acabaria com sua paz.

Isso se tivesse alguma naquela cabeça agitada.

Tom sentou-se e aguardou. Foi interessante assistir ao show particular, sem contar que era uma bela música.

E Lakroff estava tão absurdamente focado que era hipnotizante.

Quando ele terminou, a respiração ofegante, os olhos enfim se abrindo, Riddle teve um tempo de deleite para observar aquele homem em sua verdadeira face. O olhar intenso, a boca semi aberta de mandíbula travada, o peito subindo e descendo quase como uma fera tomando fôlego após uma caçada e uma boa refeição. Ele estava tão tenso, tão ameaçador para um homem armado apenas com um instrumento musical. Tão selvagem.

Então sumiu.

Outra música começou a tocar na vitrola, várias cordas, Vivaldi concerto número 4.

— Boa noite – cumprimentou com uma voz grave, o único vestígio da selvageria de antes.

Ele já estava com um daqueles sorrisos gentis falsos, os olhos mais simpáticos, uma vida que não era sua brilhando, mesmo o suor ou sua respiração, agora ele não parecia um homem perigoso, apenas um professor cansado.

Odiava aquilo, mas o que fazer? Riddle também era um homem de papéis em certo ponto da vida. Uma pena que Lakroff ainda não tivesse superado isso mesmo com a idade.

Ou pior, tivesse escolhido aquilo com a idade.

Escolhido não mostrar mais o verdadeiro e selvagem que cobria sua pele.

Escolheu ser uma presa, não predador.

Um desperdício.

— Noite – respondeu Tom, sem ânimo.

Era madrugada, Harrison estava inquieto, sem a culinária a que recorreu no dia anterior para distraí-lo, ou um certo Weasley de brinde que fazia a coisa muito bem, o menino estava inquieto e claramente não conseguiria dormir. Foi quando Tom pediu para falar com Lakroff, era uma oportunidade e Harry entendeu que não queria se meter na briga deles e que Tom não ficaria satisfeito até que pudesse dizer tudo o que o estava enfurecendo.

Mais de uma vez.

Vieram para o quarto de Lakroff para tomar um poção de noite sem sonhos, o que fazia Tom não ter a menor ideia de quanto tempo conseguiria ficar naquela forma.

As coisas já estavam instáveis com apenas o medalhão.

Claro, foi uma grata surpresa que aquela horcrux tivesse força (junto de Harrison, é claro, sem ele nada daquilo era possível) para mantê-lo fisicamente.

Aparentemente andar com ele todas as vinte e quatro horas de seu dia desde que o conseguiu, doando magia instável e intensa de um recém nomeado lorde como forma de diminuir a carga própria, gerou uma horcrux muitíssimo forte e abastecida, muito obrigada.

O medalhão era sua terceira horcrux. Muito forte por si próprio.

E já tinha feito uma vítima.

Carregava muita história, muitos anos absorvendo a magia de um elfo dedicado a destruí-la.

Se o diadema sozinho, sua quinta horcrux, havia sido capaz de criar um espectro de Tom quando Harrison tentou, talvez tivessem de ter imaginado que o medalhão conseguiria manter as coisas mesmo sem seu companheiro.

Não era perfeito, nem tão estável e com certeza exigia bem mais de Harrison. Ele ficou tonto na última vez que tentou manter isso até que Riddle terminasse de gritar com Lakroff pela pequena traição. No pior dos casos, poderia apenas possuir o garoto, mas queria tentar fazer a coisa através de seu próprio rosto primeiro.

Quer dizer, contar a Harrison o que estava fazendo?

Era para os dois estarem contra Voldemort juntos.

Mas de repente eram os Grindelwald lutando...

Por Tom.

Para mantê-lo.

— Você está arriscando demais – observou, sem nem responder ao cumprimento.

Lakroff, com aquela frase, já sabia exatamente a que a horcrux se referia e apenas suspirou, colocando seu violino na caixa:

— Eu sou um homem de riscos, criança.

— Não deveria, não agora.

— Você ouviu o que Harrison disse. Você é dele agora, não de Voldemort. E eu, como alguém que jurou protegê-lo, vou proteger também suas coisas.

— Não me chame de coisa.

— Não se preocupe querido, você é a mais bela e complicada delas.

Tom revirou os olhos.

Lakroff pegou a caixa e guardou-a no seu lugar, depois enxugou seu rosto com um lenço que transfigurou e retomou a forma original depois do uso, então foi até uma das poltronas e se sentou.

— Sem vinho hoje? – perguntou Tom cruzando levantando a sobrancelha.

— Tem minha total atenção, querido.

Riddle nem se preocupou em revirar os olhos para aquela forma de tratamento ridícula.

— No que estava evitando pensar?

— Nada demais.

— Mentiroso.

— Nós dois sabemos que sou.

Silêncio. Lakroff esperou o baque. Tom lhe ofereceu:

— Você me traiu.

— Sim. Contei a Harrison o que você queria.

— Eu te odeio.

— Não sempre, mas decididamente deve estar com ódio agora.

— Lhe garanto que se pudesse, eu lhe mataria.

— Irônico como agora e mais do que nunca – ele tirou de dentro do casaco uma pequena mas muito importante peça de prata com um vidro de sangue. – Você não pode.

Mas se olhares pudessem matar, Riddle estaria sufocando agora e Lakroff caído no chão.

— Em minha defesa, estou fazendo isso por você.

Tom apertou os punhos:

— Eu não pedi isso, quantos riscos você está tomando por essa atitude impensada?

— Eu pensei muito nela.

— Então me diga como! Eu odeio isso! Odeio como você acredita que sabe mais do que todos só porque tem uma habilidade diferente que te dá alguma vantagem! Como quer tomar todas as decisões e arriscar a vida de todos por objetivos egoístas, eu odeio como você...

— Como eu me pareço com você?

— Calado!

— Odiamos pessoas que nos mostram as nossas piores partes.

— Você! – Tom não sabia o que mais queria agora, enforcar aquele homem ou torturá-lo. Qualquer uma das duas parecia uma ótima opção. – Você me irrita tanto!

Lakroff se levantou.

Tom foi atrás:

— E agora quer me deixar no escuro porque é tão convencido e arrogante que acha que ninguém precisa saber suas visões idiotas, que só você vai saber como lidar com elas! Oh, o grande Lakroff não precisa de ajuda, ele é o velho de guerra que não tomará as decisões erradas baseadas nelas! Acha que vai saber o que fazer com elas quando você já falhou muitas vezes nesta mesma coisa! Se fosse um vidente tão bom Gellert não teria perdido a guerra!

Lakroff estava de costas para Tom, olhando para sua prateleira e a horcrux soube que provavelmente tinha conseguido atingir seu objetivo. Pegou no ponto fraco. Havia machucado ou no mínimo incomodado Lakroff.

Para a merda com essa história de autocrítica, ele estava furioso e queria que o homem sentisse essa fúria. Pegaria todos os seus pontos fracos se fosse preciso. Não podia causar mal a ele, veria então o quão longe poderia destruí-lo psicologicamente antes que sentisse um efeito de um pacto de sangue.

Isso se sentisse.

Talvez pudesse matar Voldemort apenas sendo um pedaço de alma rebelde, quem sabe. Poderia testar e acertar alguma coisa na cabeça de Lakroff para aplacar sua fúria.

Grindelwald suspirou:

— Eu nunca disse que era um vidente tão bom.

— Mas agiu como se fosse!

— E você é tão arrogante e convencido que acha que ninguém consegue te vencer além de si mesmo. Acha que meu plano não tem chance porque não é seu plano.

— Bem, você não teria chance contra mim se não tivesse minha ajuda.

— Criança convencida.

— Velho caduco! O pior de tudo é que você continua achando que está certo! Você não se arrepende!

— Eu não – Lakroff deu de ombro e puxou algo entre seus livros.

— Não sei porque eu achei que poderia confiar em você! De todas as pessoas! Você vai nos afundar como já fez antes com seu último grande plano! Parabéns! Tomou todas as decisões erradas! De novo! E não reconhece seus erros, você é tão idiota! É exatamente igual a Gellert!

Existem coisas que nunca se deve dizer a uma pessoa.

Tom nunca se importou com esse tipo de coisa.

Claramente.

Se fosse o caso, teria evitado aquelas últimas palavras.

Aquele era o tipo de coisa que, se não soubesse antes, ficaria evidente de qualquer forma que nunca deveria ser dito a Lakroff.

O homem olhou com tanta fúria para Tom que quase parecia outra pessoa.

Quase deixava de ser uma pessoa.

A vida sumiu de seus olhos e foi substituída por um vazio que seria incômodo para qualquer um. Qualquer um que não fosse um antigo lorde das trevas tão vazio quanto aquele homem. Tão preenchido por ódio insano e desmedido que perdia a humanidade para sangue puro. Não foi surpresa ver a cor vermelha aparecer no lugar do azul, a marca de um homem que tinha se entregado completamente para as trevas e sido tomado por elas, um vermelho fosco, escuro, um pouco acinzentado de um necromante. Bordô ou marsala. Não conseguia identificar tão bem daquela distância, nem tentou tanto. Não era tão interessante a cor que aqueles olhos assumiam como era ver o homem que enfim se mostrava.

Ah.

Aquele era o monstro.

Até sua voz era diferente:

— Eu? Igual a Gellert?

Tom não recuou:

— Pior, porque continua cometendo as mesmas falhas como um tolo.

— Gellert desistiu de uma guerra e um exército por amor.

— E você desistiu de matar um único homem e por quê?

— Eu decidi matar outras centenas.

Aquela frase surpreendeu Tom, que não soube o que responder. Principalmente quando o homem continuou:

— Não sou como Gellert, Riddle – Tom não tremeu, ele se recusava a tremer, mesmo diante de seu nome na boca daquele homem. – Eu sou muito pior. Acha que eu falhei em te matar? – ele se aproximou e agarrou o rosto de Tom.

Tom não era o tipo que permitia quieto e agarrou o pescoço do homem, pronto para apertar até ver o que o pacto poderia fazer a uma mísera horcrux.

Lakroff não vacilou, continuou o encarando com aqueles olhos avermelhados, com a fúria, com o vazio de uma alma corrompida por mortes:

— Você falhou – apertou Tom.

— Eu escolhi quanto você valia. Quanto valia a vida de um lorde das trevas idiota.

— Você não tinha esse poder.

— Mas fiz. E sabe quanto vale, Tom?

— Você – mas o mais novo foi interrompido.

Lakroff lhe entregou com força um caderno de capa de couro. Marvolo olhou para a coisa confuso e soltou sua vítima, seus próprios olhos deviam estar vermelhos, ele abriu a agenda e viu várias palavras escritas na caligrafia do outro:

— Que é isso?

— Vamos chamar de caderno de contabilidade.

Havia muitos nomes naquilo, nenhum número.

— Não entendi.

— São as pessoas que vão morrer por você.

Riddle piscou. Seu cérebro começou a correr, fazendo todo tipo de ligação, ele voltou para a primeira página e leu por cima.

Era uma descrição.

De um evento.

No futuro.

— Minhas visões. Todas elas – concedeu Lakroff, respirando fundo para diminuir sua raiva.

Ou tentar.

Ainda sentia seu corpo queimando de toda forma, sua magia destrutiva louca para destruir qualquer coisa.

Talvez até mesmo Tom.

— Todos que vão morrer, os massacres que Voldemort causará por estar vivo. Tudo que escolhi que aconteceria para te manter vivo.

Riddle ficou um bom tempo quieto. Estava lendo, era óbvio pela forma como seus olhos iam de um lado para o outro no caderno.

— Não sou como Gellert – repetiu, talvez mais para si mesmo, porque precisava dizer alguma coisa, precisava soltar aquela fúria de alguma forma que não fosse contra a pessoa à sua frente.

O maldito que o fez sacrificar centenas de vidas e que ainda se achava no direito de irritá-lo. Maldito arrogante.

Podia estar agradecendo, mas não. Riddle tinha que estar certo.

— E não fui fraco. Eu só percebi que me importava mais com você do que com a morte de alguns de idiotas por aí.

Uma pausa.

Se estendeu por um minuto, depois dois. Lakroff estava começando a se acalmar, seus olhos voltaram a ficar azuis quando Tom ergueu a mão para ele.

— O que foi? – perguntou confuso.

— Pare.

— Com o que?

— Com isso – e fez um gesto amplo para Lakroff.

— Isso o que? – estava começando a se irritar de novo.

— Exatamente – respondeu enfim tirando os olhos do caderno e encarando diretamente o homem. – Isso de virar professor Lakroff. Odeio esse cara. Quero esse aqui – e mostrou o caderno. – Esse assassino.

Lakroff estreitou os olhos e recuou, confuso. Riddle se aproximou dele e, bizarramente, riu.

Ele riu.

Fechou os olhos e riu com vontade, bem próximo de Lakroff, que quase poderia estender a mão e agarrá-lo.

— Do que está rindo?

— De você.

— Fico muito satisfeito em ser o motivo de sua felicidade, mesmo que não tenha ideia do motivo.

Isso pareceu aumentar a diversão de Riddle que continuou rindo, Lakroff estava quase perdendo a paciência. O som era divino, sem dúvida alguma, e Tom, por favor, se um homem na Terra poderia ser mais belo que ele deveria ser crime que ainda o fizesse sorrindo, porque era arrebatador, seus lábios, seus dentes, seu rosto se iluminando. Havia algo acima de uma divindade? Tom Riddle, isto estava acima.

Se os deuses gregos dos antigos clássicos vivessem em um mundo com Tom Riddle, estariam em fúria. Sua beleza os superava, mesmo aquela conhecida como a deusa da beleza não poderia alcançá-lo, então eles tentariam destruí-lo, ou tomá-lo para si e não conseguiriam, o orgulho e o poder de Riddle os faria tentar e falhar e eles buscariam puní-lo por isso.

Mas Riddle não se curvaria.

Ele os desafiaria ao pior.

Um mortal fazendo deuses contorcerem-se para tentar chegar aos seus pés. Ou, com seu poder, buscando diminuí-lo ao seu tamanho. Ao tamanho de um simples deus grego.

Ah, que tragédia grega Tom Riddle não inspiraria aos antigos bardos e dramaturgos.

Lakroff se sentia um deus em fúria agora, sua magia se agitava com uma vontade de destruir aquele sorriso na mesma proporção que não conseguia deixar de se maravilhar com ele e cair aos seus pés em devoção. Era ridículo. Como aquele homem tinha tanta força sobre si? Podia tirar tanto seu rumo?

Então Riddle estendeu seu braço e Lakroff, tolo Lakroff, como um servo apenas fez o que tinha de ser feito, se curvando. Tomando a mão de Tom na sua. Beijando suas costas gélidas.

Ele desfrutou como um choque, não que quisesse, ainda tomado e tenso por raiva e magia obscura, mas ainda sim magia essa que quase cantou quando sentiu as trevas de Riddle em contato com a sua naquele encostar suave de lábios com pele.

Quase o desmontou, quase o fez pensar que aquilo era certo outra vez.

Quando Riddle o encarou arrogantemente de cima, Lakroff não conseguiu evitar:

— Você é a própria serpente que tentou Eva ao pecado.

— Eu te fiz tomar a maçã do conhecimento, Grindelwald?

Que sorriso terrível.

Que homem terrível.

E Lakroff estava tomado como um objeto que Riddle podia roubar. Como seus prêmios no orfanato. Os brinquedos das outras crianças.

O melhor brinquedo.

Riddle não conseguia evitar. Era ridículo e quase não condizia com ele próprio, mas foi invadido por felicidade. Felicidade genuína como poucas vezes teve além dos momentos com Harrison.

Não conseguia evitar sorrir daquela situação.

Lakroff Mitrica tinha lhe dado suas visões.

Aquilo era a coisa mais significativa que poderia oferecer a alguém. Durante os sete anos que conhecia o homem, e sabendo que antes disso houve muito mais tempo, Lakroff nunca, jamais, disse nada a ninguém. Talvez uma pista sutil aqui ou ali, mas as visões todas? Ele não confiava em si mesmo ou nas pessoas, em como reagiriam, que culpa teria de suas ações. As visões eram perigosas e apenas suas.

Ele uma vez lhe confidencializou sobre suas visões acerca de Neville Longbottom, mas aquele caderno? Os detalhes, as datas, os nomes.

Depois de anos em silêncio.

Uma vida quase em silêncio, ao observar em retrospecto, havia bem mais omissão do que qualquer coisa, um homem fechado já muito cedo em uma trajetória longa de vida.

Mas que tinha se dado ao trabalho de escrever um caderno inteiro para Tom.

Apenas para Tom.

Para que ele soubesse. Para que não estivesse no escuro. Para que entendesse suas motivações.

E ainda havia lhe dado vidas.

Várias delas.

Massacres inteiros vistos por um vidente do apocalipse.

Ele fez exatamente como Tom lhe disse para fazer e não evitou a destruição que via, mas escolheu qual lhe convinha mais e, não importa quanto sangue havia naquele caminho, escolheu Tom.

Todo aquele caos e destruição. O vazio de sacrificar vidas, corromper a alma, a liberdade de Voldemort, as consequências sangrentas. Deu tudo para Tom.

Como o perfeito psicopata que ele era.

— Acho – sussurrou, porque talvez se falasse aquilo em voz alta ficaria ainda mais feliz e tinha plena ciência do quão doentio era aquilo – que essa é a melhor declaração que já recebi de alguém.

— Como é? Declaração? – questionou Lakroff.

— Olha que muitos tolos ousaram declarar intenções para mim.

— Eu não fiz isso.

— Fez.

— Você saberia melhor se eu estivesse declarando intenções para você. Eu faria de forma a não deixar dúvidas.

— Não é você que disse que não tinha dúvidas sobre seu plano?

— É diferente.

— Agora está mentindo para mim ou para si mesmo, Grindelwald?

— Eu não teria porque mentir. Se eu quisesse oferecer minhas intenções a você...

— Teria de fazer exatamente assim. Eu não aceitaria de outra forma.

— E o que seria assim?

— Do seu jeito. Não do jeito que finge ser.

Do melhor jeito.

Do que poderia conquistar Tom Riddle, nada menos do que isso.

O sacrifício de vários apenas por ele, para ele. E tudo de Lakroff, até aquilo que ele mais prezava guardar.

Lakroff deu tudo a Tom.

Tudo.

— Eu só...

E Tom queria tomar tudo para si, por isso o beijou.

Porque quis, porque aquilo era tão ridiculamente perfeito como ninguém nunca antes pôde oferecer a Tom que ele só queria agarrar. Da mesma forma estranha, ele nunca diria as palavras, assim como Lakroff não disse, mas daria algo a ele da mesma forma.

Um caderno. Um beijo. Uma ação, então o petisco para seu cachorrinho treinado.

E Lakroff aceitou. Devorou o petisco.

Segurou sua nuca com mais força do que fazia normalmente e isso Tom também apreciou como a parte real daquele homem. Enroscou-se em suas vestes, segurando as lapelas do terno bruxo e se esticando para ficar mais alto e acima, empurrando o homem com seus lábios.

A magia dos dois se ligou e criou uma sensação de arrepio que percorreu-os da cabeça aos pés e intensificou o gesto já violento. A mão livre de Lakroff puxou a cintura de Riddle com tanta possessividade que poderia deixar marca se fosse real e este por sua vez chupou com tanta força e mordeu os lábios do homem ao ponto de sentir o gosto de sangue quando a pele machucada se rompeu.

Não havia gentileza ou carinho naquele beijo, apenas uma força, um desejo que ambos sentiam por tomar algo.

Tomar um ao outro.

Tom sentia os dedos de Lakroff o apertando e levou os seus para o rosto do homem, agarrando como ele tinha feito mais cedo, arranhando para ouvi-lo gemer como sabia que faria.

Como, uma parte muito profunda dele conseguia admitir, gostava.

Mitrica empurrou Riddle contra a parede e eles deixaram cair um quadro que quebrou de forma audível no chão, suas línguas se encontravam e se enroscavam enquanto seus corpos buscavam por mais.

O beijo era alguma coisa, mas eles precisavam de mais.

Língua, magia das trevas, pele.

Era quase um feitiço, um atordoante e viciante como as artes sombrias. Uma maldição. Havia desejo intenso e sem dúvidas emoção. Se faltasse o sacrifício eles compensariam com sangue, com seus corpos. Lakroff enfiou seus dedos e imprensou cada um por baixo da camisa de Tom enquanto este agarrava seu pescoço e sentia o coração pulsante, a respiração ofegante e as gotículas de suor que apenas um ser vivo poderia oferecer.

E era seu.

Seu.

A possessividade tomava conta dos pensamentos de Tom e aquela vontade de subjugar.

Lakroff Mitrica tinha que ser seu.

De todas as formas mais intensas e profundas.

Havia música clássica tocando no fundo e era como se as batidas erráticas do coração de Lakroff se misturassem ao ritmo intenso da música, mas Tom não queria aquilo, não queria dividir nem mesmo os batimentos daquele coração, ele queria ter tudo de Lakroff mais do que já tinha. Ele reverteu a posição que estavam e bateu sem dó as costas de Lakroff na parede agora e orgulhosamente derrubou dois quadros dessa vez, o som deles se quebrando sendo um prazer a parte junto do gemido fraco do loiro.

Havia alguma intimidade na forma como não quebravam a conexão de suas bocas, a pele de Lakroff irradiava calor em contraste com a frieza de Tom e causava pequenos choques de prazer ao contato, o Mitrica tombou a cabeça para o lado e os dois aproveitaram cada nova sensação que poderiam obter de uma nova posição, então de outro e quando ficou claro que Lakroff precisaria respirar porque já estava ficando vermelho, Tom sorriu.

E os dois sabiam que aquilo não era bom sinal.

No instante que soltou a boca machucada de Lakroff, um fio de saliva escorrendo no canto dos lábios de Tom que soltou a garganta do homem para limpar, Lakroff observando fascinado o dedo do homem passando por lábios imaculados de uma horcrux. As implicações da ausência de sangue, de inchaço ou machucados mesmo depois de um beijo daqueles não tiveram tempo de atingi-lo de uma forma deprimida, porque Riddle se abaixou para morder-lhe o pescoço com força.

O que, por si só, já lhe arrancaria um bom gemido, mas seu joelho traiçoeiro tocou em cheio a parte entre as pernas de Lakroff e este foi seu fim.

O gemido que o lorde Mitrica soltou foi vergonhosamente alto, uma combinação que não teve como evitar, sua boca estava aberta para tomar ar e no mesmo segundo haviam aqueles dois estímulos novos fazendo sua cabeça girar e suas pernas tremerem.

Tom sorriu vitoriosamente, mas não perdeu tempo em sua missão de devorar com chupões e mordidas o pescoço alheio, rompendo o máximo que podia a pele, pronto para deixar quantas marcas fossem necessárias para carimbar uma mensagem clara de que aquele homem era seu.

Toda a raiva que sentiu antes, todo o ciúmes que percebeu que teve de si mesmo e de todos os comentários Lakroff fez à Voldemort, como o tratou... para enganá-lo, mas ainda sim.

Agora Lakroff era seu.

Estava preso e rendido nos seus braços, na sua boca.

E seria punido por ter agido como se não fosse.

Quando se sentiu satisfeito com a quantidade de feridas que deixou para trás, roxos e pontos vermelhos de sangue coagulado, ele moveu os lábios até a orelha do mais velho, mordeu seus lóbulo, chupou e moveu seu joelho até ouvi-lo gemer outra vez, então sussurrou:

— Tem certeza de que não pretendia declarar intenções para mim, Mitrica?

Lakroff estava uma bagunça e balbuciou alguma coisa incoerente enquanto Tom voltava a maltratar seu pescoço, ele fez um carinho fraco nas costas do mais novo e gemeu com mais uma fricção em sua virilha, depois com a risada debochada e satisfeita de Riddle diante de suas reações:

— Responda.

— Não estava declarando nada.

Tom apenas riu, alto, completamente divertido:

— Não sei como as pessoas continuam caindo nas suas mentiras, você é péssimo nelas.

— Ou você é bom demais em ler através delas.

Tom o beijou e puxou seu lábio inferior até o limite antes de sorrir olhando diretamente para os olhos azuis alheios.

Escuros de prazer:

— Boa resposta. Agora diga a verdade.

— É uma ordem? – provocou.

— Sim.

Lakroff agarrou agora com as duas mãos a cintura alheia e o puxou ainda mais para perto, ainda mais colados. Ligados. Olhou penetrantemente em seus olhos e sussurrou:

— Então o que quer ouvir de mim, milorde?

Muitas coisas.

Tom mal conseguia listar todas, mas ele percebeu que uma lhe daria muito mais prazer agora. Ele fez Lakroff gemer novamente com o movimento firme de seu joelho e agarrou-lhe o rosto para que estivesse olhando diretamente quando fizesse:

— Quero que diga que é meu.

E para sua surpresa, Lakroff não hesitou:

— Sou seu – cedeu.

E Tom foi quem gemeu agora, um som baixo e grave rouco na garganta, mas ainda ali.

De alguma forma aquilo o irritou, era tão irracional e intenso quanto o que sentia por aquele maldito vidente e ele teve que dizer:

— Eu te odeio.

E é claro que Lakroff respondeu:

— Não. Não odeia – e voltou a beijá-lo.

Tom não duraria muito, podiam sentir que a magia estava enfraquecendo, além disso Harrison estava logo ao lado e poderia acordar a qualquer momento, eles tinham pouco tempo e Lakroff queria aproveitar cada segundo com os lábios daquela horcrux.

O caderno de visões ficou esquecido por boa parte daquela noite.

VOTEM NO CAPÍTULO

Olá! E então? Gostaram?

Espero que sim, também espero que tenham uma boa noite e uma boa semana gente, até a próxima!

Aqueles que ficaram, gostaria de perguntar uma coisa. Se eu fizesse (no caso, terminasse) um livro do Lakroff e do Tom como protagonistas e postasse na Amazon vocês comprariam? Ou será que eu tenho que lutar e ir atrás de uma editora e fazer um físico? Na amazon eu não preciso de editora e vocês gostam o que? Cinco reais e me ajudam a patrocinar isso aqui, no físico aí podemos atingir mais leitores, quem sabe. Enfim. O que acham? E que casais da fanfic vocês acham que mereciam um livro solo, fico curiosa para saber. 

Tchau!

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