O Guardião
Jessamine me passou um endereço e disse que me encontrava lá, porque ela ainda achava carros estranhos demais e precisava salvar um pouco de energia depois de aparecer por tanto tempo para mim.
Demorei alguns minutos para chegar no local. O trânsito de Nova York estava um inferno e o lugar ficava distante do centro.
Quando cheguei ao endereço, avistei um prédio pequeno de três andares. O andar da rua era uma loja de antiguidades com uma placa de madeira escrito "Sheridan Antiguidades".
Havia um estacionamento para três carros e eu parei ao lado de um carro vermelho e velho.
Encarei o prédio. De todas as possibilidades que imaginei, a loja de antiguidades era o lugar perfeito para se ter uma biblioteca que revelava os mistérios do pós-morte.
Senti um arrepio subir pelo meu braço e, então, Jessamine estava do meu lado.
Estava um calor absurdo em Nova York. Aquele vestido de mangas longas e cheio de camadas seria insuportável se ela sentisse alguma coisa.
— Deve ser difícil ver o mundo de novo depois de trezentos anos — comentei, tentando me colocar na sua pele, saindo de um lugar que você conhecia para um que não seguia as regras que você aprendeu.
Quando eu deixei minha casa e fui para o abrigo infantil, a sensação foi um pouco parecida com essa. Mas, claro, eram situações extremamente diferentes. O tempo continuou o mesmo para mim.
— No começo foi estranho, mas tive um tempo para me acostumar. Além disso, eu... Os mortos têm essa capacidade de vazar suas memórias no Outro Lado. Então, pude acompanhar a evolução — ela disse — Ainda me impressiono com os cheeseburgers.
— Sério? Temos inteligência artificial e vacinas para quase todas as doenças do mundo e você se impressionou com o quê? O McDonalds?
Jessamine me olhou, séria.
— É pão, carne, queijo e salada. Como ninguém pensou nisso antes? É um pouco genial, sim — ela falou com firmeza — Se eu ao menos sentisse apetite, teria muita vontade de provar um deles.
Balancei a cabeça.
— Eu acho que o mundo está melhor do que aquele que vivi. Ainda há muita coisa errada, mas eu posso ver garotinhas indo para escola e isso é mais do que eu poderia sonhar para mim mesma.
Jessamine era alguém muito inteligente, talvez até mais do que a maioria das pessoas, mas isso não deve ter sido o suficiente para lhe abrirem as portas na época.
— Chega disso. Vamos entrar. Ele está lá dentro.
— Certo — falei, ainda que eu não quisesse encerrar aquela conversa por ali.
Jessamine era uma garota de outro século. Ela viveu coisas que não estão nos livros de história e eu estou sendo um pouco nerd ao pensar isso, mas queria ouvir sua experiência.
— O que preciso saber desse Guardião?
— Bom, como eu disse, os Guardiões protegem a biblioteca dos Guias e os auxiliam em seu trabalho, como o Dr. Watson e o Sherlock Holmes... O quê? Eu passei muito tempo vagando por aí, aprendi algumas coisas — Jessamine falou ao perceber meu olhar — Enfim, algumas famílias até mesmo chegaram a se casar, unindo as duas linhagens... Não foi o nosso caso, claro. O Guardião atual se chama Nathan Sheridan.
— Hum, que ótimo, é um velho de 60 anos com uma loja de antiguidades em Nova York... O casamento é obrigatório? — perguntei. Jessamine começou a andar em direção a loja e ela atravessou a porta sem responder minha pergunta.
Eu empurrei o vidro e os sinos acima da porta bateram um contra o outro, anunciando minha chegada. Olhei para dentro. Era uma loja pequena e cheirava a lavanda. Logo nas primeiras prateleiras avistei algumas vitrolas e uns telefones antigos.
Procurei por alguma alma viva naquele lugar e meus olhos pousaram em um cara atrás de um balcão que parecia ter a idade de Jessamine. Pele bronzeada, cabelos castanhos e olhos claros. Ele lia Carrie e parecia não notar minha presença.
Talvez fosse o filho ou neto do senhor Nathan Sheridan cumprindo algum castigo.
— Olá, eu procuro por Nathan Sheridan.
— É mesmo? E quem é você? A polícia, por acaso? — ele perguntou, sem nem se dar o trabalho de tirar os olhos do maldito livro.
Tinha sotaque nova iorquino, então descartei a possibilidade de ser parente do senhor Sheridan. Até onde sabia, Sheridan era um sobrenome irlandês e fazia sentido o Guardião ser europeu como Jessamine, já que, pelo que ela explicou, era uma tradição passada de geração para geração.
Eu me aproximei do balcão.
— Na verdade, sim — disse com um sorriso e tirei a minha identificação do bolso de trás da calça.
O rapaz finalmente ergueu a cabeça. Notei o leve tremor da sua garganta quando avistou a carteira, então ele me encarou e semicerrou os olhos.
— Você não parece um tira.
— E como eu tenho uma carteira provando que sou um?
— Qualquer um pode falsificar uma. Estamos em Nova York, cara.
— Ok, será que você pode apenas chamar o senhor Sheridan? Eu não tenho tempo para lidar com adolescentes.
— Eu não sou um adolescente, tenho vinte e cinco — ele respondeu, mas seus traços eram delicados e meio infantis, o que lhe dava um ar adolescente — E o que você quer com Nathan Sheridan? Ele não está aqui no momento, mas posso te passar o contato se for importante.
Suspirei. Olhei para o lado. Jessamine encarava com curiosidade um rádio antigo. Eu não teria a ajuda dela no momento, pelo que parecia.
— Olhe, vai soar estranho o que vou dizer, mas o senhor Sheridan entenderá o recado — falei, apoiando o cotovelo no balcão — Eu preciso acessar a biblioteca dos Guardiões. É um assunto urgente.
O garoto me olhou por alguns segundos. Ele achava que eu era um idiota com uma carteira de polícia. Cristo, por que Jessamine não pegou o endereço direto do senhor Sheridan?
Lição número um do dia: nunca confie em fantasmas para te orientar.
— Você é o Guia atual?
Franzi o cenho.
— Como você- — eu me interrompi e respirei fundo — Pensei que ele fosse um velho!
— Nunca disse que ele era. Você apenas concluiu isso — Jessamine tirou os olhos do rádio e me encarou — Edmund Sheridan era o antigo guardião. Ele repassou os conhecimentos para o neto. Nathan.
— Com quem você está falando? — Nathan semicerrou os olhos — Ah, meu Deus, é um deles? Tem um deles na minha loja? Como ele é? Por favor, não me diga que é tia Olga. Aquela velha maldita prometeu me assombrar um dia.
Puta que pariu. Esse trabalho seria mais difícil do que eu pensei.
— Não, não é sua tia Olga. Ela veio comigo. Ela se chama Jessamine Bassford e...
— Foi a última guardiã do clã Bassford. Uau — Nathan assobiou — Eu e meu avô achávamos que ela tinha sido a última protegida pela nossa família. Não há registros de que a Visão tenha sido repassada para outras pessoas. Nós pensamos que tudo tinha acabado com ela.
Isso atraiu o interesse de Jessamine que se aproximou de Nathan como se ele pudesse enxergá-la, mas os olhos deles ainda estavam focados em mim.
— Ela acha que a Visão foi para algum primo distante da mãe na Escócia. Eu não sei como funcionam as linhagens, mas, de alguma forma, eu estou aqui.
— Isso é... — Nathan largou o livro. Se eu soubesse que essa história toda atrairia tanto seu interesse, teria começado com isso — Algum dos seus parentes era um Guia? Sua mãe? Seu pai? Avós?
— Eu não sei. Eu acho que sou o primeiro da família.
— Quem são seus pais? Precisamos ver as árvores deles e depois podemos traçar de volta para a Europa...
— Se você souber quem é meu pai, por favor, compartilhe essa informação comigo também — sorri com ironia. Nathan não apreciou meu humor.
— E Jessamine Bassford. Você pode ver Jessamine Bassford. Eu tenho tantas perguntas! Ela é tão bonita quanto nos retratos?
Olhei para Jessamine que observava toda a conversa sem piscar os olhos. Seus cabelos loiros reluziam com a luz que entrava pela janela e parecia ouro derretido.
— Ela é aceitável.
— Você é aceitável — Jessamine rebateu, franzindo o cenho.
— Olhe, você terá que deixar toda sua nerdice para depois. No momento, temos um problema maior em mãos... Jessamine veio até mim, porque há um problema com o Outro Lado.
A expressão de Nathan mudou. Ele não parecia mais um adolescente agora, e sim, um jovem adulto com olhos cansados demais como Jessamine.
— Imaginei que sim — ele disse, mas não respondeu como sabia disso — A biblioteca dos Guardiões, incluindo as do Bassford, está no segundo andar... — Nathan parou e olhou para o livro, depois para mim — Olhe, meu avô morreu há um ano. Ele me ensinou tudo que sabia sobre os Guardiões e os Guias, e eu tentei levar a sério, mas, sabe, eu tinha uma vida, estava terminando a faculdade. Não parecia um assunto tão urgente, até porque os Guias que minha família orientou desapareceram...
Eu tinha a sensação de que Nathan se arrependia por não ter dado tantos ouvidos ao seu avô, mas eu não poderia culpá-lo. Quem levaria essa história de mortos e Guardiões à sério quando o mundo real estava acontecendo?
— E-então... O que quero dizer é... Eu não tenho preparo para te auxiliar — ele gaguejou.
— Os Sheridan nunca deixaram seu trabalho de lado — Jessamine disse ao meu lado — Os tempos realmente mudaram.
Claro que Jessamine não entenderia. Esse trabalho costumava ser sua vida.
— Nathan, eu acabei de descobrir todas essas coisas hoje de manhã. O que você tiver a oferecer já é o suficiente e... Bem, eu tenho uma garota pedante me assombrando, ela não vai deixar de dizer que estou errado quando eu estiver errado.
Nathan me encarou. Torci para que ele não desse para trás. Eu apenas precisava ter acesso aos livros, assim que encontrasse aquele que falava da transmutação e o que quer que Jessamine estivesse procurando, o serviço de Nathan estava feito.
— Os livros estão lá em cima — Nathan saiu detrás do balcão e foi até a porta onde virou uma placa de madeira com as palavras "Fechado".
Ele me levou até uma escada nos fundos da loja. O lugar inteiro parecia uma antiguidade. Papel de parede com flores descascando, piso de madeira que rangia a cada passo e uma luminária com espaço para velas no centro da loja.
O cheiro de lavanda também ficou mais forte conforme íamos para o fundo. Era estranho, mas havia algo de aconchegante naquele prédio caindo aos pedaços, como uma ruptura da modernidade no meio de Nova York. Eu me perguntei como Jessamine estava se sentindo ao ver o lugar. Ao olhar para o lado, percebi que ela tentava passar a mão por alguns objetos das prateleiras.
Ela perdeu muitas coisas nestes trezentos anos.
— Então, você herdou esse lugar do seu avô?
— Sim — Nathan respondeu, conforme subíamos a escada — Vovô me escolheu como o próximo guardião, porque meu pai nunca deu bola para isso. Ele é um grande idiota que só se importa com dinheiro... E, para ser sincero, eu estava quase seguindo o mesmo caminho. Eu me formei, arrumei um emprego no banco, então o velho morreu e minha família quis vender o prédio, mas eu não pude deixar.
Nós alcançamos o segundo andar e as palavras foram arrancadas de mim. O cômodo enorme tinha o mesmo papel de parede e piso do andar de baixo, mas era cheio de prateleiras com todos os tipos de livros, desde brochuras até capas de couro. No centro, havia uma mesa redonda enorme com uma espécie de brasão queimado na madeira. Cadeiras estofadas cercavam a mesa, mas elas eram modernas demais para o espaço. Imaginei que Nathan as colocou ali.
Em cima da mesa, tinha algumas velharias também como globos de vidro, papéis e um sextante náutico dourado. Não parecia um sextante comum. A minha vizinha gostava de velharias e tinha um daqueles, mas o dela parecia bem mais velho, aquele não possuía nem mesmo as marcações de milhas.
— São mais de trezentos anos da história dos Sheridan aqui e nós perdemos muita coisa quando meus parentes vieram da Irlanda durante a Segunda Guerra — Nathan explicou ao meu lado enquanto eu andava pelo lugar.
Devo admitir que o garoto fez um bom trabalho em manter o lugar. Eu não via traços de poeiras e os livros pareciam organizados em ordem alfabética.
— Nós não somos como vocês. O nosso legado não é possível ser passado para outra família sem o mesmo sangue. Isso é tudo trabalho dos Sheridan — ele disse, se apoiando na mesa larga de madeira — Creio que a senhorita Bassford conheceu alguns dos meus ancestrais. Deve ter trabalhado com... Quem era mesmo?
Eu meio que havia perdido Jessamine enquanto olhava o lugar, mas senti um sopro gelado no meu ombro esquerdo e a sua voz se sobressaiu:
— Thomas.
— Thomas? — repeti, olhando para Nathan.
— Sim. Thomas Sheridan! — Nathan assentiu, satisfeito — Ela está do seu lado? — ele olhou para o meu lado esquerdo onde não havia ninguém.
— Do outro — respondi. Nathan redirecionou o olhar, mas ele devia pensar que Jessamine era mais alta do que realmente era — Os Sheridan sempre foram meio idiotas? — perguntei para ela.
— Thomas era o garoto mais inteligente da vila — ela respondeu e eu senti um tom melancólico na sua vez.
Jessamine estava me dizendo que Guardiões e Guias costumam se casar. Será que ela e Thomas...? Ela tinha apenas vinte e quatro anos quando morreu, mas as pessoas se casavam cedo na época. Não seria difícil imaginar algo assim.
— Como é ter a Visão? Eu li os livros escrito pelos Bassford, mas não consigo nem imaginar! — Nathan se animou. Ele encarava toda essa história como se fosse um dos livros do Stephen King.
— Imagine ter dez anos e falar para sua professora que um cara com um serrote na cabeça a está perseguindo — disse com um sorriso fraco.
Essa era uma das minhas piores memórias envolvendo a "Visão". Depois, eu descobri que o homem era um serial killer que, em vida, perseguia mulheres na casa dos trinta. Ele foi morto por uma delas no quintal da minha escola, mas eu nunca consegui "mandá-lo" embora.
Eu me recusei a ir para a escola. O abrigo aumentou minhas sessões de terapia e depois de ter feito um grande escândalo, finalmente aceitaram me colocar em outra escola, em compensação tive que tomar uma série de remédios para esquizofrenia. As outras crianças começaram a me chamar de maluco.
Eventualmente, tive que mentir para o psiquiatra que não via mais nada, mas as visões só aumentaram depois daquele episódio.
Isso pareceu calar a boca de Nathan.
— Você conhece os outros Guardiões?
— Vovô costumava ter uma rede de contatos com eles, mas o conhecimento deles é vago atualmente. Ninguém continuou a tradição.
— Ok, bem, vamos ao que importa. Preciso dos livros sobre a transmutação e... O que estamos procurando? — eu virei para Jessamine.
— A abertura mais próxima.
— A abertura mais próxima — repeti as palavras, franzindo o cenho — Não sei o que isso quer dizer.
— Ok, ok... Calma. A transmutação está junto com os livros dos Guias. Provavelmente na parte de feitiços...
— Podemos fazer feitiços?
— Não feitiços, mais para "comandos", mas feitiços soa mais legal — Nathan sorriu — Para que você-
— Ok, e a tal abertura?
Nathan abriu a boca e fechou no mesmo instante. Ele se virou para a mesa e pegou o sextante esquisito. Era duas barras douradas com dois semicírculos. O semicírculo maior onde deveria estar a indicação das milhas tinha pedaços de papéis que, então, eu percebi ter o nome de bairros de Nova York.
— É um detector que localiza os pontos onde o véu entre o Outro Lado e o nosso mundo está mais fraco — Nathan disse — Meu avô mapeou Nova York. Aqui estão os pontos que formam um círculo. Por aqui, podemos identificar de qual ponto a abertura está mais próxima.
— Essas aberturas sempre existiram — Jessamine completou — Mas apenas um Guia treinado pode abri-las por completo. Eu acredito que exista uma que esteja rompendo. Vamos aproveitar para usá-la.
— E o que você pretende fazer?
— Você está falando com ela, não é? — Nathan interrompeu. Eu o encarei, irritado e ele voltou a brincar com o sextante.
— Você vai entrar.
— Perdão?! — falei — Você quer que eu entre no Outro Lado? Onde apenas pessoas mortas estão? Você enlouqueceu, Jessamine?
— Por Deus, Montague, eu não arriscaria sua vida se não tivesse certeza do que estou fazendo! — ela disse, a irritação visível no seu rosto.
Percebi que o abajur que Nathan tinha ligado piscou. Isso não era um bom sinal. Por que eu pensei que Jessamine não seria capaz de provocar as mesmas coisas que os outros fantasmas provocavam?
— Uh-oh — Nathan murmurou.
Ela percebeu nosso olhar na direção do abajur e respirou fundo.
— Guias têm a capacidade de transitar pelo Outro Lado sem precisarem estar mortos. Eu ouvi boatos.
— Você ouviu boatos, mas nunca tentou por conta própria? — falei com ironia — Me sinto mais seguro assim... E como diabos eu faria isso? Você mesmo disse que a matéria não existe lá.
— Eu sei que existe um jeito seguro de fazer a passagem. Está em algum desses livros — Jessamine apontou com o queixo para as estantes — Você precisa entrar lá. Eu estou limitada lá dentro pela minha condição, mas você conseguiria encontrar a fonte da coisa com facilidade.
— Eu estou um pouco perdido na conversa, já que estou ouvindo apenas seu lado, mas existe sim um jeito de alguém vivo entrar no Outro Lado — Nathan comentou, deixando o sextante de lado — Eu sei que os Bassford antes de Jessamine exploraram essa possibilidade e anotaram tudo.
— Viu só? — Jessamine disse. Ainda bem que os dois não conseguiam se comunicar ou eu teria uma dupla contra mim — Você precisa entrar.
Não era como eu queria terminar meu ano: entrando em um lugar que não existia de verdade. Estava quase desistindo dessa ideia. Por mais que a possibilidade de poder transferir a "visão" me animasse, não sei se valia o esforço.
— Tem algo acontecendo lá, não é? Tem haver com os desaparecimentos? — Nathan se sentou em uma das cadeiras.
Virei a cabeça na sua direção.
— Do que está falando?
— Não é por isso que vocês estão aqui? — Nathan franziu o cenho — Você é um policial, deve ter ouvido falar do caso de pessoas desaparecendo à noite em Nova York.
— Isso é mais comum do que você pensa.
— Bem, tinha esse senhor que frequentava a loja todos os domingos, sem falta. Eddie. Ele estava sempre contando alguma história sobre seu gato... Enfim, Eddie desapareceu por duas semanas. Eu fui até a casa dele para ver se ele precisava de alguma coisa. Ele era sozinho e eu pensei em vovô... — Nathan suspirou — A dona do prédio disse que não o viu desde que saiu para ir à loja no domingo. Eu refiz seu caminho e reparei que ele passava por um dos pontos onde o véu é fraco.
"Eu achei que era só coincidência, então fui na delegacia relatar o desaparecimento. O policial me disse que uma garotinha também desapareceu próximo a rua Houston dois dias antes e adivinhe só, quando cheguei em casa, descobri que a Houston também é próxima de um dos pontos. Pesquisei em alguns sites por desaparecimentos e contei um total de cinco, todos próximos aos pontos."
— É possível que eles tenham caído no Outro Lado?
— Talvez — Nathan respondeu ao mesmo tempo que Jessamine.
Estava tentando me livrar dessa idiotice, mas agora que havia pessoas reais em perigo, não podia virar as costas. Proteger as pessoas era a única regra que eu respeitava do Departamento de Polícia.
— Agora você irá levar isso a sério? — Jessamine perguntou e eu senti o ar frio na minha bochecha. Ela estava próxima, tão próxima que podia sentir aquele mesmo medo primordial da noite passada, uma lembrança de que Jessamine estava mais próxima deles do que de Nathan e eu.
— Reúna o máximo de informações que você tem sobre o Outro Lado e a travessia nos livros dos Bassford, e não esqueça da transmutação — disse para Nathan. Ele ergueu as sobrancelhas para mim — Esse é seu trabalho, certo?
— Sim, mas eu não esperava que meu Guia fosse um idiota — ele murmurou.
— Eu teria mesmo que me casar com ele em outra época? — falei para Jessamine que tinha seus olhos presos em uma estante em particular com livros de couro velho.
Desde que entramos no cômodo, ela parecia mais distante que o normal. Talvez a proximidade com objetos que fizeram parte da sua vida estava mexendo com ela.
— Eu posso fazer a pesquisa, mas olhe para esse lugar, são muitos livros. Eu e meu avô catalogamos a maioria. Ainda sim, faltam vários! Sem contar que os Bassford tinham livros em latim. Eu não falo latim. Ninguém fala latim — ele reclamou — Preciso de uma ajuda.
— Eu preciso verificar os desaparecimentos na delegacia. Posso ajudar quando voltar. Quanto ao latim, não sei como... — me interrompi.
Meu celular tocou no bolso. Eu peguei e olhei a bina. Era uma mensagem nova de Coleman, me chamando para assistir o jogo de beisebol na sua casa. Coleman odiava beisebol, mas ele sempre me convidava, apenas pela companhia.
— Porra.
— O que houve? — perguntou Nathan.
— Eu conheço alguém que sabe latim — suspirei, irritado — Eu volto logo. Bassford? — eu a chamei, porém ela não se deu o trabalho de me olhar — Creio que você terá a excelente companhia da senhorita Bassford esta tarde.
— Não sei se gosto da ideia de ser assombrado.
— Bem vindo ao meu mundo.
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