Capítulo Vinte e Quatro
Victor Jones:
O refeitório estava repleto de alunos, todos imersos em animadas conversas, com risadas ecoando pelo ambiente. Com passos automáticos, adentrei o espaço, atraído pelo aroma tentador das iguarias mágicas dispostas para os aprendizes. A sopa mágica, capaz de se transformar no sabor desejado, formava pilhas coloridas de líquidos. Um opalescente pudim esperava como sobremesa. Com nossos pratos em mãos, dirigimo-nos a uma mesa onde Anna e Duncan estavam sentados, cabelos chamuscados e um pouco de ração de animal, despertando olhares curiosos de nossos colegas.
— Demos aula sobre ferramentas mágicas hoje — Duncan começou, notando os olhares de Rebecca e eu. — Em um momento, Anna deixou cair uma varinha experimental.
— No final, fomos atingidos pela explosão — acrescentou Anna, rindo nervosamente. — E ainda explodimos uma mesa. Agora, duas semanas de trabalho na estufa encantada com a Mestra Flora e auxiliando o Mestre Damian na criação de poções, enquanto Duncan não poderá ensinar sobre as ferramentas mágicas por um tempo determinado.
Ri em resposta, imaginando a cena caótica que eles deviam ter causado. No entanto, minha atenção foi desviada pela chegada de Aurora, que se juntou a nós com uma expressão serena.
— Olá a todos — cumprimentou ela, sentando-se ao lado de Anna. — Parece que vocês tiveram um dia agitado.
— Para dizer o mínimo — respondeu Duncan, ainda esfregando a fuligem das sobrancelhas. — Mas você não parece ter passado por nada assim. Como foi sua tarde?
— Estávamos no Lago das Faíscas, tentando encontrar uma maneira de coletar a água sem perder sua magia — expliquei, observando a curiosidade brilhar nos olhos de Anna e Duncan.
— E conseguiram? — perguntou Anna, inclinando-se para frente.
— Com muito esforço e algumas discussões acaloradas — admitiu Merlin, lançando um olhar furtivo para Aurora, que apenas sorriu levemente.
— Foi uma experiência interessante — interveio Rebecca, dando uma olhada de lado para Merlin. — Aprendemos muito sobre cooperação e controle dos elementos.
— Falando em experiências — disse Aurora, mudando de assunto com um brilho nos olhos —, Anna, ouvi que você e Duncan foram verdadeiros heróis na aula de ferramentas mágicas hoje.
Anna corou, enquanto Duncan ria.
— Se por "heróis" você quer dizer que quase explodimos a sala de aula, então sim — brincou Duncan.
Aurora riu, e o som era como música, acalmando as tensões restantes do dia. Conversamos mais, trocando histórias e risadas, enquanto o refeitório continuava cheio de vida ao nosso redor.
No entanto, não pude deixar de notar um olhar de preocupação cruzar o rosto de Aurora ocasionalmente, como se estivesse pensando em algo além do que estávamos discutindo. Decidi não perguntar por enquanto, mas fiz uma nota mental para conversar com ela mais tarde.
Os Mestres ocuparam uma mesa redonda do outro lado do refeitório, provavelmente discutindo punições para os alunos com sorrisos sinistros. Quatro figuras trajando uniformes verde-oliva, duas mulheres e dois homens, entraram no refeitório e se curvaram diante dos Mestres. O último deles lançou um sorriso para Meteora.
— São membros da Assembleia — explicou Rebecca. — Nosso conselho de administração, e o último parece ser um sumo sacerdote.
O homem se aproximou de mim com um sorriso amplo.
— Guardião, venha comigo — disse ele.
— Mas eu ainda não terminei de comer — protestei.
— Terá tempo para comer mais tarde — respondeu o homem. — Sou o sumo sacerdote Horeom, precisamos conversar. Isso foi adiado por tempo demais.
Levantei-me e segui Horeom por corredores sinuosos até uma sala que, segundo rumores, nunca era usada. Para minha surpresa, a porta brilhou e revelou uma pequena placa com o nome dele. Entramos, e o interior da sala era muito diferente do que eu esperava. Mobília moderna, estantes de aço, um sofá de couro elegante e uma mesa de trabalho coberta de equipamentos estranhos. Equações com marcações peculiares pendiam nas paredes, e um pequeno dispositivo redondo estava à vista.
Minha atenção foi atraída para um retrato sobre uma escrivaninha antiga. Nele, uma versão jovem de Meteora estava acompanhada de Horeom e duas outras pessoas. O garoto se assemelhava a uma versão adulta de Duncan, e a jovem tinha longos cabelos castanhos até a cintura.
— Não consigo tirar os olhos desse retrato — murmurei, observando a felicidade capturada na imagem. Isso me fez perguntar como Meteora se sentiu traída com o que os seus discípulos haviam feito em uma quase guerra entre magos.
— Sente-se, Victor — disse Horeom, apontando para o sofá. — Quero ouvir o que você pensa sobre essa academia mágica e o mundo que tem conhecido até agora.
Antes que pudesse responder, uma faísca de magia surgiu e um envelope caiu sobre a mesa. Horeom pegou a carta, examinou o remetente e a deixou repousar.
— Não é tão importante — disse ele, rindo. — Mas voltando ao assunto, como tem sido viver na dimensão mágica? Como se sente em seu treinamento como mago e guardião?
— É desafiador em algumas áreas da magia — respondi, — mas, em geral, tem sido tranquilo. O que me estressa são as constantes convocações para encontros com a nobreza.
Horeom sorriu levemente.
— Você é bem diferente de Camilla — comentou. — Ela costumava atender a todos os pedidos imediatamente e indo atrás para que não trouxesse uma confusão.
— Parece que ela deveria ter sido mais assertiva em relação a si mesma — disse. — Li em livros que ela nunca construiu laços verdadeiros ou se estabeleceu em algum lugar. Muitos elogiam suas realizações, mas poucos a conheciam de verdade.
— O que diz é verdade — concordou Horeom. — Camilla foi profundamente ferida por pessoas em quem confiou antes de descobrir seu papel como guardiã. Um grande peso foi colocado em seus ombros de uma vez, fazendo com que se isolasse.
Aquelas palavras me fizeram lembrar de Urlac e como ele também estava magoado quando descobriu que sua amiga havia morrido e ele nem soube.
— Nos últimos dias, você recebeu muitos elogios de todos os mestres — continuou Horeom. — Você ajudou na luta contra o Devorador e seus Elementais e ainda sua pequena batalha na capital. Estou aqui para elogiar seu controle perfeito dos poderes.
Expliquei sobre os Elementais, criaturas feitas de elementos, e sobre os Devoradores, magos que sucumbiram aos poderes elementais. Horeom concordou com meu entendimento.
— Se está aqui, deve ser para que o Templo me leve embora e me treine em segurança — sugeri.
— Infelizmente, está enganado. Queremos que continue aqui — revelou Horeom. —Temos grandes expectativas para o seu futuro, especialmente considerando a falta de um Guardião para purificar o caos que se instalou.
— Então, vou ficar aqui para proteger os outros — murmurei. — E para ouvir os problemas deles.
Horeom confirmou, e então mencionei o que ouvira da Devoradora no refeitório.
—Ela chamou o mestre Borges de pai — disse eu.
Horeom suspirou.
— Sim, ela é. Ravan era a filha de Borges. Ela era uma maga excepcional, aspirando a se tornar ainda melhor e ser reconhecida entre os grandes magos. Seu pai, Borges, tinha muito orgulho dela e a encorajava a explorar profundamente a magia. No entanto, Ravan foi consumida pelo seu próprio poder relâmpago e se tornou uma Devoradora. Ela culpa o mestre por incentivá-la a ir longe demais — Horeom falou.
Lembrei-me da dor nos olhos de Urlac quando descobriu sua verdadeira natureza.
— Ela disse que ele não conseguiu salvá-la — murmurei.
Horeom assentiu tristemente.
— Isso é verdade. Borges estava profundamente marcado pelo que aconteceu com sua filha. Eles tinham uma relação tão próxima, até que a magia a separou deles — Horeom falou.
A conversa revelava informações que me deixavam atordoado. Parecia que Ravan tinha um motivo específico para atacar o mestre Borges, algo que o conhecia muito bem.
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Aquela reunião foi inquietantemente curta, deixando-me com um gosto amargo de frustração. As palavras de Horeom, permeadas de desapontamento e perplexidade por não compreender por que uma Devoradora dos Raios teria escolhido este lugar simples para um ataque direto, arrepiaram-me a espinha.
Naquela noite, meu sono foi perturbado por pesadelos sombrios que se manifestaram de forma aterradora em minha mente. Encontrei-me em um lugar completamente isolado e desprovido de qualquer som, exceto pelo eco vazio dos meus próprios passos. A escuridão se fechava ao meu redor, apertando como uma mão gélida.
Uma criatura inominável emergiu das sombras, seus olhos brilhando com uma malevolência aterradora. Ela começou a perseguir-me incansavelmente, sempre a uma mera fração de segundo de me agarrar, suas garras esqueléticas prontas para me dilacerar. O terror encharcava o ar, e eu gritava desesperadamente com uma voz rouca, enquanto a criatura proclamava, de maneira arrepiante, que me pegaria cedo ou tarde, suas palavras ecoando em minha mente como um presságio sinistro. A sensação de impotência e inevitabilidade me deixou completamente apavorado, tornando esse pesadelo uma experiência indelével de terror.
A escuridão ao meu redor parecia ter vida própria, como se as sombras se retorcessem e se contorcessem, agravando o meu pavor. Meu coração martelava descontroladamente no peito, e a sensação de sufocamento tornava-se cada vez mais real.
A criatura continuava a me perseguir implacavelmente, sua presença sinistra acompanhada pelo som de suas patas arranhando o chão, criando arrepios na minha pele. Cada vez que ela se aproximava, meu corpo parecia ficar mais pesado, minhas pernas mais lentas, como se o próprio medo estivesse me prendendo em um pesadelo interminável.
Eu gritava, tentando afastar a criatura com todas as minhas forças, mas meus esforços eram em vão. Seu hálito quente e fétido arrepiava meus cabelos enquanto ela sussurrava ameaças cruéis e obscuras no meu ouvido, prometendo que, mais cedo ou mais tarde, eu seria sua presa inevitável.
Cada segundo naquele pesadelo parecia uma eternidade de sofrimento. Eu estava preso em um ciclo angustiante, onde a criatura nunca alcançava seu objetivo, mas meu tormento continuava a se intensificar. A sensação de desespero era avassaladora, e eu ansiava desesperadamente acordar e escapar daquele pesadelo aterrador que se desdobrava diante de mim.
Minhas pernas finalmente cederam sob o peso do medo avassalador, e eu caí de joelhos em meio à escuridão sufocante. A criatura estava agora próxima o suficiente para sentir sua presença gelada em minha pele, mas ainda não conseguia me tocar. Suas garras famintas raspavam o ar à minha volta, mas não me atingiam.
Envolta em sombras insondáveis, a criatura soltou um rosnado gutural e angustiante que reverberou em meus ouvidos como um eco infernal. Era como se a própria escuridão estivesse rugindo em minha direção, sedenta pelo meu desespero.
Meu grito rouco ecoou pela escuridão, uma mistura de pavor e agonia, enquanto eu implorava pelo fim desse pesadelo torturante. As palavras sombrias da criatura continuavam a assombrar minha mente, prometendo um destino terrível.
Por um instante, a escuridão pareceu se intensificar ainda mais, como se estivesse prestes a me engolir por completo. Eu sabia que não podia suportar mais um segundo dessa tortura psicológica.
E então, como se o próprio universo tivesse compaixão de mim, acordei abruptamente, meu corpo banhado em suor, o coração disparado. A sensação daquela presença maligna ainda pairava em minha mente, deixando-me com a perturbadora certeza de que o pesadelo não estava completamente no passado.
Acordei ofegante, o suor frio escorrendo pela minha testa e o coração martelando no peito. O quarto ao meu redor estava mergulhado na escuridão, mas agora parecia reconfortante em comparação com o pesadelo que acabara de vivenciar. As sombras no ambiente real não tinham a mesma malevolência do meu sonho, mas a sensação de uma presença maligna ainda pairava sobre mim, como uma lembrança indelével.
Levantei-me da cama, tentando acalmar minha respiração e ordenar meus pensamentos. A lua cheia brilhava através da janela, lançando uma luz pálida no chão. Caminhei até a janela e olhei para o céu noturno, tentando encontrar um senso de tranquilidade nas estrelas.
Minhas mãos ainda tremiam, e o medo persistente fez com que eu decidisse procurar alguma companhia. Precisava falar com alguém, sentir a presença de outro ser humano para afastar a solidão esmagadora que o pesadelo havia deixado. Peguei um robe e saí silenciosamente do meu quarto, andando pelos corredores adormecidos da academia.
Cheguei à porta do quarto de Merlin e bati suavemente. A porta se abriu, e Merlin me olhou com um misto de surpresa e preocupação.
— Victor, o que aconteceu? — perguntou ele, puxando-me para dentro.
— Um pesadelo — murmurei, sentindo a voz trêmula. — Preciso falar com alguém.
Merlin assentiu e me guiou até uma cadeira. Sentou-se ao meu lado, colocando uma mão reconfortante no meu ombro.
— Fale comigo, amigo. Estou aqui para ouvir.
Relatei a ele os detalhes do meu pesadelo, a criatura aterrorizante, a escuridão sufocante e a sensação de impotência que me assombrava. Merlin ouviu atentamente, sua expressão séria e preocupada.
— Esses pesadelos são mais do que simples sonhos, Victor — disse ele após um momento de silêncio. — Parece que algo está tentando se comunicar com você, ou talvez te assustar. Precisamos entender o que está acontecendo.
— Eu sei — respondi, esfregando os olhos cansados. — Mas como podemos descobrir isso?
— Amanhã de manhã, falaremos com a Mestra Miele e com Horeom — sugeriu Merlin. — Eles podem ter alguma ideia sobre o que está causando esses pesadelos. Até lá, fique aqui. Não precisa voltar para o seu quarto.
Concordei com gratidão, sentindo-me um pouco mais seguro na presença de Merlin. Deitei-me em um colchão improvisado que ele arranjou, ainda com o coração pesado, mas sabendo que não estava sozinho nessa luta.
Enquanto fechava os olhos, tentando encontrar algum descanso, um pensamento persistente atravessou minha mente: o pesadelo não era apenas uma manifestação do meu medo, mas um aviso. Algo sombrio e poderoso estava à espreita, e eu precisaria de toda a ajuda que pudesse obter para enfrentá-lo.
Na manhã seguinte, Merlin e eu nos reunimos com a Mestra Miele e Horeom. Descrevi o pesadelo em detalhes, cada momento aterrorizante e cada sensação de desespero. Os dois mestres ouviram com atenção, suas expressões ficando cada vez mais sombrias.
— Parece que estamos lidando com uma presença maligna que está tentando invadir seus sonhos, Victor — disse Mestra Miele, seu tom grave. — Precisamos proteger sua mente e descobrir a fonte desse mal.
Horeom assentiu, sua expressão séria. — Faremos tudo o que for necessário para garantir sua segurança e encontrar a origem desses ataques. Por enquanto, você deve se concentrar em fortalecer sua mente e suas defesas mágicas.
Com a ajuda de Merlin, Mestra Miele e Horeom, comecei a aprender novas técnicas de proteção mental e a fortificar minhas habilidades mágicas. Sabia que a jornada à minha frente seria árdua e cheia de desafios, mas com aliados fortes ao meu lado, estava determinado a enfrentar o mal que me ameaçava.
As noites ainda eram sombrias e cheias de incertezas, mas eu estava mais preparado para os pesadelos que poderiam vir. E com cada novo dia, minha determinação crescia, sabendo que, juntos, poderíamos superar qualquer escuridão.
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Gostaram?
Até a próxima 😘
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