Casa Grande
O treino da tarde foi interrompido, para os aprendizes ajudarem nos preparativos da festa de apresentação dos filhos dos Nobres à sociedade. Se os Guardiões ganhavam uma estadia forçada nas arenas de treinos do Grande Clã. Os filhos dos Nobres, após a primeira metamorfose, ganhavam uma festa luxuosa.
E assim, Henrique e Dylan passaram o dia carregando sacos de batatas, verduras, farinha, açúcar e caças do mercado para os fundos da Casa Grande.
O serviço forçado seria inconveniente se ele não sentisse seu coração disparar ao atravessava o cercado vivo de rosas, que rodeava a casa entrelaçado ao muro de ferro. A mansão de mármore branco, de dois andares e muitas janelas retangulares com floreiras a sua frente, era uma obra de arte tão bela quanto a Grande Biblioteca. Ele se demorava com os sacos nas costas ao olhar as janelas na esperança de ver Ágatha.
— O quarto dela é do outro lado. Para o jardim interno — Dylan disse ao empurrá-lo, para que ele iniciasse a descida de pedras até a entrada de serviço da mansão.
— Como sabe? — Henrique ergueu a sobrancelha.
— É uma questão de segurança. Todos os quartos de dormir estão na parte interna. — Ele deu de ombros fazendo o saco as suas costas sacudir. E sorriu. — Saberia disso se prestasse mais atenção ao seu treino ao invés de suspirar pela princesa.
— Eu não... — Não terminou a fala. Soltou o saco no chão de modo desajeitado e arrumou a postura ao perceber Ágatha vindo na direção deles.
Ela estava com um vestido amarelo claro, que descia reto por seu corpo cobrindo seus joelhos. Os ombros escondidos por uma estola de pele e um chapéu colado ao rosto. Colares de pérolas caíam sobre seu busto. Henrique não tinha fala. Nunca a vira em roupas "oficiais", apenas com a capa vermelha e seus vestidos brancos de dormir.
— Meu pai colocou vocês no trabalho? — Ela sorriu para eles de modo educado, Henrique constatou frustrado.
— O que acha? — Dylan retrucou aborrecido. — Essa vai ser a maior festa já vista no território. Afinal faz quase cem anos que não há princesas na festa de apresentação.
— Não fui eu quem escolheu essa tradição. — Ágatha se mostrou aborrecida ao segurar as pérolas e girá-la entre os dedos.
— Você está linda! — Henrique deixou escapar, e logo sentiu seu rosto corar. Dylan lhe lançou um olhar divertido e se afastou com o saco de batatas nas costas.
— Obrigada. — Ágatha sorriu. Era impressão ou suas bochechas estavam coradas?
— Princesa! — Um garoto alto e de costas largas, vestindo um colete de couro e calça social, correu na direção dela. Os cabelos pretos na altura do queixo voavam bagunçados. Ágatha sobressaltou-se, mas sorriu ao estranho. — Pensei que lhe houvesse perdido. Nosso piquenique está pronto.
— Sim, vamos — ela disse com voz baixa, e aceitou a oferta do outro para cruzarem seus braços. O coração de Henrique apertou.
Ele pegou o saco de batatas novamente e colocou sobre as costas. Enquanto ia até a porta de serviços, observava sua paixão se afastar de braço dado com um lobo forte e bonito, que provavelmente era o filho de um dos Nobres de outro território.
Carregou mais uma dúzia de sacos do mercado até a Casa Grande em silêncio. Por fim foram liberados do serviço e voltaram para as arenas. Henrique não tinha vontade de lutar. Após ser derrubado a terceira vez por Dylan, este se sentou ao seu lado com os braços ao redor dos joelhos.
— A conversa com a princesa não foi boa — constatou. Um lobo foi atirado próximo a eles, e voltou a rolar para mais adiante lutando com seu oponente.
— Ela estava acompanhada.
— Bem, isso é o esperado. — Dylan balançou a cabeça, como se não acreditasse na idiotice de Henrique ter se deixado envolver. — A festa é pra isso, para organizarem suas alianças políticas entre territórios.
— Eu sei.
— Deixa de choramingar. — Dylan se ergueu e o puxou pela mão. — Alianças podem ser feitas essa noite, mas a princesa não vai sair daqui antes dos vinte, então ainda dá tempo.
— Tempo de quê?
— De se divertirem. — Dylan sorriu ao piscar para ele e se posicionar para reiniciarem os treinos.
Henrique parou novamente com as costas no chão, ainda atordoado demais pelas palavras do loiro para se concentrar na luta. Ágatha não era uma "diversão", ele desejava mais ao lado dela. Mas Dylan tinha razão, ainda tinham um ano e meio para ele desfrutar de sua companhia durante as noites de caçada. Uma noite por semana, quatro dias por mês...
Palmas sem vontade ecoaram interrompendo seus cálculos. O garoto que levara Ágatha ao piquenique, sorria para Dylan.
— Não foi um grande show. — Seus olhos pousaram sobre Henrique sem muito interesse. — Mas você tem potencial — disse a Dylan.
— Quem é você? — Dylan soltou seco, ao esquivar do toque do outro em seu ombro.
— Lúcio Montenegro, filho do líder dos Nobres de Caxias do Sul.
— Hum... já ouvi falar. — Dylan sorriu e piscou para Henrique, que não compreendeu. Mas isso pareceu irritar o outro, que apertou seu maxilar como se tentasse se controlar para não morder a jugular do loiro e então voltou ao seu modo cordial.
— Mas de você eu não ouvi nada. Estranho que o filho de um líder dos Guerreiros seja tão desconhecido.
Henrique sentiu a tensão se formar. Então se apresentou, na tentativa de quebrar o clima. Lúcio o encarou com desprezo. Voltou-se para Dylan e fez um cumprimento de despedida.
— Nos vemos na festa, passe bem.
Dylan não se deu ao trabalho de responder, apenas arrumou o cabelo com as mãos e andou em direção aos dormitórios. Henrique correu atrás dele.
— Era esse o lobo que estava com Ágatha.
— Então não precisa se preocupar. Ela não vai aceitar um covarde como pretendente. — Dylan riu. Henrique sentia algum alívio, mesmo que passageiro.
— Por que o chama de covarde?
— Hans serviu ao pai desse Lúcio no ano passado, e me contou como esse covarde quase matou uma loba de hierarquia inferior.
— Em uma briga?
— Não, ele a queria. Mas ela o dispensou. Então ele teve um acesso de raiva e bateu nela com uma barra de ferro. Só não a matou porque Hans interveio.
— Isso não tem perdão no meu clã! — Henrique quase cuspiu em nojo.
— Nem no nosso. Mas ele é filho de um líder, então conseguiu algum acordo e está vivo andando por aí.
— Ágatha sabe disso? — Henrique se preocupou.
— Sim, quando Hans me contou ela estava junto.
A informação o deixou mais tranquilo. Então sorriu para Dylan ao passar o braço sobre o ombro do amigo.
— Você vai estar na festa hoje. Não consegue me colocar lá também? — Era um pedido ousado, afinal ele nem era do clã. Mas sentia uma urgência em ficar próximo a sua amada e saber quais "alianças" políticas podiam estar à espreita.
— Eu querendo fugir dessa chatice e você quer entrar? — Dylan balançou a cabeça como se não acreditasse, então sorriu. — Sabe servir bebidas?
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