O Pacto
Hey
Atualização dupla ͡° ͜ʖ ͡°
Boa Leitura!!
Votem e comentem sz
—— T H E • PAPER • B O Y ——
Não há passe de mágica nem efeitos especiais.
Palavras lançadas no papel o criaram, e palavras no papel são a única coisa que nos livrará dele.
— Stephen King
Paramos num posto logo depois de Torrance Beach. Não sei se o Bugatti tinha motor de foguete, mas bebia muita gasolina.
PACIFIC COAST HIGHWAY
SOUTH BAY, LA
DUAS HORAS DA TARDE
A fila nas bombas estava longa. Para não ficar esperando muito tempo, decidi encher o tanque em uma das bombas automáticas. Ao sair do carro, quase dei um grito: meu tornozelo doía cada vez mais e tinha começado a inchar. Inseri meu cartão de crédito, digitei o número correspondente à minha residência seguido do meu...
SEU CARTÃO NÃO PERMITE O FORNECIMENTO DE COMBUSTÍVEL
A mensagem desfilava em letras digitais na tela. Recolhi meu Platinum, esfreguei a tarja com a manga da camisa e repeti a operação, sem sucesso.
Merda...
Procurei na carteira, mas encontrei apenas uma solitária nota de vinte dólares. Irritado, virei-me para a janela do passageiro.
— Meu cartão não funciona!
— Óbvio que não! Você não tem mais nenhum centavo. Não é um cartão mágico.
— Por acaso você não teria algum dinheiro?
— E onde eu teria escondido? — ele respondeu tranquilamente — Eu estava nuazinho quando despenquei no seu terraço!
— Obrigado pela força! — resmunguei, me dirigindo mancando à caixa registradora.
O interior da loja de conveniência estava entupido de gente. Como trilha sonora, ouvia-se a famosa “The Girl from Ipanema”, na versão mágica de Stan Getz e João Gilbert. Uma obra-prima, infelizmente arruinada por tocar há quarenta anos em elevadores, supermercados e lugares como aquele.
— Que máquina! — alguém na fila assobiou.
Através das janelas, vários fregueses e funcionários observavam curiosos o Bugatti, e em pouco tempo um círculo se formou ao meu redor. Expliquei o problema com o cartão de crédito ao sujeito no caixa, que me escutou pacientemente. É preciso dizer que eu tinha uma cara honesta e, de lambuja, um carro de dois milhões de dólares – ainda que não tivesse com o botar dez litros de gasolina no tanque. Perguntas voaram da plateia, paras as quais eu não tinha uma única resposta: Era verdade que era preciso depositar um sinal de trezentos mil dólares no ato de encomenda? Existia mesmo uma chave secreta que, adicionada, fazia o carro alcançar quatrocentos quilômetros por hora? A caixa de marchas custava mesmo cento e cinquenta mil dólares?
Depois de pagar sua conta, um dos clientes – um cinquentão elegante, cabelo grisalho e camisa branca gola de Mao – sugeriu, em tom de brincadeira, comprar meu relógio para que pudesse encher o tanque. Ele ofereceu cinquenta dólares. Então os lances foram subindo exponencialmente: um funcionário me ofereceu cem dólares, depois cento e cinquenta, enquanto o dono da loja subiu para duzentos...
Era um presente de Liam cuja simplicidade me fascinava: caixa metálica sóbria, mostrador branco e cinza e pulseira de crocodilo preta, mas eu entendia tanto de relojoaria quanto de automóveis. Aquele relógio me dava a hora certa, e era tudo o que eu lhe pedia.
Todos na fila entraram no leilão, e o último lance acabara de alcançar trezentos e cinquenta dólares. Foi o momento escolhido pelo homem de gola Mao para tirar da carteira um grosso maço de notas. Contou dez de cem dólares e as pousou sobre o balcão:
— Mil dólares se fechar negócio agora – disse com certa solenidade.
Hesitei. Eu admirara mais meu relógio naqueles últimos três minutos do que nós últimos dois anos. Seu nome impronunciável – IWC Schaffhausen – não me dizia nada, mas eu também não era nenhuma autoridade no assunto. Capaz de recitar de cor páginas inteiras de Dorothy Parker, eu suaria para pronunciar mais de duas marcas de relógio.
— Negócio fechado – finalmente eu disse, soltando a pulseira.
Peguei os mil dólares e dei duzentos ao frentista para pagar adiantado o tanque cheio. Eu estava me preparando para ir embora quando me ocorreu lhe perguntar se ele não teria também uma atadura para meu tornozelo.
Bastante satisfeito com a transação, voltei para o Bugatti e introduzi a pistola da bomba no tanque. De longe, vi o sujeito do relógio me lançar um discreto aceno de mão antes de deixar o local em seu Mercedes cupê.
— Como você se virou? – perguntou Tommo, abaixando o vidro.
— Não foi graças a você.
— Vamos, não seja mesquinho.
— Eu dei um jeitinho – respondi orgulhoso, ao mesmo tempo em que observava os números desfilarem na máquina.
Eu havia despertado sua curiosidade, e ele insistiu:
— Como?
— Vendi meu relógio.
— Seu Português?
— Que Português?
— Seu relógio. É o modelo “Português” da IWC.
— Obrigada pela informação.
— Por quanto vendeu?
— Mil dólares. Isso paga nossa gasolina até o México. E posso inclusive te oferecer um almoço antes de pegarmos a estrada.
Ele deu de ombros.
— Vamos, fale a verdade.
— Mas é a verdade. Mil dólares. — repeti, prendendo a pistola de bomba novamente.
Tommo levou as mãos na cabeça.
— Vale no mínimo quarenta mil!
Na hora achei que era piada – um relógio não podia custar tanto, certo? –, mas, vendo o seu rosto desfigurado, não tive outra saída a não ser admitir que cairá no golpe como um patinho...
* * *
MEIA HORA MAIS TARDE
NUMA LANCHONETE DE BEIRA ESTRADA
DEPOIS DE HUNTINGTON BEACH
Limpei o rosto com o lenço umedecido e, após ter feito um curativo no tornozelo, deixei o banheiro para encontrar Tommo na mesa.
Empoleirado num banquinho alto, ele terminava uma enorme banana split, que pedira depois de dois cheeseburgers e uma porção grande de fritas. Como ele podia manter a forma comendo daquele jeito?
— Hum... deliciosa, quer provar? – ele me ofereceu, de boca cheia.
Recusei, me limitando a limpar com um guardanapo o mashmallow que grudada na ponta de seu nariz.
Ele sorriu antes de desdobrar diante de si um grande mapa rodoviário para que pudéssemos acertar os detalhes de nossa incursão.
— É muito simples. De acordo com a revista, a Aurore e seu namorado ainda estão de férias em um hotel de luxo de Cabo San Lucas, onde ficarão até o fim da semana.
Ele se debruçou sobre o mapa e, com um marca-texto, desenhou uma cruzinha na ponta da península mexicana da Baixa Califórnia do Sul.
Eu já tinha ouvido falar daquele lugar, famoso por ser point de surfe por causa das ondas gigantes.
— Não fica exatamente ali na esquina! – constatei, servindo-me outra xícara de café. — Você não prefere ir de avião?
Ele me lançou um olhar fúnebre.
— Para irmos de avião, precisamos de dinheiro, e, para termos dinheiro, você não pode gastar tudo o que tem!
— A gente podia vender o carro....
— Pare com as suas tolices e se concentre um pouco! De qualquer forma, você sabe muito bem que eu não tenho passaporte.
Com o dedo, percorreu no mapa um itinerário imaginário.
— Estamos a pouco mais de duzentos quilômetros de San Diego. Acho que devemos evitar rodovias e trechos com pedágio para economizar, mas, se você me deixar dirigir, podemos estar na fronteira mexicana em menos de quatro horas.
— Por que eu deveria deixar você dirigir?
— Bem, você não acha que sou melhor no volante? Carro não parece ser muita sua praia. Acho que você tem mais talento para as coisas intelectuais do que para mecânica. Sem falar no seu tornozelo...
— Hum...
— Acho que você se ofendeu. Será que tem vergonha de ser transportado por uma mulher? Espero que já tenha superado a fase de macho primário!
— Bom, podemos negociar. Tudo bem você dirigir até San Diego, mas depois revezamos, porque é muito chão.
Ele pareceu se contentar com essa divisão de tarefas e continuou expondo seu plano:
— Se tudo correr bem, atravessamos a fronteira de Tijuana no fim da tarde. Esticando mais um pouco, podemos encontrar um hotelzinho simpático no México.
Um hotelzinho simpático... Como se estivéssemos em férias!
— E amanhã acordamos de madrugada e pagamos a estrada de novo. Cabo San Lucas fica a mim e duzentos quilômetros de Tijuana. Podemos percorrê-lo durante o dia e chegar à noite no hotel da sua Dulcineia.
Dito assim, parecia simples.
Meu celular vibrou no bolso – eu continuava recebendo ligações, embora fosse impossível fazê-las. Era o número de Liam. Na última hora ele havia me deixado uma mensagem a cada dez minutos, mas eu as apagava confirme chegavam, sem nem me dar ao trabalho de ouvi-las.
— Então estamos combinados: ajudo você a reconquistar sua garota e, em troca, você escreve esse maldito terceiro volume! — ele recapitulou.
— O que faz você acreditar que eu ainda tenho chance com a Aurore? Ela encontrou o grande amor no tal piloto de Fórmula 1.
— Isso é assunto meu. O seu é escrever. Mas sem truques, hein? Um romance de verdade! Respeitando as minhas especificações.
— Lá vem você de novo: especificações!
Ele mordiscou a caneta, como uma criança procurando antes de começar um dever.
— Em primeiro lugar — ela começou, escrevendo um grande 1) na toalha de papel –, quero que pare de me transformar no bode expiatório de seus livros! Que graças a você vê em fazer todos os feiosos do mundo passarem pela minha cama? Por acaso você fica excitado me fazendo conhecer caras cujas mulheres perderam todo o encanto e que só veem em mim a trepada de uma noite para satisfazer a libido? Talvez minha falta de sorte agrade seus leitores, mas isso me cansa e me machuca.
Aquela reclamação repentina me deixou sem voz. Tudo bem, eu não poupara Tommo nas minhas histórias, mas para mim isso não tinha grandes consequências: ele era um personagem de ficção, pura abstração que não tinha outra existência material se resumia a algumas linhas impressas em folhas de papel. E eis que agora a criatura ousava de voltar contra o criador.
— Em segundo lugar – continuou Tommo, desenhando um 2) na toalha de papel sobre a mesa —, não aguento mais comer pão que o diabo amassou. Gosto do meu emprego, mas trabalho com oncologia e estou cheio de ver gente sofrendo e morrendo todo dia. Sou uma verdadeira esponja, absorvo todo o sofrimento dos pacientes. Além disso, me endividei para pagar meus estudos! Não sei se você sabe quanto ganha um enfermeiro, mas posso lhe garantir que não é nenhuma fortuna!
— E o que eu posso fazer para te agradar?
— Quero a minha transferência para pediatria, ver com mais frequência de vida que a morte... Faz dois anos que peço isso, mas aquela megera da Cornelia Skinner nega meu pedido sistematicamente, alegando sempre que precisa de mim. E depois...
— E depois o quê?
—...como cereja do bolo, eu gostaria muito de receber uma pequena herança...
— Que beleza!
— No que isso pode te afetar? É fácil para você! Basta escrever uma linha! Que que eu redija? Aqui está: “Tommo recebeu quinhentos mil dólares de um tio, do qual era a única herdeira”.
— Sem problemas. Se eu bem entendi, você quer que eu mate seu tio!
— Não! Meu tio de verdade, não! Um tio-avô que eu nunca tenha visto mais gordo, enfim, como nos filmes, ora bolas!
Satisfeito, anotou sua frase com capricho.
— Muito bem, terminou sua lista para o Papai Noel? Nesse caso, podemos voltar para a estrada.
— Mais uma coisa – ele ponderou. — A mais importante.
Escreveu um 3) na ponta da toalha, seguido de um nome:
JACK
— Pronto! – explicou com seriedade —, quero que o Jack largue definitivamente a mulher e venha morar comigo.
Jack era seu amante. Um homem casado, um carinha boa-pinta e egoísta, pai de dois filhos pequenos, com quem ele vivia de dois anos para cá uma relação destrutiva e passional. Um narcisista perverso, ciumento e possessivo, que o dominava alternando falsas juras de amor eterno com humilhação que a degradavam ao nível da amante que só serve para trepar.
Balancei a cabeça, fazendo cara de decepção.
— O Jack tem pau na cabeça.
Não tive tempo de ver sua mão levantar. Intempestivamente, ele me aplicou uma bofetada magistral, que quase me fez cair do banquinho.
O restaurante inteiro se virou para nossa mesa, esperando a minha reação.
Como é que ele pode defender esse idiota?, Perguntou a voz da cólera dentro da minha cabeça. Porque está apaixonado por ele, caramba!, respondeu a voz do bom senso.
— Não permito que julgue a minha vida sentimental, da mesma forma que não julho a sua – ele respondeu, me desafiando com o olhar. — Ajudo você a recuperar a Aurore e você me escreve uma vida na qual eu possa acordar todas as manhã ao lado de Jack. Negócio fechado?
Ele assinou o contrato improvisado que redigira na toalha, depois recortou cuidadosamente o quadrado de papel antes de me estender a caneta.
— Negócio fechado – eu disse, coçando o rosto.
Rubriquei o documento e deixei alguns dólares na mesa antes de sair da lanchonete.
— Você vai me pagar caro por essa bofetada – prometi, fuzilando-o com o olhar.
— É o que veremos – ele respondeu altivamente, se instalando no volante.
Notas Finais
Desculpem os erros, espero que a história esteja sendo bem legal para vocês, tenho meus capítulos preferidos, eles estão bem próximos ♥
Até logo ♥
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