Capítulo 35 (Parte I)
"Sim, eu prefiro ser um apaixonado do que um lutador
Porque toda a minha vida eu tenho lutado
Nunca senti uma sensação de conforto
Todo esse tempo estive escondido." - Silence, Marshmello
Dinesh abotoava o seu terno, apressando os passos até estar dentro do estúdio. A maquiadora fazia os últimos retoques na pele do indiano antes dele ir ao ar em uma das maiores emissoras do Japão. O crescimento de sua empresa a deixou em uma posição de destaque, principalmente por ocupar o segundo lugar no ranking mundial. Após as devidas apresentações, o homem lançava um sorriso gentil para a câmera sabendo que, assim, poderia conquistar o público.
— É raro ver empresários se expondo dessa forma, especialmente quando envolve uma atividade econômica tão poderosa quanto essa. — comenta a apresentadora, Nijima Taiko, olhando a sua prancheta. — Por que decidiu sair do padrão, senhor Yamir?
— Eu sempre gostei de mostrar diferença, tanto em meu trabalho quanto em meu estilo de vida. — comenta com o orgulho aveludado por falsa gentileza. — Gosto de expor meu trabalho para que empresários inexperientes possam seguir o mesmo caminho, apesar de que aconselho que cada um tenha o seu próprio método.
— E, se me permite perguntar, qual é o seu?
— Honestidade, transparência e esforço. O meu pai, Raj Yamir, era sincero com seus sócios e não aceitava um acordo que desse desvantagem para eles. Por isso, eu decidi seguir os seus mesmos ensinamentos, sendo totalmente sincero com a minha equipe.
Nos bastidores, Youko e Masaichi riam alto diante da mentira descarada de seu chefe. O vice diretor batia na mesa sentindo a barriga doer e, por outro lado, Youko secava uma lágrima do canto do seu olho.
— Como você consegue lidar com o stress da sua rotina, senhor Yamir?
— Eu passo o tempo livre com minha família ou cozinhando.
— Oh, o senhor gosta de cozinhar? Não parece ser o seu estilo.
E por acaso eu preciso andar com um toque blanche* por onde passo?, pensava com um sorriso simpático para disfarçar.
— Eu escuto muito isso, senhora Taiko, mas não os julgo. Acho que as pessoas têm uma imagem errada de mim por parecer sério demais.
— E ameaçar todos os concorrentes. — completa Masaichi do camarim.
— Não dar aumento aos funcionários, lançar no mínimo três palavrões a cada reunião e ainda soltar a fumaça do cigarro na cara dos empresários que tentam passar a perna nele. — afirma Youko ao lado do vice diretor, segurando a risada. — Sim, fora isso, é porque ele é sério demais.
Os dois se encaram antes de caírem novamente na risada.
— Então, temos um lado desconhecido do senhor Yamir. — dizia a apresentadora. — Conte-me mais sobre ele.
Dinesh lançava um olhar amável em direção à câmera, começando a relatar sobre a sua vida na Índia, ocultando o seu histórico de agressividade e, evidentemente, os momentos que poderiam "sujar" a sua imagem. Enquanto isso, Masaichi e Youko encaravam o Yamir com orgulho, apesar de estar mentindo em rede nacional. Eles sabiam que era necessário criar uma imagem de "bom homem" para o indiano, assim a empresa também sairia beneficiada – e, no fundo, os dois queriam que as pessoas vissem o verdadeiro lado bom dele.
Ao final da entrevista, Dinesh se despedia com um beijo na mão da apresentadora que sorria sem jeito. Logo após, ele seguia de volta para os bastidores e encontrava Miyuki no meio do corredor, andando de um lado para o outro. Ela havia sido convocada para acompanhar Youko, mesmo sabendo que o real objetivo era ter mais momentos perto do seu chefe. O Yamir aproximava-se aproveitando a distração dela para roubar um demorado beijo de seus lábios. Inicialmente, Miyuki pisca os olhos confusa mas acaba retribuindo por ser levada pelo calor do momento. Quando afastava os lábios, olhava para os lados preocupada e dava um leve tapa no ombro dele.
— A-Alguém pode nos ver, Dinesh.
— O corredor está vazio e, particularmente, eu não ligo de ser visto. — murmura distribuindo beijos pelo pescoço dela. — O que achou da entrevista?
— Céus, você mentiu mais do que o Pinóquio. — brincava. — Não tem medo do nariz crescer?
— Meu nariz nunca cresceu quando conto uma mentira, mas tem outra coisa que cresce quando estou perto de você.
— D-Dinesh!
O Yamir precisava se afastar quando escuta o som da porta ser aberta, lançando um olhar impaciente para Youko e Masaichi.
— Seus empata foda.
— Tem câmeras no corredor, sua anta. — dizia Masaichi apontando para o teto. — Eu estou te avisando à tempo.
— Eu já sabia.
— E ainda assim ia continuar?!
— É claro. Eles conseguiram uma entrevista comigo e iam ganhar, de brinde, um filme pornô também.
Miyuki o olhava incrédula enquanto Youko caía na risada.
— Você não tem jeito mesmo, Dinesh.
— O importante é que tudo correu bem entrevista. — pontua Youko entre algumas risadas arrastadas. — A aceitação da empresa irá crescer mais ainda.
Dinesh assentia com a cabeça, puxando Miyuki pela cintura para ir contra seu corpo. Ela sorria fraco apoiando a mão sobre o peitoral do indiano enquanto desvia a atenção para os demais.
— Poderíamos sair para comemorar, o que acham?
— Uma boa ideia, eu preciso encher a cara depois de aturar o Dinesh por tanto tempo.
— Vai se foder, Masaichi.
— Vocês estão vendo, não estão? Esse cara é um poço de estresse.
— E de tesão, não é Miyuki? — questiona o Yamir com um sorriso de canto.
— N-Não sei de nada.
— Vamos logo, eu também quero beber. — comenta Youko os empurrando para fora do estúdio. — Precisamos comemorar a situação da nossa empresa e, também, a queda daqueles empresários tóxicos.
Dinesh suspirava baixo lembrando de todos os acontecimentos recentes.
A morte de Thomas Adams ganhou grande repercussão na mídia, mesmo depois de um mês. Os jornais acompanhavam de perto as investigações em busca do culpado, já que não houve nenhuma testemunha. Para que não fossem descobertos, Dinesh contratou Takeo – líder da máfia local – e pediu para que sua equipe ameaçasse os capangas de Thomas. Na realidade, não foi muito difícil mantê-los calados porque ninguém queria realmente trabalhar para aquele homem de olhos frios como gelo. Então, sem nenhuma testemunha, as investigações seguiram um ritmo lento. O Yamir também subornou a mídia para que, aos poucos, esquecesse do caso da morte do empresário. Dessa forma, quando o culpado fosse preso – e se fosse – não haveria tanta repercussão.
Na empresa, Dinesh esforçava-se ao máximo e conseguiu conquistar a simpatia de boa parte dos funcionários. Aos poucos, as pessoas ao seu redor começaram a entender o tratamento rígido do Yamir. Por causa da sua política severa, a empresa não sofreu perdas durante uma forte crise no Japão naquela época. Enquanto as demais empresas despediam seus funcionários, Dinesh conseguiu manter o mesmo efetivo e ainda garantiu um aumento valioso no último mês do ano. Quando o aumento foi liberado apesar dos tempos difíceis no mundo dos negócios, os membros da empresa perceberam como o sacrifício no início do ano foi necessário. Mesmo com um método diferente do que provavelmente Raj adotaria, o presidente trouxe vantagens para todos.
Em seus momentos vagos, aproveitava com a sua família. Maya estava aprendendo alguns golpes com o seu irmão que, mesmo abandonando o Muay Thai por quase cinco meses, ainda tinha plena ciência da execução dos golpes. Mahara aprendeu a preparar as refeições do café da manhã com a ajuda do seu filho e também aperfeiçoou o seu preparo do bolo de chocolate.
— Eu nunca vou aprender a relação de Girard. — dizia Kiran apoiando a cabeça sobre a escrivaninha do seu quarto. — Eu sou muito burro.
— Se tem tempo para se lamentar, tem tempo para continuar tentando.
Kiran olhava para Dinesh sentado em sua cama, digitando em seu computador com um semblante sereno. O mais novo semicerra os olhos e largava o lápis na mesa.
— Eu ainda não sei o motivo de estar aqui.
— A mamadi pediu para que eu te ajudasse.
— Que chato. — murmura voltando a focar no seu caderno. — E por que não está me ajudando?
— Porque você não pediu.
— Filho da mãe.
Dinesh solta uma alta risada, deixando o notebook de lado e aproximando-se do seu irmão. Ele apoiava ambas as mãos nas costas, onde seu corpo tinha um leve inclinar para frente. As mechas do cabelo escorregavam pelos ombros enquanto seus olhos analisavam brevemente as fórmulas no papel.
— Quando aparece a soma ou os produtos da equação, você irá usá-la. Não é tão difícil quanto parece, mas requer muita atenção. Como você está no Ensino Médio, não precisa se preocupar com uma equação de quinto grau mas, com certeza, irá lidar com os pequenos diabinhos de quarto grau. Veja os produtos dessas equações, Kiran. — comenta pegando a caneta e começando a calcular, onde o mais novo observava tudo com atenção. — A letra "a" equivale à três e "d" vale um. Aqui diz que uma das raízes vale dois. Tente resolver essa questão, ao obter o resultado você irá trocar esses valores.
— E no final?
— Você irá resolver o sistema com os elementos que possui. A equação vai cair para o segundo grau, onde você usa a Bhaskara.
Kiran balança a cabeça em concordância e começa a resolver a equação, recebendo algumas dicas do mais velho. Ao final, mostrava o resultado para Dinesh que fazia um sinal positivo com os dedos.
— Woah! Como você conseguiu? Aprendeu isso na faculdade de Administração?
— Não, eu aprendi no Ensino Médio como você.
— E ainda lembra?! — exclama surpreso.
Ele ria fraco diante da reação do irmão.
— Eu tenho uma boa memória. Eu sempre me esforcei para que o baldi notasse o meu bom desempenho.
— A mamadi comentou que você era o melhor aluno da turma.
— Ela foi humilde. Eu era o melhor aluno do colégio, até venci um concurso de soletrar com sete anos.
— Não acredito!
— Quer ver o troféu?
— Claro!
Sendo levado pela curiosidade, Kiran ia até o quarto do maior que vasculhava em uma caixa de papelão localizada dentro do guarda roupa. Ele aproveitou para analisar o quarto do seu irmão, pois fazia muito tempo que não entrava nesse cômodo. O quarto tinha cores neutras como o cinza e o prata, principalmente nas paredes e as decorações. Havia uma poltrona preta no canto, uma televisão diante da cama – com uma coberta cinza, por sinal – e uma prateleira repleta de livros na mesma parede da televisão. Além do mais, o lustre no teto era uma bola branca com uma iluminação sutil, acentuando o clima mórbido do local.
Timidamente, Kiran se aproximou de uma coleção de medalhas das competições de Muay Thai. A maioria era ouro, exceto por duas de prata que eram de longa data. Os seus olhos percorrem pelos livros que variavam de gastronomia até administração, captando alguns livros de Stephen King.
— Desde quando você tem bom gosto para livros?
— Acha que eu sou o mais inteligente da família pesquisando a resposta no Google? — ironiza Dinesh ao se aproximar, mostrando o troféu de vidro com detalhes pretos nas bordas e o centro branco com o slogan do colégio. — Isso basta para você?
— Tenho quase certeza que você roubou de alguém. — brincava Kiran.
— Mais respeito, baixinho!
Dinesh dava um leve tapa na nuca dele.
— Ei! Eu sou quase do seu tamanho. — comenta acariciando o local do tapa com um leve bico, mas logo ficava com um semblante triste. — Dinesh...
— Sim?
— A Sakura disse que quer falar com você. Ela me pediu para marcar hoje na cafeteria no centro da cidade, aquela perto da livraria.
— Então, ela quer terminar a sua vingança.
— Você não precisa ir, sabe. — dizia com uma evidente preocupação, o que rende uma exclamação surpresa do mais velho. — Nós podemos dar um jeito e...
— Eu não vou fugir do meu destino. Não importa o que aconteça, eu vou encarar de frente os meus erros.
Kiran suspirava pesadamente e se limita a balançar a cabeça em concordância.
— Tudo bem...
— Agora, eu preciso ir. Eu prometi à Maya que iríamos passear e, provavelmente, essa será a última vez.
— Dinesh...!
O mais velho Yamir virava-se para o seu irmão, um pouco confuso por causa do grito repentino. Kiran mexia os próprios dedos de forma inquieta, sentindo algo preso em sua garganta. Por mais que quisesse se expressar, não sabia exatamente o que dizer e optou por balançar a cabeça negativamente.
— Nada. Divirta-se e cuide bem dela.
(...)
Maya fechava os olhos rindo alto quando seu corpo girava de forma desajeitada pelo gelo, caindo sentada no chão. Dinesh observava tudo com um sorriso descontraído, patinando até a sua irmã e a ajudando a levantar ou, ao menos, tentando pois acabava caindo sentado também. A pequena ria mais ainda apoiando as mãos sobre a barriga e essa visão aqueceu o coração do mais velho.
Com muito esforço, os dois conseguem se levantar e continuam a patinar na pista de gelo. Maya segurava a mão de seu irmão enquanto impulsionava o corpo para frente, sentindo o vento gelado do ambiente bater contra seu rosto. Dinesh havia prendido o cabelo em um coque, usava um cachecol cinza e um longo sobretudo preto que acentuava a sua aparência "tenebrosa". Por outro lado, a menor usava um conjunto de roupas de inverno de tonalidade amarela – a sua cor favorita – e um par de luvas brancas. Quando os dois avançavam para o centro da pista, o mais velho a girava abaixo de seu braço como uma dançarina em seu auge na apresentação. Ela sorria de forma descontraída até ficar tonta, quase caindo mas segurava firmemente nos braços do Yamir. Ele notava as pernas dela trêmulas e afagava seu cabelo por cima do gorro bege que usava.
— Não tenha medo. Pode se apoiar em mim.
— Eu sempre vou poder, bhaya?
Ao lembrar de que, provavelmente, a Sakura irá matá-lo por ser o último homem em seu plano de vingança ou seu objetivo de se entregar, Dinesh respondia à sua pergunta com um sorriso triste. Ele olhou para o rosto da sua irmã, lembrando de quando preparava suas sobremesas favoritas ou a jogava no ar, ouvindo sua risada contagiosa. Naquele momento, gravou a imagem do seu sorriso e o brilho em seus olhos dourados.
Ele a puxava para continuar a patinar, disfarçando a tristeza com um sorriso – o que aprendeu com o Kiran. Ao final do passeio, ele retirava os patins e se sentava em uma das mesas da cafeteria ao lado da pista de patinação. Após receberem os seus pedidos, os olhos da pequena se arregalavam bem como sua boca fica em formado "O" ao ver o chocolate quente repleto de chantilly. Dinesh ria com a reação da sua irmã, bebericando o seu chá quente.
— Gostou do passeio, Maya?
— Eu amei! Vamos patinar próximo final de semana, bhaya? O Kiki e a mamadi podem vir.
— Claro, eu imagino a cara do Kiran ao cair no gelo.
Infelizmente não estarei ao seu lado para ver, pensava.
Depois que saíram da cafeteria, Dinesh a levou para uma loja de brinquedos. Maya olhava para toda a extensão da loja de dois andares, apertando forte a mão do seu irmão e o encarando em um pedido silencioso. Ele balança a cabeça em concordância e a pequena sai correndo em direção ao setor de bonecas. Os olhos dela enchem-se de brilho diante das inúmeras opções à sua frente. Enquanto isso, Dinesh mandava uma mensagem para Miyuki pedindo para que se encontrassem à noite no escritório dele.
Maya retornava com uma boneca com metade do seu tamanho, mostrando ao irmão toda animada.
— Que linda, Maya!
— Não é? Não é? Ela tem um lacinho igual ao meu e sua pele me lembra o Kiki.
— É mesmo. Quer levá-la?
— Quero sim, por favor.
Ele beijava suavemente a testa da menor, seguindo até o caixa onde comprava a boneca. A atendente demorava um pouco para finalizar a compra por estar perdida na beleza do rapaz. Em seguida, os dois se dirigiram para o carro do indiano onde voltaram para a mansão da família Yamir. Maya mostrava o seu presente para Mahara enquanto Dinesh ia para a cozinha pegar os ingredientes para o jantar.
— Eu gostaria de ajudar. — dizia Mahara sendo acompanhada por sua filha.
— Eu também, bhaya!
— Que bom. Vamos preparar yakisoba. — comenta abrindo o armário. — Hum... Onde eu deixei o macarrão?
— Está no compartimento direito. — comenta Kiran ao se aproximar, rendendo uma exclamação surpresa do mais velho. — Eu também vou ajudar.
Dinesh lança um olhar confuso para Mahara que apenas dá nos ombros.
Kiran colocava os ingredientes na mesa e, com a ajuda do seu irmão, refogava a cebola e os demais legumes na panela. Por outro lado, Mahara preparava o macarrão sob a supervisão de Dinesh enquanto Maya jogava os ingredientes na panela conforme era pedido. Os quatro terminaram o yakisoba em poucos minutos e tiveram tempo extra para fazer uma sobremesa. Porém, a menor precisou ir para o banho e a sua mãe a acompanhou, deixando os outros dois indianos com a missão de preparar a sobremesa escolhida: mousse de chocolate.
— Deve ser usado chocolate amargo, Kiran.
— Mas não vai combinar, Dinesh! — exclama enrugando a testa. — A sobremesa tem que ser doce.
— Quando você adicionar o leite condensado, o sabor amargo será anulado. Na verdade, não totalmente mas esse é o "charme" da sobremesa.
— E se ficar ruim?
— Quem tem o diploma de Gastronomia aqui?
Kiran revira os olhos dando-se por vencido naquela pequena discussão. Dinesh sorria convencido, cortando o chocolate amargo em cubos e os adicionando na panela para derreter. Em meio ao silêncio de longos segundos, a risada de Kiran ecoa pelo local.
— Ficou maluco?
— Você definitivamente não combina com isso. — comenta apontando para o avental rosa, soltando uma alta risada. — Se o pessoal da empresa descobrisse, você não ia intimidar ninguém.
Dinesh apoia a mão no peito, fingindo estar magoado.
— Consigo intimidar mais com um avental do que você com um terno.
— O que?! Está dizendo que eu não sou capaz de intimidar?
— Com essa cara de bebê? Nem em mil reencarnações, bhai.
Kiran fazia um bico como se estivesse irritado, mas logo cai na risada sendo acompanhado pelo seu irmão. Dinesh jogava a cabeça para trás enquanto mexia o chocolate, sem perceber que era alvo do olhar terno de Mahara.
Eles ainda se amam como bons irmãos, pensava.
(...)
Miyuki observava a neve cobrindo toda a cidade enquanto estava na sala do diretor. O seu chefe havia ligado para o segurança, permitindo a entrada da jovem naquele início da noite. O crepúsculo tornava o ambiente mais belo, principalmente pelos raios alaranjados atravessando as nuvens densas. Ao ouvir o som da porta sendo aberta, virava-se em direção ao indiano que usava um longo sobretudo preto e coturnos da mesma cor.
— Por que me chamou até aqui, Dinesh?
Ele afastava o cachecol cinza para poder falar ao mesmo tempo que se colocava ao lado dela.
— Essa é a minha última noite.
— Como assim?
— Hoje, eu irei pagar pelos meus erros. Não sei de qual forma, mas isso acontecerá.
Os olhos de Miyuki ficam marejados e ela morde o interior das bochechas para conter o choro. Então, desviava a atenção para o horizonte com a imensa do olhar distante do seu chefe em mente.
— Você está com medo...?
— Eu enfrento empresários e mafiosos em meu dia à dia, Miyuki.
— Você não respondeu a minha pergunta.
Dinesh soltava um longo suspiro, abaixando o olhar.
— Sim, estou com medo. Eu não quero morrer, não quero ficar longe da minha família mas eu não posso fugir do que eu fiz.
— Você é bem corajoso, Dinesh. — comenta apoiando a mão no ombro dele, sorrindo fraco. — Você foi o herói que me salvou e, independente do que diga ou pense, isso não vai mudar. Eu ainda acredito que você não fez aquilo.
— Eu também assumirei outros erros, tão sérios quanto esses. De qualquer forma, está na hora de encarar de frente tudo o que eu fiz.
Miyuki concordava silenciosamente com um leve balançar da cabeça, repousando-a no ombro do indiano logo em seguida. As mechas soltas de seu cabelo escorregavam por seus ombros, alguns atravessando o rosto com graciosidade. Um longo suspiro saía de seus lábios enquanto os olhos estavam focados nas luzes natalinas da cidade, mas a mente vivendo unicamente aquele momento.
— Como ficará a empresa?
— Deixarei nas mãos do Masaichi. Se algo der errado, o Kiran quem assumirá mas acho pouco provável.
— Entendo...
Sem ao menos perceber, as lágrimas já escorriam pelo rosto da jovem. Por outro lado, Dinesh continha qualquer sentimento negativo para manter a pose inquebrável de sempre. Porém, era perceptível como estava assustado por dentro pois seu corpo tremia levemente.
Miyuki queria agradecer por todos os momentos em que foi salva por aquele homem, mas também lançar xingamentos por ter sofrido por causa do jeito egoísta e indiferente dele. Queria se desculpar por, no começo, não ter compreendido a profunda ferida no coração de Dinesh. Desejava torná-la dele mais uma vez, sentir o calor de seu corpo e a sua respiração pesada contra sua pele. O seu coração clamava por mais palavras de afeto ou um singelo abraço repleto de sentimentos. Tudo o que queria era poder expressar o quanto a existência dele mudou totalmente a sua vida. Miyuki ergueu um pouco a cabeça para fitá-lo e, então, ela o abraçou de lado inspirando profundamente o seu aroma agradável. Por mais que quisesse se expressar, as palavras se encontravam presas em sua garganta e só pôde chorar nos braços da pessoa amada.
Dinesh entendeu a sua dor e retribuiu o abraço, apertando-a contra o seu corpo. Ele deu um beijo no topo da sua testa enquanto uma lágrima teimosa escorria do canto do seu olho.
Os dois permaneceram em silêncio por muito tempo, apenas apreciando a companhia um do outro.
Então, Dinesh se desvencilhou do abraço e ajeitou os alguns fios da cabeça dela, colocando-os atrás da sua orelha.
— Eu preciso ir.
Ela afirma com a cabeça e o observa se afastar com os olhos marejados. Porém, quando Dinesh abria a porta, Miyuki deixava uma pergunta escapar junto com sua insegurança:
— Em algum momento, você me amou?
Ele a olhou por cima dos ombros, onde os seus lábios se moveram desenhando um sorriso triste. Os seus olhos negros refletiam a luz da Lua e o seu semblante, como sempre, era indecifrável.
— Até mais, senhorita Sato.
Quando a porta é fechada, Miyuki encontrava-se sozinha no escritório com a luz do luar sendo a única iluminação presente. Nesse momento, ela se permitiu desabar em lágrimas abaixando-se e escondendo o rosto com ambas as mãos.
— Até mais, senhor Yamir...
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